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4.3 RESULTADOS E ANÁLISE DO ESTUDO PILOTO

4.3.1 Diário de Campo

4.3.1.3 Fechamento do Caso A Relatório Final:

Neste momento assume a mediação do grupo, o tutor substituto 2. O estudante coordenador do grupo retoma as discussões postadas no fórum e também instiga o que cada um construiu individualmente e quer agora compartilhar. O relatório começa a ser elaborado colaborativamente de acordo com as pesquisas individuais. Abaixo, alguns extratos das falas dos sujeitos retirados do diário de campo feito durante o fechamento do Caso, momento presencial.

“eu achei nas minhas pesquisas artigos sobre Pneumonia Adquirida na Comunidade – PAC. Conceito muito importante mas que na abertura a gente não colocou. Ninguém se lembrou de citar. Vamos botar agora, acho legal.” (Fala Sujeito 1)

O tutor – agora o substituto 2 – pergunta se o grupo acha conveniente a inserção do termo Pneumonia Adquirida na Comunidade (PAC) como objetivo da aprendizagem. O grupo concorda. A discussão tem início recuperando os conceitos já construídos anteriormente sobre PAC. Entretanto, é sugerido que comecem as discussões por um conceito mais básico: pneumonias agudas – etiologia. As falas são contextualizadas, trazem o foco para uma vivência possível, atual: a superbactéria. E começam a refletir sobre a influência da mídia na formação dos conceitos por conta da superexposição midiática do assunto superbactéria. O tutor substituto 2 intervém:

“Gente, vamos focar no que queremos discutir. Deixa a gente acabar o que se construiu sobre PAC, para finalizar este primeiro conceito. Se não o tempo passa e nada...” (Fala Tutor substituto 2)

Discutem sobre epidemiologia da PAC e traçam tabela com o índice de mortalidade infantil. Todos, realmente, participam da elaboração do relatório final do Caso. Os estudantes interagem entre si, querendo mostrar o conhecimento construído. O tutor faz a mediação, interligando os conceitos. Instiga a discussão e a participação dos mais tímidos que acabam se envolvendo também. O tutor observa a não participação do secretário que está às voltas com um problema técnico no computador, o tutor estimula.

“Vamos participar, não é porque a máquina quebrou que a cabeça deixa de funcionar ... pode falar, se coloque...” (FalaTutor substituto 2)

O secretário do grupo coloca sua opinião sobre o que está sendo discutido. O tutor retoma a discussão, colocando conceitos que se inter-relacionam, interligam-se com conceitos já abordados anteriormente, motivando os estudantes através da colocação dos conhecimentos prévios. Faz a mediação colocando conceitos distintos que os estudantes recuperaram para chegar a um conceito único construído consensualmente. Podemos trazer exatamente para esta situação o professor problematizador dentro de uma abordagem construtivista interativa, o que Pucci (2009) ao citar Martín-Barbero (2003), coloca que

o desafio comunicacional do professor presencial e online, em que apresenta o ciberespaço como o novo locus de comunicação, de sociabilidade, de organização, de informação, de conhecimento e de educação, resgata a função do professor na era do hipertexto: De mero transmissor de saberes deverá se converter em formulador de problemas, provocador de interrogações, coordenador de equipes de trabalho, sistematizador de experiências, e memória viva de uma educação que, em lugar de aferrar-se ao passado (transmissão), valoriza e possibilita o diálogo entre culturas e gerações. É “conselheiro”, “parceiro” e “facilitador”, (...) “sistematizador de experiências”, pois expressa bem as novas características desse profissional: “arquiteto de percursos”, “agenciador da construção do conhecimento na experiência viva da sala de aula”, mobilizador das inteligências múltiplas e coletivas na experiência do conhecimento, estimulador da participação criativa dos alunos (2009, p.21).

Alguns estudantes recorrem a o que chamamos anteriormente de muleta (texto impresso, alguma fonte de referência), o tutor substituto 2, diferentemente do tutor substituto 1, não acha bom este recurso de recorrer a muletas. Ele acha que a discussão com o objetivo de construir o relatório tem que seguir unicamente o que foi construído por cada um. O que gera um conflito de opiniões entre estudantes e tutor.

“Este auxílio muleta que vocês utilizam para discutir agora a construção dos conceitos é ‘fake’. Estamos fazendo este tutorial baseado no que construímos ou baseado no que estamos copiando?” (FalaTutor substituto 2) “Professor, todo mundo recorre a alguma referência para se colocar. Isto não é proibido, ajuda.” (Fala Sujeito 2)

Numa abordagem construtivista, reconhecemos por situação didática o momento em que há a intenção, seja ela explícita ou não, de aprendizagem. Podem ser consideradas as ações contidas na relação aluno/professor/saber. Ao ser colocado aqui este conflito, podemos trazer o conceito de contrato didático de Guy Brousseau (1996)

(...) conjunto de relações estabelecidas explicitamente e ou implicitamente entre um aluno ou um grupo de alunos, num certo meio, compreendendo eventualmente instrumentos e objetos, e, um sistema educativo (o professor) com a finalidade de possibilitar a estes alunos um saber constituído ou em via de constituição... o trabalho do aluno deveria, pelo menos em parte, reproduzir características do trabalho científico propriamente dito, como garantia de uma construção efetiva de conhecimentos pertinentes.

A maioria do grupo concorda com o estudante. Entretanto, a opinião do Tutor é entendida como um fator enriquecedor para o grupo. Chegam a um acordo consensual de que é melhor não consultar, neste momento, muletas. No diálogo acima é provável que tenha ocorrido a quebra do contrato didático. Uma vez que o comportamento do tutor não estava previsto pelo grupo. Entretanto, a renegociação permite o andamento das ações. O coordenador do grupo chama a atenção para, de acordo com esqueleto, o que está faltando ser discutido – neste momento a mediação do grupo é feita pelo coordenador do grupo. Após novas discussões e dispersões o grupo fecha o relatório final com a leitura do esqueleto como quem checa uma listagem, fazem um check list relacionando o que foi proposta no momento da abertura do Caso como objetivos da Aprendizagem e o que foi discutido, construído e colocado no relatório final do Caso. O coordenador faz a leitura final do relatório e todos concluem que os objetivos elencados na abertura do caso A foram atingidos e os conceitos construídos colaborativamente. Nesta etapa em que se conclui o Caso A, o relatório é redigido pelo secretário do grupo presencialmente e publicado no fórum virtual pelo tutor. Este relatório fica disponível para consultas, assim como, todas as discussões ocorridas até a solução do Caso clínico. (Imagem 10).

Relatório Final – Módulo 03 Coordenador: xxxxxxxx Secretário: xxxxxxxxx CASO 10:

Título: Necessidade de encaminhamento Considerações Finais

**Pneumonia Adquirida na Comunidade

-Epidemiologia

-Definição: doenças inflamatórias agudas de causas infecciosas (bactérias, vírus, fungos, protozoários) que acometem os espaços aéreos. Inicia-se em até 48h após a internação.

-Fisiopatologia: Fases: Edema-> hepatização vermelha-> hepatização cinza-> resolução.

-Manifestação clínica: tosse seca ou produtiva, dispnéia, frêmito aumentado...

-Diagnótico: Baseado nas características clinicas e achados radiológicos (infiltrado pulmonar). As culturas não identificam o agente em até 50% dos casos.

-Tratamento: Depois do diagnostico fechado (clinica, radiologia) começar -Prevenção: vacinação contra influenza e pneumococos, evitar os fatores de risco.

Derrame pleural: é o acumulo de liquido no espaço

pleural. Para velar o seio costofrênico são necessários 150-200 ml; para chegar a meio tórax 1000 ml são necessários...

**Pneumonia Adquirida no Hospital, Pneumonia associado ao ventilador

-Definição: é a que se apresenta depois de 48h após internação. Anaeróbicas e Gram negativas são mais prevalentes. As -Tratamento: pode ser monoterapia ....

Imagem 10. Relatório Final Turma A Caso 10. Exposto Resumidamente.

Em toda nossa observação, neste estudo piloto, seguindo a dinâmica: Momentos Presenciais - Exposição do Caso, Abertura do Caso; Momento Virtual – Fórum AVA; Momento Presencial – Fechamento do caso, concluímos que na abordagem construtivista constituinte da metodologia ABP, o aprender a aprender; assim como o entendimento da importância das relações dialógicas para o desenvolvimento de sujeitos autônomos e éticos se verificaram em todos os estágios dos momentos presenciais. Foi possível perceber claramente a convergência das ações e a crença dos tutores com o posicionamento de que

(...) o pensar do educador somente ganha autenticidade na autenticidade do pensar dos educandos, mediatizado ambos pela realidade, portanto, na intercomunicação. Por isto, o pensar daquele não pode ser um pensar para estes nem a estes impostos. Daí que não deva ser um pensar no isolamento, na torre de marfim, mas na e pela comunicação, em torno de uma realidade(FREIRE, 1996, p. 74).

Com relação à interação entre Tutor X Estudantes observamos que houve muita interação nos momentos presenciais. Entretanto, no fórum virtual não aparecem

discussões ou interações propriamente ditas. Mesmo assim, identificamos a importância do fórum na construção coletiva do conhecimento, onde o ponto inicial é o compartilhamento de informações. Foi observado que o conceito de informação defendido por Buckland (1991) é trabalhado e a informação é percebida de duas formas: Informação como Processo – os sujeitos são informados sobre “algo”, por exemplo, os links com sugestões de pesquisa; e Informação como Conhecimento quando este “algo” é entendido pelos sujeitos e transformado em conhecimento. Por exemplo, quando é utilizado na postagem do aluno, mesmo que este não faça nem referência à ADMI, nem use este saber para prosseguir com as interações. Entretanto, dentro do que era de certa forma previsto, em virtude de se estar utilizando uma metodologia inovadora dentro do paradigma emergente de educar, faz-se necessária uma reflexão maior por parte dos tutores e dos estudantes sobre a utilização da tecnologia como forma de interação. Se percebermos interação, da forma como é entendida por Vigotsky, seria oportuno afirmar então que “o uso de signos conduz os seres humanos a uma estrutura específica de comportamento que se destaca do desenvolvimento biológico e cria novas formas de processo psicológicos enraizados na cultura” (VIGOTSKY, 2000, p.54).

É através dos processos de interação que os sujeitos constroem conhecimento. Internalizam informações para (re) construir conceitos. Contudo, compreender que é necessário superar a inibição com relação ao uso da ferramenta fórum é imperativo para que se opere mudanças a partir da identificação e do por quê deste sentimento. De acordo com Gomes (2007, p.52), o fórum

pode ser usado para promover qualquer tipo de discussão, desde uma conversa cujo único intuito é o de promover a quebra do gelo inicial entre os participantes do curso on-line, até temas mais elaborados e específicos do curso com o intuito de promover a construção do conhecimento ou o aprofundamento neste tema de forma coletiva.

Corroborando com o posicionamento de Kenski (2006) as tecnologias incentivam e instigam as formas de se comunicar com seu poder de interação aliado à força propulsora da internet. Contudo, por si só não acarretam mudanças significativas, pois

não são as tecnologias que vão revolucionar o ensino, e, por extensão, a educação de forma geral, mas a maneira como essa tecnologia é utilizada para mediação entre professores, alunos e a informação. (...) Os processos de interação e comunicação no ensino sempre dependeram muito mais das pessoas envolvidas no processo do que das tecnologias utilizadas, seja o livro, o giz, ou o computador e as redes (KENSKI, 2006, p. 121).

No nosso recorte foi observado que a prática presencial docente foi bastante adequada ao modelo de ensino contemporâneo. Entretanto, contrariando alguns autores (CASTELLS, 1999, KENSKI, 2006; LÉVY, 1996) - que se posicionam afirmando que na maioria das experiências educacionais, com relação à transposição das práticas tradicionais de ensino e aprendizagem presenciais ao ambiente virtual (AVA), levando à compreensão que os ambientes presenciais são sempre ultrapassados e os AVA’s, por conclusão, modernos, integradores e motivantes. O olhar sobre este recorte observou o contrário: Nossos sujeitos não migraram suas estratégias de interação presencial para o universo virtual. No momento presencial o professor assumiu o papel que se exige dele no paradigma atual – problematizador, mediador, instigador e motivador. E no ambiente virtual – apesar da utilização da ferramenta Fórum compor uma das partes mais importante no AVA – as práticas tornaram-se obsoletas, podemos até dizer: tornaram-se tradicionais/burocráticas. Seguindo um modelo sem muita inovação o que nos leva a crer que o novo papel do professor na cibercultura requer sua reestruturação e uma nova reflexão. Porque esta reflexão sobre o modelo educacional emergente

é crucial para o sucesso dos processos educacionais presenciais ou a distância. Sua atuação tenderá a passar do monólogo sábio da sala de aula para o diálogo dinâmico dos laboratórios, sala de meios, e-mail, telefone e outros meios de interação mediatizada (BELLONI, 2001, p. 83).

Como fundamento de toda nossa discussão a Teoria Pragmática do Conhecimento e da Aprendizagem de Jürgen Habermas nos traz na formulação das suas proposições que a construção do conhecimento, não é só dialógica, mas se fundamenta em uma visão transcendente da aprendizagem e da transformação dos sujeitos através dos processos dialógicos e, assim como Vigotsky defende que a aprendizagem precede o desenvolvimento. E numa percepção mais incisiva acredita na habilidade dos sujeitos de se comunicarem, dialogarem e estabelecerem seus valores éticos, suas relações interpessoais possibilitando a transformação da realidade social.

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