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4.2 AS MEDIDAS CAUTELARES PESSOAIS

4.2.2 Fiança

fiança, que, como já tratado no capítulo anterior, praticamente caiu em desuso com a inserção de parágrafo único no art. 310 do CPP pela Lei nº 6.416/77.

Destarte, o Anteprojeto não recepciona a possibilidade de o réu “livrar-se solto” de determinados crimes (a teor do atual art. 321 do CPP), tampouco a vedação à concessão da fiança nos casos elencados pelo art. 323 do Código de Processo Penal vigente.

Sendo assim, de acordo com a proposta, todos os crimes, em tese, admitem fiança, excetuados aqueles com impedimento constitucional (art. 5º, XLII, XLIII e XLIV, da CF). (BRASIL, 2010a, p. 88).

Assim, de acordo com o Projeto a fiança consiste no valor arbitrado pela autoridade competente, cuja prestação enseja a imediata liberação do preso (art. 567) e que tem por finalidade o pagamento das custas processuais, da indenização civil pelos danos causados pelo crime e da pena de multa eventualmente aplicada (art. 579, caput).

São compromissos do afiançado: comparecer a todos os atos do inquérito e do processo para os quais for intimado; não mudar de residência sem prévia autorização da autoridade judicial; e não se ausentar da comarca ou do País sem comunicar àquela autoridade o lugar onde será encontrado.

Ao firmar o termo de compromisso, o afiançado se declara ciente das consequências pelo quebramento da fiança (art. 581).

Tal como ocorre hoje, é competente para arbitrar a fiança, de regra, a autoridade judicial, de ofício ou a requerimento (art. 568, caput).

Há casos, porém, em que a autoridade policial pode arbitrar a fiança, logo após a lavratura do Auto de Prisão em Flagrante: tratando-se de crimes punidos com detenção, qualquer que seja a pena cominada; prisão simples, também sem limite de pena máxima cominada; e reclusão, com pena máxima cominada de 5 (cinco) anos, exceto se praticados com violência ou grave ameaça à pessoa (art. 568, §1º).

Sendo arbitrada pela autoridade policial, a concessão da fiança e os compromissos assumidos pelo afiançado devem ser comunicados ao magistrado (art. 568, §2º).

Ainda, quando for de competência da autoridade policial a concessão da fiança e esta se recusar ou demorar para arbitrá-la, o preso ou alguém por ele pode prestá-la perante o juiz competente, mediante simples petição (art. 568, §3º).

Considerando a realidade econômica do país, entretanto, não poderia o Projeto deixar de prever a possibilidade de liberação do preso sem o pagamento da fiança. Dessa forma, quando a toda evidência, verificar-se que o preso não tem condições econômicas

soltura e o juiz conceder-lhe a liberdade provisória, sem prejuízo dos demais compromissos do termo de fiança (arts. 568, §4º, e 573).

Para a liberação sem o pagamento de fiança podem ser solicitados documentos ou provas que atestem a condição de insuficiência ou exigido que o afiançado declare formalmente a falta de recursos, incorrendo no crime de falsidade ideológica, se inverídica a informação (art. 573, parágrafo único).

Além dos crimes inafiançáveis, assim declarados pela Constituição Federal – racismo, tortura, tráfico ilícito de drogas, terrorismo, hediondos e a ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático – o Projeto veda a concessão de fiança: quando estiverem presentes os motivos autorizadores da prisão preventiva; aos que, no mesmo processo, tiverem quebrado fiança anteriormente concedida ou injustificadamente infringido as obrigações do termo de fiança; e quando a prisão efetuar-se em razão de mandado do juiz do cível ou de prisão disciplinar militar (arts. 569 e 570).

Comparativamente ao sistema atual, o Projeto eleva os valores da fiança, e prevê que o valor pode ser reduzido até o máximo de dois terços (pelo delegado de polícia ou pelo juiz) ou aumentada em até cem vezes (exclusivamente pelo juiz) (art. 572).

Salienta-se que, segundo o Anteprojeto, a concessão da fiança independe de audiência do Ministério Público. Entretanto, após sua prestação, o parquet deve ter vista do processo (art. 576).

De acordo com o art. 578 do Projeto, o juiz deve reexaminar o valor fixado para a fiança se o pagamento não for efetuado em 10 (dez) dias. Na hipótese, pode o magistrado manter ou diminuir o valor, ou declarar sem efeito a fiança e aplicar outra medida cautelar.

O Anteprojeto amplia as hipóteses de quebramento da fiança, que passam a ser: descumprimento injustificado de um dos compromissos prestados; prática de infração penal dolosa na vigência da fiança; deliberada obstrução do andamento da investigação ou do processo; e descumprimento de medida cautelar imposta cumulativamente com a fiança.

Inova o Projeto, ainda, ao dispor que em caso de quebramento da fiança, o perdimento do valor se dá ao Fundo Penitenciário Nacional ou fundos estaduais (art. 585) – atualmente os valores são destinados ao Tesouro Nacional.

Ademais, o Anteprojeto estabelece que na hipótese de quebra da fiança ou de descumprimento das obrigações impostas quando da concessão de liberdade provisória, o magistrado deve avaliar a decretação da prisão preventiva ou de outras cautelares (art. 584).

disciplina da fiança, é desvinculá-la da liberdade provisória, dotando-a de autonomia enquanto medida cautelar. Uma crítica, porém, há de ser feita.

É fácil perceber a intenção do Projeto de reformular totalmente o sistema das medidas cautelares no processo penal brasileiro. Todavia, visualizam-se ainda resquícios do atual sistema de cautela e contracautela quando o art. 570 do Projeto vincula a concessão da fiança à ausência dos requisitos autorizadores da prisão preventiva7.

No mesmo sentido, afirma Cruz (2009b, p.222) que

[...] embora seja fiança incluída entre as medidas cautelares, parece ainda ser tratada como um instituto com função contracautelar, ou seja, como substituto da prisão em flagrante [...].

Na verdade, a fiança é, ou deveria ser, mais do que isso, pois nada impede que sirva ela, também, para manter o status libertatis do investigado ou acusado que responde solto ao processo, e não apenas para restituí-la, como sugere o referido preceito. [...] Deveras, ante situação concreta que, no sistema original, permitiria a decretação da prisão preventiva, poderá o magistrado optar por outra (s) medida (s) cautelar (es), com igual idoneidade/eficácia para a proteção do bem jurídico ameaçado, com menor afetação da liberdade individual. [...].

Dessa forma, a despeito da interpretação literal do dispositivo em comento, vale lembrar que do espírito do Anteprojeto depreende-se que importa é que o juiz analise, no caso concreto, a necessidade da tutela cautelar, e, com base no princípio da proporcionalidade, considere cada uma das medidas cautelares arroladas no art. 533 e aplique a que melhor atenda à exigência dos autos.

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