• Nenhum resultado encontrado

Fichas de interpretação e planos evolutivos

PARTE I INTRODUÇÃO

3.3 dispositivos da pesquisa

3.3.4 Fichas de interpretação e planos evolutivos

Posteriormente às entrevistas, iniciamos o processo de análise a partir da escuta ativa e sensível, necessária para a seleção das falas presentes nas frases mais recorrentes ou as mais banais, na busca de núcleos de sentidos importantes para a construção da tese. De acordo com Silva R. (2006), à medida que se vai aprofundando a análise das falas dos entrevistados, é preciso manter um constante diálogo com os interlocutores (saber local) e com as teorias necessárias à análise, ou seja, manter o confronto entre os sentidos emanados dos interlocutores e os aportes teóricos elucidativos.

Foi com a intenção de obter os sentidos, a fim de responder à indagação central sobre a EaD e sua implicação na ação dos docentes em formação, que começamos as análises. Com isso, iniciamos a elaboração das fichas de interpretação e, em paralelo, os planos evolutivos, um ajudando na construção do outro e ambos funcionando como guias indispensáveis ao movimento de ir e vir entre as hipóteses forjadas das escutas e a teoria.

As fichas de análise são instrumentos de registros do diálogo entre as falas dos interlocutores da pesquisa, nossas impressões e as possibilidades teóricas. Os planos evolutivos são utilizados para prevenir eventuais dispersões, funcionando como um guia do trabalho, o fio condutor, a cadeia de ideias centrais, auxiliares do pesquisador. Utilizados em paralelo com as fichas de interpretação, neles são esboçadas as hipóteses encontradas no campo, as quais são registradas nas análises contidas nas fichas de interpretação. Esses planos são evolutivos porque podem crescer ou decrescer com as hipóteses que surgirem do campo, quando há desvelamento de novos sentidos dos docentes em formação (SILVA R., 2006).

Cabe destacar que essa fase é árdua, requer muito trabalho, atenção e muita dedicação, pois as fichas e os planos são fontes de orientação para o trabalho final de escrita do texto de tese. Por essa razão, a elaboração dos planos evolutivos e das fichas de análise ocorreu ao mesmo tempo, sendo essas anotações realizadas nas fichas de interpretação, e as hipóteses, registradas nos planos evolutivos, fundamentais, pois delas surgem a definição da estrutura e sumário da tese, caracterizando o processo inverso ao habitual na construção do objeto de estudo. A evolução dos planos, após toda a análise, aponta a estrutura da tese, organizada a partir do que encontramos no campo, contendo o diálogo entre a análise das falas e os estudos da teoria realizados em função das descobertas ao longo da pesquisa.

A seguir (Quadros 4 e 5), apresentamos, a título de ilustração, um fragmento de uma de nossas fichas de interpretação e dois planos evolutivos, o primeiro e o último. Os demais planos evolutivos encontram-se no apêndice.

Quadro 4 – Ficha de interpretação

Helena (03/04/2012 - consultório da clínica)

Falas Anotações

1.3 Experiências ligadas à EaD

Escolha da modalidade

“Surgiu Filosofia na EaD, o que me permitia trabalhar e cursar”.

“Meus horários de trabalho são muito alternados, e se o curso fosse totalmente presencial eu não teria conseguido dar conta de cursar”.

Conhecimentos prévios

“Eu tinha conhecimento superficial de que as aulas seriam algumas presenciais e que o aluno teria uma responsabilidade muito grande”.

“Essa foi uma dificuldade que eu trabalhei no começo do curso, porque não teria uma pessoa pra ficar me cobrando, eu teria que me virar, correr atrás”.

“No começo os alunos argumentavam muito com os professores: “- ah, mas ninguém disse nada”, “- sim! mas ninguém tem que dizer, vocês têm que entrar na plataforma todo dia”.

“[...] Se o aluno não tiver uma consciência de que tem ir atrás, de como funciona essa modalidade, o curso não tem qualidade para o aluno, ele pode até concluir o curso, mas não vai ter um bom desempenho”.

- Escolha em função da flexibilidade espaço-tempo. Ver Flexibilidade na EaD. Relação espaço-tempo em Harvey (1989 apud CARVALHO, 2007).

- Os elementos constitutivos da modalidade a distância são favoráveis aos trabalhadores que dificilmente poderiam compatibilizar o trabalho e os estudos, no que se refere a uma formação inicial e/ou continuada. Ver: Educação a distância: uma prática educativa mediadora e mediatizada (Oreste Preti, 1996)

- O ingresso na modalidade da EaD é um momento novo e diferente para o estudante, que deverá ser estimulado à aprendizagem dos códigos, das regras de como se movimentar nesse “novo mundo”. São novas regras, uma nova dinâmica. Ver relação heteronomia e autonomia

- O desconhecimento sobre a modalidade e a dificuldade de adaptação ao “novo” (Lembrei de

potencial de bloqueio x potencial de mudança, ELIAS, 1998) podem levar a um baixo desempenho

do aluno, conforme traz Helena, ao qual acrescento um outro efeito, a elevada taxa de evasão, um dos problemas da EaD. Ver Tese de Aleksander sobre evasão.

Esses fatores (falta de conhecimento prévio sobre a modalidade, sua metodologia de funcionamento e a dificuldade no contato com as tecnologias) podem conduzir a um processo dilemático. O envolvimento ou o distanciamento (alienação) da situação de medo do desconhecido, do novo, podem se configurar em um potencial de bloqueio ou de mudança. A força de vontade é vista como o potencial de mudança.

- Responsabilidade é fator de qualidade para o aluno.

- Responsabilização. Autogerenciamento.

- Qual o papel dos docentes da EaD?

Quadro 5 – Planos evolutivos 1 e 9

PLANO EVOLUTIVO 1 PLANO EVOLUTIVO 9

1. Formar-ações ao SER professor

1.1 Da formação presencial à formação a distância 1.1.1 Iguais na finalidade, diferentes no fazer 1.1.2 O uso do virtual e das tecnologias na formação 1.1.3 O fazer da formação como bloqueio

1.1.4 A vontade de continuar como potencial de mudança 2. Potenciais de bloqueios e mudanças na ação como docente

2.1. O conceber e o fazer 2.1.1 Educa-ações e práticas 2.1.3 Mediações

a) Aprender e trabalhar com as TICs

b) Gestão da escola x gestão do conhecimento 3. Alteridades e paradoxos do uso da EaD e a ação docente 3.1 Relações, influências e implicações

3.2 Em paradoxos

a) Por uma EaD mais presencial

b) Fator de insucesso é também vantagem da EaD

1. Formar-ações ao SER professor

1.1 Da formação presencial à formação a distância 1.1.1 Iguais na finalidade, diferentes no fazer

a) A flexibilidade tempo-espacial como determinante

b) Dependência aluno-professor dá lugar à autonomia no processo c) A qualidade depende do aluno

1.2 Concepções e práticas 1.2.1 Educações

a) Na educação presencial o paradigma educacional é o tradicional

b) A EaD legitimada para a democratização: inclusão para o estudante-trabalhador c) Distância transacional na EaD: um caminho a ser percorrido

d) A independência intelectual não independe de mediação 1.2.2 Aprender e trabalhar com as TICs

a) Importante: com ressalvas

b) Catalizador de novos conhecimentos c) Não prescinde de mediação

2. Dilemas: a EaD na formação

2.1 Dispositivos institucionais e bloqueios Os grandes nós e as fronteiras

a) Competências transversais como alicerce b) O tempo como o grande articulador

c) O sentir-se só: o professor e o estar junto virtual

d) O espaço/distância como mediação à autonomia acelerada e) Tudo converge para a gestão

2.2 A motivação como propulsora de mudança a) Construir nas relações

b) A vontade de continuar

3. EaD e ação docente: alteridades, limitações e paradoxos 3.1 Relações, influências e implicações

3.1.1 O uso das TICs como a maior influência

3.1.2 Ação docente x gestão da escola: potencializando mudanças e bloqueios 3.2 Em paradoxos

a) Por uma EaD mais presencial

b) Flexibilidade na EaD: de vantagem a fator de insucesso

De forma sumária, podemos explicar que nosso primeiro passo foi a elaboração do roteiro temático que orientou a conversação, o qual foi passível de modificações no decorrer do processo. O segundo instrumental elaborado foi o quadro de entrevistados, no qual descrevemos algumas características gerais dos interlocutores de nossa pesquisa. De forma particular, adotamos o próprio roteiro de entrevista como guia para a escuta das entrevistas gravadas. Nesse momento, dois outros instrumentos foram fundamentais: as fichas e os planos evolutivos. Nas fichas, anotamos a transcrição das falas (fragmentos ou frases completas) e algumas observações nossas, fazendo sempre referência às nossas impressões ou a algumas teorias em torno do assunto. Os planos evolutivos foram se originando após a escuta e primeira análise das falas de cada sujeito, assim, com base no último plano evolutivo, foi delineada a estrutura da tese, o que resultou no sumário deste trabalho.