• Nenhum resultado encontrado

5 AS TENSÕES ENTRE A FIDELIDADE E AS COLIGAÇÕES PARTIDÁRIAS:

5.2 A fidelidade partidária obrigatória com o regramento estabelecido pela Lei nº

Em 29 de setembro de 2015, foi publicada a Lei nº 13.165, que consiste na última e acanhada reforma política e eleitoral no Brasil. Ela alterou três diplomas legislativos: a Lei nº 9.504/97 (lei das eleições), a Lei nº 9.096/95 (lei dos partidos políticos) e a Lei nº 4.737/65 (Código Eleitoral).

O projeto de lei foi objeto de acalorados debates, sobretudo por manter expressamente o financiamento empresarial de partidos e campanhas eleitorais, já declarado inconstitucional pelo STF no julgamento da ADI 4650/DF, que teve como relator o Ministro Luiz Fux93. Mas, diante da posição do Supremo, a Presidente Dilma Roussef vetou os dispositivos que permitiam e regulavam as doações eleitorais por pessoas jurídicas.

Outro tema de grande debate foi o sistema eleitoral para a eleição dos cargos de vereador e deputados (estaduais, distritais e federais), tendo sido derrotada a proposta de criação de um “distritão” defendida pelo então Presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, e que consistia na eleição desses cargos também pelo sistema majoritário, o que significaria o sepultamento do sistema proporcional.

93 A proibição de doações eleitorais por pessoas jurídicas foi decidida por maioria no STF, vencidos os ministros

Teori Zavascki, Gilmar Mendes e Celso de Mello, deve ser aplicada já nas eleições municipais de 2016, pois o tribunal deliberou não modular os efeitos da decisão, tendo em vista não haver sido atingido o número necessário de votos esse fim.

Dentre as alterações aprovadas, está o encurtamento do processo eleitoral, com a postergação do prazo para as deliberações sobre coligações, que passou para 20 de julho a 5 de agosto do ano eleitoral (era de 10 a 30 de julho); a data limite de 15 de agosto para o registro de candidaturas (era 5 de julho); a redução de prazo das campanhas eleitorais, agora somente permitidas a partir de 15 de agosto (era 6 de julho). A propaganda eleitoral em bens particulares (em bens públicos continua proibida) agora só poderá ser feita em adesivo ou papel e não poderá exceder meio metro quadrado (antes o limite era de 4 metros quadrados).

Com relação à filiação partidária, foi revogado o art. 18 da Lei nº 9.096/95 e alterado o art. 9º da Lei nº 9.504/97, com a redução do prazo mínimo de filiação para que o candidato possa concorrer as eleições, que passou de um ano para seis meses de antecedência do pleito94. Isso certamente em nada colabora -pelo contrário- para o fortalecimento dos partidos políticos como instrumentos de veiculação da soberania popular, pois a minirreforma claramente procurou facilitar a migração partidária e dar mais prazo para as “negociações” entre as siglas e seus potenciais pré-candidatos.

A par disso, a fidelidade partidária como requisito para a manutenção dos cargos eletivos foi finalmente reintroduzida na legislação brasileira, após quase oito anos de vigência por força exclusiva da interpretação judicial em mandados de segurança que resultaram na Resolução nº 22.610/2007 do Tribunal Superior Eleitoral. Todavia, a Lei 13.165/2015 não fez qualquer ressalva quanto aos cargos majoritários, cuja exclusão da regra fora declarada pelo Supremo Tribunal Federal na ADI 5081/DF, conforme visto no tópico antecedente.

Provavelmente, será mantida a exclusão da possibilidade de perda de mandato dos eleitos pelo sistema majoritário, pois o STF, naquela oportunidade analisando a Resolução TSE 22.610/2007, declarou ser ilegítima e inconstitucional a extensão da regra da fidelidade partidária aos candidatos eleitos pelo sistema majoritário, e o posicionamento não deve ser diferente (ao menos, não por enquanto, mantida a atual composição da Corte) com a veiculação do mesmo tema por lei ordinária.

A Lei nº 13.165/2015 alterou a lei orgânica dos partidos políticos (Lei 9.096/95) para introduzir, em seu Capítulo IV, que trata da filiação partidária, o art. 22-A,

94 Todavia, caso o estatuto partidário estabeleça prazo maior, deverá ser observado, pois a Lei 9.504/97 continua

estabelecendo a perda de mandato por desfiliação partidária, fixando um prazo de “janela” e restringindo, em relação ao regramento da Resolução TSE 22.610/2007, as hipóteses de justa causa para a desfiliação:

“Art. 22-A. Perderá o mandato o detentor de cargo eletivo que se desfiliar, sem justa causa, do partido pelo qual foi eleito.

Parágrafo único. Consideram-se justa causa para a desfiliação partidária somente as seguintes hipóteses:

I - mudança substancial ou desvio reiterado do programa partidário; II - grave discriminação política pessoal; e

III - mudança de partido efetuada durante o período de trinta dias que antecede o prazo de filiação exigido em lei para concorrer à eleição, majoritária ou proporcional, ao término do mandato vigente.”

Como se vê, a nova legislação é mais restritiva que a Resolução do TSE - que provavelmente será reeditada para atendê-la-, pois não admite mais a hipótese de criação de novo partido, ou mesmo incorporação ou fusão do partido, como justificativa para a migração partidária, o que a Resolução até então autorizava (§ 1º do art. 1º, incisos I e II). A hipótese de “grave discriminação pessoal” (inciso IV) agora exige que seja política, e não mais genérica.

Contra essa redução, o partido Rede Sustentabilidade, cujo registro foi deferido em 22 de setembro de 2015 pelo TSE (apenas 7 dias antes da publicação da Lei nº 13.165/2015), impetrou a ação direta de inconstitucionalidade com pedido de liminar nº 539895. Nessa ADI a Rede defende que a criação de um novo partido político deve ser hipótese de justa causa para desfiliação, como prevê a Resolução 22.610/2007, pois “as normas que expressem limitações à liberdade de criação partidária violam a Constituição Federal”.

Como a Rede teve seu registro deferido sob a égide somente da Resolução, alega que “para que, após criado, possa funcionar adequadamente e cumprir a sua finalidade estatutária, é fundamental que atraia o maior número possível de filiações, inclusive de parlamentares eleitos, filiados a partidos políticos já existentes, que simpatizem com a inspiração daquela nova agremiação, desejando fazer parte dos seus quadros”.

O partido afirma ainda que a norma que inseriu o art. 22-A na lei dos partidos políticos contraria o entendimento do Supremo Tribunal Federal no julgamento da ADI 4430, que debatia o sistema de distribuição do tempo de propaganda eleitoral gratuita,

95“ADI questiona perda de mandato de parlamentar que se desfiliar para criar novo partido”. Disponível no

endereço eletrônico do STF, link: http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=301979 .Acesso em 18/10/2015.

quando o STF firmara ser inconstitucional qualquer interpretação que privasse o novo partido de receber adesão de detentores de mandatos eletivos, respeitando-se o prazo de 30 dias contados do registro do estatuto no TSE (por aplicação da Resolução TSE 22.610), sob pena de afronta ao princípio da livre criação de partidos políticos e do do pluralismo político.

No caso específico dos partidos políticos criados antes da vigência da Lei 13.165/2015, cujo prazo de 30 dias para as filiações de detentores de mandato eletivo ainda estava fluindo, a Rede afirma que a nova norma inviabiliza o funcionamento dos novos partidos, ao dificultar a sua organização e funcionamento, em consequente prejuízo do pluralismo político.

Por isso, pediu liminar para suspender a eficácia do artigo 22-A da Lei 9.096/95, inserido pela Lei 13.165/2015, na parte em que exclui (pela locução “apenas”) a filiação a novos partidos políticos como justa causa para afastar a perda de mandato. O relator da ADI 5398 é o ministro Luís Roberto Barroso, que até a conclusão deste trabalho não havia ainda proferido decisão.

Já a recém instituída “janela da infidelidade”, por força da redução de um ano para seis meses do prazo de filiação necessário para que se possa concorrer às eleições, ficou autorizada no sétimo mês antecedente à eleição majoritária ou proporcional, ao término do mandato vigente do trânsfuga. Trata-se, como aquela redução de prazo da filiação para o registro de candidatura, de mais um fator de empobrecimento da cultura partidária, pois injustificadamente (a não ser pelo casuísmo de viabilizar as negociações de véspera do processo eleitoral) inverte a regra de que o mandato eletivo pertence ao partido, e não ao candidato eleito.

Como a lei não estabelece o procedimento para o processo de perda de mandato por desfiliação partidária, é de se concluir que continuará a cargo do TSE por força de suas atribuições de natureza regulamentar, mas deverá ser adaptada às novas disposições legislativas.