• Nenhum resultado encontrado

2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

2.2 Filtração

2.2.1 Filtração lenta em areia

A filtração lenta em areia foi objeto de vários estudos realizados Devido a isto, é importante dar uma atenção especial sobre este tipo de filtração. Na figura 2.3, podem-se observar alguns eventos importantes relacionados com a filtração lenta em areia.

Figura 2.3 – Timeline dos principais eventos relacionados com filtros lentos de areia (FLA)

(Adaptado de Haig et al., 2011).

A filtração lenta tem sido usada no tratamento de água para abastecimento público desde o começo do século XIX e tem-se mostrado um sistema eficaz de tratamento, desde que projetado de forma apropriada e aplicado nas situações corretas (Di Bernardo et al., 1999). Ainda segundo os mesmos autores, a filtração lenta caiu um pouco em desuso devido à substituição tecnológica e à deterioração das massas de água devido à opção de um desenvolvimento económico baseado num modelo urbano industrial sem qualquer preocupação em assegurar a qualidade dos meios hídricos.

Segundo Camplesi (2009), a necessidade de se realizarem estudos acerca da filtração lenta em areia, prende-se com a necessidade de aperfeiçoar técnicas eficazes de tratamento de água para consumo humano sem coagulação química e, também, pelo facto de este tipo de filtração constituir uma alternativa sustentável para se aplicar em pequenas comunidades rurais.

A filtração lenta é um sistema de tratamento de água de operação simplificada que, em verdade, simula mecanismos naturais de depuração das águas, na sua percolação pelo subsolo, sendo que, nesse percurso, são removidos microrganismos, partículas e substâncias químicas (Camplesi, 2009).

Segundo Di Bernardo et al. (1999), a filtração lenta é um processo de tratamento que não necessita da adoção de coagulantes, trabalha com taxas de filtração baixas e usa um meio filtrante de granulometria fina.

No tratamento sem coagulação química, a filtração lenta e a cloração são os principais processos capazes de assegurar a produção de água com qualidade adequada ao consumo humano. Porém, a eficiência da filtração lenta pode ser comprometida, se a turbidez da água bruta for superior a 10 UNT. Neste caso, a pré-filtração possibilita a redução das impurezas da água antes da filtração lenta (Veras et al., 2008).

A eficiência da filtração lenta é substancialmente afetada pela turvação da água a ser tratada, pois tal parâmetro de qualidade reflete a quantidade de partículas pequenas presentes na água, às quais muitos microrganismos encontram-se aderidos (Di Bernardo et

al., 1999).

De acordo com Camplesi (2009) e Murtha et al. (2003), um filtro lento convencional é composto pelos seguintes elementos:

 Camada de água sobrenadante;

 Camada Schmutzdecke (camada superficial de finos e biofilme);  Leito filtrante;

 Camada suporte;  Sistema de drenagem;  Controlo de vazão.

Figura 2.4 – Configuração geral de um filtro lento.

A Schmutzdecke, é uma camada constituída por partículas inertes, matéria orgânica e diversas variedades de bactérias, algas, protozoários, metazoários, entre outros, além de precipitados de ferro e manganês quando se encontram dissolvidos no afluente e é formada a partir da retenção de partículas suspensas e adesão de microrganismos. A atividade de microrganismos no Schmutzdecke, no filtro lento, é um dos fatores chaves para se obter água de boa qualidade (Di Bernardo et al., 2005). Segundo Campos (2006) considera que o extenso período de retenção hidráulico da água acima da camada do leito filtrante de areia permite o desenvolvimento desta comunidade biológica.

Campos et al. (2002) estudaram a importância da camada Schmutzdecke para a atividade microbiológica dos filtros lentos. Durante este estudo, foi possível aos autores do mesmo, concluir que a acumulação de biomassa na Schmutzdecke é bastante variável, não apresentando quaisquer padrões específicos, quer temporal como espacialmente. Apesar deste facto, foi possível verificar que, durante a pesquisa, a quantidade de biomassa na camada do leito filtrante aumentou. Outra conclusão interessante neste trabalho é o facto de a Schmutzdecke ser responsável pela entrada de substratos de carbono para a camada de areia, que funciona como nutrientes para a atividade biológica que se desenvolve ao longo do leito filtrante.

Com o passar do tempo de operação, a Schmutzdecke dificulta o escoamento nos filtros e, consequentemente, o desempenho dos mesmos diminui temporariamente, sendo necessário que essa camada seja removida (Dizer et al., 2004).

De acordo com Di Bernardo et al. (1999), o desempenho dos filtros lentos na remoção de microrganismos depende de vários fatores como:

 A taxa de filtração (remoção diminui com o aumento da taxa de filtração);  A temperatura (menores temperaturas resultam em taxas de remoção menores);  A espessura do meio filtrante (quanto mais espesso é o meio filtrante, geralmente, mais

eficiente é o processo);

 O tamanho dos grãos de areia (maior granulometria resulta numa menor remoção);  A idade da Schmutzedecke;

 A maturidade microbiológica do meio filtrante.

Dos fatores mencionados acima, Bellamy et al. (1985) consideram que o mais importante é a maturidade microbiológica do meio filtrante.

Keijola et al. (1988) realizaram estudos em escala de laboratório e piloto e verificaram que a filtração lenta apresentou maior eficiência de remoção de toxinas em relação ao tratamento convencional mas a adsorção em carvão ativado mostrou ser ainda mais eficiente.

Injai (2013) utilizou os mesmos tanques de filtração lenta que seriam utilizados neste estudo mas com três granulometrias de areia (godo, areia grosseira e areia fina). Os resultados obtidos pelo autor são esclarecedores das vantagens da utilização deste tipo de sistema de tratamento de água. Relativamente ao parâmetro turvação, obteve uma remoção média durante o estudo de cerca de 77,99% sendo a máxima remoção deste parâmetro 98,12%. No que diz respeito à condutividade elétrica, este parâmetro apresentou um valor médio para a água filtrada igual a 93,39 μS/cm e 101,14 μS/cm para a água recirculada, existindo, assim, tendência para a condutividade elétrica diminuir durante a passagem pelo filtro. Outros parâmetros medidos por Injai (2013), neste mesmo estudo, encontram-se na tabela 2.6.

Tabela 2.6 – Outros parâmetros indicadores da qualidade da água obtidos por Injai (2013)

Valores Médios

Água Filtrada Água Recirculada

pH 6,80 7,01

Temperatura (°C) 23,12 23,09

OD (mg/L) 8,75 9,03

Camplesi (2009) avaliou a eficiência da remoção de vários parâmetros da qualidade da água quando tratada pela FiME (Filtração em múltiplas etapas) com duas taxas de filtração (3 e

6 m/dia). A autora concluiu que o aumento da taxa de filtração no FLA (Filtro lento de areia) afetou negativamente a remoção de turvação e cor aparente mas, por outro lado, houve um aumento da eficiência de remoção para os parâmetros coliformes e sólidos suspensos totais.

Camplesi (2009) concluiu, com base no seu trabalho, que o desempenho do sistema de FiME na remoção de turvação e sólidos suspensos totais foi bastante aceitável sendo superior a 90% tal como a remoção de cor aparente. A mesma autora concluiu ainda que o filtro lento de areia (FLA) e o filtro lento de areia com carvão ativado (FLAC) mostraram ser as unidades mais importantes do sistema FiME.

Ellis (1985) concluiu que é possível aumentar a taxa de filtração sem afetar a eficácia do processo se o pré-tratamento da água bruta e a desinfeção após a filtração lenta ocorrerem sem problemas.

Murtha et al. (2003) testaram filtros lentos de areia com diferentes taxas de filtração e dois sentidos de fluxo para aferir qual a eficácia de remoção dos parâmetros turvação, cor verdadeira, cor aparente, coliformes totais e Escherichia Coli (E. Coli). Os dois autores concluíram que as taxas de filtração não apresentaram uma influência significante na remoção dos vários parâmetros estudados. A filtração lenta apresentou uma elevada eficiência na remoção de sólidos coloidais e em suspensão, medidos pelo parâmetro turvação. Os valores efluentes da turvação apresentaram-se consistentemente inferiores a 1,0 UNT e quase totalmente inferiores a 2,0 UNT. Por outro lado, a remoção mediana de cor verdadeira variou para os filtros-piloto entre 35 e 52% sendo ligeiramente mais elevada para os filtros com menores taxas de filtração. A filtração lenta constitui-se como um processo com excelente índice de remoção de E. Coli, sendo frequente a completa remoção. Para ampliar a utilização da filtração lenta para águas de qualidade inferior à recomendada na Tabela 2, faz-se necessária a adoção de sistemas de pré-tratamento que permitam condicionar a qualidade da água bruta às limitações das unidades de filtração lenta (Di Bernardo et al., 1999).

O filtro lento pode se configurar como uma alternativa sustentável no tratamento de águas de abastecimento para comunidades de pequeno e médio portes, representando um potencial subutilizado de contribuição para a universalização do suprimento de água e melhoria dos indicadores sanitários e de saúde pública (Murtha et al., 2003).

Documentos relacionados