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Fisiologia da coagulação, da trombogénese e da trombólise

No documento Clínica e cirurgia de animais de companhia (páginas 61-64)

A trombogénese envolve a coordenação e equilíbrio de vários mecanismos, nos quais par- ticipam diversos componentes (como as plaquetas, fatores de coagulação e endotélio), de forma a manter a hemostase no animal saudável (53). A hemostase é constituída por três processos dinâmicos e que ocorrem simultâneamente: hemostase primária, hemostase secundária e fibri-

nólise. Da hemostase primária fazem parte as interações entre a parede dos vasos, plaquetas e o fator de von Willebrand (fvW), enquanto a hemostase secundária consiste na formação da rede de fibrina. A fibrinólise é o processo através do qual os coágulos anteriormente formados são dissolvidos (56).

As plaquetas possuem glicoproteínas de superfície que permitem a adesão à parede do vaso quando o endotélio está lesionado. OfvWé necessário para esta adesão, já que desaenca- deia a ativação plaquetária e a produção de adenosine diphosphate (adenosina difosfato) (ADP) e de tromboxano A2. A libertação local destes dois elementos potencia a ativação de mais pla- quetas. Por outro lado, o fator tissular ou tromboplastina, presente na parede vascular, estimula a produção de trombina, que também promove a ativação plaquetária. Assim, a constituição do coágulo com plaquetas aumenta exponencialmente (53), através da adesão das plaquetas às paredes do vaso e à agregação destas entre si (56). O fibrinogénio liga-se aos recetores da glicoproteína de superfície gp IIb/IIIa, que apenas estão expressas nas plaquetas ativadas. O acoplamento do fibrinogénio é muito importante para os passos seguintes da hemostase (57).

No entanto, o coágulo temporário de plaquetas necessita de ganhar estabilidade e coe- são, características que são obtidas através da integração da fibrina nesta estrutura - hemostase secundária. A formação da fibrina envolve uma cascata de reações enzimáticas e uma série de fatores de coagulação que interagem em cadeia por meio de uma via intrínseca e de uma via extrínseca (57). Estes fatores são produzidos no fígado (fatores II, VII, IX e X obrigatoriamente sob a presença de vitamina K1) e são libertados na circulação sanguínea na sua forma inativa, sendo necessária a sua ativação para se tornarem funcionais (56). O endotélio lesionado liberta tromboplastina para a circulação sanguínea, que activa o fator VII (VIIa), que por sua vez ativa o fator Xa (via extrínseca da cascata de coagulação). O fator Xa ativa o fator Va; ambos combi- nados com cálcio ionizado (Ca2+) e com os fosfolípidos provenientes da membrana plaquetária,

promovem a formação de trombina a partir da protrombina no coágulo de plaquetas (56). O fator X (ativado tanto pela via intrínseca como pela via extrínseca) é muito importante, uma vez que para além da ação sobre a protrombina, possui ainda capacidade de ativação de plaquetas, cé- lulas endoteliais e leucócitos através de recetores ativados por proteinases, que são acoplados de proteína G (57).

A formação da trombina é o começo da chamada via comum (tanto à via intrínseca como à via extrínseca) da cascata de coagulação. A trombina cataliza a conversão de fibrinogénio (57) (que anteriormente se ligou a recetores da glicoproteína de superfície gp IIb/IIIa, que apenas estão expressos nas plaquetas ativadas) (58) em fibrina e amplifica o progresso da coagulação ativando outros fatores procoagulantes, particularmente os pertencentes à via intrínseca da cascata. Após ser ativado pela trombina, o fator XIIIa cataliza a reticulação das cadeias de fibrina numa malha insolúvel que estabiliza o coágulo de plaquetas formado através da hemostase primária (57). Embora ambas as vias da cascata de coagulação sejam muito importantes, a ativação do fator XI

(evento inicial da via intrínseca) é catalizada pela trombina, que terá sido gerada anteriormente na via extrínseca. Assim, a via extrínseca pode ser considerada como a iniciadora da cascata de coagulação, enquanto a via intrínseca sustenta e amplifica a coagulação (56). A cascata de coagulação e as suas duas vias estão representadas em pormenor na Figura3.1.

Figura 3.1: Representação esquemática da cascata da coagulação. a, forma ativa dos fatores de coagulação; PL, fosfolípidos plaquetários; TFI, inibidor da via do fator tissular ; TPL, tromboplas- tina tissular (Adaptado de Barret et al., 2012 (57)).

A fibrinólise consiste na dissolução dos coágulos e é mediada pelo plasminogénio, produ- zido no fígado (56). A plasmina é a forma ativa do seu precursor plasminogénio (sendo ativada pelo ativador tissular do plasminogénio (tPA), uroquinase, bradiquinina, calicreína e fator VII) e tem ação fibrinolítica ao formar produtos da degradação do fibrinogénio que inibem a trombina (53). Neste processo, a plasmina cliva também as redes de fibrina em X-oligómeros que pos- teriormente são quebrados, dando origem aos D-dímeros. Assim, os D-dímeros apenas são produzidos quando existe coagulação ativa seguida de fibrinólise (59).

O equilíbrio entre a coagulação e a fluidez sanguínea normal num animal saudável é com- posta por reações de destruição dos coágulos formados e/ou prevenção da formação dos mes- mos. O endotélio produz fatores ”antitrombóticos”como a antitrombina, trombomodulina, tPA, prostaciclina e óxido nítrico. A antitrombina é um inibidor da serino protease que é produzida no fígado, libertada na circulação sanguínea, e quando ativada bloqueia a ação dos fatores de

coagulação IXa, Xa, XIa e XIIa, atuando na via intrínseca da cascata da coagulação. A ligação entre a antitrombina e a protease é facilitada pela heparina, um anticoagulante natural constituído por polissacarídeos sulfatados. Tal como representado na Figura3.2, a trombomodulina liga-se à trombina formando um complexo anticoagulante que activa a proteína C; esta proteína em con- junto com o cofator proteína S, inactiva os fatores V e VII e um inibidor dotPA, aumentando a formação de plasmina (57).

Figura 3.2: Representação esquemática da sistema fibrinolítico e sua regulação pela proteína C. (Adaptado de Barret et al., 2012 (57)).

A prostaciclina inibe a activação e a agregação plaquetária e promove o relaxamento da musculatura lisa vascular. O óxido nítrico também é um inibidor da activação plaquetária e tem efeito vasodilatador local (58). Tanto a prostaciclina como o óxido nítrico contribuem assim para a inibição da hemostase primária (60).

No documento Clínica e cirurgia de animais de companhia (páginas 61-64)

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