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2 SINAIS CEREBRAIS E SONOLÊNCIA

2.4 Fisiologia do sono

Segundo (SANCI; CHAMBERS,2007), o sono é um estado natural de descanso observado em humanos e em diversos animais, mas que no entanto ainda é um fenômeno fisiológico não totalmente compreendido. É caracterizado pela redução dos movimentos voluntários do corpo e pela diminuição da reação a estímulos externos. Em relação ao metabolismo celular, durante o sono ocorre um aumento do anabolismo (síntese de estruturas celulares) e uma diminuição do catabolismo (quebra de estruturas orgânicas com liberação de energia).

Ainda segundo (SANCI; CHAMBERS, 2007), estudos recentes mostram que o sono é um processo dinâmico e que envolve atividade mental, contrariando a ideia histórica de que o sono era considerado um estado passivo e inativo do organismo humano. O processo de sono tem início a partir do tronco cerebral, onde certos neurotransmissores causam sinapses inibitórias nas regiões do cérebro que mantêm uma pessoa acordada.

O sono tem um papel fundamental na manutenção da saúde humana. Estudos comprovam que a privação de sono causa um decréscimo na temperatura do corpo, uma redução no número de glóbulos brancos – o que diminui a imunidade do organismo, e em jovens, um decréscimo na produção do hormônio do crescimento. Além disso, a privação de sono causa sonolência, fadiga, e diminuição do estado de alerta (ELMENHORST et al.,2008).

Em (BLINOWSKA; DURKA,2006), os estágios do sono são apresentados seguindo a clas- sificação original definida por Rechtschaffen e Kales (R&K) em 1968, ainda hoje amplamente utilizada pela comunidade científica e médica. Na classificação R&K o sono é dividido nos seguintes estágios: (a) Estágio I (sonolência); (b) Estágio II (sono leve); (c) Estágio III (sono profundo); (d) Estágio IV (sono muito profundo) e (e) Estágio REM, período com intensa ativi- dade cerebral, quando podem ocorrer os sonhos e movimento dos olhos, cuja nomenclatura provém do inglês Rapid Eye Movement. Os estágios I, II, III e IV podem também ser classifica- dos como sono NREM (Nonrapid Eye Moviment) (SANCI; CHAMBERS,2007). Durante uma noite normal de sono, os estágios NREM e REM alternam-se em ciclos completos com duração

de aproximadamente 1.5 hora.

Na polissonografia, a diferenciação entre os estágios do sono utiliza não somente a infor- mação do EEG, mas também medidas do eletro-oculograma (EOG, mede o potencial elétrico da retina) e eletromiograma (EMG, mede a atividade elétrica muscular). Alguns clínicos tam- bém avaliam os batimentos cardíacos através de eletrocardiogramas (ECG) e a respiração. A utilização cruzada destas informações, na análise visual, possibilita a rejeição das épocas con- taminadas por artefatos (BLINOWSKA; DURKA,2006).

A Figura2.8 apresenta as formas de onda de um sinal de EEG2 para os diferentes estágios

do sono. A caracterização de cada estágio baseia-se principalmente nos ritmos cerebrais e na ocorrência de transientes (CARSKADON; RECHTSCHAFFEN,2000), conforme detalhado a seguir:

• Vigília: o estado relaxado de vigília é caracterizado por atividade cerebral em diferentes ritmos, conforme abordado na Seção2.3.1. A atividade alfa (α) é atenuada quando o indi- víduo está de olhos abertos ou desenvolvendo atividade de atenção. Com os olhos fecha- dos, a atividade no ritmo alfa torna-se evidenciada. Em segundos ou minutos que pre- cedem o estágio I, verificam-se movimentos circulares e vagarosos dos olhos; Na Figura 2.8(a) é representado o estado de vigília onde o paciente desenvolve atividade de concen- tração, enquanto na Figura2.8(b) ocorre o estado de vigília com o indivíduo relaxado e de olhos fechados.

• Estágio I: está associado com o decréscimo da atividade no ritmo alfa (α) e apresenta atividade de baixa amplitude principalmente no ritmo teta (θ). Conforme a sonolência é aprofundada, o ritmo cerebral torna-se ainda mais lento e verifica-se a ocorrência de vértex – onda de potencial composto, onde ocorre uma pequena descarga de pico de polaridade positiva seguida por uma grande onda negativa, caracterizando uma onda de descarga. A transição do estado alerta para a sonolência é visualizada claramente quando há atividade alfa (α) bem definida no padrão EEG do indivíduo acordado. Desta maneira, para a obtenção do EEG as derivações frontal ou occipital tornam-se as mais indicadas, uma vez que o ritmo alfa é proeminente nestas regiões do córtex. De acordo com a clas- sificação R&K, o estágio I é marcado quando menos de 20% da época contém atividade alfa (α), o sinal é de média amplitude e possui frequências mistas, com atividade maior

2Sinal do paciente sc4002 da base de dados PhysioNet. Para os sinais de (a) a (g) da Figura2.8foram repre-

no ritmo teta (θ). Um sinal de EEG deste estágio é representado na Figura2.8(c).

• Estágio II: é caracterizado pela presença de fusos do sono (spindles) – oscilações de curta duração (máximo de 0.5s) e frequência de 11 a 15Hz – e complexos K – ondas com uma componente negativa de alta amplitude seguida imediatamente por um componente positivo mais lento. Neste estágio, o ritmo delta (δ) pode ocorrer em menos de 20% da época. Na Figura 2.8(d), no intervalo de 8s a 9s, observa-se a ocorrência de fusos do sono.

• Estágio III: pela classificação R&K, é marcado quando ondas delta (δ) de 0.5 a 2.5Hz correspondem a 20% ou 30% do total da época. A amplitude pico a pico do sinal pode ser maior de 75µV , conforme observado na Figura2.8(e).

• Estágio IV: é marcado quando 50% da época contém atividade delta (δ), com ondas lentas e de alta amplitude. Neste estágio podem aparecer complexos-K. A Figura2.8(f) mostra uma onda característica deste estágio.

• Estágio REM: caracterizado por uma diminuição na amplitude do EEG, rápido movi- mento dos olhos, perda da atividade muscular e ocorrência de ritmos rápidos. Sendo uma atividade polirrítmica, a utilização apenas do EEG torna difícil sua distinção do estágio I e do estado acordado, conforme pode ser constatado comparando-se as Figuras2.8(g), referente ao estágio REM, com as Figuras 2.8(a-c), referentes à vigília e ao estágio I do sono.

A sequência de estágios de sono é usualmente representada por hipnogramas. Estes são diagramas que representam os diferentes estágios do sono de um paciente, elaborados por um especialista ao atribuir um estágio para cada época. A American Academy of Sleep Medicine define a seguinte nomenclatura: W, acordado; N1, estágio NREM-1; N2, estágio NREM-2; N3, estágio NREM-3; N4, estágio NREM-4 e REM, que simboliza o estágio de mesmo nome.

Figura 2.8: Sinal de EEG para diferentes fases do sono: (a) vigília com atividade de concen- tração; (b) vigília, relaxado e de olhos fechados; (c) estágio N1; (d) estágio N2; (e) estágio N3; (f) estágio N4; (g) estágio REM.

2.4.1 Detecção da sonolência

Nos sistemas de detecção da sonolência, há o pressuposto inicial de que o indivíduo es- tará invariavelmente acordado. Além disso, presume-se que a transição do estado alerta para a sonolência ocorrerá de maneira usual, isto é, do estado de vigília para o estágio I do sono, an- tecedido de piscar de olhos demorados e ou olhos fechados. Os transientes cerebrais (spindles, complexos K e vértex) não serão considerados no escopo deste estudo, sendo o algoritmo de detecção proposto baseado apenas nos ritmos cerebrais.

Neste estudo, a utilização de um único canal de eletroencefalografia também é baseada na condição inicial de vigília do indivíduo. Considerando-se um sistema com apenas três estados – a saber: (i) acordado; (ii) acordado e de olhos fechados; (iii) estado N1 – elimina-se a necessidade das demais medidas utilizadas na polissonografia, utilizadas principalmente na

diferenciação entre o estado alerta e o estágio REM, cujos ritmos cerebrais são pouco distintos. Quanto à escolha do canal a ser utilizado, há na literatura pouca referência ao assunto. Se- gundo (CARSKADON; RECHTSCHAFFEN,2000), o estagiamento do sono (termo utilizado para referir-se à construção do hipnograma pelo especialista) pode ser feito utilizando-se apenas o canal C3 ou C4 de um paciente. Para a detecção da sonolência, (PAL et al.,2008) afirma que a utilização do canal Oz (ver Figura2.6) tem um desempenho superior em relação aos outros canais. Já (BABILONI et al., 2001) sugere a utilização dos canais C3, P3, C4 e P4. Neste estudo, optou-se por utilizar o canal Fpz por (i) melhor representar os ritmos alfa e teta; (ii) apresentar menor número de artefatos, em relação aos outros canais disponíveis nas bases de dados utilizadas; (iii) ser adequado à utilização em um sistema embarcado, sob a perspectiva de produto.