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Fixação biológica de nitrogênio em caatinga no Nordeste do Brasil Leonardo Queiroz de Souza A , Ana Dolores Santiago de Freitas B , Everardo Valadares de

Sá Barretto SampaioA, Patrícia Maia MouraA e Rômulo Simões Cezar MenezesA

A Departamento de Energia Nuclear, Universidade Federal de Pernambuco, Av. Prof Luís Freire, 1000, Recife, PE, E-mail: leoqueiroz28@yahoo.com.br , esampaio@ufpe.br , patriciamaia5@hotmail.com ,rmenezes@ufpe.br

B Departamento de Agronomia, Universidade Federal Rural de Pernambuco, Av. Dom Manoel de Medeiros, s/n, Recife, PE, Brazil, 52171-900, E-mail:

ana.freitas@depa.ufrpe.br Resumo

Dados quantificando a fixação biológica de nitrogênio (FBN) em vegetação nativa são raros, especialmente em florestas secas tropicais. Foram estimadas as quantidades de N fixadas anualmente, medindo-se as proporções de N fixado (%Ndda) e as quantidades de N nas biomassas de folhas de leguminosas arbóreas em uma área de caatinga madura da Paraíba. O %Ndda foi calculado comparando concentrações de 15N das plantas leguminosas e de referência. A biomassa de folhas foi estimada usando equações alométricas baseada no diâmetro do caule a altura do peito. Mimosa tenuiflora, Piptadenia

stipulacea e Anadenanthera colubrina tiveram grandes proporções do N de suas folhas derivado do N2 atmosférico. O porte médio das plantas das espécies fixadoras não foi muito grande e as biomassas de suas folhas corresponderam a 5-10% das biomassas totais. O teor de N nas folhas foi maior nas leguminosas do que nas não-leguminosas. A baixa densidade de plantas e a baixa biomassa de folhas das espécies fixadoras foram os fatores que mais contribuíram para as quantidades relativamente pequenas de N fixado nas folhas (10,6 a 15,1 kg.ha-1). Embora pequenas, elas são quase duas vezes as quantidades estimadas para uma floresta tropical úmida da Amazônia e para uma caatinga próxima. Estes aportes de N, acumulados ao longo dos anos, são cruciais para o balanço de nutrientes dentro do sistema.

Palavras-chave: Fixação Biológica de Nitrogênio, Mimosa tenuiflora, Piptadenia

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Abstract

Quantification of symbiotic nitrogen fixation in native vegetations is scarce, especially in tropical dry forests. We estimated the amounts of N fixed annually, measuring the proportions of fixed N (%Ndda) and the amounts of N in the leaf biomass of tree legumes in one area of mature caatinga in Paraíba state, Brazil. The %Ndda was calculated comparing 15N concentrations of legume and reference species. Leaf biomass was estimated using allometric equations based on the stem diameters at breast height. Mimosa

tenuiflora, Piptadenia stipulacea and Anadenanthera colubrina had large proportions of their leaf N derived from atmospheric N2. The average sizes of the plants of the fixing species were not very large and the leaf biomasses corresponded to 5 to 10% of the total aboveground biomasses. The N content in the leaves was higher in legumes than in the non legume species. The low plant density and the low leaf biomasses of the fixing species contributed the most to the relatively low amounts of fixed N in the leaves (10.6 to 15.1 kg ha-1). Although low, they are almost twice the amounts estimated for a tropical rain forest and a nearby caatinga. Their accumulated inputs, along the years, are crucial to the nutrient balance of the systems.

Key words: nitrogen biological fixation, Mimosa tenuiflora, Piptadenia stipulacea,

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Introdução

A fixação biológica de nitrogênio (FBN) é o principal processo de entrada de N nos ecossistemas naturais e também um dos mais importantes processos ecológicos (Cleveland et al. 1999). Apesar da sua importância, dados quantificando a FBN são raros, principalmente em vegetação nativa tropical. A principal limitação é a inexistência de um método adequado para determinação da fixação em árvores e arbustos de maior porte. O método mais confiável, baseado na abundância de 15N, só pode ser usado quando há uma diferença significativa entre o sinal de 15N da leguminosa fixadora e o de plantas não fixadoras tomadas como referência (Högberg 1997; Boddey et al. 2000, Gehring e Vlek 2004). Esta condição não é encontrada em muitos locais e tipos de vegetação, mas é encontrada na caatinga (Freitas et al. 2009), que cobre aproximadamente um milhão de quilômetros quadrados do nordeste brasileiro (Sampaio 1995).

Baseado no método da abundância natural de 15N, as proporções do N fixado simbioticamente em relação ao N total da planta têm sido determinadas em várias espécies de florestas tropicais secas, em diferentes condições ambientais, na África (Schulze et al. 1991; Ndiaye e Ganry 1997) e na América (Shearer et al. 1986). Para estimar as quantidades de N fixado nas plantas, as medidas destas proporções precisam ser feitas simultaneamente às determinações das quantidades de N produzido. Isto não é feito facilmente em vegetações perenifólias, que têm produção de folhas ao longo de todo o ano, mas é mais fácil em vegetações caducifólias, nas quais a massa de folhas é renovada anualmente e corresponde à maior parte da biomassa aérea produzida (Machado et al. 1997). Para estimar as quantidades de N fixadas em uma área, as quantidades de N em todas as leguminosas fixadoras desta área precisam ser determinadas. Isto também é mais fácil em florestas secas do que nas úmidas porque elas têm menos espécies. Estas determinações simultâneas e integradas raramente foram feitas e só uns poucos trabalhos foram publicados com estimativas de FBN em vegetações nativas tropicais (Roggy et al.1999, Sylla et al. 2002). Apesar de serem mais facilmente obtidos, praticamente inexistem dados para florestas tropicais secas.

Considerando esta ausência de informação, foram estimadas as quantidades de N fixadas anualmente em folhas de árvores numa área de caatinga do Nordeste do Brasil.

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Material e Métodos

O estudo foi conduzido na Fazenda Tamanduá, município de Santa Terezinha, Paraíba, em torno das coordenadas 07°0’14” S e 37°20’38” W. A precipitação média anual é de 600 mm, com grande variação de ano a ano e concentrada em três meses, normalmente entre março e maio. A temperatura anual média é de 26° C, com pouca variação sazonal e diária. Os solos são Neossolos Litólicos, relativamente rasos e de baixa fertilidade.

Foram escolhidas três áreas dentro da propriedade, todas cobertas com caatinga preservada por mais de 50 anos. Em cada área, foi demarcada uma parcela de 20 x 50 m e, em cada parcela, todas as plantas com o diâmetro do caule igual ou superior a 3 cm foram marcadas, identificadas e tiveram seus diâmetros do caules medidos à altura do peito (DAP, 1,3 m do solo). A biomassa total e de folhas de cada planta foram estimadas utilizando as equações alométricas desenvolvidas por Sampaio e Silva (2005) e Silva e Sampaio (2008). Como todas as espécies de leguminosas estudadas são decíduas, a estimativa das biomassas de folhas foi considerada equivalente a produção anual de folhas. Folhas maduras, completamente expandidas, de cada espécie de leguminosa fixadora foram coletadas em cada parcela, assim como folhas de uma leguminosa não fixadora (Caesalpinia pyramidalis Tul.) e de uma espécie não leguminosa (Aspidosperma

pyrifolium Mart.), usadas com espécies de referência. Das espécies de leguminosas fixadoras com menos de cinco plantas em cada parcela, foram coletadas amostras de todas elas; das com mais de cinco plantas, foram selecionadas, aleatoriamente, cinco para coleta. As folhas foram secas em estufa, moídas e analisadas quanto aos seus teores de N total, pelo método de Kjeldhal, e de 15N, por espectrometria de massa.

A proporção de N fixado em cada planta (%Ndfa) foi calculada utilizando a seguinte fórmula (Shearer e Kohl, 1986):

%Ndfa = (δ15N(referência) – δ15N(fixadora)/ δ15N(referência) – B) × 100;

Onde δ15N(referência) é o valor médio de δ15N das plantas das espécies de referência em cada parcela, δ15(fixadora) é o valor médio de δ15N de cada leguminosa considerada como possível fixadora e B é o valor de δ15N do processo de fixação em plantas crescidas em meio sem suprimento de N mineral. Considerando os altos valores de δ15N das plantas não fixadoras da caatinga, as dificuldades metodológicas de determinar este valor B em espécies arbóreas (Högberg 1997, Boddey et al. 2000) e a ausência deste valor para

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quaisquer espécies da caatinga, ele não foi determinado. Como recomendado por Högberg (1997), testaram-se valores extremos de B da literatura, para avaliar o efeito nos cálculos da %Ndfa. Foram usados os valores de 0% e -2%, comumente empregados em estudos de FBN (Schulze et al. 1991, Roggy et al.1999, Raddad et al. 2005).

A quantidade de N fixado nas folhas foi estimada multiplicando-se a biomassa de folhas de cada planta na parcela pela média da proporção do N fixado (%Ndfa) da espécie, em cada parcela.

Resultados e Discussão

Os valores de δ15N das folhas das leguminosas fixadoras foram significativamente menores (médias de 1.02 a 1.74‰) que os das plantas de referência (4.48 e 4.70‰) (Tabela 1). Todas as espécies fixadoras tiveram altas proporções de seus conteúdos de N derivadas do N2 atmosférico. Elevadas capacidades de fixação de Mimosa tenuiflora e de Piptadenia stipulacea já haviam sido encontradas por Freitas et al. (2009), em um local próximo, mas eles não encontraram sinais de fixação em Anadenanthera colubrina neste mesmo local. As proporções da fixação destas espécies estão entre as mais altas já registradas em leguminosas crescendo em vegetações naturais (Schulze et al. 1991, Ndiaye e Ganry 1997, Roggy et al. 1999, Sylla et al. 2002, Gehring et al. 2005).

Os valores médios das biomassas das espécies fixadoras não foram muito elevados (Tabela 1), seguindo o padrão da vegetação local, limitada pela disponibilidade de água durante 5 a 7 meses por ano. A biomassa de folhas correspondeu a proporções entre 5 e 10% da biomassa aérea total, dentro da faixa usualmente referida para plantas arbóreas e arbustivas de caatinga (Silva e Sampaio, 2008).

Os teores de N nas folhas das leguminosas foram mais elevados que nas folhas das plantas da espécie não leguminosa (Tabela 1). As quantidades de N fixado nas folhas de A

colubrina, M. tenuiflora e P. stipulacea foram estimadas entre 12,8 e 18,3 kg ha-1, dependendo do valor de B adotado. Entre as variáveis que compuseram o cálculo da fixação biológica de N nas folhas das plantas (biomassa de folhas, quantidade de N e proporção de N fixado), somente a biomassa de folhas teve valores baixos em relação a outros tipos de vegetação. Calculando com base na área, as baixas densidades de plantas e as baixas biomassas de folhas foram as variáveis responsáveis pelas baixas quantidades de N fixado (Tabela 1). Estas quantidades são bem menores que as registradas em leguminosas cultivadas, que podem chegar a 87 e até a 177 kg ha-1 (Hauser e Nolte 2002).

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No entanto, são mais do dobro das quantidades estimadas por Roggy et al. (1999), em uma floresta tropical na Guiana, e por Freitas et al. (2009) em uma área de caatinga próxima.

Conclusões

Mimosa tenuiflora, Piptadenia stipulacea e Anadenanthera colubrina fixaram simbioticamente grandes proporções de seus conteúdos de N, mas as baixas densidades das plantas na área e as baixas quantidades de biomassa de folhas fizeram com que as quantidades de N fixado nas folhas fossem relativamente baixas (10,6 a 15,1 kg ha-1). Embora baixas estas entradas acumuladas ao longo dos anos são cruciais para o balanço de N no sistema.

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Referências

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Tabela 1. Biomassa de folhas, quantidade de N nas folhas, quantidade de N, δ15N foliar, nitrogênio derivado da atmosfera e fixado nas espécies de caatinga em uma área do Nordeste do Brasil.

Espécies Biomassa de folhas Quantidade de N na folha Quantidade de N δ15N Ndfa Fixação N

B=0 B=-2 B=0 B=-2 (kg ha-1) (%) (kg ha-1) (‰) (%) (kg ha-1) Leguminosas fixadoras 738 20.2 15,1 10,6 Anadenanthera colubrina (Vell.) Brenan 106 2.72 2.9 1.84 42,3 1,7 1,2

Mimosa tenuiflora (Willd.)

Poire 141 3.24 4.6 1.02 78,0 54,6 3,6 2,5

Piptadenia stipulacea (Benth.) Ducke 491 2.70 12.7 1.05 77,5 54,2 9,8 6,9 - - - - Leguminosas não-fixadoras 1931 2.77 53.5 4.79 - - - - - - - - Outras espécies 2773 2.04 56.7 4.48 - - - -

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