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Flexibilidade x Avaliação – a compreensão da influência do modelo econômico no chão

5 O DIREITO À EDUCAÇÃO: UM RETRATO DAS POLÍTICAS DESTINADAS À

5.3 Flexibilidade x Avaliação – a compreensão da influência do modelo econômico no chão

Outro olhar sobre a educação na modernidade é a configuração do neoliberalismo que evidencia o sistema capitalista e que, mal administrado, torna a mercadoria mais valiosa que o sujeito. O desenho moderno não gera possibilidades igualitárias para que o sujeito possa usufruir das coisas criadas pelo ser humano. Com as distrações provocadas pelo mercado, pela indústria e pelo discurso, o indivíduo não enxerga a complexidade de um sistema público de educação de qualidade e para todos. De fato, há uma ilusão de ideias muitas vezes inalcançáveis pelo discurso social vigente. Para que alguém compreenda os seus direitos, principalmente o direito à educação, é necessário compreender o que é educação. A ilusão econômica perpetrada pelo modelo neoliberal imprime uma ideologia de que o indivíduo aceite de maneira passiva o que está posto. E de fato o que está posto: uma legislação com princípios democráticos? Uma legislação que se propõe a alcançar a todos? Uma melhoria gradativa da educação? Índices que revelam o crescimento da educação brasileira e a credibilidade da escola? De fato, observamos como está o chão da escola.

O mau investimento do Estado na escola pública é reflexo de discursos manipulatórios e de uma má gestão dos bens públicos, que busca a privatização dos setores fundamentais do

67 Estado para um controle de mercado e colocando a melhoria na educação em segundo plano. Nessa perspectiva mercadológica da educação, em contraponto, a LDB, expressa uma legislação com princípios democráticos que podem possibilitar uma educação justa e completa para o cidadão. Observa-se que na formulação da LDB já havia grandes embates políticos entre progressistas e democratas. E quais os embates políticos que foram relevantes para esta formulação?

No Brasil Imperial, a obra de maior expressão sobre o sistema de ensino foram os pareceres de Rui Barbosa. Por questões políticas, as suas ideias não prosperaram, entretanto, inspiraram a LDB de 1961, primeira lei que estabeleceu as diretrizes e bases do ensino em nível nacional, propondo uma reforma do ensino primário e sugerindo a criação de um sistema de ensino que definisse as competências e a atuação de cada esfera pública na prestação dos serviços educacionais. (COSTA, 2011, p. 27).

A LDB (1996) vem trazendo uma proposta de democratização da educação brasileira, colocando a necessidade da igualdade de ensino entre o público e o privado e também a preocupação em preparar o estudante para o mercado de trabalho. O embate político existente na formulação da LDB se deu por pensamentos políticos opostos. Por um lado, os progressistas defendiam a existência de um sistema, uma gestão democrática que fosse base para todas as escolas (públicas e particulares) e mantinham a ideia de uma formulação de uma política educacional nacional. Enquanto isto, os privatistas recusavam o sistema e defendiam a diferenciação de políticas entre escola pública e escola privada. Diante do embate os progressistas da proposta educacional de massas começaram a incentivar a participação da população fazendo com que o projeto fosse viabilizado dentro da proposta democrática. Mesmo após sua formulação, a participação da população ainda é de extrema importância para a construção de uma educação que atenda os diferentes tipos de pessoas.

Dentro dessa aparente luta entre a ideia de uma configuração democrática dentro de um sistema capitalista e de um governo neoliberal, torna-se complexa a totalidade da materialidade do artigo 205 da Constituição, como destacam Lisita, Verbena e Sousa (2003, p. 101):

Os dois eixos básicos que fundamentam a atual LDB revelam claramente uma dissonância: o eixo de flexibilidade e o eixo de avaliação. Se por um lado a flexibilidade traz o tom de descentralização da desregulamentação, da diminuição dos controles cartoriais e burocráticos, aventando inclusive possibilidades de desoficialização ou mesmo de desescolarização dos sistemas, se a lei dá força aos chamados ―projetos pedagógicos‖ das escolas, ao direito a diferen a, ao valor da diversidade cultural e da gestão democrática, ela aciona, também, com maior força, o eixo da avaliação externa desenvolvida pelo próprio Estado.

68 A visão ―democrática‖ na LDB reitera a prática de uma educa ão voltada para o mercado e para a manutenção de um Estado neoliberal, quando coloca avaliações externas para medir a qualidade da educação. Este Estado evidencia a configuração da modernidade, tendo em vista que as avaliações cujos resultados são considerados mais importantes para a educação brasileira não são realizadas pelo Estado brasileiro, mas, sim, por organizações externas que não compreendem de fato a realidade da educação brasileira.

Por outro lado, a LDB também vai proporcionar uma flexibilidade através dos projetos pedagógicos que proporcionam um olhar exclusivo para realidade de cada escola, podendo assim evidenciar o chão da escola. Diante dessa dualidade entre flexibilidade e eixo de avaliação, apresentamos um trecho do texto de abertura do PPP da escola pesquisada, no qual se apresentam a preocupação com a participação de todos na construção do saber, com base na democracia, e também a preocupação da escola com índices externos de avaliação.

Preocupação com o todo, evidenciando a gestão democrática:

Nossa proposta de trabalho baseia-se na vontade de fazer com que a educação pública seja desenvolvida em um ambiente harmônico entre todos os seguimentos da comunidade escolar, pois pensamos que a democracia é o pilar central do conhecimento. Dessa forma, é importante garantir a participação da comunidade no processo de ensino-aprendizagem, promovendo debates sobre melhores formas de conhecer, saber, fazer e entender o mundo que nos circunda. (Distrito Federal, SEDF, PPP, Colégio A, 2018, p. 4)

O parágrafo seguinte aponta para as avaliações externas com base em uma nova política pública:

Na perspectiva dos ciclos que está sendo implantado neste ano em nossa escola, este projeto educativo prevê uma organização didática e administrativa numa visão da pedagogia histórico-crítica da construção de novos saberes. Nossos objetivos também serão direcionados ao aumento de índices já alcançados no IDEB, garantindo a aprendizagem do aluno. Outro foco é descobrir caminhos para minimizar o problema da indisciplina que vem aumentando nos últimos anos [...](Distrito Federal, SEDF, PPP, Colégio A, 2018, p. 4)

Esses trechos exemplificam a dualidade dos discursos presentes na legislação que refletem na construção e compreensão do chão da escola, pois o gestor coloca em evidência a responsabilidade da participação da comunidade e o objetivo da aprendizagem, mas aponta que a materialidade dessa proposta seria evidenciada em índices de avaliações externas.

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