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Floresta e direito de propriedade nas Constituições brasileiras

4.3 PF na ótica das funções de Estado

4.3.1 Floresta e direito de propriedade nas Constituições brasileiras

As terras brasileiras cobertas por exuberantes florestas deveriam ter sido usadas como instrumentos de uma política de desenvolvimento socioeconômico, através do uso racional, do emprego do trabalho, recursos materiais e financeiros, de acordo com as potencialidades dos

ecossistemas e sua capacidade de suporte. Isso poderia ter criado aqui seu próprio princípio de desenvolvimento, com uso de uma fonte de recurso renovável inserida na cultura de consumo da população brasileira, como processo de cidadania. Porém, a história demonstra que o caminho tomado foi outro, de maior entropia ambiental e socialmente iníqua.

O processo de ocupação territorial e uso da terra no Brasil tem sido e continua sendo danoso aos ecossistemas; e gerado u’má distribuição de terras com conseqüentes conflitos no campo. A estrutura fundiária e o uso do solo constitui um forte componente do subdesenvolvimento do país, e suas origens remontam ao princípio da colonização do sistema sesmarial.

O ordenamento jurídico sobre o mundo agrário brasileiro foi prescrito na Lei Superior de 1934, que dispunha sobre a competência da União para legislar privativamente sobre normas fundamentais do direito rural e sobre florestas etc., cabendo aos Estados legislar supletivamente e complementarmente (art. 5, inciso XIX, alínea c, parágrafo § 3º em consonância com o art. 7, inciso III).

A Constituição de 1934 assegurava o direito de propriedade, desde que não fosse exercido contra o interesse social e coletivo, e sua desapropriação por utilidade pública era condicionada à prévia indenização (art. 113, item 17). Dispunha ainda no título da Ordem Econômica sobre a promoção da produção e a fixação do homem no campo via colonização. Por outro lado, o Código Civil - vigente à época - no seu art. 190, não previa a desapropriação por utilidade pública na hipótese da redistribuição. As terras que poderiam ser redistribuídas eram as devolutas e as particulares. COSTA (2000) discorre que além da inexecução constitucional da redistribuição da terra haveria também a falta de respaldo político para a consecução da mesma, e, em face da inaplicabilidade dos dispositivos, o autor considerou estes como natimortos. Neste contexto, conserva-se a estrutura fundiária do período colonial com poucas ou parcas evoluções.

Mesmo erigida em circunstâncias excepcionais, a Constituição de 1937 manteve o direito de propriedade, a desapropriação por interesse ou utilidade pública, assegurando aí o interesse social ou coletivo.

De acordo com COSTA (2000) a Carta Política erigida por uma Assembléia Constituinte em 1946, foi a que mais acolheu o reclamo de justiça social por incorporar bases marcantes rumo a uma justa distribuição da propriedade. Preservou-se, o direito de propriedade, mas garantiu a desapropriação por utilidade pública e por interesse social (art. 141, § 16). O uso da propriedade ficou condicionado ao bem-estar social, podendo a mesma ser justamente distribuída com igual oportunidade para todos (art. 147). Para fazer cumprir os atos constitucionais que visavam a reforma da estrutura fundiária, criou-se uma instituição para coordenar seus objetivos – Instituto Nacional de Imigração e Colonização – INIC (Lei nº 2.163, de 5 de janeiro de 1954), e o Serviço Social Rural - SSR (Lei nº 2.613, de 23 de setembro de 1955), posteriormente transformados na Superintendência de Política Agrária - Supra (Lei Delegada nº 11, de 11 de outubro de 1962).

Todavia, ratificava-se aí, o alicerce de um modelo que viria mais tarde a consolidar uma cultura de uso da terra brasileira, de desenvolvimento rural baseado na expansão agrícola e pecuária. A Carta de 1946 concebia no seu art. 150 a criação de estabelecimento de crédito especializado de amparo à lavoura e à pecuária. Ratificado por dispositivos constitucionais e instrumentos de implementação que visavam uma melhor distribuição da propriedade como pressuposto do alicerce para o desenvolvimento e bem-estar social. Por outro lado, devido à conjuntura do desenvolvimento econômico, social, político, e aos fatores externos que condicionavam o modelo de desenvolvimento endógeno, este alicerce jurídico e instrumental viriam a confluir num modelo de desenvolvimento que tinha como princípio do progresso a remoção da floresta, sem levar em consideração as potencialidades e fragilidades dos biomas brasileiros. Após a promulgação da Emenda Constitucional n° 10 de 1964, surgiu o Estatuto

da Terra (Lei nº 4.504, de 30 de novembro de 1964), e com estes o instrumentos administrativos para conduzir a reforma agrária e desenvolvimento rural: respectivamente, o Instituto Brasileiro de Reforma Agrária – IBRA – (art. 37, inciso I) e o Instituto Nacional do Desenvolvimento Agrário – Inda (art. 74). Alei extinguiu então a Superintendência de Política Agrária – Supra. Concebeu-se, neste momento, um grande avanço como marco legal de legitimação de reforma agrária no país e na distribuição da propriedade.

No que tange à questão florestal, esta foi respaldada no Art. 4º, alíneas a, b, e d do Estatuto da Terra. Esta lei excluía do processo de desapropriação o imóvel rural, independente de sua extensão, cujas características recomendassem sob o ponto de vista técnico e econômico, a exploração florestal racionalmente realizada, mediante planejamento adequado; e as áreas mesmo de particulares, cujo objeto de preservação florestal ou de outros recursos naturais fossem reconhecidas para fins de tombamento pelo órgão competente da administração pública. Porém, não apontava mecanismos de promoção da atividade florestal como componente do desenvolvimento rural, nos seus instrumentos econômicos de consecução da política agrária. Por outro lado, a política agrária incentivava a destruição dos recursos florestais com potencial produtivo, tendo em vista que só seria considerado produtivo o imóvel rural com produção agrícola ou pecuária; com florestas somente se tivesse sendo manejada.

A Carta Constitucional de 1988, em vigor, apresenta a função da propriedade privada esmiuçada no art. 186, sendo na acepção de COSTA (2000), os critérios puramente subjetivos e de difícil constatação.

O Código Florestal Brasileiro (Lei 4.771, de 15/09/1965) estabelece no seu artigo primeiro que “as florestas existentes no território nacional e as demais formas de vegetação, reconhecidas de utilidade às terras que revestem, são bens de interesse comum a todos os habitantes do País...”. Vinte e quatro anos mais tarde, a Lei 7.804 (de 18/07/1989) incluiria na Lei da Política Nacional do Meio Ambiente (6.938, de 31/08/1981) as florestas no conceito amplo de recursos ambientais. Essa relevância social coletiva das florestas seria posteriormente fixada na Constituição Brasileira de 1988, que estabeleceu no seu artigo 225 um Capítulo sobre o Meio Ambiente, propugnando que “todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações” SILVA (2001).