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3. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

3.5. Concentração de Minérios de Ferro

3.5.3. Flotação

A flotação é um processo de concentração aplicado a partículas sólidas que explora diferenças nas características de superfície entre as várias espécies presentes. A propriedade diferenciadora da flotação é o grau de hidrofobicidade de uma superfície mineral. O conceito de hidrofobicidade está relacionado com a umectabilidade ou

“molhabilidade” de uma partícula pela água. Quanto mais hidrofóbica a superfície da partícula, menos ela será “molhada” pela água. O oposto de hidrofobicidade é a hidrofilicidade. Uma partícula hidrofílica é ávida por água.

Na flotação a fase líquida é sempre a água, que é uma espécie polar e a fase gasosa é quase sempre o ar, constituído por moléculas apolares. Uma substância hidrofóbica pode ser então caracterizada como aquela cuja superfície é apolar e apresenta maior afinidade com o ar. Por outro lado, uma substância hidrofílica pode ser caracterizada como uma substância de superfície polar, apresentando maior afinidade com a água. Apenas alguns minerais são naturalmente hidrofóbicos, que são a grafita, a molibdenita, o talco, a pirofilita, alguns carvões e ouro livre de prata.

Como poucos minerais são naturalmente hidrofóbicos, a aplicação da flotação seria restrita. Porém, a propriedade diferenciadora da flotação pode ser induzida através da adsorção de reagentes, conhecidos como coletores, na superfície de minerais hidrofílicos, tornando-os hibrofóbicos.

A adsorção de coletores nas superfícies presentes num sistema de flotação é melhor compreendido com conhecimentos básicos de propriedades das interfaces. As interfaces presentes no sistema são as interfaces sólido-líquido, sólido-sólido, sólido-gás, líquido- gás e líquido-líquido. Os principais tipos de ligações químicas ocorridas num sistema de flotação ocorrem na região interfacial. Todo o conhecimento sobre os fenômenos interfaciais se baseia em modelos empíricos e em medidas experimentais de adsorção, tensão superficial e potencial zeta.

Adsorção significa concentração na interface pode ser física ou química. A adsorção química, ou quimissorção, é assim denominada porque neste processo ocorre efetiva troca de elétrons entre o sólido e a espécie adsorvida, ocasionando a formação de uma única camada sobre a superfície sólida e a irreversibilidade e liberação de energia.

A adsorção física é um fenômeno reversível em que normalmente ocorre a deposição de mais de uma camada de adsorbato sobre a superfície adsorvente. As forças atuantes na

adsorção física são idênticas às forças de van der Waals. As energias liberadas são relativamente baixas e o sistema atinge rapidamente o equilíbrio.

As propriedades elétricas das interfaces são extremamente importantes num sistema de flotação. Essa importância levou PARKS (1975) a classificar a adsorção em específica e não específica de acordo com mecanismos eletrostáticos envolvendo as interfaces. A carga elétrica dos sólidos suspensos numa polpa atrai uma “atmosfera” de íons de carga contrária e íons de mesma carga são repelidos para longe da superfície. Essas duas regiões podem ser representadas pelo modelo da dupla camada elétrica, apresentado na figura 3.13.

Contraíons

Líquido polar Partícula

Camada adsorvida (Stern) Camada difusa

Dupla Camada Seio da solução

P o te n c ia l Distância x ψo: Potencial na superfície Partícula Contraíons Líquido polar Partícula

Camada adsorvida (Stern) Camada difusa

Dupla Camada Seio da solução

P o te n c ia l Distância x ψo: Potencial na superfície Partícula

FIGURA 3.13: Modelo da dupla camada elétrica para uma partícula de carga de superfície negativa em solução.

Essa distribuição de cargas desde a superfície da partícula até o seio da fase líquida acarreta na presença de campo elétrico na interface, gerando uma diferença de potencial. O potencial medido experimentalmente no plano de cisalhamento é definido como potencial zeta (LEJA, 1982). Este potencial avaliado determina a carga de superfície das partículas, suas estabilidades na dispersão, ou suas tendências rumo à coagulação.

A geração de cargas na superfície do sólido pode ser devida a vários fatores, como por exemplo, à uma interação química específica, à dissolução preferencial de íons na superfície ou por substituição isomórfica na rede cristalina, que são as mais comuns. Segundo LEJA (1982), as cargas surgem na superfície das partículas minerais devido à fragmentação dos mesmos, o que provoca um rompimento de ligações covalentes.

Os reagentes usados num sistema de flotação são compostos orgânicos e inorgânicos empregados com o objetivo de controlar as características das interfaces envolvidas no processo. Qualquer substância orgânica ou inorgânica que tende a se concentrar numa das interfaces é denominada agente ativo na superfície. Surfatante é uma substância ativa na superfície que apresenta um caráter anfipático do tipo R-Z. O grupo Z é polar e consiste de um agregado de dois ou mais átomos ligados por ligação covalente. Esse grupo apresenta afinidade com a água. O grupo R é apolar e consiste na parte hidrofóbica da espécie.

Os reagentes de flotação podem ser classificados quanto ao seu papel exercido no processo. São tradicionalmente classificados como coletores, modificadores e espumantes. Coletores são aqueles reagentes que atuam na interface sólido-líquido, modificando a superfície mineral, que passa de hidrofílica para hidrofóbica. Como os sistemas de flotação são classificados em sulfetos e não-sulfetos, adota-se a mesma lógica para a classificação dos reagentes coletores, que são divididos em tio-compostos e compostos ionizáveis não-tio. Os tio-compostos são coletores empregados na flotação de sulfetos. Os compostos ionizáveis não-tio são coletores de não-sulfetos.

Os principais reagentes coletores não tio são os alquil-carboxilatos, como ácidos graxos, os alquil-sulfatos e sulfonatos, mono e di-alquil-fosfatos, sulfossuccinatos, sulfossuccinamatos, hidroxamatos, aminas primárias e sais quaternários de amônio.

Os surfatantes empregados como espumantes são compostos não-iônicos, e geralmente pertencem à classe dos álcoois ou éteres. Alguns reagentes coletores têm também poder

espumante, como as aminas, que na faixa de pH entre 10 e 11 apresenta-se na forma iônica (forma coletora) e na forma molecular (forma espumante).

Os reagentes classificados como modificadores podem ser de vários tipos, apresentando funções distintas como modulador de pH, como controlador do estado de dispersão da polpa, ativador de superfície para tornar a ação dos coletores mais efetiva, ou como depressor. A ação depressora de um modificador consiste em inibir a ação do coletor e hidofilizar a superfície dos minerais. Entre os depressores orgânicos, destacam-se os polissacarídeos, em especial o amido de milho, usado como depressor de óxidos de ferro e de ganga na flotação direta de rochas fosfáticas (PERES, 2005).

A flotação normalmente é empregada como etapa final de concentração, após o emprego de outras técnicas, desempenhando um papel de ajuste final da qualidade dos produtos obtidos. A tabela a seguir resume as aplicações atuais da flotação no beneficiamento de minérios de ferro. O Brasil apresenta o maior número de usinas com o uso de flotação e também possui aplicação mais diversificada de flotação em colunas de todo o mundo nesse setor.

A flotação na concentração de minérios de ferro é realizada basicamente por três rotas diferentes:

• Flotação aniônica direta de óxidos de ferro em valores de pH próximo de 7, com o emprego de ácidos carboxílicos, alquil-sulfatos ou alquil- sulfonatos;

• Flotação aniônica reversa de quartzo ativado com íons cálcio em pH elevado com o emprego de coletores da classe dos ácidos carboxílicos;

• Flotação catiônica reversa de quartzo em pH alcalino com emprego de alquil éter-aminas e alquil éter-diaminas e com uso de depressores para os óxidos de ferro, especialmente amidos.

A flotação catiônica reversa tem hoje a maior aplicação industrial. Em outras aplicações a técnica de flotação reversa (flotação dos minerais de ganga) é aplicada para a remoção de fosfatos e sulfetos.

Na flotação catiônica reversa, o quartzo é flotado com éter aminas parcialmente neutralizadas com ácido acético e os óxidos de ferro são deprimidos com o uso do amido. O grau de neutralização das aminas está em torno de 25% e 30%. A neutralização é feita com o objetivo de se aumentar a solubilidade das aminas. A amina exerce também o importante papel de espumante na flotação. O grande emprego da flotação reversa de quartzo em pH alcalino se deve ao fato da alta taxa de flotação obtida para o quartzo e a alta seletividade obtida.

A adsorção do amido é preferencial sobre a hematita. Tudo indica que além de pontes de hidrogênio formadas entre os grupos OH- do amido e oxigênios da superfície da hematita, a presença de íons férrico nas partículas de hematita pode fixar os anéis de glicose do amido, possivelmente através de uma reação de natureza química e determinada por características estruturais (estereoquímicas).

A flotação de minérios de ferro pode ser feita também com o uso de coletores aniônicos, como os ácidos graxos e seus sabões. Usando-se o oleato de sódio, por exemplo, a hematita pode ser flotada diretamente em pH próximo de 7, ou a ganga pode ser flotada com a ativação do quartzo com íons cálcio em pH elevado. A figura 3.14 mostra a alta flotabilidade (>95%) da hematita com oleato de sódio em pH = 7.

0 20 40 60 80 100 4 5 6 7 8 9 10 11 12 pH F lo ta b il id a d e (% ) 5x10-6M 5x10-5M 0 20 40 60 80 100 4 5 6 7 8 9 10 11 12 pH F lo ta b il id a d e (% ) 5x10-6M 5x10-5M

FIGURA 3.14: Efeito do pH na flotabilidade da hematita com oleato de sódio (QUAST, 2006).

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