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3. Ensino de História e mídias

3.1 Fontes

O uso de fontes no ensino de História deve ser pensado de maneira complexa no sentido de que não deve ser visto como apenas uma forma de comprovação para determinadas narrativas históricas abordadas durante as aulas. A abordagem de fontes deve ser pensada com o objetivo de aproximar os alunos da complexidade da produção do conhecimento histórico e subverter ao ensino de história preso a uma determinada narrativa e vertente de pensamento. Tanto a animação, como o cinema, a imagem e o relato oral estão ligados a formas de produzir o conhecimento histórico para além do documento escrito, de modo que se explora a pluralidade de ângulos que um mesmo fato ou processo histórico pode ser analisado.

O uso de fontes diversificadas está ligado à chamada “Revolução Documental”, uma redefinição do conceito de fonte histórica que ocorre mais incisivamente a partir da criação da chamada Escola dos Annales no início do século XX preponderantemente entre os historiadores franceses. Pereira e Seffner (2008) argumentam que

[...] a revolução documental acabou com o império do documento escrito, permitindo que o olhar do historiador se desviasse dos documentos oficiais e das tramas políticas, típicas da história positivista, para uma quantidade indefinível e enorme de vestígios do passado: imagens, filmes, crônicas, relatos de viagem, registros paroquiais, obras de arte, vestígios arquitetônicos, memória oral... (PEREIRA; SEFFNER, 2008, 115).

Este fato desembocou na multiplicação do olhar historiográfico para os aspectos da vida sociocultural antes objeto quase exclusivo da antropologia e da etnologia. Dessa maneira, outras vertentes e métodos de pesquisa (novas formas de dialogar com os documentos, inclusive com os documentos escritos oficiais) foram sendo organizadas e sistematizadas. Outro aspecto importante ligado à revolução

documental é a possibilidade de abandonar a história eurocêntrica e pensar a historicidade, a temporalidade, a narrativa história no ponto de vista de outras culturas. Dentro dessa perspectiva, no caso deste trabalho em questão, a animação, o cinema e as imagens televisivas, de modo geral, também podem ser entendidos como fonte e contribuir para os objetivos do ensino de história analisando com criticidade produtos culturais e midiáticos de determinadas épocas. O objetivo não é que os alunos sejam aprendizes de historiadores e sim que pensem a historicidade das construções socioculturais e políticas e internalizem conceitos históricos que os tornem capazes de compreender uma realidade “produzir opiniões e de considerar soluções políticas para os problemas do seu tempo” (PEREIRA; SEFFNER, 2008).

A produtividade do uso de fontes está na possibilidade de mostrar às novas gerações a natureza e a especificidade do conhecimento histórico. Nosso objetivo, ao ensinar história às novas gerações utilizando fontes, não consiste em ensinar a ler documentos, separá-los por séries, descrever suas regularidades, não se trata de tornar ou querer tornar o estudante um micro- historiador, como se ele tivesse condições intelectuais de fazer o mesmo que os historiadores fazem. Ensinamos os estudantes a ler o relato histórico e ensinamos a ler as representações sobre o passado que circulam na sua sociedade (PEREIRA; SEFFNER, 2008, p. 126).

A questão é que na escola o ensino-aprendizagem se dá de maneira diversa que no espaço acadêmico pois o saber escolar é resultado de um amplo leque de relações que o tornam específico, há uma diferença substancial entre o conhecimento específico da disciplina e o conhecimento pedagogizado. Convém lembrar que o conhecimento pedagogizado não é sinônimo de simplificado. O saber escolar é repleto de analogias, ilustrações, demonstrações e relações com a realidade conhecida pelos alunos. Transpor o conteúdo de maneira que ele possa ser compreendido na complexidade dos seus conceitos é uma tarefa que requer grande capacidade didática e argumentativa, sem esquecer também que o ensino-aprendizagem é relacional: se produzem novos saberes a partir do contato dos alunos com os conceitos e do professor com as interpretações dos alunos.

Dessa forma, é inadequado falar em simplificação quando se pensa a aprendizagem histórica. Ana Maria Ferreira da Costa Monteiro e Fernando Araújo Penna defendem que o ensino de História é um lugar de fronteira como analogia a um conceito da geopolítica: “A fronteira é o lugar onde são demarcadas as diferenças, mas onde também é possível produzir aproximações, diálogos ou distanciamento

entre culturas que entram em contato” (MONTEIRO; PENNA, 2011, p. 194). Podemos pensar, a partir disso, que os processos em que se dão as construções de conhecimento não são idênticos pois têm objetivos diferentes e também relações e narrativas diferentes (assim como a fronteira é um lugar de distanciamentos e aproximações). Monteiro e Penna concordando com Schulman (2004) argumentam que:

[...] a racionalização e ação docentes configuram um ciclo que se inicia com uma compreensão e termina com uma nova compreensão, inclusive do conteúdo pedagogizado, e que envolve os seguintes processos: compreensão, transformação, instrução, avaliação e reflexão. No momento da transformação, o professor, a partir de sua compreensão sobre o objeto, realiza a elaboração para tornar possível a sua compreensão pelos alunos [...] (MONTEIRO; PENNA, 2011, p. 200).

A transformação é entendida como a fase mais incisiva neste processo de transposição do conhecimento:

A atividade de transformação é o processo através do qual o professor produz as formas de representações mais poderosas (analogias, metáforas, ilustrações, exemplos, etc) em função da idade e das características gerais dos alunos (adaptação) e das características específicas de cada turma (adequação). (MONTEIRO; PENNA, 2011, p. 200)

E, sendo assim, o ensino deve utilizar-se de propostas múltiplas a fim de atender a uma necessidade de pedagogizar o conteúdo produzindo representações que, por sua vez, abrirão um leque de possibilidades para a aprendizagem significativa e crítica em história.

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