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2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2.1 DESENVOLVIMENTO PROFISSIONAL E FORMAÇÃO DOCENTE

2.1.4 Formação continuada docente

Segundo Imbernón (2010), as pesquisas sobre a formação continuada saíram de uma fase descritiva, com uma produção teórica significativa sobre a temática, para uma fase mais experimental, devido ao grande investimento durante os anos de 1980, 1990 e 2000 na difusão de programas de formação continuada.

A partir de uma pequena genealogia da formação, é possível compreender os discursos sobre a formação continuada de professores. As etapas da genealogia da formação são apresentadas por Imbernón (2010, p. 15) da seguinte maneira:

 Até os anos de 1970: início.

 Anos de 1980: paradoxo da formação. O auge da técnica na formação e a resistência prática e crítica.

 Anos de 1990: introdução de mudança, apesar de tímida.

 Anos 2000 até a atualidade: busca de novas alternativas.

Para o autor, a primeira etapa é considerada como início porque é a partir da década de 1970 que a formação continuada passa a ser analisada como um campo de conhecimento nos países latinos, dando início a diversos estudos sobre a relação entre professores e programas de formação continuada, na perspectiva de analisar a importância da participação efetiva dos docentes no processo de planejamento das atividades de formação. Nesta década, houve a institucionalização da formação inicial e predominou um modelo individualizado de formação continuada, em que cada um buscava para a si a vida formativa, ou seja, primava-se pela formação inicial, que era melhor ou pior, dependendo da época e do território, e a formação continuada era responsabilidade exclusiva do profissional. A formação inicial era vista como um conhecimento perpétuo, ou seja, por toda a vida profissional docente. Dessa forma, a formação continuada era algo secundário à profissão.

Nos anos de 1980, objetivando a busca pelo bom e competente professor, a formação continuada desenvolve-se, tendo como base o paradigma da racionalidade técnica. A formação continuada ocorria em um contexto positivista, autoritarista e técnico, em que a reflexão e a análise, por parte do docente, não eram vistas como aspectos fundamentais da formação. Ramalho, Nuñez e Gauthier (2003) identificam esse modelo como Modelo Hegemônico da Formação (MHF), no qual se une o racionalismo técnico com a formação academicista e tradicional.

Neste modelo, o professor é reconhecido como um executor/reprodutor e consumidor de saberes profissionais produzidos pelos especialistas das áreas científicas, sendo, portanto, o seu papel no processo de construção da profissão minimizado, uma vez que ele ocupa um nível inferior na hierarquia que estratifica a profissão docente. Dessa concepção de docente, emerge um ―modelo formativo‖ baseado em determinadas características:

- no treinamento de habilidades (identificadas como competências);

- em conteúdos descontextualizados da realidade profissional, fragmentados, reveladores de uma formação acadêmica fragilizada;

- na distância do objeto da profissão (do processo educativo da escola), com uma evidente dicotomia teoria/prática, com o criticado estágio terminal e com escassos momentos para mobilizar saberes da profissão na prática real (RAMALHO; NUÑEZ; GAUTHIER, 2003, p. 23-24).

Os anos de 1990 representam uma época produtiva e, ao mesmo tempo, negativa para a formação continuada. A produtividade está relacionada à inserção de novas concepções e ideais sob a influência da pedagogia anglo-saxônica com os conceitos de pesquisa-ação, currículo, projetos, triangulação e reflexão na formação de professores. A parte negativa fica por conta da institucionalização da formação continuada, ou seja, intentou-se ―adequar os professores aos tempos atuais [anos de 1990], facilitando um constante aperfeiçoamento de sua prática educativa e social, para assim adaptá-las às necessidades presentes e futuras‖ (IMBERNÓN, 2010, p. 19).

O aperfeiçoamento originou um modelo de treinamento que teve como objetivo proporcionar aos professores a apropriação, de forma coletiva ou individualizada, de conhecimentos e habilidades selecionados por um especialista e que deveriam ser transpostos para a sala de aula. Imbernón (2010, p. 19) chama essa época de ―frutífera‖ e de ―confusa‖ por causa do desenvolvimento de modelos de formação alternativos que valorizavam um saber reflexivo em meio à predominância do modelo de treinamento.

Em relação à busca de novas alternativas para a formação continuada, nos anos 2000 até os dias atuais, destaca-se o surgimento da ―crise institucional da formação‖ devido ao novo contexto sócio-político-cultural-tecnológico inaugurado pelo século XXI, que retrata a importância ―da formação emocional das pessoas, a relação entre elas, as redes de intercâmbio, a comunidade como elemento importante para a educação‖ (IMBERNÓN, 2010, p. 22). A crise institucional da formação configura-se como o conflito entre as novas possibilidades alternativas para a formação continuada e a resistência a elas, ou seja, como um conflito entre a mudança progressista e o retorno aos sistemas anteriores.

A breve introdução histórica da formação continuada feita por Imbernón (2010) permite compreender tanto os paradigmas que subsidiaram e ainda subsidiam as iniciativas de

formação continuada como também perceber os desafios históricos para a reestruturação dessa modalidade.

Ao se pensar uma reestruturação de formação continuada – porque ―outra formação é possível‖ (IMBERNÓN, 2010, p. 36) – adota-se, nesta pesquisa, a concepção de Alarcão (2003, p. 100-107), que a entende como ―o processo dinâmico por meio do qual, ao longo do tempo, um profissional vai adequando sua formação às exigências de sua atividade profissional [...]‖, o que pode ―ajudar a configurar uma nova profissionalidade ao estimular a cultura profissional dos professores e a cultura organizacional das escolas‖.

Alarcão (2003) afirma que a formação continuada precisa visar o desenvolvimento da pessoa do professor, da escola como organização e da profissão docente. O autor propõe quatro enquadramentos contribuidores desta perspectiva, a saber: 1) O professor como construtor de sua própria maneira de ser e agir profissional: a formação continuada deve centrar-se no professor enquanto sujeito e valorizar a sua experiência e realidade docente, a fim de dar sentido à formação e oportunizar momentos de autorreflexão e autoconhecimento sobre a sua ação profissional; 2) Formação apoiada: a formação continuada estimula mudança de posturas, e esse processo traz diversos conflitos tanto pessoais, profissionais, quanto institucionais; com isso o autor defende que os apoios estimulam o empenho e a continuidade dos professores pela transformação de suas concepções e práticas profissionais; 3) Da escola como objeto de reflexão à escola como local de ação: a relação entre o que se pensa e o que se faz, ou seja, o autor, aqui, aponta a necessidade de ―ser profissional reflexivo, observador atento, questionador, pesquisador, mas também decisor, actor, experimentador e avaliador‖ (ALARCÃO, 2003, p. 116); 4) Os professores e a produção dos saberes profissionais docentes: reflexão aprofundada sobre os processos de apropriação, transformação e construção dos conhecimentos específicos da profissão docente.

Nessa mesma linha de pensamento, Imbernón (2004, p. 69) complementa dizendo que:

A formação permanente do professor deve ajudar a desenvolver um conhecimento profissional que lhe permita: avaliar a necessidade potencial e a qualidade da inovação educativa que deve ser introduzida constantemente nas instituições; desenvolver habilidades básicas no âmbito das estratégias de ensino em um contexto determinado, do planejamento, do diagnóstico e da avaliação; proporcionar as competências para ser capazes de modificar as tarefas educativas continuamente, em uma tentativa de adaptação à diversidade e ao contexto dos alunos; comprometer-se com o meio social. Tudo isso supõe uma formação permanente que desenvolva processos de pesquisa colaborativa para o desenvolvimento da organização, das pessoas e da comunidade educativa que as envolve.

Assim, a formação continuada na acepção de Alarcão (1980) e Imbernón (2010) não é vista apenas como uma mera atualização de informações, mas como um processo de desenvolvimento profissional que empondera o professor a tomar iniciativas mais críticas e reflexivas em relação a sua prática docente e pedagógica ou, melhor ainda, como fomentadora do desenvolvimento pessoal, profissional e institucional, potencializando um trabalho colaborativo para transformar a prática educativa.

Neste trabalho, a formação continuada está centrada nas cinco ideias de atuação estabelecidas por Imbérnon (2010, p. 49):

 A reflexão prático-teórica do docente sobre a sua própria prática, mediante uma análise da realidade educacional e social de seu país, sua compreensão, interpretação e intervenção sobre a mesma. A capacidade dos professores de gerar conhecimento pedagógico por meio da análise da prática educativa.

 A troca de experiências, escolares, de vida etc., e a reflexão entre indivíduos iguais para possibilitar a atualização em todos os campos de intervenção educacional e aumentar a comunicação entre os professores.

 A união da formação a um projeto de trabalho, e não ao contrário (primeiro realizar a formação e depois um projeto).

 A formação como arma crítica contra práticas laborais, como a hierarquia, o sexismo, a proletarização, o individualismo etc., e contra práticas sociais, como a exclusão e a intolerância.

 O desenvolvimento profissional da instituição educacional mediante o trabalho colaborativo, reconhecendo que a escola está constituída por todos e que coincidimos na intenção de transformar essa prática. Possibilitar a passagem da experiência de inovação isolada e celular para inovação institucional.

A formação continuada sedimentada nas cinco ideias de atuação busca romper com o caráter tradicional da formação continuada pensada como ―culturalização dos professores‖ (IMBÉRNON, 2010, p. 95). Procura-se superar a ideia de mera atualização de conhecimentos científicos, didáticos e psicopedagógicos e caminhar para uma formação que estimule, nos professores, um processo de reflexão sobre as suas práticas, um processo de colaboração profissional e um processo de intervenção curricular, institucional e pedagógica, aspectos esses de suma importância para a promoção do desenvolvimento profissional.

Portanto, por meio da concepção de formação continuada apresentada, direciona-se a análise do curso objeto de investigação nesta pesquisa.

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