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CAPÍTULO 2 FEUDALISMO OU CAPITALISMO:

3.5 A FORMAÇÃO DO ESTADO E O CARÁTER DAS

O Estado é um instrumento de mediação entre a sociedade e os indivíduos, é o que regulamenta as relações entre as pessoas circunscritas em determinado território. Esta instituição é essencialmente de classe e possui o monopólio legítimo da força física para a manutenção da ordem. Conforme Marx, “domínio desavergonhadamente simples do Sabre e da Sotaina” (MARX e ENGELS, 1983, p. 211), ou seja, o Estado como aquele que se utiliza da força da espada: o exército e a hegemonia ideológica por meio da Igreja. Friedrich Engels, em “A origem da família da propriedade e do Estado”, afirma que este é um instrumento de dominação de classe, sendo assim, só faz sentido a sua existência em sociedades que estejam divididas em classes antagônicas e para que se mantenha a ordem e a segurança da propriedade privada. Portanto, é necessária a “instituição de uma força pública”.

a instituição de um poder público que já não corresponde diretamente a população e se organiza também como força armada… Esse poder público existe em todos os Estados. Compreende não só homens armados, como também elementos materiais, prisões e instituições

coercivas de toda a espécie… (ENGELS, 1985, p 155).

O Estado, portanto, está para a manutenção da sociedade de classes com o uso da força física e da dominação ideológica, a fim de assegurar a propriedade privada. É um instrumento de dominação de homens sobre homens e de alguns destes homens sobre o território.

O Estado não é de forma alguma, uma força imposta, do exterior, à sociedade. Não é, tampouco, “a realidade da ideia moral”, nem “a imagem e a realidade da razão” como pretende Hegel. É um produto da sociedade numa certa fase de seu desenvolvimento. É a confissão de que essa sociedade se embaraçou numa insolúvel contradição, se dividiu em antagonismos inconciliáveis de que não se pode desvincilhar. Mas para que essas classes antagônicas, com interesses econômicos contrários, não se entredevorassem e não devorassem a sociedade numa luta estéril, sentiu-se a necessidade de uma força que se colocasse aparentemente acima da sociedade com o fim de atenuar o conflito nos limites da “ordem”. (ENGELS, 1985, p. 191). O Estado manifesta-se como elementar para a manutenção de uma sociedade de classes. Marx, em “As lutas de classe na França”, apresenta a materialidade de uma disputa política pela hegemonia do Estado, ou seja, seus meios de dominação e competição econômica, ideológica, jurídica e cultural.

As avaliações, em geral, indicam o Estado como um meio de dominação em que o exercício da força física lhe é legitima com o fim de manutenção da ordem e da propriedade privada, ambas restritas a um limite territorial. Aqui nestas terras, a constituição do Estado deu-se de forma absolutista, ou seja, o poder da gestão do Estado a serviço do Rei de Portugal. Como já visto, Portugal estava inserido na lógica mercantil do capitalismo que já se encontrava em fase de reprodutividade industrial(o transito de modo de produção feudal para o capitalista é possível verificar que a expansão inicial ocorreu via o comércio criando bases para a efetiva modificação das relações de trabalho que passam do

artesão para o industrial) nesta complexa contradição, do novo que carrega em si ainda características do velho, as condições políticas, jurídicas e ideológicas estavam intimamente vinculadas à nobre aristocracia conservadora. Os interesses da burguesia reinol e da burguesia vinculada à agro-exportação inicialmente eram os mesmos

Compreende-se, aliás, tal atitude passiva da metrópole. Coincidiam perfeitamente seus interesses nestes primeiros anos da colonização com os das classes dominantes na colônia. Eram eles que desbravavam o território – ou faziam-no desbravar – conquistando-o palmo a palmo aos indígenas e aventureiros de outras nações que aqui se instalavam. … E faziam tudo isso por conta e risco próprios, não concorrendo a metrópole senão nos passíveis proventos, que sob a forma dos dízimos e dos quintos reais reservava para si. (PRADO J C, 2012, p. 30)

Evidentemente, a administração colonial se dava por câmaras municipais nas mãos dos proprietários vinculados diretamente à metrópole. “A sociedade colonial brasileira é o reflexo fiel da sua base material: a economia agrária que descrevemos. Assim como a grande exploração absorve a terra, o senhor rural monopoliza a riqueza, e com ela os seus atributos naturais: o prestígio e o domínio” (PRADO J C, 2012, p. 24).

Com o desenvolvimento da sociedade brasileira, a disputa de poder entre os burgueses ocorre na medida em que uma burguesia comercial passa a se fortalecer. Esta, vinculada ao comércio e ao crédito,“começa a pôr em xeque a nobreza dos proprietários rurais, até

então a única classe abastada e, portanto, de prestígio da colônia. É por obra dela que as cidades do litoral, onde se fixa, se transformam em centros populosos e ricos”. (PRADO J C, 2012, p. 38)

Oposições entre os interesses da metrópole, da “aristocracia fundiária nacional” e da nascente burguesia comercial iniciam, assim, a interna e ainda atual luta entre a burguesia pelo domínio da direção política e econômica do Brasil. Conforme Caio,

A nossa evolução política segue portanto passo a passo a transformação econômica que se opera a

partir de meados do sec. XVII. Esta transformação, que se define pela maior penetração da economia da metrópole, repercute no terreno político pelo desaparecimento gradual da nossa autonomia local do primeiro século e meio de colonização. Desloca-se a autoridade das mãos dos proprietários, a antiga classe dominante, para as da Coroa portuguesa. (PRADO J C, 2012, p. 43)

E é deste conflito que se fundam as bases para a emancipação do jugo imperial, evidenciando na genética do Estado brasileiro o conchavo e a conciliação que preparam o terreno para a Independência. Assim nos mostra Caio :

A transferência da Corte portuguesa para o Brasil em 1908 veio a dar à nossa emancipação política um caráter que singulariza no conjunto do processo histórico da independência das colônias americanas. … Mas enquanto nas demais a separação é violenta e se resolve nos campos de batalha, no Brasil é o próprio governo metropolitano, premido pelas circunstâncias, embora ocasionais, que faziam da colônia a sede da monarquia, quem vai paradoxalmente lançar as bases da autonomia brasileira. (PRADO J C, 2012, p.44)

Esta questão, do caráter da evolução política do Estado, é fundamental para a percepção que busca alcançar uma ruptura radical das relações de poder, de propriedade e de trabalho. Conforme afirma Mazzeo,

A inexistência de condições que direcionassem a uma ruptura concreta de cunho revolucionário, com a estrutura socioeconômica colonial, possibilita à burguesia latifundiária que assuma o processo da independência e, posteriormente, crie um aparelho do Estado, dentro das diretrizes ideológicas, com o cuidado permanente de afastar

quaisquer iniciativas que apontassem para o perigo de transformações mais radicais (MAZZEO, 2015, p. 83).

Outro passo que leva à evolução política do Brasil rumo à independência é o fim do trabalho escravo, portanto “integração sucessiva do país numa forma produtiva superior: a forma capitalista. As instituições primitivas como a escravidão, herdadas da antiga colônia, são varridas pelas novas forças produtivas que se vão formando e desenvolvendo no decorrer do século XIX.” (PRADO J C, 2012, p. 93). A abolição marca o cenário político brasileiro, mais uma vez, por conflitos internos à classe dominante: por um lado, os burgueses visando o desenvolvimento integralmente capitalista e, por outro, os senhores das grandes plantações que, com o fim da escravidão, ficam à deriva na falta de força de trabalho. Depreende-se daí que, com o fim do trafico negreiro e o inicio de relações de trabalho capitalistas, a forma e o conteúdo não suportavam mais o estado imperial burguês.

Resulta daí que a independência se fez por uma simples transferência pacífica de poderes da metrópole para o novo governo brasileiro. E na falta de movimentos populares, na falta de participação direta das massas neste processo, o poder todo é absorvido pelas classes superiores da ex-colônia, naturalmente as únicas em contato direto com o regente e sua política. Fez-se a Independência praticamente à revelia do povo; e se isto lhe poupou sacrifícios, também afastou por completo sua participação na nova ordem política. A Independência brasileira é fruto mais de uma classe que da nação tomada em conjunto. (PRADO J C, 2012, p.51)

Afirmando o caráter classista do projeto político para o Brasil, a suprir os interesses da classe dominante, afasta-se a participação da maioria da população, tornando exclusivo aos proprietários, sobretudo os rurais, a direção política do parlamento e os que almejavam alguma benfeitoria popular acabavam ou isolados ou cooptados pelo sistema. Assim é formado nosso Estado nacional, uma autocracia burguesa, embebida por privilégios, conchavos e corrupções típicos de uma relação nebulosa entre o público e o privado.

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