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2 O ESTÁGIO SUPERVISIONADO: CONSTRUÇÃO PEDAGÓGICA E REGULAMENTAÇÃO

2.4 FORMAÇÃO DA IDENTIDADE DO ESTAGIÁRIO

A formação da Identidade do aluno estagiário como profissional da prática pedagógica está intimamente ligada à formação inicial. Exige que seja ultrapassada a transmissão do conhecimento e estimule o estudante à reflexão, a ter senso crítico, questionando as consequências de sua ação. Embora, para isso, não se discuta especificamente a formação, mas o repensar sobre ela com a análise da prática pedagógica na formação do futuro profissional de Educação Física, considerando como um dos aspectos os saberes necessários que se configuram na prática pedagógica do aluno estagiário.

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Os subsídios para este estudo foram definidos por Pimenta quando diz:

Em relação à formação inicial, pesquisas têm demonstrado que os cursos de formação, ao desenvolverem um currículo formal com conteúdos e atividades de estágios distanciados da realidade das escolas, numa perspectiva burocrática e cartorial que não dá conta de captar as contradições presentes na prática social de educar, pouco têm contribuído para gestar uma nova identidade do profissional docente (PIMENTA, 2007, p. 16).

Dada a natureza do futuro profissional que será contribuir, por meio do ensino, na construção do conhecimento e no processo de humanização dos alunos historicamente situados, espera-se que o Curso de Bacharelado em Educação Física possa desenvolver nos alunos estagiários “habilidades, atitudes e valores que lhes possibilitem permanentemente irem construindo seus saberes-fazeres” (PIMENTA, 2007, p. 18). A fim de articular as práticas sociais/profissionais com a realidade educativa e do cotidiano, novas perspectivas buscam entender o trabalho do professor por intermédio de uma abordagem que vai além do saber acadêmico-científico. De acordo com Nóvoa (1992), essa abordagem se coloca em oposição aos estudos que reduziam a profissão docente a um conjunto de competências técnicas, gerando uma crise de identidade nos professores em decorrência de uma separação entre o profissional e o eu social.

A nova forma de conceber o trabalho do futuro professor tem a intenção de dar “voz ao professor” com base na análise da trajetória, história de vida, etc. Passou-se a valorizar os diferentes aspectos da história individual profissional do professor, reconhecendo e considerando a construção desses tipos de saber, relacionando-os com sua formação. Novos estudos educacionais passaram então a reconhecer o professor como sujeito dotado de um “saber fazer”, e é na análise dos valores e princípios que orientam a ação docente que estão os elementos principais para a compreensão acerca dos fundamentos da prática cotidiana do professor.

Como o universo de informações vem sendo ampliado de forma acelerada nas últimas décadas, a práxis pedagógica inovadora, na sua ação docente, precisa passar do ensinar para enfocar na mediação de aprender a aprender. Por sua vez, a produção do saber, fazer e ser de forma contínua contempla o aprender a aprender, mas para isso, o professor necessita ser desafiado a buscar novas metodologias para atender as exigências da sociedade atual (SANTOS; FRANÇA, 2011, p. 227).

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Por meio dos conhecimentos adquiridos na relação teoria-prática é que os alunos terão subsídios para formar sua identidade, transformando seu savoir-faire num processo contínuo.

Quando falamos de identidade profissional, referimo-nos a uma identidade social particular, uma entre tantas outras identidades sociais do sujeito, como vimos. É uma identidade especializada que diz respeito a um mundo institucional especializado que partilha saberes específicos, isto é, saberes profissionais (FINO, 2003, p. 3). Quais seriam os saberes necessários para construção dessa identidade? Pimenta (2007) argumentou que tais saberes estão relacionados com a própria vida dos alunos estagiários, um repensar e refletir dele por todo o seu caminho até chegar à sua prática pedagógica, passando por essa jornada seus valores, suas experiências como aluno, suas angústias, sua história de vida e no sentido que pretende construir sua prática. Na linha do tempo, os alunos puderam conferir como alunos a prática de vários professores que influenciaram positiva e negativamente nessa construção e levaram consigo aquelas que se transformaram em experiências de êxito.

Na linha da Inovação Pedagógica, Fino (2003) afirmou que é necessário romper com teorias tradicionais, um novo agir de forma a entender o aluno como construtor do próprio conhecimento, sugerindo o Construcionismo, e não apenas o Instrucionismo (em que o sujeito participa da construção, não apenas recebe instruções), baseado nas teorias de Papert (1994), como estudo e caminho para essa nova identidade.

Entende-se um ensino voltado para a pesquisa e a produção do conhecimento o do sujeito que norteia seu eixo, participando na construção do conhecimento de forma integral, indivisível, portanto, entendendo o aluno como sujeito que pensa, reflete, critica, questiona como ser criativo, ou seja, um ser universal, ideal Epistêmico. Nos estudos de Piaget e Vygotsky, encontram-se as bases e os pressupostos fundamentais de que o indivíduo é o centro do próprio percurso em direção ao conhecimento.

Contudo, na formação inicial, as IES necessitam mobilizar saberes até que o aluno estagiário possa construir sua identidade; mas quais são esses saberes?

Conforme Pimenta (2007), são três: os da Experiência, do Conhecimento e os Pedagógicos. Nenhum aluno chega à IES como tabula rasa, todos trazem suas experiências de vida como estudantes, muitos foram atletas ou participaram de

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atividades esportivas, outros procuram o curso pela boa experiência e pelo relacionamento com antigos professores. Na própria IES, quando já estão mais maduros, conseguem distinguir melhor, por meio dos docentes, que tipo de postura como profissional vão querer adotar nas suas futuras práticas.

Os alunos trazem e adquirem também conhecimentos específicos de todas as disciplinas que percorrerão oferecidas pelo currículo, tais disciplinas mesmo sendo vistas em compartimentos. É fundamental o olhar do estagiário para o viés que existe em todas as disciplinas e suas contextualizações, que os conhecimentos não são estanques, todas as disciplinas estão interligadas. À medida que se dirigem para sua prática, seja ela em qual modalidade da Educação Física que ele escolha, sempre terá de fazer a contextualização com outros saberes necessários à prática. Não podem também esquecer os conhecimentos pedagógicos relacionados com métodos e técnicas fundamentais para orientação do seu proceder, como planejamentos e planos de aula, avaliações físicas, entre outros.

Tardif (2002) classificou os Saberes da Formação Inicial, ligados aos Pedagógicos, definindo-os como os Saberes Disciplinares em que, por intermédio da IES, os alunos tomam conhecimento desses saberes produzidos pelas ciências nas diversas disciplinas do curso, definindo como Saberes Curriculares, aqueles que correspondem aos conteúdos e métodos na elaboração de projetos, planilhas, tabelas que os alunos devem aprender para aplicar, e Saberes Experienciais aqueles em que o aluno vai incorporar as experiências individuais e coletivas de sua prática.

Mesmo que se descreva de forma diferenciada, há semelhança entre os autores que corroboram ser importante para o entendimento dos estagiários o modo como mobilizarem os saberes em suas práticas.

Analisando as características do saber docente, Tardif (2002) afirma que o saber profissional é o saber da ação, o saber do trabalho está a serviço do trabalho, todos os saberes estão relacionados com o mundo do trabalho e como os professores conseguem articulá-los para resolver situações problemas, o que o distingue do saber científico. Ao mesmo tempo, eles estão relacionados no tempo – temporais – relacionam-se com a história de vida, pois a mobilização do processo em ensinar vai acontecendo ao longo de sua vida, são diversos (plurais), personalizados, situados – singulares – e carregam consigo marcas do seu objeto, que é o ser humano. Assim, baseando-se nessa perspectiva, o autor afirma que a prática profissional não é local de aplicação do saber

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científico, mas, sim, de transformação em função das exigências do trabalho, do aqui e agora.

A concepção de tipos de saber da ação de Tardif (2002), de certo modo, relaciona-se com a ideia de Schön (1992) de que os professores, na sua prática pedagógica, criam um conhecimento específico ligado à ação. Esse conhecimento é pessoal, tácito, não sistemático, espontâneo, experimental, intuitivo e cotidiano, o que leva muitas vezes as pessoas a agir sem ter consciência da sua ação. De acordo com Schön (1992), o professor analisa e interpreta sua realidade no ato, o que seria a reflexão-na-ação e também após a realização, que é a reflexão-sobre-a-ação.

Zeichner (1993) ressaltou a importância da preparação dos alunos estagiários de forma a assumirem atitudes reflexivas. Afirma também que essa apreensão dos saberes se prolonga por toda a vida, e na IES os professores iniciam o processo de como ensinar, sendo este um ato reflexivo para o resto da vida.

Importante também o estudo das Competências necessárias à prática pedagógica. Perrenoud (2000) fala sobre práticas inovadoras e descreve dez competências que devem orientar a prática pedagógica desde os estagiários até os futuros profissionais:

1) organizar e dirigir situações de aprendizagem; 2) administrar a progressão das aprendizagens; 3) conceber e fazer com que os dispositivos de diferenciação evoluam; 4) envolver os alunos em suas aprendizagens e em seu trabalho; 5) trabalhar em equipe; 6) participar da administração da escola; 7) informar e envolver os pais; 8) utilizar novas tecnologias; 9) enfrentar os deveres e os dilemas éticos da profissão; 10) administrar a própria formação contínua (PERRENOUD, 2000, p. 15-16).

Nessa formação de identidade entende-se que, para construir todo esse processo no sentido de mobilizar os saberes, faz-se necessário aos estagiários uma abordagem na disciplina Estágio Supervisionado, que os alunos estagiários possam observar para problematizar suas práticas, analisar e conferir novas literaturas e começar a ter um olhar para os locais de estágios não apenas como aluno, mas sim como futuros profissionais. Nesse processo de reflexão crítica os alunos estagiários poderão avançar para transformação da Prática Pedagógica, reconhecidos como intelectuais que, com a tomada de consciência dos valores e significados de sua emancipação partam para mudança do estudo da sua prática, passando a entender a epistemologia da Práxis.

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A consciência-praxis é aquela que age orientada por uma dada teoria e tem consciência de tal orientação. Teoria e prática são processos indissociáveis. Separá-los é arriscar demasiadamente a perda da própria possibilidade de reflexão e compreensão. A separação de teoria e prática se constitui na negação da identidade humana (GHEDIN, 2012, p. 153).

Por meio da mobilização dos Saberes e da compreensão entre a aplicabilidade da teoria e a prática, de forma conjunta, é que os alunos estagiários vão construindo sua Identidade Profissional, definindo o tipo de profissional que desejam ser, o tipo de prática que vão adotar, qual a maneira de agir diante de uma situação-problema do cotidiano, quais os princípios éticos, qual a relação professor-aluno. Será com o estágio que eles se adaptarão ao mundo da sua Prática Pedagógica.