• Nenhum resultado encontrado

2 DEFINIÇÃO DO PROBLEMA E OBJETIVOS

3.2 Indústria fonográfica: processos de transmissão de música

3.2.2 Formas de atuação das majors

Para entendermos melhor este ponto de vista é preciso analisar um pouco mais de perto os processos de internacionalização da economia, da cultura e da vida cotidiana, que têm sido descritos pelo termo Globalização. Maria Celeste Mira lembra que o capitalismo, desde sua origem, sempre teve uma vocação internacional, mas agora, mais nitidamente, revela seu caráter global, estendendo o “processo civilizatório”, que lhe é inerente, por todas as partes do mundo: Esta fase caracteriza-se pelo descentramento da atividade capitalista. Na verdade, o processo de globalização propicia as diferenças e a produção atinge uma dimensão mais flexível (MIRA,1994, p.137).

Essas características da globalização, promovem o deslocamento das coisas, indivíduos e ideias, o desenraizar de uns e outros, uma espécie de desterritorialização generalizada. Conforme Dias, as mercadorias culturais que sempre apresentaram grande capacidade de deslocar-se e, por suas características próprias, incrementam intensamente o sistema mundial de trocas simbólicas, têm, com o processo de globalização, o seu trânsito mundial agilizado e intensificado. Os sistemas produtivos são igualmente transformados, fragmentados, desterritorializados, e os mercados, fortemente segmentados. As novas tecnologias permitem a autonomização de etapas inteiras da produção de bens, favorecendo a terceirização e a busca de novos tipos de produtos e nichos de mercado. O discurso dominante evoca o advento da descentralização, da individualidade, da democracia. Entretanto, no que diz respeito à indústria fonográfica, Dias afirma que a atual mudança é especialmente observada na intensidade do movimento de concentração, considerando-se a configuração já conhecida:

As empresas que detêm, atualmente, mais de dois terços do mercado mundial de discos são a Sony Music, empresa transnacional de origem japonesa da área de produtos eletro- eletrônicos, a Sony Corporation que há alguns anos comprou o setor fonográfico da rede CBS (uma das pioneiras do setor); a PolyGram, antigas Phonogram e Polydor, que por sua vez sucederam à Gramophone francesa e à alemã, hoje braço fonográfico da Philips, igualmente uma empresa transnacional do setor eletro-eletrônico, administrada basicamente por capital holandês e alemão; a Warner Music, cujo filão fonográfico integra, juntamente com o cinema, a televisão e a mídia impressa, um dos maiores conglomerados americanos produtores de mercadorias culturais, o Time-Warner; a EMI, de origem inglesa, que desde 1969 está reunida com a não menos tradicional Odeon, e a BMG-Ariola, que por seu turno é o braço fonográfico do grupo alemão Bertelsmann, que atua na área de televisão, edição e comercialização de livros (Círculo do Livro assim como no de fabricação de compact-discs). Esse cenário é acrescido de duas companhias de menor porte, mas fortemente atuantes em escala mundial: a americana MCA-Geffen que, juntamente com o selo Motown, em 1990 foi adquirida pelo grupo Matsushita, e a inglesa Virgin. Todas as cinco primeiras estão produtivamente instaladas no Brasil. A MCA acaba de fazê-lo e a Virgin é representada no país pela EMI. O movimento de concentração tragou para dentro do grupo das transnacionais a única grande empresa brasileira produtora de discos: em 1993 a Warner comprou a Continental. (Dias, 2000, p. 42)

A partir deste cenário transnacional construído por Márcia Dias, percebe-se que tais empresas, apesar de instaladas produtivamente no Brasil, não se originaram nem têm sede no território nacional, apenas filiais ou representantes. Isso leva a crer que contando com capitais externos para investimentos na produção de mercadorias restritas à veiculação e consumo locais seus lucros (ou parcelas destes) são remetidos ao exterior. A origem de tais empresas, deve ser entendida aqui, como fato, pois não pretendemos destrinchar toda a estrutura e organização das transnacionais instaladas no Brasil, assim como o fez Márcia Dias.

Todavia, para o entendimento do contexto no qual se consolida a indústria produtora de discos no Brasil (tendo em vista que os aspectos de distribuição e difusão de músicas são cruciais para o desenvolvimento de nossa revisão de literatura), é preciso considerar o processo de expansão e desenvolvimento dos meios de comunicação de massa no país. O desenvolvimento dos media é fundamental para o desenvolvimento da indústria fonográfica. Ao lado do rádio, que foi se popularizando na primeira metade do século XX, toca discos e televisores passaram a estar, cada vez mais, presentes nos lares brasileiros e em todo o mundo. Conforme Levy, a música popular de hoje é ao mesmo tempo mundial,

eclética e mutável graças à gravação sonora e à transmissão radiofónica. A difusão das gravações provocou na música popular fenômenos de padronização comparáveis aos que a impressão teve sobre as línguas. O fato de que a música seja independente das línguas (com a notável exceção das letras das canções) evidentemente facilitou esse fenômeno de rompimento do isolamento:

Se a escrita descontextualiza a música, sua gravação e reprodução criam progressivamente um contexto sonoro mundial e os ouvidos que lhe correspondem (...) Até que a qualidade das gravações ultrapassasse um certo limite, o rádio transmitia apenas peças tocadas ao vivo. Quando as estações de freqüência modulada, que só se disseminaram após a Segunda Guerra Mundial, começaram a transmitir discos com boa qualidade sonora, o fenômeno da música mundial de massa tomou vulto, sobretudo com o rock e o pop nos anos 60 e 70. (Levy 1999, p. 138)

É nesse contexto que o setor fonográfico transnacional se expande. O setor não se amplia desvinculado do desenvolvimento dos mass media. Contudo é importante salientar, conforme argumentação de Daniela Ghezzi, que a técnica, que percorre o processo de ponta a ponta afastou definitivamente a artesanalidade da produção musical, realizada segundo os ditames da racionalidade e do imperativo do maior lucro possível:

A gravação em estúdio alterou significativamente seus procedimentos-padrão em função dos novos recursos técnicos e dos sintetizadores digitais, que queimam etapas e minimizam custos com contratação de músicos. Estas mudanças são perceptíveis já na década de 70, e se estendem até os dias de hoje. A utilização de tais inovações tecnológicas permitiu que a gravação não fosse necessariamente “ao vivo”, podendo ser feita com cada músico em separado. Assim, percebe-se a autonomização de algumas etapas já na fase de gravação e mixagem do produto, possíveis graças à técnica utilizada e restrita às grandes empresas da época. (Ghezzi, 2003, p.81)

Todavia, tal autonomização não correspondeu, necessariamente, a uma maior liberdade criativa por parte do artista, que via suas intenções criativas subjugadas às regras de mercado plenamente estabelecidas pela indústria fonográfica. Nesse sentido, o avanço e a popularização das novas tecnologias de gravação, ao mesmo tempo, propiciaram o surgimento de um movimento musical independente (com a globalização a produção tornou-se mais flexível e em 2005 uma pessoa que pretende gravar, utilizando um estúdio digital, com um mínimo de recursos técnicos,

é capaz de produzir um CD), e desencadearam uma significativa mudança no mercado de produção e distribuição de produtos musicais.

Documentos relacionados