2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
2.6 Fosfolipases-D (PLDs)
Entre os organismos vivos que produzem fosfolipases-D, as aranhas do
gênero Loxosceles são notáveis em produzir uma mistura de isoformas destas
moléculas em seus venenos (da SILVA et al., 2004, KALAPOTHAKIS et al.,
2007). As fosfolipases-D dos venenos loxoscélicos, também conhecidas como
toxinas dermonecróticas, são as principais responsáveis pelo desenvolvimento da
lesão dermonecrótica nos acidentados, principal evento do loxoscelismo (da
SILVA et al., 2004, APPEL et al., 2005, SWANSON e VETTER, 2006).
Essas enzimas catalisam a hidrólise de fosfolipídios como esfingomielina na
ligação fosfodiéster terminal para liberar colina e produzir ceramida 1-fosfato
(C1P) e também fosfatidilcolina de uma maneira dependente de íon Mg
+2(da
SILVA et al., 2004; van MEETEREN et al., 2004; CHAIM et al., 2011b; HORTA et
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Gremski e colaboradores (2010) revelaram que no transcriptoma da glândula
de veneno de L. intermedia 9% dos transcritos analisados correspondem a
fosfolipases-D. Estes dados estão de acordo com os descritos por Machado e
colaboradores (2005), que identificaram pelo menos 11 isoformas de PLD no
veneno de L. gaucho, denominadas Loxonecroginas, ou dados relatados por
WILLE et al., (2013), que por eletroforese bidimensional seguido por imunoblotting
encontraram no veneno de L. intermedia pelo menos 25 spots imunologicamente
relacionados com as toxinas PLDs.
Estas toxinas são proteínas com massa molecular de 30 a 35kDa, que
contém de 284 a 285 aminoácidos e incluem um peptídeo sinal seguido por um
pró-peptídeo. Apresentam uma única cadeia polipeptídica que dobra-se para
formar um barril distorcido onde a superfície interna do barril é revestida com oito
folhas β paralelas (denominadas A-H) e por oito α-hélices (denominadas de
hélices 1-8) que formam a superfície externa do barril (MURAKAMI et al., 2005).
Este motivo estrutural foi observado pela primeira vez na estrutura da Triose
Fosfato Isomerase (TIM) e é referido como um barril TIM ou como um barril
(α/β)8. Estas enzimas apresentam um loop catalítico (azul), um loop variável
(verde), um loop flexível (vermelho) e outros loops curtos que cercam o sítio ativo
(Figura 7A). O loop catalítico contém um resíduo catalítico importante, a
His47, que forma um gancho, devido à presença de uma ponte dissulfeto
(Cys51-Cys57).
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Figura 7: Estrutura de fosfolipases-D de aranhas do gênero Loxosceles. (A) Alinhamento estrutural entre a LiRecDT1 de Loxosceles intermedia (classe II) e a PLDI de Loxosceles laeta. Os loops catalíticos estão coloridos em azul, loops flexíveis em vermelho, loops variáveis em verde (Modificado à partir de GIUSEPPE et al., 2011). (B) Diferenças entre os aminoácidos do sítio ativo da PLD classe IIa (átomos em branco) e classe IIb (átomos em amarelo). Observar a presença do átomo de Mg2+ no sítio catalítico. Modificado a partir de MURAKAMI et al., 2006, CHAVES-MOREIRA, 2011.
As sequências de aminoácidos das fosfolipases-D são altamente
conservadas (55 a 99%), especialmente nos resíduos próximos a fenda catalítica,
no entanto, essas enzimas podem ser agrupadas em duas classes com base na
sua sequência, estruturas e dados bioqímicos (MURAKAMI et al., 2006, de
GIUSEPPE et al., 2011). A classe I representada pela PLDI de L. laeta é
caracterizada pela presença de apenas uma ponte dissulfeto (Cys-51-Cys57) e
um circuito hidrofóbico variável (loop variável). Já a classe II compreende PLDs
que contêm uma ponte dissulfeto adicional (Cys53-Cys201) intra-cadeia adicional
ligando o loop flexível ao loop catalítico. A classe II pode ser subdividida em duas
classes dependendo da sua capacidade de hidrolisar esfingomielina, classe IIa
(maior atividade catalítica) e IIb (menos ativa ou inativa) (MURAKAMI et al., 2005,
de ANDRADE et al., 2006, MURAKAMI et al., 2006) (Figuras 7A e 7B).
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O íon Mg
2+é essencial para a atividade catalítica dessas moléculas e seu
sítio de ligação é completamente conservado em todas as fosfolipases-D do
veneno de aranha marrom. Este íon é octaedricamente coordenado (com uma
significativa distância média Mg
2+-O de 1,98 Å), equatorialmente por oxigênios
carboxilados nas cadeias laterais de Glu
32e Asp
34e por duas moléculas de água
fortemente ligadas e apicalmente por átomos de oxigênio carboxilados de cadeias
laterais de Asp
91e por uma molécula de água que é também ligada ao átomo de
hidrogênio do Glu
32O
1. A estrutura da enzima é determinada pela presença da
ligação de um íon sulfato, o qual é considerado por ocupar a metade da posição
fosfato do substrato e é coordenado por três moléculas de água, duas das quais
também coordenam o íon Mg
2+. O anel indol de Trp
230é parcialmente
desordenado e provavelmente desempenha um papel na estabilização do grupo
de cabeça de colina do substrato (MURAKAMI et al., 2005).
Com base na estrutura do cristal da fosfolipase D, foi sugerido um
mecanismo catalítico dividido em dois passos nos quais His12 e His47
desempenham importantes funções. No primeiro passo a His12 atua como um
nucleófilo que inicia o ataque sobre o substrato no ponto de quebra da ligação, o
qual é seguido pela formação de um intermediário penta-coordenado que
posteriormente é desestabilizado pela doação de um átomo de hidrogênio pela
His47, levando à formação de uma molécula de colina. Em um Segundo passo da
reação a His47 retira um próton da molécula de água o que inicia o ataque
nucleófilo sobre o estado intermediário covalente da histidina resultando na
formação de um segundo produto ceramida 1-fosfato, e o retorno para o estado
inicial. O íon Mg
2+é importante para o reconhecimento e ligação do substrato e
para uma estabilização adicional do estado intermediário do mecanismo catalítico
de dois passos (MURAKAMI et al., 2006) (Figura 8).
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Figura 8: Mecanismo catalítico da fosfolipase-D. Hidrólise de esfingomielina envolvendo duas histidinas (His 12 e His47) encontradas no sítio catalítico da enzima. Adaptado de MURAKAMI et al., 2006.