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Capítulo 3. – O escândalo político enquanto notícia

3.3. Framing, o enquadramento das notícias

“A capacidade de suscitar emoções está ligada ao uso de imagens, sons e palavras. As palavras têm a função de evocar frames, quadros de referência que permitem evocar imagens, mapas mentais e conhecimentos de outro género” (Cacciotto, 2011, p. 153), pelo que a forma como o discurso político é transmitido irá influenciar a forma como os públicos enquadram as questões relacionadas com a política, assim como os sentimentos e opiniões que desenvolvem em relação aos político e partidos.

O afastamento da objetividade que caracterizava o jornalismo e a comunicação conduziu à ideia de que de uma perspetiva construtivista da realidade. O enquadramento dado a uma informação pode gerar diferentes perspetivas sobre um mesmo acontecimento ou assunto.

Para Entman (1993, p. 52)10 “enquadrar é selecionar alguns aspetos de uma realidade percebida e torná-los mais salientes no texto comunicativo de forma a promover uma definição particular de um problema, uma interpretação causal, uma avaliação moral e/ou recomendação de tratamento para o item descrito”.

Quer a identidade, quer o interesse próprio de cada individuo vão influenciar a forma como este irá reter as mensagens e as irá interpretar, pois a simples apresentação de factos e argumentos não é suficiente para a alteração de conceitos que fazem parte da estrutura

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mental de cada um de nós. Levar o público a adotar uma determinada visão, recorrendo ao framing, necessita de uma contextualização das mensagens por forma a torná-las consensuais. Aliás, a forma como a informação é apresentada vai afetar o processo de formação da opinião pública.

Gradim (2016, p. 19) defende que as notícias não são unicamente o seu conteúdo, “é que o seu enquadramento, o modo como são apresentadas e contextualizadas, e como certos termos, certas pregnâncias do real, são preferidos em detrimento de outros para descrever algo, tem um impacto decisivo na construção do seu significado”.

Os frames podem assim,

“definir problemas – determinar qual o responsável e quais os custos e benefícios, geralmente medidos pelos valores culturais comuns; diagnosticar

causas – identificar as forças que criam o problema; fazer julgamentos morais

– avaliar os responsáveis e os seus efeitos; e sugerir soluções – oferecer e justificar tratamentos para os problemas e prever os seus possíveis efeitos”.

(Entman, 1993, p. 52)11

Ao comunicarmos, de forma consciente ou inconscientemente, fazemos enquadramentos, que pelas palavras, terminologias e imagens, entre outros, reforçam determinadas ideias que podem determinar um julgamento e, por sua vez, influenciar o recetor nas suas conclusões, que podem ou não corresponder ao enquadramento inicial da comunicação. A cultura é fator determinante também neste processo, dado que determina a forma como os discursos é transmitido pela sua representatividade do pensamento comum da sociedade que representa.

Entman, no entanto, defende que apesar do framing implicar a noção que um frame terá um efeito mais comum num conjunto alargado de recetores não significa que o seu efeito seja o mesmo em todos. Não só o que se transmite, mas também o que se omite tem implicações na forma como o processo informativo é percecionado. O autor, numa abordagem às notícias políticas, defende que o framing “desempenha um papel principal no exercício do poder político, e o frame num texto noticioso é realmente o reflexo desse poder – regista a identidade dos atores ou interesses que competiram para dominar o texto”. (1993, p. 55)12

11 Tradução própria

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Salgado (2012) afirma,

“os políticos tentam controlar ao máximo as suas mensagens e imagens, que

têm de ser estrategicamente calculadas no contexto da sua campanha e tentam incorporar na sua estratégia os acontecimentos inesperados que também podem ter impacto na opinião dos eleitores. Obviamente, é mais fácil controlar as mensagens que são transmitidas pelos candidatos e pela organização da campanha do que as mensagens e as avaliações que os media fazem do desempenho dos candidatos, das suas possibilidades de vencer a eleição, da forma como estão a decorrer as iniciativas de campanha, ou as críticas e ataques dos adversários”.

Mauro Porto (Rubim, 2004, p. 75) fala sobre a necessidade que se impõe aos media de por um lado serem objetivos, e não se deixarem influenciar por ideologias e valores, e por outro, serem imparciais, não adotando atitudes que possam favorecer qualquer grupo, partido ou candidato, no entanto a forma como a cobertura dos assuntos é realizada pelos media pode afetar e determinar a perceção do público.

O mesmo autor apresenta a definição de framing de Goffman, para quem os enquadramentos eram “os princípios de organização que governam os eventos sociais e o nosso envolvimento nesses eventos”, são “marcos interpretativos mais gerais, construídos socialmente, que permitem às pessoas dar sentido aos eventos e às situações sociais”. (Rubim, 2004, p. 78)

São definidos dois tipos de enquadramento por Mauro Porto (Rubim, 2004, p. 91): 1. Enquadramento noticioso

“Enquadramentos noticiosos são padrões de seleção e ênfase utilizados por jornalistas para organizar seus relatos. No jargão dos jornalistas, este seria o ‘ângulo da notícia’, o ponto de vista adotado pelo texto noticioso que destaca certos elementos de uma realidade em detrimento de outros”. 2. Enquadramento interpretativo

“Os enquadramentos interpretativos operam em um nível mais específico e possuem uma independência relativa em relação aos jornalistas que os relatam. Enquadramentos interpretativos são padrões de interpretação que promovem uma avaliação particular de temas e/ou eventos políticos, incluindo definições de problemas, avaliações sobre causas e

responsabilidades, recomendações de tratamento, etc. (…) Trata-se aqui de interpretações oriundas de um contexto mais amplo que podem ser incorporadas ou não pela media”.

O enquadramento pode até nem ser percetível ou intencional, pois não se trata de omitir ou distorcer a informação, mas criar um determinado impacto com a forma como esta é apresentada. Práticas de enquadramento fornecem à mensagem movimento, organizam o discurso, pois ao selecionar, ao dar destaque e ao rejeitar, contribui-se para uma construção interpretativa dos factos, influenciando assim a opinião pública.

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