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2. Mercado Ibérico de Eletricidade

2.2. Fundamentos para a liberalização

Embora a liberalização do sector elétrico seja relativamente recente, tendo iniciado no ano de 1990 com criação da bolsa de energia elétrica de Inglaterra e Gales, esta tem ocorrido um pouco por todo o mundo. As motivações que levaram os sistemas elétricos a liberalizarem-se são distintos de sistema para sistema, no entanto, destacam-se três fundamentos que, de modo geral, motivaram a sua liberalização, sendo estes, o investimento excessivo na geração de energia elétrica, a extinção das condições de monopólio natural e as motivações de carácter politico [28].

3 Também denominado de mercado spot.

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2.2.1. Investimento excessivo na produção

Um aspeto geralmente contestado na estrutura do sector elétrico no período pré-reforma, isto é, antes da liberalização, diz respeito ao nível de investimento efetuado. De facto, tanto nos sistemas baseados em empresas privadas reguladas, como nos sistemas explorados por intermédio de empresas públicas, existiam evidências teóricas e práticas de que o nível de investimento era excessivo.

No caso da regulação económica de uma empresa monopolista privada, quando esta se baseia na taxa de retorno sobre os ativos fixos, verifica-se que a empresa realiza investimentos excessivos por forma a obter um maior lucro, pois a taxa de retorno aumenta com o aumento do investimento, sendo este comportamento denominado de efeito de Averch-Johnson.

Numa empresa pública, a inexistência de um controlo sobre os decisores com o mesmo nível de eficácia que a estrutura acionista tem no caso privado, faz com que os gestores públicos possuam um maior grau de discricionariedade nas suas ações, privilegiando os aspetos de maior visibilidade, que lhes proporcionam maior reputação e bem-estar, em vez daqueles que proporcionam uma melhor eficiência a nível económico [28].

2.2.2. Extinção das condições de monopólio natural

As condições de monopólio natural existem quando uma só empresa conduz à minimização do custo de produção de um determinado bem ou serviço, comparativamente com a existência de várias empresas a operar nesse sector de atividade económica. No sector elétrico, especialmente ao nível da produção de energia elétrica, as condições que o permitiam classificar como um monopólio natural estavam a extinguir-se, sendo esta uma das principais justificações para a sua liberalização. Esta extinção deve-se não só a evoluções tecnológicas, que proporcionaram uma diminuição da escala mínima eficiente, mas também ao aumento da procura resultante do crescimento do consumo e da integração de mercados. Ambas as situações são ilustradas na Figura 2.1, onde a redução da escala mínima eficiente é representada pela redução dos custos de produção de AC para AC’, e a expansão da procura é representada pelo aumento da curva de procura de D para D’.

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Figura 2.1: Redução da escala mínima eficiente (1) e expansão da procura (2) [28]. Relativamente ao aspeto da diminuição da escala mínima eficiente, o desenvolvimento tecnológico permitiu a construção de centrais de pequena dimensão, mas extremamente competitivas, como é o caso as centrais a gás de ciclo combinado que apresentam rendimentos próximos dos 60%. Esta redução da dimensão das centrais leva a que o seu ponto de eficiência máxima seja reduzido, passando a ser favorável a repartição dos consumidores por diversas centrais.

Além da diminuição da escala mínima eficiente, acresce ainda o aumento da procura, resultante do crescimento do consumo. Este crescimento é justificado quer pelo crescimento da atividade económica, ao nível do consumo empresarial, quer pelo aumento dos níveis de conforto e lazer, no sector doméstico. Mesmo em mercados reduzidos, como é o caso português, a potência máxima do consumo é já várias vezes superior à máxima capacidade de potência instalada em qualquer central, pelo que se pode concluir que, só pelo nível de consumo existente, as condições para monopólio natural na produção não estariam satisfeitas. Para além disso, a tendência para a integração de mercados, faz com que este fenómeno seja ainda mais evidente, contribuindo de forma positiva para a possibilidade de mercados competitivos [28].

2.2.3. Motivações políticas

Os fatores previamente apontados fundamentam as posições de liberalização, no entanto, o tempo no qual estas ocorrem está intimamente relacionado com fatores mais abrangentes, que se podem considerar como de natureza política.

Em primeiro lugar, a queda do bloco soviético e o consequente enfraquecimento das posições políticas de cariz ideológico a favor de um Estado interventor, promoveram a

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aceleração do processo de globalização no sentido do estabelecimento de modelos tendencialmente mais liberais. Este fenómeno atravessou diversas áreas de atividade, inclusive o sector elétrico.

Na União Europeia, a liberalização foi promovida pela vontade política de aprofundamento do mercado interno, através da sua expansão aos sectores da eletricidade e gás. Este processo foi inicialmente estabelecido através da Diretiva 96/92/CE de 19 de dezembro de 1996, com vista à introdução de maior concorrência nos países da UE, sendo posteriormente revisto no sentido de acelerar a liberalização e integração de mercados, pela Diretiva 2003/54/CE [28]. Com o intuito de consolidar os mercados de forma a funcionem em benefício de todos os consumidores, independentemente da sua dimensão, garantindo ao mesmo tempo um fornecimento de energia mais seguro, competitivo e sustentável, foi criada a Diretiva n.º 2009/73/CE de 13 de julho de 2009 [30].

Em certos países como o Reino Unido, Chile e Argentina a reforma do sector elétrico foi motivada, parcialmente, por programas de privatização das empresas públicas. De facto, em países onde o sector elétrico tinha a configuração de monopólio público verticalmente integrado, a privatização permitiu encaixes financeiros importantes e a diminuição da dimensão do sector público em áreas potencialmente competitivas, onde a intervenção do Estado era frequentemente questionada.

No caso português, este processo iniciou em 1982 com a eliminação das restrições ao capital privado. Em 1989, foi retirada da Constituição a irreversibilidade das nacionalizações e da reforma agrária, tendo sido aberto o caminho para a privatização de diversas empresas públicas, entre as quais a da EDP (Electricidade de Portugal) [28].

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