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O movimento cristão entrou, há dois milênios, em um mundo onde havia muitas religiões, um universo diversificado em termos sociais e culturais. Eram muitas línguas, práticas religiosas, costumes diversos, uma infinidade de divergências culturais. Nasceu como seita também em um contexto no qual Israel estava inserido no mundo dominado militarmente pelos romanos, porém cultural e religiosamente dominado pelos gregos. Esse povo diversificado, ao ouvir a mensagem dos apóstolos, não era uma página em branco, mas já trazia sua tradição e levava consigo suas ideias sobre a vida e a salvação quando aderiu à nova doutrina, o cristianismo.

Por isso, para se entender o ícone, arte sacra litúrgica da Igreja Católica indivisa, faz- se necessário conhecer suas origens e ter consciência de que a mensagem apostólica atravessou muitas fronteiras políticas, culturais e linguísticas nas primeiras décadas. Há que se levar em conta, também, que a origem do cristianismo se deu junto ao povo judeu, cultura monoteísta que tem por tradição a interdição de imagens. É preciso conhecer a arte pictural na Roma Antiga, na Grécia e no Egito, onde as imagens sagradas nunca foram assunto exclusivo da religião, mas também, e sempre, da sociedade que se expressou através dela. Os novos cristãos continuavam a usar linguagens antigas, serviam-se das estruturas sociais e culturais que encontravam para construir as novas comunidades:

Por mais que a mensagem do evangelho cristão exortasse seus ouvintes a romper com seu passado em ato radical de conversão, a prática era tomar contato com o mundo circunstante nas suas profundezas linguísticas e culturais. Para entender a história das igrejas cristãs primitivas,

75 devemos, pois, ter em vista a diversidade dos ambientes sociais e culturais em que o movimento se espalhou.1

Este capítulo buscará as origens da arte no cristianismo primitivo, mais especificamente a arte do ícone – como aconteceu a passagem de uma cultura pagã para o cristianismo, que surgiu como uma seita judaica –, com o objetivo de encontrar a origem da imagem de Cristo Pantocrator para entender sua relação com a arte de Claudio Pastro.

A palavra ícone é de origem grega: eikôn significa “imagem”, “retrato”. Embora a imagem cristã estivesse em formação em Bizâncio, designava-se por essa palavra toda a representação de Cristo, da Virgem, de um santo, de um anjo ou de um fato da história sagrada, fosse essa imagem pintada ou esculpida, móvel ou um monumento e qualquer que fosse a técnica utilizada. Agora, de preferência, aplica-se esse termo às obras pintadas, esculpidas, mosaicos, entre outras. É esse o sentido que se dá ao ícone na arqueologia e na história da arte. Na Igreja também se faz uma distinção entre a pintura de parede e o ícone: uma pintura de parede, afresco ou mosaico, não é um objeto de arte por si mesmo, mas faz parte de um corpo arquitetônico, pois um ícone pintado sobre uma prancha de madeira é em si um objeto. No entanto, em princípio, o sentido e o significado de ambos são os mesmos. Podem ser distinguidos não segundo seu sentido, mas de acordo com o seu uso e sua destinação. Assim, ao se falar de ícones pode-se ter em vista as imagens sacras em geral, sejam elas pinturas, afrescos, mosaicos ou esculturas. De certa forma, a palavra “imagem”, assim como a palavra russa obraz, exprime bem essa concepção global.2

Denomina-se ícone, no que se refere à Igreja Católica Ortodoxa, uma imagem cristã destinada ou suscetível de ser venerada. Nem todas as imagens religiosas são feitas com esse fim. Nos primeiros séculos a arte cristã, em sua maioria, não foi feita com essa finalidade, mas as imagens do gênero ícone não tardaram a aparecer. No século VI, na época do imperador Justiniano e, mais ainda, nos dois séculos seguintes, numerosos testemunhos literários e arqueológicos assinalam o crescimento do comportamento devocional ou da veneração realizada diante ou para com o ícone. Essa evolução não é consequência de uma transformação de ordem estilística ou iconográfica. Ela revela o nascimento e a difusão de um novo uso das imagens mais que a aparição de um novo tipo de objeto religioso ou uma nova sorte de imagem. A definição de ícone, pelo uso, parece se impor. O ícone não pode ser

1 Dale T. IRVIN; Scott W. SUNQUIST, História do movimento cristão mundial: do cristianismo primitivo a

1453, v. I, p.73.

definido unicamente enquanto uma superfície pintada, nem como uma técnica de pintura, mas sim como a concepção de uma imagem que se presta à veneração.3

O desenvolvimento da arte propriamente cristã, durante os primeiros séculos do cristianismo, aconteceu de maneira muito lenta. As paredes das catacumbas foram marcadas por grafites, esboços, signos e símbolos pelos iniciados. Muitos símbolos pagãos ganharam uma nova significação. O jardim, a palmeira, o pavão designam o paraíso terrestre; o navio, símbolo da prosperidade e de uma feliz travessia, torna-se a Igreja; o tema erótico de Eros e Psique passa a significar a sede da alma e o amor de Deus em Jesus Cristo; Hermes, símbolo da humanidade, representa o Bom Pastor. Há também muitas cenas do Antigo Testamento: Daniel no fosso dos leões, os três jovens na fornalha, Adão e Eva, entre outras. Só no fim do século II apareceram os símbolos propriamente cristãos: a multiplicação dos pães – que expressa o banquete eucarístico; a adoração dos reis Magos – a entrada dos pagãos na Aliança; a ressurreição de Lázaro; e, enfim, símbolos compreensíveis apenas por poucos, como a vinha e, sobretudo, o peixe, ichthys4, que se refere ao Cristo – Jesus Cristo Filho de Deus Salvador. Esses signos são encontrados, sem mudança de estilo e de tema, na Espanha, na Ásia Menor, da África até o Reno. As pinturas são sumárias: alguns traços em uma estrita gama de cores. Não são imagens cultuais. A Igreja não impõe um programa. Elas são lembranças dos momentos do Cristo ou da Virgem, são seus retratos.5 Como diz Evdokimov, nas catacumbas encontra-se uma arte puramente significativa, cujo fim é didático: proclama a salvação e traça seus instrumentos por meio de signos decifráveis. Em suas palavras:

Podem ser classificados em três grupos: 1) tudo o que se refere a água: a arca de Noé, Jonas, o peixe, a âncora; 2) tudo o que se relaciona com o pão e o vinho: a multiplicação dos pães, o trigo, a vinha; 3) tudo o que diz respeito à salvação e aos que foram salvos: os três jovens na fornalha, Daniel entre os leões, o pássaro fênix, Lázaro ressuscitado, o Bom Pastor.[...] Observa-se maior negligência na forma artística e ausência de um desenvolvimento teológico. O Bom Pastor não representa o Cristo histórico, mas quer dizer: o Salvador salva realmente.6

Não são artistas os que participam dessa produção inicial de pinturas que ainda não pode ser considerada arte. Os artistas, com efeito, trabalham na elaboração de imagens do

3 Cf. François BOESPFLUG, Dieu et ses images : une histoire de l’Eternel dans l’art, p. 104. 4Do grego ΙΧΘϒΣ: Iésous Chistós Théou Yós Sóter.

5 Cf. Alain BESANÇON, L´image interdite: une histoire intellectuelle de l´iconoclasme, p. 206-207. 6 Paul EVDOKMOV, L´art de l´icône: théologie de la beauté, p. 149.

77 mundo pagão, diante das quais os mártires cristãos são condenados. Tertuliano (155-222) recomendou que se eles quisessem se converter que mudassem seu ofício e Hipólito (170?- 235) declara: “se alguém é escultor ou pintor, que saiba que não deve fazer ídolos e, se não se corrigir, que seja expulso”7.

De qualquer maneira, não foi sem dificuldade que o cristianismo admitiu a imagem em seu culto. No início houve uma rejeição pura e simples à imagem religiosa. O culto não era centrado em imagem, mas sim na mensa, o altar do sacrifício. O templo cristão não se limitava à mesa onde seria encontrada uma estátua de um deus, mas reunia uma comunidade em torno da cerimônia do banquete sagrado. Uma imagem era considerada pelos cristãos como expressão do culto pagão aos ídolos, ao qual eles se opunham, por isso a imagem cultual era reprovada, assim como a imagem imperial à qual os cristãos se recusavam venerar, o que lhes causou perseguição. Enfim, as imagens também contrariavam a Lei mosaica da proibição das imagens, constituindo, assim, uma interdição da religião monoteísta que opunha o Deus invisível e único aos deuses visíveis.

Embora houvesse todos esses pressupostos contra a imagem religiosa, mais particularmente o aspecto cultual, o incredível aconteceu quando a Igreja, após as resistências, aceitou a imagem no espaço cultual, não na forma de estátuas, mas de pinturas. Isso se deu em seguida às discussões teológicas sobre a natureza do Cristo, quando aparece uma doutrina das imagens justificando retrospectivamente seu uso cultual. Segundo Hans Belting, autores atuais retomam esse argumento com o mesmo respeito profundo que eles dispensam ao ícone: É assim que persiste o erro de acreditar que se tratava de uma interpretação originalmente cristã e originalmente intelectual da imagem, como se os cristãos tivessem tido uma relação clara, face a face das imagens cultuais de seus ancestrais pagãos. Mas não se deve deixar induzir por esse erro de uma doutrina apologética que sublima práticas existentes buscando uma justificativa teórica a posteriori. A doutrina dos ícones não pode então ser tomada tal qual, pois ela não deixa de ser um produto da controvérsia histórica em torno da imagem religiosa.8

Esse é o ponto que interessa particularmente investigar: houve uma assimilação da cultura artística pagã no cristianismo? Há nos relatos históricos sobre o aparecimento da imagem no cristianismo um direcionamento apologético para justificar o que se deu quando a seita cristã passou a ser a religião do Estado, após Constantino no Império Romano? Houve

7 Apud Egon SENDLER, L´icône: image de l’invisible, p. 17.

uma construção teológica para “autorizar” o uso da imagem? Segundo o historiador e arqueólogo André Grabar (1898-1990) a passagem da arte imperial para arte cristã deve ser cuidadosa para não levar a reduções e precipitação nas interpretações que ela tem suscitado.

Depois da conversão constantiniana, houve paz na Igreja: os artistas podiam, então, trabalhar tranquilamente para produzir obras que exaltassem a nova fé agora sem sofrer coerções.

As primeiras declarações sobre a imagem datam do século IV, época em que o cristianismo se torna religião do Estado do Império Romano. A primeira declaração se encontra em uma carta de Eusébio de Cesarea (morto por volta de 339), teólogo da época de Constantino I (306-337) cuja irmã, Constancia, pede a Eusébio para que lhe traga um retrato de Cristo de Jerusalém9, carta esta que condena a imagem.

2.1 Origens da imagem cristã

A arte dos primeiros cristãos, assim como o cristianismo, é o resultado de uma evolução que começa com o contato entre as culturas de quatro regiões do mundo antigo: o judaísmo da Palestina; o helenismo da Grécia e dos países do Oriente Próximo; o espírito romano e sua concepção de imagem e também da antiga arte egípcia, na Itália. Uma das questões que intriga ao se pensar na força que a imagem ganhou no cristianismo é: por que se adotou a veneração de imagens se na origem do cristianismo, a primeira, pelo menos, está uma cultura iconoclasta, a judaica?

É buscando o valor e a representação que as imagens tinham nessas culturas que se pretende entender a imagem e sua permissão no cristianismo, pois o ícone, desde a sua aparição, sempre suscitou opiniões divergentes e foi, sobretudo, a sua veneração que deu ocasião às primeiras posições favoráveis elaboradas pela Igreja hierárquica, ou seja, papas e bispos reunidos em concílios na defesa das imagens, de onde emergiu uma disciplina ou uma doutrina cristã das imagens, ou mesmo uma iconologia teológica.

Para se entender as divergências existentes a respeito da origem da arte cristã e a atitude da Igreja em relação à arte nos primeiros séculos vale uma breve explicação. Existem, com efeito, apreciações bem diversas. Há de um lado os pontos de vista da ciência, múltiplos, variáveis e muitas vezes contraditórios, que às vezes se aproximam da atitude da Igreja e às vezes se opõem ao que ela professa e há, de outro lado, o ponto de vista de Igreja que

79 é único e não mudou desde o princípio até os nossos dias. A Igreja ortodoxa afirma e ensina que a imagem sacra existia desde o início do cristianismo e longe de se contradizer, ao contrário, afirma que a arte é um atributo indispensável. A Igreja afirma que o ícone é uma conseqüência da encarnação divina, que ele está fundamentado sobre a encarnação e que ela é, por conseqüência, a própria essência do cristianismo do qual ela é inseparável. Os pontos de vista que contradizem a afirmação da Igreja se propagaram a partir do século XVIII. Um sábio inglês, Gibbon (1737-1791), autor do livro Histoire de la décadence et la chute de l´Empire romain, sustenta que os primeiros cristãos tinham uma aversão insuportável pelo uso das imagens. Segundo ele, essa aversão era devida à origem judaica. Gibbon pensava que os primeiros ícones só apareceram no início do século IV. Essa opinião fez escola e as ideias de Gibbon se mantiveram sob uma forma ou outra até os nossos dias.10

Essa observação de Léonide Ouspensky nos faz atentar para os autores pesquisados para fazer a distinção dos pontos de vista tanto o histórico como o que professa a Igreja sobre a arte e veneração dos ícones. Esse ponto será explorado no quarto capítulo, o “Pantocrator”, em que veremos o pensamento tanto de cristãos que tinham aversão às imagens, os iconoclastas, assim como de Pais da Igreja que defendiam a inserção da arte no cristianismo e essas diferenças no Oriente e no Ocidente antes mesmo da Igreja se dividir.

Os cristãos primitivos assimilaram e interagiram com as práticas religiosas das culturas helenística e romana, porém a maior herança veio da religião de Israel, cujo povo adorava o Deus único e onde a interdição das imagens era ponto fora de discussão.

2.1.1 A imagem no judaísmo

Muitas civilizações antigas representaram plasticamente seus deuses. Como observa Boespflug:

Considerava-se como saindo de si que os deuses se deixavam voluntariamente representar – não se sabe de nenhum deles que tenha pedido que cessassem de fazê-lo – para que os fiéis lhe expressassem sua confiança. A forma mais difundida de figuras de deuses foi a estátua cultual, em torno da qual se organizava a vida cultual. Sem se confundir com a estátua, o deus era pressuposto e lá se tornava presente em algumas ocasiões e sob certas condições. Era, pode-se crer, um lugar de uma troca benéfica: a comunidade trazia ao deus toda a sorte de coisas boas e honrosas e o deus, por sua vez, assegurava aos fiéis sua proteção contra a desordem, guerras, epidemias e outras catástrofes. A interdição das imagens cultuais, promulgada no Decálogo, não é um dado dos mais antigos na vida do Israel bíblico: os exegetas hoje pensam que ela seja contemporânea ao Exílio da Babilônia

(578-538 aC). Ela nem constitui ao menos uma ruptura com a vida religiosa do Oriente Médio antigo. Seu sentido deve ser bem compreendido: só eram estritamente proibidas as imagens cultuais. Sobre a legitimidade e utilidade das outras imagens, pode-se questionar, e o legítimo judaísmo bíblico e pós- bíblico não é privado de fazê-lo. De onde uma grande diversidade de interpretações que explica que a interdição das imagens foi de acordo com o tempo e lugares mais ou menos estrita, sem jamais ser absoluta. De onde também o papel do judaísmo “liberal” teve de fato no nascimento de uma arte bíblica figurativa (Doura-Europos). No entanto, Deus jamais foi representado a não ser por signos indiretos. Acontece sensivelmente o mesmo no Islã, que herdou a interdição judaica e jamais a transgrediu no que concerne a Allah e tentou aumentar, mas nem em todos os lugares e nem sempre, a figuração do Profeta.11

A palavra decálogo provém do grego e significa as dez palavras. Ela é fiel à expressão hebraica usada em Ex 34,28: “Moisés esteve ali com Iahweh quarenta dias e quarenta noites, sem comer pão nem beber água. Ele escreveu nas tábuas as palavras da aliança, as dez palavras”. Esse é o cerne da Lei revelada na Aliança do povo com Deus. É uma Lei concebida e promulgada por Deus, ele mesmo. Deus não é apenas aquele que garante a Lei, mas sim seu autor. Sob o ponto de vista da história comparada das religiões há um dado insólito: nas leis do antigo Oriente, os deuses jamais apareciam como autores do direito, mas somente como suas garantias. É esse o caso do Código de Hamurabi, cujo deus Shamash (representado sentado diante do rei no alto de um monumento no Louvre) salvaguarda as decisões de autoria do rei. No Antigo Testamento, entretanto, Iahweh é apresentado como fonte e origem da Lei. É Ele quem legisla pronunciando essas “dez palavras”. A interdição das imagens não é, portanto, anônima, ela tem um autor identificado, um interditor. Por isso parece preferível usar a interdição das imagens a usar o interdito das imagens. Desde Freud o termo interdito tem a conotação de tabu. Um tabu é anônimo e anistórico, não tem autor, nem data de promulgação. No caso do Decálogo, o interditor é por sua vez juiz e parte, pois concerne a Ele a interdição. É Deus quem declara, na sua autoridade, não querer imagens dele.12

No Pentateuco se encontra uma atitude negativa diante da imagem: “não farás para ti imagem esculpida de nada que se assemelhe ao que existe lá em cima, nos céus, ou embaixo, na terra, ou nas águas que estão debaixo da terra. Não te prostrarás diante desses deuses e não os servirás” (Ex. 20,4-5). Em Dt 4, 15-18, a proibição da imagem se baseia na representação idólatra de um homem ou de animais de todas as espécies. No entanto, nem todas as imagens eram proibidas. No livro do Êxodo também se lê que o Senhor mandou colocar dois querubins

11 François BOESPFLUG, Dieu et ses images: une histoire de l´Eternel dans l´art, p. 33. 12 Cf. François BOESPFLUG, Caricaturer Dieu? Pouvoirs et dangers de l´image, p. 70-71.

81 de ouro sobre o propiciatório13 da arca, era pelo propiciatório assim configurado que Iahweh falava ao seu povo, por isso costuma-se dizer que “Iahweh está sentado sobre os querubins” (Ex.25,17-22) 14.

A interdição absoluta das imagens e a afirmação de que existem imagens de Deus são temas que permeiam o Antigo Testamento: mal Moisés subia ao Monte para receber as tábuas da Lei, o povo derretia suas joias e ornamentos para construir o bezerro de ouro, embora o ciumento Deus de Israel tenha proibido que seu povo se inclinasse ou servisse a outros deuses, que a eles prestasse culto. Como lembra Besançon:

O povo fez a Aarão o pedido: faze-nos deuses que vão à nossa frente. Este, “tendo recebido o ouro de suas mãos, o fez fundir num molde e com ele fabricou uma estátua de bezerro”. Então exclamaram: este é o teu Deus, ó Israel, o que te fez sair da terra do Egito (Ex, 32,1-4). Como se vê, não se pode dizer propriamente que o povo apostatou nem mudou de Deus. Ele quis possuir uma imagem que tornasse esse Deus visível e tangível. Mas Deus considerou essa apropriação de sua pessoa – assim entendida a confecção da imagem – como uma apostasia. Dispõe-se a exterminar seu povo e a preparar para si outro. Concorda, entretanto, com a intercessão de Moisés, e aceita restabelecer a Aliança, mas não sem que parte considerável da comunidade – três mil pessoas em um dia – deva perecer pela espada. (Ex. 32, 28).15

Em Levítico, ao enumerar as condições das bênçãos que vai lançar a Israel, a primeira é: “não fareis ídolos, não levantareis imagem ou estela e nem colocareis na vossa terra alguma pedra com figuras, para vos prostrardes diante delas; pois eu sou o Eterno, vosso Deus” (Lev. 26,1). O Deuteronômio, na voz de Moisés, ainda insiste: “velai atentamente por vossas almas

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