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3. MARGENS ESTUARINAS

4.1 G EOLOGIA , H IDRODINÂMICA , G ÉNESE E E VOLUÇÃO

A dinâmica dos estuários está relacionada com a sua natureza transicional, entre os domínios terrestre e oceânico, originando fácies resultantes das ondas, das marés e da descarga fluvial. O Estuário do Tejo, classificado como mesotidal elevado, sofre a influência de marés semidiurnas, com amplitudes que variam entre os 0,75 m em maré morta, no exterior do estuário, e os 4,3 m em maré viva, na zona montante (Rilo et al., 2014). Na zona de Lisboa as marés variam entre os 1,5 m em maré morta média e os 3,2 m em maré viva média (Freire et al., 2013). O ciclo de maré é assimétrico e dominado pela vazante, sendo esta mais rápida do que a enchente. Em período de marés mortas o atraso entre as marés oceânica e a estuarina pode ser de duas horas (Silva et al., 2013).

Os sedimentos que alimentam o interior do estuário, de natureza silto-argilosa e transportados em suspensão, são maioritariamente de origem fluvial (Freire, 2003). O domínio subtidal do estuário interno é dominado pelos processos de assoreamento, principalmente a montante, ocorrendo erosão predominantemente nos canais principais, devido ao aumento da força das correntes e às operações de dragagem (Freire, 2003). O comportamento dos sedimentos silto-argilosos na coluna de água depende dos processos de floculação em suspensão, dos processos de consolidação no leito e das trocas entre estes dois domínios, cuja interface pode ser constituída por uma suspensão densa (lodo fluido), com concentrações da ordem dos 70 g/l. A concentração de sedimentos em suspensão nos níveis superiores da coluna de água é influenciada pela relação entre as direções relativas das correntes de maré e da propagação das ondas (Freire, 2003).

Os sedimentos arenosos de origem fluvial não chegam ao interior do estuário, situando-se em Cacilhas (Almada) o limite montante dos sedimentos provenientes do oceano, sugerindo que os sedimentos arenosos que alimentam as praias estuarinas terão origem local, resultante de erosão pluvial e hidrográfica dos afloramentos miocénicos, pliocénicos e quaternários enquadrantes, essencialmente da margem sul, por possuírem maior erodibilidade e por estarem mais expostos à agitação local (Freire, 2003). Outra fonte sedimentar destas praias será a troca de materiais com os rasos de maré e os canais, resultante das condições hidrodinâmicas no interior do estuário. A ressuspensão de sedimentos grosseiros de fundo por parte das ondas é mais frequente nas zonas pouco profundas, até dois metros, mas pode ir até 6 metros de profundidade, no fundo dos canais, em situação de ventos fortes (Freire, 2003). A deriva residual longitudinal nas praias, para o clima de agitação médio, faz-se para NE na zona do Samouco, para SW na zona da Base Aérea do Montijo e para SE na zona da Restinga do Alfeite (Freire, 2003).

A Restinga do Alfeite enraíza em formações plistocénicas (Silva, 2013) e ter-se-á instalado a partir da mobilização de materiais grosseiros provenientes de fontes próximas, provavelmente rochas detríticas miocénicas e pliocénicas aflorantes perto do canal de embocadura do estuário, na zona de Almada, sofrendo transporte curto (Freire, 2003). Apesar de se desenvolver numa zona abrigada da agitação das ondas oceânicas, terá sofrido influência da ondulação gerada no interior do estuário, suficiente para o desenvolvimento de praias e restingas na margem sul. Com distância de fetch de cerca de 13 km na orientação NNE-SSW, a altura das ondas que chegam à restinga varia entre 0,2 e 0,3 m, podendo chegar aos 1,3 m em situação de evento extremo (Freire et al., 2007). Uma alteração no regime de ventos há cerca de 500 anos (que pode estar relacionado com a Pequena Idade do Gelo na Península Ibérica, com condições mais frias e áridas que as atuais), terá contribuído para a sua instalação e crescimento graduais, por episódios sucessivos (sugeridos pela série de cristas transversais - Figura 4.3) sobre sedimentos de canal e de raso de maré, para leste da zona de enraizamento (Freire, 2003; Andrade e Freitas, 1998). Dados mais recentes apontam para uma maior longevidade da restinga, com uma datação da base do Sapal de Corroios, a quase 3 m de profundidade, correspondente ao intervalo entre Cal AD 80 e Cal AD 240 (Silva, 2013), o que significa que a restinga terá de ter idade superior a 1775 anos, porque tem de ser mais antiga do que o sapal (para que este tenha as condições de abrigo necessárias ao seu desenvolvimento).

O regime de agitação local promove o transporte sedimentar longitudinal para leste ao longo da praia do Alfeite. Os estudos de Freire (2003). apontam para a dominância de processos erosivos na restinga nos últimos 150 anos (mais fortes entre as décadas de 1930 e 1970), associados ao arqueamento da praia até 1993, processos que podem ser resultantes da construção de estruturas perpendiculares à costa a oeste (o Arsenal do Alfeite e os estaleiros da Lisnave), que terão impedido o transporte longitudinal dos sedimentos para alimentação da restinga. O hidrodinamismo local é também influenciado pela passagem diária e frequente de navios de transporte de passageiros, a cerca de 300 m a leste (para o cais do Seixal) e a nordeste (para o cais do Barreiro) da restinga (Figura 4.2.b). A Ponta dos Corvos sofre a influência de cerca de 165 passagens diárias de navios de passageiros (catamarans), de acordo com os horários da Transtejo de 2014 (média diária para as carreiras com origem e destino no Seixal e no Barreiro, não considerando a influência das carreiras do Montijo, mais distantes, a NE). A mesma fonte refere que o cais fluvial do Seixal terá sido inaugurado em 1997, tendo os catamarans começado a circular em 1998, substituindo os antigos navios, que circulavam mais lentamente, produzindo ondas mais fracas.

Na zona abrigada pela restinga, a Baía do Seixal, os fundos são constituídos essencialmente por vasas e vasas arenosas, com areias presentes apenas no canal do Rio Judeu (Figura 4.4), sendo os sedimentos em suspensão constituídos principalmente por siltes e

argilas (com importante componente orgânica, com possível origem nos detritos vegetais provenientes dos sapais), podendo incluir alguma areia fina. O modelo morfodinâmico desta zona é de redistribuição sedimentar controlada pelas marés, com acreção vertical nos sapais e rasos de maré mais elevados e erosão nos canais e rasos de maré mais baixos, não se verificando trocas significativas com o exterior da baía, a não ser em situações de eventos extremos (Freire, 2003). A taxa de sedimentação calculada para o sapal de Corroios (Silva, 2013) é de 0,6 mm por ano, atualmente superior à taxa de subida do NMM, mas a tendência futura poderá ser para o seu desaparecimento, dando lugar a ambientes de raso de maré, quando aquela taxa deixar de conseguir acompanhar as taxas previstas de subida do NMM.

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