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Capítulo V – ANÁLISE DO CASO

5.1 GAIA E O FENÔMENO BORN GLOBAL

O fenômeno born global é relativamente recente, mas sua presença é crescente nos negócios

internacionais, e vem sendo estudado há pouco mais de uma década. Uma questão

fundamental para avaliar se estas teorias e estudos fornecem subsídios à interpretação do caso

consiste em verificar se a Gaia seria ou não uma empresa born global.

O enquadramento da Gaia como empresa born global é apoiado pelos seguintes aspectos:

• A Gaia foi fundada na década de 90, época em que se identificam as primeiras manifestações estudadas do fenômeno born global (Moen e Servais, 2002). Alguns

autores, inclusive, sugerem que só deveriam ser consideradas como born globals

• Outro fator que está presente na história da Gaia é a sua internacionalização imediata. Conforme Chetty e Campbell- Hunt (2004) apontaram, as born globals entram no

mercado internacional assim que são concebidas. A parcela exportada de sua

produção é de praticamente 100% no início de operações, mas, mesmo com a entrada

no mercado doméstico, a participação das exportações no faturamento da empresa em

muito excede o critério de 25% indicado na literatura.

• A escolha de mercados da Gaia inicia-se por mercados distantes e desenvolvidos, entrando em vários mercados simultaneamente. A velocidade de entrada em mercados

estrangeiros da Gaia é típica de uma born global. Rapidamente, a empresa inicia

operações em dois continentes: o europeu e o americano. Enquanto isto, o mercado

doméstico era visto como mais um mercado, a que a empresa recorreu apenas para

vender os produtos que não se enquadravam nas exigências de seus mercados

externos. A entrada no mercado doméstico ocorre apenas posteriormente na história da

empresa.

Outro ponto que se destaca na literatura de born globals e que é possível identificar no caso é a influência da orientação internacional do empreendedor no processo de

criação de uma born global. Verifica-se, no caso Gaia, a vivência de dois sócios

fundadores no exterior e a fascinação do idealizador do projeto pelos mercados

internacionais. A orientação internacional, conforme destacaram Moen e Servais

(2002) e Knight, Madsen e Servais (2004), é um ponto importante. As inovações na

linha de produtos e introdução de novos produtos tiveram seu foco no melhor

atendimento e nas solicitações de clientes estrangeiros. Também neste aspecto a Gaia

A produção no país de origem da empresa é ainda consistente com o perfil das born

globals. Chetty e Campbell-Hunt (2004) destacaram que as born globals tendem a

escolher o território nacional para produzirem, devido a vantagens competitivas,

economias de escala, concentração de experiência e conhecimento, além do controle

sobre a qualidade do produto. A existência de vantagens específicas do país na

produção de frutas sugere a necessidade de manter a produção da Gaia em solo

brasileiro.

• A empresa apresenta especialização inicial em um único produto, mantendo uma linha reduzida no decorrer dos anos, como identificado por Chetty e Campbell- Hunt (2004),

mas entrando em múltiplos mercados.

• A empresa não apresenta forte uso de tecnologia de informação como determinado em estudo realizado por Chetty e Campbell- Hunt (2004), entre outros. No entanto, é

possível que esta característica tenha sido encontrada pelo fato de muitas born globals

estudadas até o momento serem empresas de alta tecnologia.

• Finalmente, no que se refere a parcerias para entrada em mercados externos, isto não ocorre no caso da Gaia. Já a importância de networks no processo de

internacionalização ocorre, mas é bastante limitada.

Em síntese, analisando o caso da Gaia, uma clara constatação é a influência da globalização

na concepção do negócio. Trata-se de uma empresa que, desde sua fundação, foi pensada para

as born globals. A Gaia encaixa-se perfeitamente na definição de Oviatt e Mc Dougall (1994),

que identificam uma born global como uma organização que, desde sua concepção, busca

grande parte da sua receita com vendas para o mercado internacional. Além disto, na maior

parte dos aspectos indicados na literatura, o desenvolvimento da Gaia está de acordo com o

previsto para uma born global.

Um argumento contrário à concepção da Gaia como born global “pura” poderia estar no fato

de se tratar, inicialmente, de uma empresa comercial exportadora, ou seja, cujas atividades

foram inicialmente concebidas para compra e venda do produto, e não para sua produção. No

entanto, a empresa se integra para trás, partindo também para a produção de seu principal

produto de exportação. Enquanto se tratava apenas de uma empresa comercial exportadora,

ela vendia no mercado doméstico unicamente produtos fora de especificação (refugo), que

normalmente não seriam aceitos no mercado internacional. No entanto, no momento em que

ela começa a produzir o seu produto principal de exportação, o mercado doméstico passa a ter

papel complementar, como forma de absorver os excedentes da produção. Observa-se aí um

fenômeno curioso e atípico, no caso de empresas exportadoras brasileiras tradicionais: o fato

de o mercado internacional ser prioritário para a empresa e não o mercado doméstico, que tem

papel secundário em sua estratégia.

Em síntese, a Gaia pode ser de fato caracterizada como uma born global, atendendo a todos

os principais requisitos apontados na literatura. A discussão anterior é sintetizada no quadro a

Característica LITERATURA CASO GAIA Data de criação da firma Após 1990. Observado.

Início das atividades internacionais

Menos de dois anos após a fundação.

Observado (imediatamente após a fundação).

Envolvimento com as atividades internacionais

Mais de 25% das vendas. Observado (inicialmente

praticamente 100%das vendas). Abrangência da

internacionalização

Mercados por todo mundo. Observado.

Orientação internacional do dirigente

Dirigentes com visão internacional.

Observado.

Pouca diferença das empresas tradicionais. Observado. Os empreendedores não têm experiência internacional específica (exportação de mamão). Experiência internacional do dirigente anterior à fundação Influencia a internacionalização. Observado. Os empreendedores têm alguma experiência geral no exterior.

Especialização ou foco Tendem a oferecer uma linha de produtos limitada.

Observado.

Vantagem tecnológica Liderança mundial em seus produtos.

Adquirida em função de vantagens país-específicas. Uso mais ativo de

tecnologia de informação

Não se mostrou uma fonte importante de informação.

Não observado.

Forte uso de parcerias As parcerias com firmas ou empreendedores locais são uma forma comum de modo de entrada.

Não observado.

Importância de networks Networks têm papel crucial

na internacionalização.

Não observado. Contatos anteriores foram úteis, mas não cruciais para a

internacionalização. Quadro 7: Gaia e o fenômeno born global.

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