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1.2 Aspectos moleculares da carcinogênese pancreática

1.2.1 Genes supressores tumorais

Os genes supressores tumorais são genes que promovem a proliferação celular e, portanto, o crescimento tumoral quando inativados. Esses genes podem ser inativados por uma série de mecanismos, entre eles, uma mutação intragênica em um alelo juntamente com a perda do segundo alelo; uma deleção em homozigose; ou, ainda, hipermetilação da região promotora, resultando em silenciamento gênico. Em cânceres esporádicos, as mutações são somáticas e, portanto, adquiridas ao longo da vida, por outro lado, pacientes com formas hereditárias de câncer herdam um alelo mutante germinativo enquanto o segundo alelo apresenta uma mutação somática nas células cancerígenas (Koorstra et al., 2008).

O gene p16INK4A, também conhecido como CDKN2A (inibidor de quinase dependente de ciclina 2A), está localizado no braço curto do cromossomo 9 (9p) e encontra-se inativado em até 95% dos casos de adenocarcinoma pancreático ductal por deleção homozigótica (40%), mutações intragênicas com perda do segundo alelo (40%) e silenciamento gênico por hipermetilação da região promotora (15%) (Caldas et al., 1994; Schutte et al., 1997). A proteína codificada pelo gene em questão pertence à família dos inibidores de quinase dependentes de ciclina e possui efeitos seletivos sobre a formação dos complexos ciclina D-CDK4 e ciclina D-CDK6, impedindo, portanto, a fosforilação da proteína do retinoblastoma (RB1) e a consequente liberação dos fatores de transcrição E2F, os quais, quando liberados, ativam a transcrição de um conjunto de genes cujos produtos são essenciais à progressão para a fase S do ciclo celular. Desse modo, a inativação de p16INK4A resulta na fosforilação inadequada da proteína RB1,

facilitando a progressão do ciclo celular para a transição G1/S (Garcea et al., 2005; Maitra e Hruban, 2008; Yachida e Iacobuzio-Donahue, 2009).

O gene p53, localizado no braço curto do cromossomo 17 (17p), codifica uma proteína com papel fundamental no bloqueio do ciclo celular e apoptose. Mutações no gene p53 podem provocar proliferação celular inapropriada, aumento da sobrevivência celular e instabilidade genética (Kirsch e Kastan, 1998). Em câncer pancreático, este gene encontra-se inativado em 50-70% dos casos devido à perda de heterozigose associada à mutação no segundo alelo, resultando em desregulação tanto na divisão celular quanto na morte celular programada (Redston et al., 1994; Garcea et al., 2005; Maitra e Hruban, 2008; Yachida e Iacobuzio-Donahue, 2009).

A interrupção do ciclo celular induzida por p53 ocorre tardiamente na fase G1 do ciclo celular por meio da transcrição p53-dependente do inibidor de quinase dependente de ciclina p21 (CDKN1A), que regula negativamente a formação dos complexos ciclina-CDK e, portanto, bloqueia a progressão da fase G1 para a fase S do ciclo celular. Este mecanismo proporciona o tempo necessário para o reparo do DNA danificado. Mutações no gene p53 levam à tradução de uma proteína incapaz de ligar-se ao DNA, logo, a transcrição de p21 não é efetuada conduzindo à proliferação anormal. A perda da atividade de p21 foi observada em aproximadamente 30-60% dos tumores pancreáticos, com linhagens celulares de pâncreas e tumores pancreáticos mostrando uma correlação entre a atividade de p53 e p21 (Garcea et al., 2005; Koorstra et al., 2008) .

A morte celular programada motivada por p53 é realizada pela ativação de genes envolvidos na cascata apoptótica, como PUMA e NOXA, os quais são ativados após o dano do DNA pela própria proteína p53. Quando ativados, codificam proteínas que se ligam a BCL2 e promovem a morte celular (Villunger et al., 2003).

O gene supressor de tumor DPC4 (SMAD4) localiza-se no braço longo do cromossomo 18 (18q) e encontra-se inativado em até 55% dos casos de adenocarcinoma pancreático ductal. Essa inativação pode ocorrer tanto por deleção homozigótica, em cerca de 30% dos casos; quanto por perda de um alelo juntamente com mutação intragênica no segundo alelo, o que acontece em aproximadamente 25% dos casos. O produto codificado pelo gene DPC4, o fator de transcrição SMAD4, é um importante regulador da via de sinalização do fator de crescimento tumoral (TGF-β) (Wilentz et al., 2000; Strimpakos et al., 2008).

As proteínas SMAD, como componentes críticos da via de sinalização de TGF- β, regulam negativamente a proliferação de células epiteliais. A transdução de sinal de TGF-β é realizada por dois tipos de receptores, TGFβRI e TGFβRII. O fator de crescimento TGF-β liga-se ao receptor TGFβRII, o qual ativa o receptor TGFβRI, este, por sua vez, promove a fosforilação dos alvos intracelulares SMAD2 e SMAD3. As proteínas SMAD2 e SMAD3 fosforiladas formam heterodímeros com SMAD4 e o complexo resultante atua no núcleo celular, interagindo diretamente com o DNA ou indiretamente por meio de outras proteínas de ligação ao DNA. Deste modo, as proteínas SMAD4 presentes nos heterodímeros são capazes de regular a transcrição de

genes alvos e, por conseguinte, controlar a proliferação celular (Miyaki e Kuroki, 2003). O fator de transcrição SMAD4 também apresenta uma ação independente por

meio da supressão da angiogênese. Este efeito é desempenhado pelo aumento de TSP-1, um potente inibidor da angiogênese (Schwarte-Waldhoff et al., 2000).

A importância do silenciamento de SMAD4 em adenocarcinomas pancreáticos ductais é apoiada pela ocorrência de tumores SMAD4-negativos biologicamente mais agressivos (Koliopanos et al., 2008). A inativação do gene SMAD4 é relativamente específica para câncer pancreático, embora ocorra com menor incidência em outros

cânceres, tais como câncer de cólon, mama e ovário ou carcinomas do trato biliar. As neoplasias pancreáticas não-ductais e a maioria das malignidades extra-pancreáticas não apresentam SMAD4 silenciado. Nessas condições, a inativação desse gene é um marcador diagnóstico auxiliar para câncer de pâncreas, incluindo suspeitas de metástases de um tumor pancreático primário oculto (Koorstra et al., 2008).

A inativação do gene supressor de tumor ppENK foi descrita em mais de 90% dos casos de adenocarcinoma pancreático como resultado de eventos epigenéticos, especificamente a metilação da região promotora (Ueki et al., 2001; Koliopanos et al., 2008).

Outros genes supressores tumorais foram relatados como inativados ou mutados em adenocarcinomas pancreáticos, entretanto, com menor freqüência. Entre eles, destaca-se o gene BRCA2, que encontra-se inativado em até 10% dos adenocarcinomas pancreáticos ductais (Goggins et al., 2000; Strimpakos et al., 2008; Koliopanos et al., 2008).

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