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O fenômeno de transição e a classificação dos regimes são importantes para entender melhor os padrões de escoamento que vão se formar na região da esteira, que é a região perturbada mais importante nos estudos relacionados ao escoamento em torno de corpos rombudos, pois as flutuações que acontecem neste local irão refletir diretamente na superfície do corpo e são responsáveis por causar as vibrações que serão estudadas no decorrer deste trabalho.

A região da esteira é formada por vórtices gerados na superfície do cilindro que são convectados pelo escoamento. Para compreender melhor como estes vórtices são formados, precisamos primeiro definir brevemente o conceito de vorticidade.

A vorticidade é uma grandeza vetorial que representa a tendência à rotação de uma partícula de fluido dentro de um escoamento. A representação matemática da vorticidade é o rotacional do campo de velocidades ( ⃗ ). Portanto, para que esta condição exista em uma direção, é necessário que haja um gradiente de velocidade na mesma, caso contrário o valor da vorticidade será zero. Em um escoamento ao longe sem perturbações, esta grandeza inexiste, pois o campo de velocidades é uniforme. Entretanto, ao chegarmos à região próxima à parede, temos o inerente perfil de velocidades da camada limite, exemplificado na Figura 2-9, o que torna o escoamento na região rotacional.

Apesar da vorticidade também poder ser definida para escoamentos invíscidos, pois é uma definição matemática, neste caso ela ocorre devido a efeitos viscosos da interação entre o fluido e a parede.

Figura 2-9 Perfil de velocidades de uma típica camada limite. Região que concentra vorticidade. Extraído e redesenhado de Schlichting (2000)

Com o conceito de vorticidade definido, e fazendo uma analogia da Figura 2-9 que representa uma camada limite em placa plana com a camada limite que vai se desenvolver na superfície do cilindro, é possível definir o conceito de vórtice e entender como ele será levado pelo escoamento a partir do momento que ele se descola da parede.

Define-se vórtice como uma região do escoamento onde o fluido possui uma trajetória circular em torno de um eixo imaginário e consequentemente uma quantia de vorticidade associada. A integral de área da vorticidade dentro de uma região do espaço (vórtice) é uma grandeza chama circulação e definida matematicamente por ∫ . Esta circulação gerada na camada limite na superfície do cilindro será convectada pelo escoamento para a região da esteira após a separação, formando as camadas cisalhantes livres, que serão fundamentais para o efeito da formação e desprendimento dos vórtices do cilindro.

O mecanismo de formação destes vórtices é descrito de maneira extremamente prática por Gerrard (1966). Podemos ver na Figura 2-10, retirada de seu trabalho, a exemplificação deste processo. É possível observar que após os pontos de separação, a camada limite desprendida está livre na esteira próxima na forma das camadas cisalhantes. Como não há mais a presença da parede do cilindro, esta região altamente rotacional enrola-se formando um núcleo, que vem a ser um novo vórtice. O fluido arrastado em (a) é engolido pelo vórtice crescente, enquanto a porção de fluido em (b) abre caminho dentro da camada cisalhante interrompendo a alimentação do vórtice (a), de modo que ele desliga-se do filamento liberado na região de separação e é convectado pela esteira. A região de baixa pressão logo atrás do corpo oscila e atrai o fluido (c) formando um novo vórtice, porem com vorticidade oposta ao recentemente liberado. Este novo vórtice formado vai ser interrompido da mesma forma devido à interação com a camada cisalhante oposta e este processo se repete indefinidamente.

Figura 2-10 Mecanismo de formação de vórtices proposto por Gerrard (1966). Figura extraída do mesmo trabalho.

Como há a interação entre camadas cisalhantes opostas, que possuem vorticidade com sinais também opostos, é de se esperar que partes da circulação liberada pelas camadas cisalhantes se anulem, resultando uma parcela menor dentro da esteira. Roshko (1954) estima que 43% da circulação gerada permanecem na esteira após a formação dos vórtices. Bearman (1984) ainda afirma que a geração e desprendimento de vórtices é um fenômeno dependente apenas da interação entre as camadas cisalhantes e não da geometria do corpo, que apenas modifica a interferência da esteira próxima com os pontos de separação.

A frequência de emissão de vórtices, fs¸ depende da distância entre as camadas cisalhantes. Quanto mais próximas elas estiverem, mais rapidamente elas interagem entre si e maior a frequência da emissão de vórtices. A distância entre estas camadas esta associada ao diâmetro do cilindro e a velocidade do escoamento. Portanto, podemos dizer que a frequência de emissão de vórtices também está associada ao número de Reynolds do escoamento e ao ponto de separação, discutidos anteriormente.

Na Figura 2-11, há uma demonstração de como o fenômeno evolui com o aumento do número de Reynolds do escoamento. Com o aumento deste parâmetro, a camada limite se desenvolve, os vórtices começam a ser gerados e desprendidos. Se o número de Reynolds continua crescendo, estes vórtices são convectados formando a esteira atrás do corpo. Esta esteira é conhecida como esteira de von Kármán ou esteira de Kármán-Bernard.

A distância entre o centro do cilindro até o final da região próxima da esteira onde os vórtices são formados é chamada de comprimento de formação de vórtices ls. Este comprimento também diminui com o aumento do número de Reynolds, devido aos motivos comentados na seção anterior onde foram descritos os mecanismos de transição.

Observa-se claramente que o aumento do número de Reynolds afeta diretamente os mecanismos de transição, que por sua vez alteram os padrões de desprendimento de vórtices e de esteira. A predição correta destes fenômenos de transição, ponto de separação, comprimento de formação de vórtices e convecção para a esteira são os grandes desafios a serem calculados ao longo deste trabalho.