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5.1 CARACTERIZAÇÃO DO PROCEDIMENTO EXPERIMENTAL DE REFERÊNCIA

5.2.1 Geração da malha

Apesar de ser capaz de realizar a discretização dos elementos subdividindo os sólidos do modelo geométrico de forma automática, o ANSYS possui uma série de métodos que permitem ao usuário a configuração da geração da malha de maneira mais ordenada. Assim, ao invés de simplesmente aceitar a geração automática, na malha desenvolvida (Figura 5.13), buscou-se regularizar a discretização aproveitando as especificidades geométricas de cada corpo – ou seja, a simetria radial dos conectores e a seção transversal constante da laje e do perfil – e o particionamento prévio dos mesmos.

Figura 5.13 – Malha gerada para o modelo

Também foi tomado o devido cuidado de, na vizinhança das interfaces entre os conectores e a laje e entre os conectores e o perfil, promover uma transição harmônica da geometria circular para a retangular (Figura 5.14). Para isso, foram utilizados ordenadamente os métodos MultiZone, Sweep Method, Face Meshing e Edge Sizing.

Figura 5.14 – Transição harmônica da geometria circular para a retangular nas interfaces conector-laje e conector-perfil

Fonte: elaborada pelo autor

Vale ressaltar que apesar de não ter havido um efetivo estudo de convergência de malha – o que por si só já configura uma pesquisa à parte –, o tamanho dos elementos foi adotado após alguns testes preliminares com o objetivo de determinar um refinamento que fornecesse uma relação custo-benefício entre esforço computacional e precisão nos resultados relativamente satisfatória.

Dessa maneira, a discretização se deu com elementos tridimensionais do tipo SOLID186 (Figura 5.15). Trata-se de um elemento de ordem quadrática, uma vez que possui nós nos seus vértices e nos pontos médios de todas as suas arestas. Ele possui três graus de liberdade em deslocamento por nó e uma variedade de formatos capaz de promover adaptações suaves às transições geométricas dos corpos modelados, tais como em arredondamentos. Neste modelo, dentre as possíveis configurações do SOLID186, a forma majoritariamente usada foi a Hex20 – elemento hexaédrico de 20 nós –, sendo subsidiada pela forma Wed15 – elemento prismático de base triangular de 15 nós – nessas transições.

Figura 5.15 – Modalidades Hex20 e Wed15 do elemento SOLID186 do ANSYS

A configuração personalizada da geração de malha do ANSYS pelo usuário possibilitou a adoção de diferentes graus de refinamento, aumentando a densidade de elementos com dimensões mais reduzidas nas regiões em que a busca por uma maior precisão nos resultados fosse mais desejada. Assim, os conectores de cisalhamento e a camada da laje de concreto de espessura igual à altura deles foram discretizados de maneira mais refinada, enquanto regiões como a alma do perfil de aço e a face superior da laje de concreto tiveram menor refinamento. Os colares de solda dos conectores de cisalhamento também tiveram maior refinamento, uma vez que se trata de uma região concentradora de tensões. Por ser plana, a interface aço-concreto (ou seja, as faces inferior da laje de concreto e superior do perfil de aço) foi discretizada com um refinamento intermediário, que se tornava maior na vizinhança das bases dos conectores de cisalhamento.

Apesar de não ser exatamente uma necessidade, para tentar melhorar a precisão dos resultados, optou-se por promover compatibilidade de malha nas interfaces entre os corpos (Figura 5.16).

Figura 5.16 – Compatibilidade da malha nas interfaces dos corpos do modelo

Embora visualmente aparente que essa compatibilidade resulte em compartilhamento de nós – o que imporia neles uma igualdade de deslocamentos que não necessariamente ocorre devido à descontinuidade da transição entre diferentes corpos e materiais –, uma vista ampliada no modelo permite observar que o ANSYS aplica automaticamente uma tolerância submilimétrica na atribuição das suas coordenadas (Figura 5.17). No entanto, no caso da interface entre o perfil de aço e os conectores de cisalhamento, foi definido que esse compartilhamento de nós efetivamente ocorresse, uma vez que a natureza soldada desse contato, em regime linear elástico e para cargas de serviço, de fato implica na continuidade de deslocamentos independente do fato de serem compostos por materiais diferentes. Essa configuração é feita ainda no SpaceClaim, reunindo os corpos do perfil e dos conectores em um mesmo grupo ao qual é atribuída a funcionalidade Share Topology.

Figura 5.17 – Tolerância aplicada pelo ANSYS para evitar compartilhamento indesejado de nós

Fonte: elaborada pelo autor

5.2.2 Definição dos contatos

A modelagem com múltiplos corpos associados requer a definição de como ocorrem os contatos entre as suas superfícies. Além de evitar a ocorrência de inconsistências físicas como penetrações e separações acima de limites de tolerância que desconfiguram a simulação do problema estrutural real, a definição dos contatos também é imprescindível para a análise do fenômeno do atrito, uma vez que é nesse momento que as condições de deslizamento superficial são atribuídas. Assim, adicionalmente aos elementos provenientes do próprio modelo geométrico, o ANSYS automaticamente identifica os contatos entre corpos rígidos distintos e gera um par de elementos planos dos tipos CONTA174 e TARGE140 para cada interface de superfícies em contato.

No modelo da viga mista, foram gerados pares de elementos de contato nas interfaces da laje com o perfil e da laje com os conectores de acordo com as suas partições (Figura 5.18). Conforme já mencionado, o compartilhamento dos nós da malha configurado para a interface do perfil com os conectores faz com que a definição do contato entre eles não seja mais cabível, uma vez que nessa situação a continuidade de deslocamentos já restringe por si só a penetração, a separação e o deslizamento.

Figura 5.18 – Definição dos pares de contatos no ANSYS nas interfaces dos corpos particionados

Fonte: elaborada pelo autor

A definição dos contatos é fundamental para a compreensão de como se processam as transferências de esforços entre os corpos. Quando um corpo rígido é pressionado contra o outro, não são admitidas penetrações e ocorre a transmissão de tensões normais de compressão. Já quando um corpo rígido é “puxado” do outro, pode ocorrer separação sem nenhuma transmissão de esforços ou eles podem permanecer unidos com o desenvolvimento de tensões de tração. Por fim, quando um corpo rígido é friccionado no outro, pode ou não ocorrer deslizamento com ou sem transmissão de tensões cisalhantes.

De acordo com essas possibilidades, dentro da ferramenta Static Structural do ANSYS, existem 5 tipos de contatos possíveis de serem atribuídos aos pares de elementos gerados nessas interfaces cujos comportamentos são descritos a seguir:

a) Bonded: impede tanto a separação dos corpos na direção normal às suas superfícies de contato quanto o deslizamento entre eles na direção tangencial, transmitindo tensões normais de tração e tensões cisalhantes, respectivamente;

b) No Separation: impede a separação dos corpos na direção normal às suas superfícies de contato com transmissão de tensões normais de tração, mas permite o deslizamento entre eles na direção tangencial sem transmissão de tensões cisalhantes; c) Frictionless: permite tanto a separação dos corpos na direção normal às suas superfícies de contato quanto o deslizamento entre eles na direção tangencial, não transmitindo tensões normais de tração nem tensões cisalhantes, respectivamente; d) Rough: permite a separação dos corpos na direção normal às suas superfícies de

contato sem transmissão de tensões normais de tração, mas impede o deslizamento entre eles na direção tangencial com transmissão de tensões cisalhantes;

e) Frictional: permite a separação dos corpos na direção normal às suas superfícies de contato sem transmissão de tensões normais de tração. Já na direção tangencial, ocorre transmissão de tensões cisalhantes sem deslizamento até uma magnitude limite para além da qual o deslizamento se inicia e se desenvolve continuamente transmitindo essa mesma tensão de cisalhamento limite. Essa magnitude é uma fração da pressão de contato quantificada pelo coeficiente de atrito, cujo valor não negativo deve ser informado pelo usuário.

Dessa forma, para simular o procedimento experimental, à interface aço-concreto da viga mista deve ser atribuído o contato tipo Frictional, aplicando-se no coeficiente de atrito o valor determinado a partir dos próprios dados do ensaio e das formulações teóricas por meio do procedimento que será proposto posteriormente na Seção 5.4. No ANSYS, a princípio, esse valor funciona como o coeficiente de atrito estático, visto que o deslizamento só começa a ocorrer após ser superada a força de atrito correspondente ao produto entre ele e a força normal ao par de superfícies de contato. No entanto, a mudança do estado de repouso para o estado de movimento relativo ocorre com a manutenção do mesmo coeficiente de atrito entre as superfícies – ou seja, não havendo a redução de um coeficiente estático para um coeficiente cinético –, representando uma deficiência na retratação mais realista possível do fenômeno. Em outras palavras, para a configuração padrão do ANSYS, os coeficientes de atrito estático e cinético são iguais. A possibilidade dessa transição de valores só seria possível com a alteração dos códigos de programação internos do programa, procedimento que não foi realizado nesta pesquisa por simplificação do modelo.

No modelo computacional, é possível ainda extrapolar a ocorrência do deslizamento relativo da interface aço-concreto da viga mista para os seus extremos teóricos de grau de interação. Assim, a interação total (ou o comportamento real da viga mista enquanto a aderência por adesão não é quebrada) pode ser simulada com a atribuição do contato tipo Bonded,

enquanto que a interação nula pode ser simulada com a atribuição do contato tipo Frictionless (ou Frictional com coeficiente de atrito igual a zero).

Quanto aos contatos entre a laje de concreto e os conectores de cisalhamento, optou-se por considera-los do tipo Frictionless. Dessa forma, a simulação induz apenas a transferência de esforços de compressão entre esses corpos rígidos, o que proporciona as maiores tensões de cisalhamento possíveis nos conectores. Entretanto, em uma simulação mais realista (porém mais conservadora), o contato mais apropriado seria o do tipo Frictional (ou ainda Bonded para baixas cargas de serviço quando preservada a aderência por adesão), com a introdução de um outro coeficiente de atrito, sendo que para essa incógnita não são conhecidas formulações teóricas de determinação. Essa razão também justifica a opção de se considerar que o deslizamento relativo entre a laje de concreto e os fustes dos conectores de cisalhamento é restringido apenas pelo encaixe mecânico promovido pelas cabeças dos pinos. Ainda vale mencionar que caso não fosse proporcionado o compartilhamento dos nós da malha na interface do perfil com os conectores, os contatos entre eles poderiam ser simulados – com alguma perda ainda que mínima de precisão – com a adoção do contato tipo Bonded.

Conforme já mencionado, alguns tipos de contatos são fontes de não linearidade no problema do modelo. Esse é o caso dos tipos Frictionless, Rough e Frictional – os que permitem a separação dos corpos –, pois neles a área do contato muda durante a aplicação da carga. Assim, a atribuição desses contatos só pode ser realizada se o modelo apresentar restrições físicas bem definidas, pois caso contrário a convergência da solução pode nunca acontecer mesmo após inúmeras iterações. Por isso, uma recomendação ao se trabalhar com contatos não lineares é começar presumindo-os lineares (Bonded, que é a opção padrão do ANSYS, ou No Separation), solucionar o problema uma primeira vez e ir atribuindo as não linearidades aos poucos.

A forma como o ANSYS impõe a compatibilidade dos contatos para impedir a penetração de pontos entre os elementos do par é definida por meio da seleção de uma das formulações das quais o software dispõe na sua biblioteca. O programa também faz o monitoramento e controle dos contatos para avaliar se eles estão fechados ou abertos, a depender da existência ou não de separação de pontos entre os elementos do par, através da definição de um pequeno raio de tolerância, formando uma região esférica de avaliação. Esses recursos avançados são inicialmente definidos de forma automática pelo programa, podendo ser aceitos ou alterados pelo usuário.

5.3 DETERMINAÇÃO DA FORÇA ATUANTE NOS CONECTORES DE CISALHAMENTO