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3.1 HISTÓRICO E EVOLUÇÃO URBANA

3.2.3. A gestão do acervo protegido pelo Estado

Sabemos que todo o processo de preservação desde sua idealização até a gestão propriamente dita, reflete-se diretamente no estado do acervo, dependendo diretamente de sua valoração pela comunidade e sua adoção pela administração municipal, e é claro do acompanhamento e gestão efetiva da instancia que promoveu a proteção legal, que em parte concerne a nossa atuação como técnica do Estado com a instancia municipal. Portanto muito do que conhecemos das ações da Fundação IPPUJ e da FCJ, se deve a nossa experiência de trabalho. No que tange a receptividade da ação de tombamento pela comunidade de Joinvillle, assim como nas outras cidades, apesar de todo trabalho já desenvolvido pelas instituições no sentido de cadastrar, promover a consciência através de seminários, e de outras ações no município, houve uma grande reação por parte dos proprietários dos bens tombados pelo Estado. A grande maioria entrou com processo administrativo de impugnação do tombamento. No entanto, mesmo depois de um longo período de processo, as impugnações foram recusadas pelo Conselho Estadual de Cultura e todos os tombamentos foram homologados pelo Governo do Estado.

O trabalho de fiscalização e assessoria desses bens tombados teve inicio, a partir dos primeiros meses após a emissão da notificação. Neste caso, as duas instituições, tanto o

89 Documento que acompanha os Processos de Tombamento, de autoria da Arquiteta Helena Cristina Vieira, de agosto de 1994. Diretoria de Preservação do Patrimônio Cultural, Fundação Catarinense de Cultura.

128 IPPUJ como a FCJ atuaram em parceria com a FCC. No entanto, nunca houve a formalização dessas parcerias ou efetivação de um convenio de cooperação técnica entre as instituições. Além disso, não existe nenhum tipo de critério definido para a intervenção no bem tombado e seu entorno, o mesmo se dando em relação à comunicação visual a ser adota na área.

Por todos esses anos a interlocução com os proprietários de bens tombados, via de regra foi relativa a obras de recuperação e reciclagem das edificações, pois pelo fato de possuírem proteção integral, as intervenções necessárias devem ser analisadas caso a caso, dependendo, em última análise, do juízo técnico dos gestores da FCC. São assessorias que dependem de uma avaliação da situação física do imóvel e análise de proposta de intervenção para a emissão de parecer técnico. No princípio das relações instituição/ proprietário, os pedidos eram encaminhados diretamente para a FCC, que dependendo da complexidade do caso, deslocava um técnico até o município, ou solicitava o apoio de uma das duas instituições locais.

Independente da não formalização, a FCC, sempre buscou a parceria das instituições municipais. Primeiro pela necessidade propriamente dita, deficiências de recursos, sejam humanos ou orçamentários, para enfrentar individualmente a tarefa de gestão requerida, e as dificuldades inerentes às distancias entre administração centralizada e municípios. Segundo porque a integração e o envolvimento da administração local no processo são fundamentais para a manutenção da ambiência do bem tombado. Além disso, a FCJ por força de lei, tem responsabilidade supletiva em relação aos bens tombados pelo Estado, já que na Lei de Tombamento Municipal, Lei Nº. 1.77390 de 1980 ficou determinado que todos os bens tombados pela União ou Estado também ficavam protegidos pelo município, e como a instituição tem por atribuição a aplicação da Lei Municipal de Tombamento, fica obrigada a exercer conjuntamente a tutela do bem protegido. No entanto, até o ano de 2006, pelo fato da FCJ não possuir arquitetos em seus quadros de funcionários, constituiu-se essa parceria mais estreita com o IPPUJ. A relação com a Fundação IPPUJ foi construída na discussão dos projetos de intervenções de restauração ou reciclagem em bens tombados de propriedade do município91, e de valorização do centro histórico. Projetos estes que a Fundação IPUJJ coordenava e tinha autoria da proposta, neste caso a demanda partia da instância municipal.

90 “Art. 3º - Os bens tombados pela União e pelo Estado sê-lo-ão também pelo Município, de ofício.”

91 Como o Lar Abdon Batista, (Edificação nº 35, pág. 165); IPPREVILLE (Edificação nº 15, pág. 150); Estação Ferroviária (Edificação nº 33, pág. 164)

Esta relação nem sempre se dava de maneira tranqüila, pois nós da FCC tínhamos que muitas vezes contrariar expectativas locais, de projetos que não cumpriam as exigências para a preservação do bem tombado, ou implicavam na descaracterização de toda uma ambiência urbana. Apesar dos muitos embates nem sempre se pode fazer valer a lei, e em certos casos as perdas foram inevitáveis. O caso da reciclagem da edificação do Lar Abdon Batista92, foi um desses casos, onde uma intervenção equivocada acarretou grande perda da substância histórica material do interior da edificação. E para isso colaboraram vários fatores, como: falta de agilidade da FCC, interveniências políticas, falta de formação na área de preservação por parte dos técnicos da Fundação IPPUJ, etc. Um outro Projeto proposto pela Fundação IPPUJ, mas não aprovado pela FCC foi a proposta de cobertura de um trecho da Rua XV de Novembro93, já que iria representar uma interferência significativa na paisagem, além de trazer prejuízos para o ambiente no meio urbano, como calor, enclausuramento de árvores e gazes veiculares, não sendo dessa forma efetivada.

O projeto Cores da Cidade94, inspirado em exemplos de outros centros históricos brasileiros, não alcançou o mesmo efeito em Joinville, já que a pintura proposta se restringiu a alguns bens tombados individuais de propriedade publica, não surtindo o efeito de renovação urbana, como nos centros históricos onde o objeto era um conjunto, reduzindo-se a um efeito pontual. Com a contratação de uma arquiteta especialista em conservação e restauro, arquiteta Simone Schroeder, a partir do ano de 2000, a FCC pode contar com uma assessoria local mais efetiva para as obras em bens tombados, fazendo vistorias e emitindo pareceres que eram encaminhados para o órgão estadual, e um olhar mais atento para o patrimônio ambiental urbano. De toda forma, o envolvimento do órgão responsável pelo planejamento urbano no município - IPPUJ, com os assuntos da preservação urbano-arquitetônica, foi sempre muito importante na perspectiva de se associar cada vez mais a ação de preservação ao planejamento urbano.

Apesar de não contar com profissionais da área de arquitetura até março de 2006, a FCJ, nunca deixou de colaborar com a FCC, fornecendo informações históricas e cadastrais sobre

92 Edificação tombada pelo Estado situada na Av. Coronel Procópio Gomes, 749 de propriedade da Prefeitura Municipal de Joinville. Programa CERI

93 A proposta era cobrir com material translúcido um trecho da rua, que deveria funcionar no sistema de Rua 24 horas.

94 Como por exemplo o Projeto Cores do Recife, no Bairro do Recife em Recife, PE. Neste caso a renovação e introdução de novas cores no conjunto histórico, alavancou a imagem do bairro dando a visibilidade desejada.

130 os bens tombados, além de servir de canal de interlocução com os proprietários95. Como as relações se tornaram mais rotineiras houve a absorção paulatina de algumas responsabilidades pela administração municipal com o patrimônio local. Por exemplo, as solicitações relativas aos bens tombados, atualmente entram na SEINFRA96, que repassa para a Coordenadoria de Patrimônio, da FCJ, e esta encaminha para a Comissão de Patrimônio, que deliberará quanto à propriedade ou não da solicitação.

Como pudemos constatar, através dos relatos anteriores sobre a construção do quadro atual da preservação na área, muitas são as instituições que contribuíram no processo, mas seus instrumentos de gestão para a preservação urbana são ainda insipientes, ou não existentes. As instituições citadas que são detentoras das leis de tombamentos, trabalham em grande parte, de forma dissociada das instituições responsáveis pelo planejamento urbano, e estas por sua vez não conseguiram implementar as propostas de alguns planos para a área, seja por descontinuidades de administrações, seja por entraves no poder legislativo local, ou ainda, por desinteresse dos dirigentes do IPPUJ em enfrentar a questão do patrimônio como mais uma condicionante do planejamento da cidade. Dessa forma, fica praticamente impossível com os dispositivos legais existentes manter um controle mais efetivo da ambiência dos bens tombados, pois conforme depoimento do Arquiteto Gilberto Lessa dos Santos, responsável pela Unidade de Planejamento do IPPUJ, isso só é possível no caso dos Setores Especiais do Cemitério do Imigrante e da Rua das Palmeiras, como áreas delimitadas e regulamentadas por lei, conforme já citamos. No entanto, todas as ações empreendidas para a preservação do patrimônio edificado de Joinville surtiram efeitos positivos, até mesmo para a proteção das unidades citadas, e a presença destas unidades como o próprio arquiteto Udo Baumann previu, teve influencia para a preservação do contexto urbano na área estudada.

As ações decorrentes da gestão compartilhada pelo Município e Estado, caracterizada por falta de coordenação, por necessidades e deficiências operacionais das instituições, e o esforço de alguns técnicos apesar de suas instituições e ingerências políticas, tiveram consequentemente reflexos neste patrimônio já protegido. São as influencias dos bens

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A historiadora e técnica da Coordenadoria de Patrimônio, Dietlind Clara Rohtert, sempre foi a pessoa responsável por fornecer as informações solicitadas e sempre esteve atenta aos acontecimentos que pudessem ameaçar a preservação na cidade.

96 Via formulário de consulta prévia, mais conhecida como consulta amarela, como qualquer outra consulta de imóvel do município.

protegidos no meio urbano e os tipos de reflexos das ações públicas ou falta delas pós- tombamentos estaduais, que nos propomos a analisar.