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2. ENQUADRAMENTO TEÓRICO

2.2. A Diabetes Mellitus como Doença Crónica

2.2.2. A Gestão da Doença Crónica

Actualmente, as doenças crónicas estão presentes, e a crescer em grande escala, em quase todas as populações do mundo, e existe evidência epidemiológica de que, se não existirem programas eficazes de prevenção e controlo, caminha-se para uma epidemia incontrolável, à escala mundial. Face ao crescente aumento da despesa em saúde, torna-se urgente desenvolver estratégias de prestação de cuidados de saúde a menores custos, sem influenciar, de forma negativa a qualidade dos serviços prestados. Para o controlo das doenças crónicas é necessária uma abordagem continuada, percorrendo de uma forma longitudinal os sistemas de saúde e envolvendo vários sectores da sociedade. Nas últimas décadas, surge um novo conceito que incentiva uma abordagem proactiva por parte dos sistemas de saúde e da população. Neste sentido, surge o conceito de “Disease

Management”.

A Disease Management Association of America foi a primeira organização internacional exclusivamente dedicada a questões relacionadas com as doenças crónicas, e define a gestão da doença como: “um sistema de intervenções e de

comunicações coordenadas de cuidados de saúde para populações, com condições nas quais os esforços de autocuidado são significativos” (Guerra, 2006).

A autogestão (“self-management”) representa o principal pilar da estrutura técnica de um programa de gestão da doença, como consta da definição anterior. Esta definição atribui particular ênfase no autocuidado e à autogestão como meios de capacitação do doente para ser um participante activo no decurso global dos seus cuidados. Na literatura, são vários os estudos que evidenciam que a educação para a autogestão é, hoje, considerada como uma intervenção incontornável para a melhoria da gestão das doenças crónicas. Tais estudos demonstram que a educação terapêutica do doente conduz a uma diminuição significativa do número de internamentos hospitalares em doentes com diabetes, para além de causar também uma diminuição nas amputações dos membros inferiores, o que resulta numa melhor qualidade de vida do doente (WHO, 1998 e Golay et al., 2008).

Há evidência de que podem obter-se ganhos em saúde, sustentadas com base em ensaios clínicos controlados, que sugerem que os programas de autogestão são

mais eficazes do que a educação baseada apenas na informação do doente, no que respeita à melhoria dos resultados clínicos, pelo que a autogestão melhora os resultados e contribui para reduzir os custos (Bodenheimer et al., 2002). Contudo, não se pode ignorar que a gestão da doença deve ter uma intervenção multidimensional, da qual a educação para a autogestão é apenas uma das componentes da gestão da doença.

Todd et al. (1998) definem gestão da doença como “gestão proactiva de

cuidados globais ao doente, baseada num sistema e dirigido por médicos, através do continuum de cuidados, com o objectivo de melhorar os resultados no doente e de reduzir os custos totais dos cuidados.”

Assim, de acordo com Todd et al. (1998), os objectivos da gestão da doença incluem:

a) encorajamento da prevenção da doença;

b) promoção do planeamento de um diagnóstico e tratamento correcto; c) maximização da efectividade das intervenções clínicas;

d) eliminação dos cuidados e intervenções desnecessárias e não efectivas; e) eliminação dos esforços de duplicação;

f) utilização apenas de diagnósticos e terapêuticas custo-efectivas;

g) maximização da eficiência da prestação de cuidados de saúde e manutenção de padrões de qualidade apropriados;

h) melhoria contínua de resultados.

Idealmente, os programas de gestão da doença devem ter como alvo populações com doenças específicas, de elevada prevalência e de custos elevados, como a diabetes mellitus, para as quais exista uma lacuna substancial entre a implementação de guidelines para os cuidados e a provisão real de cuidados aos doentes. As doenças seleccionadas para a implementação destes programas devem possuir um elevado potencial para o tratamento, autogestão e modificações comportamentais, para melhorar os resultados. Neste sentido, têm sido desenvolvidos programas de gestão da doença, para a hipertensão arterial, diabetes e doença pulmonar obstrutiva crónica (Teixeira, 2007).

A implementação de um modelo de gestão da doença implica a reorganização do sistema de saúde, ao nível dos cuidados de saúde primários e da articulação entre os diferentes níveis de cuidados, e interligação com a comunidade. Segundo o Department of Health (2004), existe uma crescente evidência, de acordo com experiências de outros países, que os componentes essenciais para a implementação de um modelo de gestão da doença crónica incluem:

a) a utilização de sistemas de informação para acesso aos dados individuais e da população, identificando os doentes com doenças crónicas (Patient Registry);

b) a estratificação dos doentes por categoria de risco;

c) o desenvolvimento e implementação de medidas de educação para a saúde e programas de empowerment do doente, baseados na evidência cientifica (Patient empowerment);

d) a coordenação dos cuidados, através do papel de gestores de caso (Disease managers/Case managers);

e) os cuidados prestados por equipas multidisciplinares, que optimizam as competências particulares dos diferentes profissionais de saúde;

f) a integração de peritos generalistas e especialistas;

g) a integração de cuidados atravessando as barreiras organizacionais; h) a implementação da medição de resultados e feedback.

Este modelo de gestão apoia os serviços de saúde, a sua relação com o doente e o planeamento dos cuidados (promoção da saúde, prevenção da doença, diagnóstico e reabilitação), enfatiza a prevenção de episódios agudos e de complicações utilizando guidelines clínicas e estratégias de empowerment do doente, avalia os resultados clínicos, a humanização da prestação dos cuidados de saúde e os aspectos económicos numa base de progressão com o objectivo da melhoria global da saúde, após as intervenções do programa (Teixeira, 2007).

Os modelos de gestão, que estão focados nos custos e na utilização de cada unidade de saúde individualmente, centram o seu modelo de acção no prestador, enquanto os modelos de gestão da doença estão focados nos resultados através de unidades para populações de doentes, centrando o seu modelo de acção no doente.

Os benefícios resultantes da implementação de um modelo de gestão da doença são:

- melhor saúde;

- redução dos custos através da prevenção; - evitar a progressão de processos degenerativos;

- transformação dos doentes de participantes passivos para auto- gestores activos;

- desenvolvimento de uma abordagem de prestação de cuidados, apoiada em equipas multidisciplinares, onde se enfatizam os papéis de cada profissional.

A evidência do sucesso dos modelos de gestão integrados da doença pode ser ilustrada pelo estudo piloto de gestão activa por condição clínica, realizado em Castlefields Health Centre, em Inglaterra (Department of Health, 2004). Este estudo demonstrou uma redução de 15% na admissão de idosos e uma diminuição da demora média de internamento em 31% (passou de 6,2 dias para 4,3 dias). A utilização da cama hospitalar por dia, neste grupo, diminuiu 41%. Verificou-se ainda uma maior interligação entre o hospital e as outras instituições presentes na comunidade, existindo uma resposta mais célere no encaminhamento dos doentes para os serviços, o que é um indicador de avaliação de desempenho positivo para este modelo de gestão de serviços de saúde.