• Nenhum resultado encontrado

2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

2.3 Metabolismo do glicerol

2.3.1 Glicerol quinase e glicerol desidrogenase

O catabolismo aeróbio do glicerol em bactérias (Figura 6) pode ocorrer mediante a fosforilação do glicerol pela enzima glicerol quinase (EC 2.7.1.30; ATP: glicerol-3-fosfotransferase) para formar glicerol-3-fosfato; ou dihidroxiacetona pela enzima glicerol desidrogenase (EC 1.1.1.6, NAD dependente) (ALVAREZ et al., 2004).

Em outra via, o glicerol é degradado a gliceraldeído pela enzima glicerol desidrogenase (EC. 1.1.1.72, NADP dependente), observada em fungos filamentosos como Neurospora crassa, Aspergillus niger e Aspergillus nidulans (SCHUURINK et al. 1990; VISWANATH-REDDY; PYLE; HOWE, 1978).

A enzima glicerol quinase catalisa a fosforilação (dependente de Mg-ATP) de glicerol para glicerol-3-fosfato (G3P). Em bactérias, o produto da reação catalisada pela enzima glicerol quinase é metabolizado na via glicolítica, ao nível das trioses fosfato, atuando ao mesmo tempo como indutor da expressão do gene regulador glpK que codifica a síntese de glicerol quinase (LIU et al., 1994).

A reação catalisada por esta enzima atua como etapa limitante da velocidade de conversão de glicerol, sendo sua atividade regulada por nucleotídeos de adenina na forma de co-fatores ligados a sua estrutura (PETTIGREW et al., 1988) e por interação com componentes do sistema fosfo- transferase bacteriano como frutose-1,6-difosfato e fosfoenolpiruvato (ZWAIG; KISTLER; LIN, 1970).

Figura 6 – Principais enzimas envolvidas na assimilação de glicerol em micro-

organismos em condições de aerobiose. Adaptado de KEGG (KANEHISA; GOTO, 2000) e LORQUET et al. (2004).

Esta enzima cumpre uma importante função fisiológica na formação de glicerol-3-fosfato para a síntese de fosfolipídeos. Industrialmente importante, é útil para a determinação do nível de triglicerídeos no sangue em combinação com a lipase, glicerol-3-fosfato oxidase e peroxidase (FUSSATI; PRINCIPE, 1982; SAKESASEWA et al., 2001).

Na Tabela 3 são apresentados os principais estudos cinéticos de glicerol quinase em bactérias e fungos.

Tabela 3 – Principais estudos de caracterização cinética de glicerol quinase em micro- organismos. Organismo Atividade (U/mg) Km (μM) Vmax (U/mg) Referência

Candida mycoderma - 65 - Grunnet, Lundquist, 1967

Escherichia coli K-7 3.2b 1,3 100 Hayashi, Lin, 1967

Escherichia coli K-10 32b- 1004c 10 - Thorner, Paulus, 1972

Streptococcus faecalis - 900 - Deutscher, Sauerwald, 1986

Debaromyces hansenii 177 5000 - Nilsson et. al., 1989

Escherichia coli - 4,9 15,7 Pettigrew et al., 1990

Escherichia coli a - 27 3,9 Voegele et al., 1993

Escherichia colia - 126 12,7 Pettigrew et al., 1996

Thermus flavus DSM674 0,71b-56,7c 38 - Huang et al., 1997

Pediococcus pentosaceus N5p - 110 108 Pasteris, Strasser de Saad,

1998

Flavobacterium meningosepticum 0,45b- 75,5c - - Sakasegawa et al., 1998

Escherichia colie 3.26b 88 - Sakasegawa et al., 1998

Escherichia colia 173,7 169 206 Steinborn et al., 2000

Escherichia colif - 140 226 Králová et al., 2000

Escherichia coli - 5 15 Holtman et al., 2001

Escherichia colia - 6 13 Holtman et al., 2001

Flavobacterium meningosepticum - 249 - Sakasegawa et al., 2001

Escherichia colie - 521 - Sakasegawa et al., 2001

L. rhamnosus ATCC 7469 2,59 - - Alvarez et al., 2004

Saccharomyces cerevisiae - 2000 1,15d Aragon et al., 2008

Lactobacillus hilgardii X1B 22,14 - - Pasteris, Strasser de Saad,

2009

a

organismo geneticamente modificado, b extrato bruto; c enzima pura; d U/mL; e mutante de Flavobacterium meningosepticum; f mutante de Trypanosoma.brucei

Em bactérias Gram-positivo e Gram-negativo, a repressão da síntese de enzimas específicas para assimilação e metabolismo de glicerol depende de um

sistema de fosfotransferase (PTS) (DEUTSCHER; SAUERWALD, 1986; HOLTMAN et al., 2001).

Em bactérias Gram-positivo como Enterococcus, Bacillus e Streptococcus, a enzima glicerol quinase é fosforilada em uma unidade de histidina, promovendo atividades 10 a15 vezes superiores às observadas em outros organismos cujas proteínas não são fosforiladas (DEUTSCHER; SAUERWALD, 1986; HOLMBERG et al., 1990;ORMO; BYSTROM; REMINGTON,1998; YEH et al., 2004). Tanto em bactérias Gram-positivo quanto em Gram-negativo, a inibição da atividade é promovida por frutose-1,6-difosfato que se liga na região que corresponde ao sítio de fosforilação da enzima, ativando o sinal positivo da disponibilidade de glicose e prevenindo a expressão de proteínas para assimilação de glicerol, mediante o bloqueio dos efetores para a síntese (ORMO, BYSTROM, REMINGTON,1998; YEH at al., 2004).

A enzima glicerol desidrogenase é encontrada em fungos, leveduras, bactérias e tecidos de mamíferos (VISWANATH-REDDY; PYLE; HOWE, 1978; YAMADA et al., 1982; LIEPINS et. al, 2006), assim como em alguns gêneros de bactérias Gram-positivo e fungos filamentosos (YAMADA et al., 1982; LIEPINS et. al, 2006).

Independente da fonte, a enzima glicerol desidrogenase catalisa reações de três tipos (Equações 1 a 3), considerando o produto final e o aceptor de elétrons da reação enzimática.

Glicerol + NAD+ Glicerol desidrogenase Diidroxiacetona + NADH + H+

Glicerol + NADP+ Glicerol desidrogenase D-gliceraldeído + NADPH + H+

Glicerol + NADP+ Glicerol desidrogenase Diidroxiacetona + NADPH + H+

O primeiro grupo (EC 1.1.1.6) catalisa a oxidação de glicerol em dihidroxiacetona na presença de NAD+ (Equação 1). O segundo grupo, glicerol desidrogenase (EC 1.1.1.72) oxida glicerol a gliceraldeído utilizando NADP+ como co-fator (Equação 2). O terceiro grupo (EC 1.1.1.156), denominado também (1)

(2) (3)

dihidroxiacetona redutase; oxida glicerol a dihidroxiacetona na presença do co- fator NADP+(Equação 3) (YAMADA et al., 1982; RUZHEINIKOV et al., 2001).

O interesse na enzima glicerol desidrogenase se fundamenta principalmente no seu uso para produção de dihidroxiacetona (DHA), base para obtenção de cosméticos (bronzeador) obtido pela fermentação de glicerol por

Gluconobacter oxydans e Acetobacter suboxydans desde 1950 (CLARET;

BORIES; SOUCAILLE, 1992), e como ferramenta para análise de lipídeos em soro sanguíneo (YAMADA et al., 1982).

A enzima glicerol desidrogenase (EC 1.1.1.72) de Neurospora crassa, de massa molar estimada em 160.000 daltons, conta com uma subunidade molecular de 43.000 daltons. Esta enzima mostrou-se específica para glicerol, sendo o pH ótimo de 9,5 para a reação direta de glicerol para D-gliceraldeído. Por outro lado, a reação reversa ocorre a pH ótimo de 6,5, sendo máxima a velocidade de reação, quando utilizado D-gliceraldeido como substrato. Os valores de Km para glicerol e D-gliceraldeído correspondem a 0,143 mM e 0,0115 mM, respectivamente (VISWANATH-REDDY; PYLE; HOWE, 1978).

O mecanismo de regulação, localização e função dos genes que codificam a síntese das enzimas-chave para a assimilação e catabolismo do glicerol, em varias estirpes de bactérias, foi estudado em Escherichia coli, Flavobacterium

menigosepticum, Lactobacillus rhamnosus e Citrobacter freundii, entre outros

(ALVAREZ et al., 2004; DANIEL et al., 1995; PETTIGREW et al., 1988; SAKASESAWA et al., 1998).

Na Tabela 4 são apresentados os principais estudos de parâmetros cinéticos da enzima glicerol desidrogenase em micro-organismos.

A sequência que codifica a síntese de glicerol quinase em outros micro- organismos, incluindo Lactobacillus, foi identificada por homologia com genomas das bactérias E.coli e Bacillus sp., nas quais as atividades enzimáticas para a assimilação de glicerol foi confirmada. A identificação por homologia da sequência do gene glpk, que codifica a enzima glicerol quinase (EC.2.7.1. 30) foi reportada para L. reuteri DSM 20016, L. sakei subsp. sakei 23K, L. acidophilus,

L. casei BL23, L. rhamnosus. Nestes casos, não foi reportada a presença de

proteínas, exceto para a estirpe L. rhamnosus (ALVAREZ, 2004). O gene regulador da enzima glicerol deshidrogenase (EC.1.1.1.6) foi identificado por homologia para L. salivarius subsp. salivarius UCC118 (BRENDA, 2009; UNIPROT, 2010).

Tabela 4 – Principais estudos de caracterização cinética de glicerol desidrogenase em

micro-organismos. Organismo Co-fator utilizado Atividade (U/mg) Km (μM) Vmax Referência

Neurospora crassa NADP+ - 1,43 105 2,20 104 Viswanath-Reddy et al., 1978

Neurospora crassa NADPH - 1,15 104 2,63 10 4 Viswanath-Reddy et al., 1978

Escherichia coli 424a NAD+ 4,6b-69C 1400 81 U/mg Tang et al., 1979

Klebsiella aerogenes IFO 3318 NAD + 0,102 - - Yamada et al., 1982 Arthrobacter ureafaciens IFO 12140 NAD + 0,138 - - Yamada et al., 1982 Aeromonas liquefaciens IFO 12978 NAD + 0,0657 - - Yamada et al., 1982 Aspergillus oryzae AKU 3301 NADP + 0,0307 - - Yamada et al., 1982 Penicillium notatum IFO 4640 NADP + 0,0139 - - Yamada et al., 1982

Penicillium expansum IFO

6096 NADP + 0,0107 - - Yamada et al., 1982 Cellulomonas sp. NT 3060 NAD + 0,183 - - Yamada et al., 1982

Cellulomonas sp. NAD+ 90 9000 - Lee, Whitesides, 1986

Enterobacter aerogenes NAD+ 5 9000 - Lee, Whitesides, 1986

Citrobacter freundii DSM 30040 NAD + 2,2b-65,5c 1270 - Daniel et al., 1995 Bacillus stearothermophilus DSM 2334 NAD + - 3,8 - Ruzheinikov et al., 2001 a

Identificar as enzimas envolvidas na assimilação de glicerol por parte de bactérias probióticas, assim como os fatores que afetam sua produção, é de fundamental importância para estabelecer as condições para uma maior produção de biomassa celular a partir deste substrato.