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Momentos de Apogeu e Declínio de uma Liderança no Jogo Político

3.3 O Governo de Venceslau Brás (1914-1918)

O primeiro grande fracasso político de Pinheiro foi o seu insucesso para influenciar de forma decisiva a próxima eleição presidencial. A elite política começara a discutir a questão da sucessão mais de um ano antes do pleito, como de praxe.

Em 28 de fevereiro de 1913, o senador havia questionado o governador de Pernambuco, Dantas Barreto, se o PRC “poderia contar” com o suporte daquele estado na seleção do próximo candidato à presidência e a resposta do segundo foi a preferência por uma “convenção nacional”, conjugando “elementos de todas as feições políticas” e não uma escolha do partido controlado pelo senador rio-grandense. O governador Clodoaldo da Fonseca, de Alagoas, “logo seguiu o exemplo” de seu colega de

174 executivo, declarando “que o domínio da organização de Pinheiro precisava terminar.”439

Em paralelo, o general Mena Barreto, notório opositor do senador, tentava formar uma frente de oposição ao PRC, congregando um grupo o qual incluiria os chamados “salvacionistas”, ou seja, os já referidos oficiais do exército que governavam os estados do Nordeste (Pernambuco, Bahia, Ceará e Alagoas) além de outros nomes possíveis de serem incluídos nesse bloco. Sobre Mena Barreto, o jornal “O País” apontou que ele voltaria para o Rio Grande do Sul e fundaria o “Partido Liberal”, e a revisão constitucional do Rio Grande do Sul e do Brasil, seguidos da “República Parlamentar”, seriam os ideais da agremiação.440

Segundo noticias vindas do Recife, a própria candidatura de Dantas Barreto à presidência da República estaria sendo planejada a partir do apoio de políticos até então “situacionistas”, como Joaquim Seabra, o qual chegou a ser aliado de Pinheiro Machado e Hermes da Fonseca, em uma nova união entre baianos e pernambucanos.441

A ligação de Dantas Barreto e Clodoaldo Fonseca também é noticiada por “O País”, pois o segundo teria mandado "aos seus colegas, governadores dos Estados do norte, um telegrama circular, exortando-os a coligarem-se para intervir de modo decisivo no próximo pleito presidencial”.442

O jornal, em tom irônico, relatava a ação regeneradora republicana proposta pelo grupo em questão. Do ponto de vista dos salvacionistas, uma “reforma política” em nível nacional só poderia ser realizada com o enfraquecimento do partido de Pinheiro. Porém, como afirma Love, seria improvável que apenas esses estados do norte-nordeste possuíssem vigor para sacramentar uma possível escolha à presidência sem o apoio de outras forças; teriam que obter o suporte de agremiações expressivas da política brasileira, como aquelas de Minas Gerais e São Paulo.

No Rio Grande do Sul, ainda segundo o autor, Borges de Medeiros tentava obter adesão à candidatura de Pinheiro Machado à presidência. A proposta agradava a Hermes da Fonseca, ainda presidente da República. Contudo, as lideranças do PRR e do PRC julgaram que deveriam contar com a força do PRM (Partido Republicano Mineiro) e do PRP (Partido Republicano Paulista) na eleição. Já no mês de janeiro de 1913,

439 BARRETO, Dantas. Conspirações. Rio de Janeiro: Livraria Francisco Alves, 1917. p. 212-214. LOVE

Joseph. Op. cit., p. 177-178.

440 O País, p. 02, 14 fev. 1913. RJ. 441 O País, p. 03, 10 jan. 1913. RJ. 442 O País, p. 01, 26 fev. 1913. RJ.

175 Hermes mandara mensagem ao governador de Minas Gerais, Júlio Bueno Brandão, indagando se o partido mineiro apoiaria uma chapa com Pinheiro para presidente e Brandão como seu vice.

Brandão não concordou, alegando preferir a candidatura de Campos Sales no pleito. Além disso, em meados de abril desse ano, o dirigente entrou em contato com um porta-voz de Rodrigues Alves, presidente do estado de São Paulo. Eles acordaram que mineiros e paulistas consultariam uns aos outros antes de se comprometerem com a sucessão. 443

Referendado por esse pacto, conforme aponta “O País”, a comissão executiva do PRM resolveu “por unanimidade, que o partido não adotaria a candidatura do senador Pinheiro Machado”.444 Assim, embora nem tivesse se declarado oficialmente candidato, sem o apoio do PRM o nome do senador rio-grandense como postulante à presidência sofria um abalo.

Pinheiro não teria tomado esse episódio como uma grande afronta. Preferiu, em vez disso, sugerir candidatos os quais dividissem seus oponentes, tática usualmente utilizada. Inicialmente teria lançado o nome de Campos Sales, com quem possuía boa relação, para ser referendado pelos paulistas.445 O jornal “O País” apontou que Pinheiro Machado comunicou ao senador Francisco Glicério ter-se acertado na reunião do PRC a escolha do nome do sr. Campos Sales, o “candidato de pacificação”. Glicério teria telegrafado a Rodrigues Alves e aos membros da comissão executiva do PRP “fazendo ver as vantagens dessa solução”.446

Em 18 de junho, uma notícia de “A Federação” indica que uma chapa formada por Campos Sales e Venceslau Brás teria sido aceita por algumas lideranças de Minas Gerais e São Paulo.447 Contudo, na sequência, uma reportagem em “O País” anuncia que Campo Sales havia enviado um telegrama para Pinheiro Machado no qual declarava a retirada da sua candidatura.448

Além disso, em maio os “coligados” do norte-nordeste já tinham repelido a candidatura de Campos Sales, por ela ligar-se tanto com Pinheiro Machado quanto ao Marechal Hermes, contestando assim o direito do presidente de interferir na escolha do próximo postulante ao cargo nacional. Ao mesmo tempo, segundo notícias do “Diário

443 LOVE, Joseph. Op. cit., p. 178. 444 O País, p. 01, 05 mai. 1913. RJ. 445 LOVE, Joseph. Op. cit., p. 178-179. 446 O País, p. 01, 13 mai. 1913. RJ. 447 A Federação, p. 04, 18 jun. 1913. RS. 448 O País, p. 01, 19 jun. 1913. RJ.

176 Mercantil”, reproduzidas por “O País”, a contestação da candidatura de Pinheiro Machado por parte do PRM deu-se pelo de fato Francisco Sales não ter sido apontado como candidato à presidência por parte do PRC, nome o qual o senador rio-grandense teria vetado antecipadamente.449

Uma charge nesse momento ilustra os movimentos de Pinheiro. Sob o título “To

be or not to be”, a cena mostra o senador em um gabinete, acariciando a cadeira

presidencial, dizendo: “É confortável, não nego. Mas, se eu posso continuar sentado à direita do todo-poderoso...”450

O script do parlamentar era atrair os republicanos de São Paulo e Minas Gerais para afastar uma possível coligação de oposição ao PRC, que incluiria, além desses dois grandes estados, aqueles controlados pelos salvacionistas e também o Rio de Janeiro.451 Porém, entre os mineiros, a candidatura de Campos Sales pretendida por Pinheiro naufragara, o que demonstraria mais um desagrado em relação às ações do senador.452

Desse modo, há indicativos para pensar que Campos Sales foi barrado porque São Paulo e Minas Gerais o consideravam um nome fortemente ligado a Pinheiro. De qualquer forma, o ex-presidente adoeceu em julho daquele ano e morreu dias depois. Entrementes, os mineiros decidiram apoiar o vice-presidente de Hermes, Venceslau Brás Pereira Gomes, um líder do PRM, à presidência. Políticos das agremiações republicanas da Bahia, Alagoas, Ceará, Pernambuco e Rio de Janeiro fizeram o mesmo.

Pinheiro opôs-se a esse nome, apresentando aos líderes do Partido Republicano Conservador e aos mineiros a indicação de Borges de Medeiros. Contudo, estes manifestaram pouca empolgação. Na sequência, Pinheiro inclusive informou que Borges recusara a proposta; além disso, as principais figuras do próprio PRC já estavam inclinadas a aceitar Venceslau como seu candidato.453

Embora o PRC tenha somente defendido o nome Venceslau Brás após sucessivos fracassos em opções lançadas anteriormente, não possuindo a “paternidade”

449 O País, p. 01, 16 mai. 1913. RJ. LOVE, Joseph. Op. cit., p. 178. 450 Careta. Rio de Janeiro, n. 253, 05 abr. 1913. Ano 5.

451 LOVE, Joseph. Op. cit., p. 179.

452 Em uma charge a qual mostra a tentativa frustrada do lançamento do nome de Campos Sales à

presidência por parte do senador rio-grandense, Pinheiro Machado aparece como contrarregra de um espetáculo e o paulista como um ator, sob o título “Nos Bastidores”. No diálogo, Pinheiro diz que Campos Sales foi muito aplaudido e este responde ter sido recepcionado “friamente”, só ganhando os aplausos da “claque”, ou seja, dos seus apoiadores incondicionais. Também afirma que “recebeu o peso dos nabos e batatas” (foi duramente vaiado, portanto) e pede para Pinheiro “mandar outro, o Rui, por exemplo”. Careta. Rio de Janeiro, n. 262, 07 jun. 1913. Ano 6.

177 sobre essa candidatura, como salientou Rui Barbosa,454 Pinheiro desejou passar a impressão de que ele e seu partido apoiavam irrestritamente o mineiro. Assim, o rio- grandense tentou convencer o candidato a convidar o senador Urbano Santos da Costa Araújo, maranhense e membro do PRC, para vice da chapa, o que foi aceito. Pinheiro relatou a Borges tal indicação como sendo uma “vitória pessoal” e também “enalteceu” a figura de Venceslau Brás.455

Em 24 de julho de 1913, o jornal “A Federação” afirmou que o “abnegado” senador rio-grandense, embora fosse o indivíduo mais indicado à presidência do país, caso declinasse de sua candidatura, para buscar uma fórmula de “conciliação” entre diversas forças políticas em curso, o órgão “aplaudiria” o nome de Venceslau Brás a fim de evitar uma “crise política” no Brasil.456

Já “O País” noticia, sobre uma convenção política ocorrida em 09 de agosto, que 213 parlamentares, entre senadores e deputados, “proclamaram” as candidaturas dos srs. Venceslau Brás e Urbano Santos para a próxima eleição. Os deputados “seabristas” (sic) explicaram a sua “ausência” declarando que apoiariam no pleito Rui Barbosa, com o suporte do governo do estado da Bahia e dos seus municípios.457 Portanto, o maior adversário de Venceslau Brás seria Rui Barbosa, lançado pelo Partido Republicano Liberal (PRL), com o apoio de seu ex-rival político na Bahia, José Joaquim Seabra.

Em 31 de dezembro de 1913, a chapa formada por Rui Barbosa e Alfredo Ellis renuncia à participação da eleição. No manifesto que encerra a presença da dupla na disputa, o baiano afirma:

O cinismo do cáucus (convenção política) (...) despiu de todo a compostura. (...) A história aludia com um facho de sombria claridade a cena da venda solene do Congresso Nacional a essa facção sediciosa (PRC) cujo chefe, da mesa do Senado (Pinheiro Machado) (...) exigiu de cada um dos membros daquela assembleia a garantia da sua assinatura na cédula do voto (...). O que há é uma falência econômica e financeira, política e institucional, por liquidar. Essa missão não se requesta. Pode um homem ser para ela requestado (...). Já não somos, pois, candidatos à presidência e a vice-presidência da República. (...) A presidência da República, neste momento, não pode ser exercida senão por um estadista, de quem conste que com ele se acha a Nação toda.458

454 BARBOSA, Rui. A gênese da candidatura do sr. Venceslau Brás. In: BARBOSA, Rui. Obras

completas de Rui Barbosa. Rio de Janeiro: Fundação Casa Rui Barbosa, 1973. p. 441-451. v. 41. tomo 2.

455 LOVE, Joseph. Op. cit., p. 179-180. 456 A Federação, p. 01, 13 jul. 1913. RS. 457 O País, p. 01, 10 ago. 1913. RJ. 458 O País, p. 03, 31 dez. 1913. RJ.

178 A partir do excerto, Rui alega que pela decadência “moral” e “econômica” do país não deveria haver disputa e sim aclamação de um candidato para resolver tais graves problemas. Como não houve um nome a congregar todas as forças políticas – possivelmente esperava que ele próprio fosse o personagem escolhido a essa grande missão – preferiu se retirar da eleição. Além disso, culpa pelo clima de acirrada luta eleitoral os arranjos condenáveis supostamente arquitetados por Pinheiro Machado, os quais incluíram a coerção sobre parlamentares a fim de apoiarem suas decisões.

Vale ressaltar que a legenda de Rui havia sido criada apenas em julho de 1913, menos de um ano antes do pleito, e não possuía expertise eleitoral, enquanto Venceslau, de fato, contava com o apoio majoritário das agremiações políticas nacionais já conhecidas. Assim, o amplo favoritismo do seu concorrente, acredito, foi fator fundamental para o parlamentar baiano desistir da disputa.

Na eleição de 1º de Março de 1914, Venceslau Brás, com 532.107 votos, tornou- se presidente da República. O curioso foi perceber quem foram os seus adversários no pleito: Rui Barbosa foi o seu principal oponente, computando 47.782 sufrágios, apesar da desistência da sua chapa. Da mesma forma, na eleição a vice-presidente, Urbano Araújo teve um escore de 556.127 votos e Alfredo Ellis ficou na segunda posição, com 18.850 sufrágios.459

Os benefícios políticos que Pinheiro obteve de Venceslau sobre a nova gestão federal também se relacionaram à participação de integrantes do PRR e do PRC no governo. Um membro do PRR tornou-se o Ministro da Justiça (Carlos Maximiliano Pereira dos Santos). Contudo, como aponta Love, o presidente “não era um produto do PRC” e permanecia “isolado” de maior contato com o senador.460 Segundo Vera Borges, “o governo de Venceslau Brás parecia ter como tarefa livrar-se do espectro de Pinheiro Machado e ainda resolver os problemas herdados da gestão anterior”.461

Indícios levam a crer que os membros do PRM proveram o novo presidente de suporte visando liberdade do controle de Pinheiro. Como exemplo, Fonseca Hermes, deputado do Rio Grande do Sul, irmão do Marechal Hermes, perdeu seu posto de líder da maioria na Câmara dos Deputados para um membro da agremiação mineira, Antônio

459 Como já ressaltado, não havia um mecanismo de registro das candidaturas o qual limitasse os

concorrentes habilitados no pleito e um sem-número de nomes eram lembrados nas urnas, mesmo que não tivessem se lançado previamente na disputa. Pinheiro Machado, por exemplo, recebeu votos pelos dois cargos, embora de forma inexpressiva (222 votos para presidente e 129 votos para vice-presidente). Ver: PORTO, Walter Costa. Op. cit., 2002, p. 173-174.

460 LOVE, Joseph. Op. cit., p. 180.

179 Carlos de Andrada, no final de novembro de 2014; os correligionários desse partido também conservaram a presidência da Câmara. Segundo “O País”, o novo nome teve boa receptividade entre seus pares.462

Em uma notícia do “Correio da Manhã”, é apontado que Hermes da Fonseca, mesmo tendo o seu mandato findo dias antes (em 15 de novembro) tentou convencer seu irmão a continuar como líder da maioria da bancada governista, pois não lhe faltaria “confiança” do novo governo”.463 Em reuniões entre os líderes partidários sobre o tema no dia 19, Fonseca Hermes permaneceu ocupando o cargo, o que também teria contado com a articulação de Pinheiro Machado.

Contudo, em 24 de novembro, conforme aponta o jornal supracitado, em “palestra” proferida pelo senador Azeredo no dia anterior, Fonseca Hermes não compareceria mais nas sessões do Congresso, abandonando as funções de liderança do PRC e da maioria na Câmara. Assim, Andrada, que já era líder da bancada mineira, acabou por assumir o cargo de líder da maioria do governo, sem ser necessário, segundo constou, uma votação a qual o confirmasse e consequentemente destituísse o ocupante anterior.

O “abandono” do posto por parte do deputado rio-grandense, sem mesmo uma renúncia formal, pelo menos inicialmente, parece-me sintomático da fragilidade de sua situação: segundo o periódico, a partir das manifestações de deputados que formaram o grupo o qual elegeu Brás, Fonseca Hermes poderia ser “retirado” de sua função mais cedo ou mais tarde. Certamente devido a sua forte ligação com o ex-presidente Hermes da Fonseca e Pinheiro Machado, além da possível vontade dos mineiros em dar provimento no posto a um membro ligado ao seu grupo político.464 Desse modo, a fim de evitar seu provável desgaste pessoal, Fonseca Hermes deixou o cargo.

Segundo Love, mesmo com esses episódios o senador almejava manter a aparência de harmonia política e acreditava poder influenciar nos movimentos do deputado Andrada. Desse modo, Pinheiro parecia “conformado” com a derrota de Fonseca Hermes na Câmara, entendendo que uma luta sobre a questão poderia levar a um sério rompimento entre o novo presidente da República e o PRC. Ele também aquiesceu com as revisões das reformas educacionais nacionais de inspiração

462 Ver: O País, p. 02, 26 nov. 1914. RJ. 463 Correio da Manhã, p. 02, 20 nov. 1914. RJ. 464 Correio da Manhã, p. 02, 24 nov. 1914. RJ.

180 “castilhista” as quais Rivadávia Correia, do PRR, havia instituído no governo anterior.465

Outro caso que enfraqueceu Pinheiro Machado foram as eleições estaduais no Rio de Janeiro. Em 1914, Feliciano Sodré candidatou-se à presidência desse estado, apoiado por Oliveira Botelho e pelo senador rio-grandense. Nilo Peçanha não concordou com a indicação e entrou na disputa. A Assembleia Estadual também se dividiu fortemente, entre apoiadores de Sodré e de Peçanha. Depois do pleito de 12 de julho de 1914, os dois candidatos declararam-se vencedores e foram reconhecidos pelos seus respectivos grupos na Assembleia fluminense. O Supremo Tribunal Federal, julgando o caso, decidiu reconhecer a vitória de Nilo Peçanha sobre seu adversário, fato o qual desagradou Pinheiro. Em meio a essa contenda, no mês de dezembro, Venceslau ordenou o envio de tropas militares a Niterói para apoiar Peçanha.

Pinheiro trouxe a questão até o Congresso no início de janeiro de 1915 e teria, aparentemente, concordado com as ações do presidente. Mas na sequência ele informou a Borges ter impedido uma separação entre o Presidente da República e os correligionários do PRC, cujos líderes continuavam ao lado de Lauro Sodré. Contudo, a despeito dessa atitude de Venceslau, acreditava que o presidente eventualmente aceitaria a posição da sua agremiação na contenda fluminense.

Pinheiro em seguida articulou um projeto no Senado o qual efetivamente recolocava o estado do Rio de Janeiro sob autoridade de Sodré, mas tal tentativa foi bloqueada na Câmara dos Deputados, cujo controle estava nas mãos do PRM naquele momento. Peçanha continuou no seu cargo, amparado também pelo governo federal.466

Outro ponto de enfraquecimento de Pinheiro deu-se dentro do PRR, com a tentativa da eleição do ex-presidente Hermes da Fonseca ao Senado. Este deixara a presidência sob uma rejeição considerável no meio político e por isso lançar seu nome à Câmara Alta criou tensões entre membros da agremiação rio-grandense 467

Durante os meses de junho e julho de 1915 há uma “luta” na imprensa entre os partidários do PRR fiéis a Borges e Pinheiro Machado contra os opositores em torno de Ramiro Barcelos, tido como um “ex-senador, um díscolo (agressivo, brigão), para quem

465 LOVE, Joseph. Op. cit., p. 180.

466 Carta de José Pinheiro Machado a Antônio Borges de Medeiros, remetida do Rio de Janeiro, em 1º de

janeiro de 1915. Apud LOVE, Joseph. Op. cit., p. 181. Ver também a pág. 180 da obra. Sobre a disputa no Rio, discutida por fim no Congresso, segundo Castro “era a última grande tentativa do chefe rio- grandense, que teve de se conformar com a inteira ineficácia do seu esforço (...) vitória inegável conseguida pela aliança das bancadas mineira e paulista (...)”. CASTRO, Sertório de. Op. cit., p. 233-234.

181 a calúnia e a ofensa soez são armas preferidas”.468 Barcelos, por sua vez, apresenta, no “Correio do Povo”, os textos “Protesto contra o estelionato político” e “Manifesto ao eleitorado do Rio Grande do Sul”. 469

Realiza-se o pleito e Hermes da Fonseca é eleito senador. Vencido na eleição, Barcelos, durante agosto de 1915, novamente em uma “série de artigos”, combate o que chama de “caudilhismo político” patrocinado pelos “algozes” dos ideais republicanos, Pinheiro Machado e Borges de Medeiros, os quais “atrasariam” a política rio-grandense e brasileira.470

Mas o mais intenso escrito de Ramiro Barcelos contra os líderes do PRR trata-se da obra “Antônio Chimango”, lançada em 1915 e redigida por ele sob o pseudônimo de “Amaro Juvenal”. Definido pelo próprio autor como um “poemeto campestre”, é composto de versos que satirizam como teria se desenrolado a trajetória política de Borges de Medeiros até chegar à liderança da agremiação partidária rio-grandense e ao comando do governo do estado do Rio Grande do Sul, tendo Pinheiro Machado como aliado nesse processo.471

Como aponta Grijó,

O texto é uma critica feroz e algo panfletaria a este líder (Borges), o que fez com que caísse no gosto dos opositores ao seu governo. Tão ampla e significativa foi tal repercussão que os partidários de Borges de Medeiros passariam a ser identificados pelas oposições como “chimangos”, ou “chimangada”. (...) Em breves linhas, o “poemeto campestre” é uma parábola da vida social e política do Rio Grande do Sul. Em cinco “rondas” (como estão divididas as partes ou capítulos do poema), paradas vespertinas da marcha de uma tropa boiadeira, o narrador Lautério, um dos tropeiros mais velhos e experientes, aproveita as ocasiões para cantar em versos a história de Antônio Chimango.472

Assim, o poema traça paralelos entre indivíduos e acontecimentos da realidade política rio-grandense e o enredo de uma fictícia vida no campo: após a morte do “Coronel Prates” (Júlio de Castilhos), dono da “Estância de São Pedro” (alusão ao Rio

468 Um dos exemplos da discussão consta em: A Federação, p. 01, 05 jul. 1915. RS.

469 O primeiro texto consta em: Há um século no Correio do Povo. Correio do Povo, p. 12, 05 jul. 2015.