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CAPÍTULO 4 MOVIMENTOS DA AUTONOMIA E HETERONOMIA DOCENTE

4.1 O GRUPO COMO ESPAÇO CATÁRTICO

Essa função ou característica encontra-se no grupo Estímulo à Criatividade do Professor de História. Ao longo de oito encontros, os integrantes do grupo ressignificaram este espaço, voltado à pesquisa no espaço escolar, para um lugar em que os professores expressavam suas angústias cotidianas neste momento o grupo assumia uma função catártica. Muitas vezes, essa angústia assumia um caráter bastante pessimista com relação à educação pública, à resistência dos alunos e ao trabalho solitário do professor, o que os conduzia, inconscientemente, a assimilar o discurso hegemônico da incompetência. Quando se iniciaram as reuniões, os participantes do grupo tiveram a percepção de que os problemas vivenciados na solidão do seu ofício assolavam outros profissionais da educação. Se tomarmos por base o objetivo desse grupo de estudos, que em primeira instância consistia na formação de redes de ajuda mútua, podemos afirmar que ele o cumpriu, já que as necessidades do grupo é que o direcionavam e a necessidade inicial desses professores consistia em expressar suas angústias. Mesmo os professores desistentes reconhecem que este espaço era significativo. No relato da professora Solange, após freqüentar quatro reuniões, e ter uma atuação significativa nas discussões e nas exposições de seus problemas cotidianos, ela faz uma descrição do grupo, bem como enfatiza a importância do mesmo para a sua formação:

[...] um grupo de estudos ótimo, pois os professores falavam sobre suas experiências em sala de aula, podendo até mesmo desabafar sobre os problemas enfrentados e também trocando idéias. [...] muitas vezes ficamos achando que nós não sabemos ensinar, que só os nossos alunos é que não conseguem nota, mas no grupo pude ver que em todas as escolas e com todos os professores é a mesma coisa. 64

Neste depoimento, a constituição de lugares onde os professores possam refletir sobre suas angústias permite que o sujeito não se sinta solitário no exercício da docência, visto que o isolamento, muitas vezes, faz com que o sentimento de incompetência e de insatisfação instale-se nestes indivíduos. Entretanto, ao interagir com outros professores, a professora percebe que suas angústias fazem parte do cotidiano de outros profissionais, que os seus problemas são comuns e este elemento permite a ela dialogar, de forma positiva, com esse mal estar, causado pelas notas baixas dos alunos. Notas que, em certa medida, deixam a descoberto a nossa competência no que se refere ao ato de ensinar.

Assim, a formação de pequenos espaços de discussão, de leitura e reflexão sobre a prática do ensino de História, vivenciada pelos integrantes do grupo de estudos Estímulo à

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Criatividade do Professor de História, possibilitou aos professores compartilhar suas angústias e assumir sua condição de sujeito. Sua autonomia está, circunscrita à capacidade de expressar suas experiências, pois os saberes da docência são mobilizados.

Em alguns momentos era visível entre os participantes a total descrença na possibilidade de transformação, os professores, durante a maior parte dos encontros, transformaram as discussões do grupo numa espécie de válvula de escape. Pareciam estar subjugados, desmotivados e, ao longo das oito reuniões, ficou muito evidente a necessidade de verbalizar elementos como a desvalorização do professor, representada pela falta de autoridade no espaço escolar.

A falta de autoridade restringe o exercício da autonomia docente. Segundo Paulo Freire, a autoridade docente está relacionada à competência profissional. A ausência de autoridade desqualifica o trabalho do professor. Para este autor, a autoridade democrática está convicta de que a disciplina verdadeira não existe na estagnação, no silêncio dos silenciados, mas no alvoroço dos inquietos, na dúvida que instiga, na esperança que desperta65. A partir das idéias de Paulo Freire pode-se destacar a importância da autoridade docente que, como já esclarecido, não significa autoritarismo. Muito pelo contrário, a autoridade não dispensa o professor do respeito à liberdade do educando, de estabelecer um diálogo com eles. A autoridade significa também reconhecer nossa responsabilidade no ato de ensinar.

No grupo de estudos criado pelo NRE de Ponta Grossa, pode-se afirmar que as angústias dos professores se estabeleceram a partir de mudanças que estavam acontecendo em suas escolas. Estas diziam respeito a dois elementos: livro de registro de classe e a avaliação

paralela. Os professores estavam perturbados, neste momento, pois não se esclarecia a forma

correta de preenchimento do livro de chamada e o número de avaliações paralelas a serem realizadas de acordo com o número de aulas de cada disciplina. Assim, um assunto burocrático ganhou espaço, atenção e preocupação dos professores, já que este, no espaço escolar, era apresentado de formas diferenciadas, o que gerava uma compreensão equivocada entre os docentes.

Pode-se afirmar que o sentimento de angústia se localizou de forma mais intensa no grupo de estudos Estímulo à Criatividade do Professor de História do que no grupo de estudos do NRE. Sentimento que, por sua vez, desencadeou outro, o de desânimo, já que os objetivos, naquele momento, não estavam sendo cumpridos. Contudo, aos poucos, a percepção do fato de os professores expressarem suas angústias como uma necessidade e que este iria se guiar

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FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. Paz e Terra, 1996, p.91- 96.

por essas motivações foi sendo compreendida já que este dado é um indício de que os professores assumiram a condição de sujeitos do processo, em vez de se encaixarem de forma passiva num roteiro pré-estabelecido. Dessa maneira, a coordenação deste grupo cumpriu a sua função no que diz respeito ao estímulo e à criação de condições para que, no grupo, todos fossem sujeitos do processo. O espaço do grupo de estudos Estímulo à Criatividade do Professor de História foi legitimado entre seus participantes como um lugar de reflexão sobre a autoridade docente, a desvalorização dos professores pelos alunos. Ao reconhecerem que possuíam problemas comuns, tiveram a possibilidade de romper com a solidão do seu trabalho; no entanto, o estereótipo de insatisfação no exercício da docência seria um obstáculo a ser vencido pelos professores.

4.2 O GRUPO COMO ESPAÇO DE CONTROLE BUROCRÁTICO E COMO ESPAÇO DE