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Grupo Escolar Delfim Moreira

No documento julianagomesdornelas (páginas 91-97)

2. VIVENDO E CONVIVENDO

2.1.3 Grupo Escolar Delfim Moreira

Em 04 de fevereiro de 1907 foi fundado em Juiz de Fora o primeiro estabelecimento público de ensino da cidade e do Estado de Minas Gerais, o Grupo Escolar Delfim Moreira, tendo como diretor o Professor José Rangel. As dependências desta instituição escolar encontravam-se divididas em oito classes, sendo quatro do sexo feminino e quatro do sexo masculino. Já na inauguração, o número de matrículas chegou a 470. O jornal O Pharol, fez a

290 Associação Comercial de Juiz de Fora. Atas da Diretoria. Atas da diretoria, 1915-1919, p.05.

291 Arquivo do Colégio Academia. Livros de Matrícula. Matrículas do curso preparatório e do curso

superior.

292 Idem. 293 Idem.

294 Associação Comercial de Juiz de Fora. Atas da Diretoria. Atas de Reunião da diretoria, 12/06/1896 –

cobertura do evento de abertura do Grupo e em seu texto destacou a salubridade do local, fato este comum às instituições de ensino analisadas anteriormente. A notícia veiculada no jornal consta que: “Em todas as dependências do vasto edifício, observa-se a mais rigorosa hygiene”. 295 A qualidade do ensino deste recinto escolar foi ressaltada no Álbum do Município de Juiz de Fora, elaborado por Albino Esteves. Quando o autor fala dos Grupos Escolares Delfim Moreira e José Rangel, destaca que: “O ensino nelles é ministrado por processos modernos e (...) methodo intuitivo, hoje adoptado nos paízes mais civilizados”. 296 Dessa forma, a boa educação dos alunos e a preservação da saúde destes, era a prioridade para direção do estabelecimento. Já no primeiro semestre de 1914 o número de matrículas aumentou para 563.

Mas quais alunos estudavam neste Grupo? Os filhos dos sírios e dos libaneses também foram direcionados a ele? Segundo os dados que encontramos neste colégio, só houve Livros de Matrícula de 1939 em diante, ou seja, dentro de nosso recorte cronológico, que vai de 1890 até 1940, só pudemos ter acesso a 1939 e 1940. Antes deste período, nas escolas públicas em geral, havia registros de matrículas simples, no qual constava apenas o nome do aluno. Só a partir de 1939, começou a haver a presença de Livros de Matrícula em detalhes, onde aparecia o nome completo do aluno, dos pais, data de nascimento, local de nascimento, dentre outros. Dessa forma, temos poucos dados sobre os sírios e libaneses e descendentes que estudaram no Grupo Escolar Delfim Moreira. No entanto analisaremos estes dois anos para compreendermos quem são estes alunos, onde moravam, de onde vieram seus pais, se tinham condição financeira estável, a fim de podermos fazer comparações com os dados que conseguimos nos colégios Academia do Comércio e Granbery.

Na documentação do Grupo Escolar Delfim Moreira, assim como fizemos para os outros estabelecimentos de ensino, adotou-se como critérios para a identificação do universo de análise dos alunos sírios ou libaneses e descendentes: o sobrenome familiar e a naturalidade dos responsáveis. Os estudantes deste grupo étnico faziam o curso primário e tinham entre 07 e 12 anos, sendo todos naturais do Brasil. Isso é compreensível, pois estamos analisando dados dos anos de 1939 e 1940, quarenta e sete anos depois da chegada dos primeiros imigrantes deste grupo em Juiz de Fora. Pelos dados apresentados no gráfico abaixo, observa-se que 73,68% dos pais de alunos de origem síria ou libanesa no Grupo Escolar Delfim Moreira são naturais da Síria, enquanto somente 21,05% dizem ser

295 O PHAROL. Grupo Escolar. 04 e 05/02/1907. Número 30. p. 01, coluna 06 e 07. 296 ESTEVES, Op. Cit. p. 261.

brasileiros. Apenas a Senhora Maria Cristina da Conceição, que matriculou o aluno Jorge Elias, não deixou seus dados completos.

GRÁFICO 8 – Naturalidade paterna dos alunos de origem síria ou libanesa matriculados no Grupo Escolar Delfim Moreira, Juiz de Fora, 1939-1940

SÍRIA; 14 BRASIL ; 4

NÃO CONSTA; 1

Fonte: Arquivo do Grupo Escolar Delfim Moreira. Livros de Matrícula. 1939 a 1940.

Durante os dois anos analisados houve um total de 25 matrículas neste Grupo Escolar, sendo que seis delas foram feitas pela mesma pessoa em 1940, ou seja, sem considerar as repetições tivemos 19 alunos de origem síria ou libanesa diferentes inscritos neste estabelecimento. Foram 11 matrículas em 1939 e 14 em 1940, no curso primário, de 1ª à 4ª séries. Para conhecermos melhor quais famílias inscreviam seus filhos nesta escola, fizemos uma análise dos sobrenomes presentes nos Registros de Matrícula.

TABELA 9 – Sobrenomes sírios ou libaneses encontrados nos livros de matrículas do Grupo Escolar Delfim Moreira, Juiz de Fora, 1939-1940

SOBRENOMES FREQUÊNCIA HALLACK 03 JORGE 03 ABDO 02 MIANA 02 ABUD 01 ARBEX 01 ELIAS 01 HABER 01 HADDAD 01 HALLAH 01 MARON 01 MOCHEDESSI 01 SABER 01 TOTAL 19

Fonte: Arquivo do Grupo Escolar Delfim

Moreira. Livros de Matrícula. 1939 a 1940.

Os sobrenomes sírios ou libaneses mais freqüentes foram Hallack e Jorge, tendo cada um três repetições. Depois deles temos, com apenas duas manifestações, Abdo e Miana. E por fim, com uma única presença foram encontrados Arbex, Abud, Elias, Haber, Haddad, Hallah, Maron, Mochedessi e Saber. Esses sobrenomes nos ajudarão no posterior cruzamento das fontes.

Os alunos de origem síria ou libanesa que estudavam neste estabelecimento moravam no que chamamos de “centro nevrálgico” 297 de Juiz de Fora. Observando a tabela abaixo o lugar onde houve a maior presença destes alunos e suas famílias foi a Rua Marechal Deodoro, local de grande instalação de comerciantes sírios e libaneses, o que nos indica que a grande maioria dos pais se dedicava ao comércio. Depois temos a Rua Santos Dumont, com três famílias, seguida pela Avenida Berlim, a Rua Francisco Bernardino e a Rua Dr. Paleta com duas. E com somente uma aparição estão a Rua Batista de Oliveira, Rua Getúlio Vargas, Rua Halfeld e Rua Santa Rita. O único aluno que não deixou seu endereço foi Jorge Elias, já citado acima.

297 Esta expressão foi retirada do texto de Ludmilla Savry Almeida. ALMEIDA, Ludmilla Savry. Sírios e

Libaneses: redes familiares e negócios, In: BORGES, Célia Maia. Solidariedades e conflitos: histórias de vida e trajetória de grupos em Juiz de Fora. Juiz de Fora: Editora da UFJF, 2000.

TABELA 10 – Endereços dos alunos de origem síria ou libanesa matriculados no Grupo Escolar Delfim Moreira, Juiz de Fora, 1939-1940

ENDEREÇOS FREQUÊNCIA

RUA MARECHAL DEODORO 05

RUA SANTOS DUMONT 03

AV. BERLIM 02

RUA DR. PALETA 02

RUA FRANCISCO BERNARDINO 02

RUA BATISTA DE OLIVEIRA 01

RUA GETÚLIO VARGAS 01

RUA HALFELD 01

RUA SANTA RITA 01

NÃO CONSTA 01

TOTAL 19

Fonte: Arquivo do Grupo Escolar Delfim Moreira. Livros de Matrícula.

1939 a 1940.

A partir do momento que tomamos contato com as fontes que nos informam sobre a profissão dos pais destes alunos, entendemos o porquê da predominância destes no centro da cidade. O gráfico abaixo nos ajuda a esclarecer esta situação.

GRÁFICO 9 – Profissão paterna dos alunos de origem síria ou libanesa matriculados no Grupo Escolar Delfim Moreira, Juiz de Fora, 1939-1940

15 2 1 1 0 2 4 6 8 10 12 14 16 PROFISSÃO COMERCIANTES MECÂNICOS DOMÉSTICAS NÃO CONSTA

Fonte: Arquivo do Grupo Escolar Delfim Moreira. Livros de Matrícula. 1939 -1940.

Segundo os dados do gráfico 9, 78,94% dos pais destes alunos eram comerciantes, o que nos ajuda a compreender que a concentração no centro urbano da cidade é resultado da profissão escolhida pelos sírios e libaneses, porque a Rua Marechal Deodoro foi a mais freqüentada por estes, já que era nesta que desenvolvia-se melhor o comércio por estar próximo a linha férrea. No entanto, aparecem nas fontes desta escola, pais com profissões

antes não citadas, como os mecânicos e as domésticas. Para os que chegaram a Juiz de Fora tardiamente (já que estamos tratando de 1939 e 1940) é provável que o comércio não fosse tão lucrativo como era para os iniciantes, devido à concorrência grande dos já estabelecidos.

Ao cruzarmos os dados desta escola com os da Associação Comercial e com os Inventários do Primeiro Ofício, conseguimos reconstituir a trajetória de vida de apenas uma família: a de Ivete Alexandre Saber. Descobrimos mais sobre este núcleo familiar através de um inventário feito por Dona Nair Saber (mãe de Ivete), devido ao falecimento de seu marido, Alexandre Saber, em 26 de agosto de 1940. O pai de Ivete era da Síria (assim como sua esposa) e se dedicava ao comércio em Juiz de Fora. Ao morrer deixou como herdeiros, além da mulher, seis filhos, e Ivete era a quinta filha. São eles: Odette Saber (brasileira, solteira e maior), Salim Saber (brasileiro, solteiro, 19 anos), Linda Saber (brasileira, solteira, 16 anos), Ivete Saber (brasileira, solteira, 12 anos) e José Saber (brasileiro, solteiro, 11 anos). A família possuía uma casa de oito cômodos situada à Rua Américo Luz, 134; um estabelecimento comercial à Avenida Berlim, 417, onde vendia vários produtos como pó de café, toucinho, fumo, linhas, lenços, doces, ou seja, trabalhava com a comercialização de alimentos em geral e utilidades do dia-a-dia. Além desses bens, havia também depósitos no Banco Comércio e Indústria e no Banco de Crédito Real de Minas Gerais no valor de 5:000$000 cada um. A herança foi avaliada em 10:000$000 de réis.298 Porém mesmo o pai de Ivete possuindo estes bens, não encontramos o nome dele na Associação Comercial de Juiz de Fora como seu sócio contribuinte.

A partir dos dados dos três colégios levantados, percebemos que os alunos de origem síria ou libanesa mantiveram um contato com as crianças e os jovens locais por estudarem na mesma escola que estes, já que não havia estabelecimentos árabes em Juiz de Fora. Esta afirmação também é confirmada pelo depoimento do senhor Wilson Coury Jabour, descendente de libaneses e nascido em Juiz de Fora. O senhor Wilson foi aluno em várias escolas da região, junto aos estudantes locais. Segundo senhor Wilson: “(...) estudei no colégio Santos Anjos, depois eu fui para o Academia, depois eu fui para o Granbery. Comecei a estudar, era um curso clássico, não sei, um curso para pré-vestibular. Eu comecei a estudar, depois eu interrompi e fui fazer o curso de técnico em contabilidade. Depois fiz vestibular para a Faculdade de Ciências Econômicas, fui aprovado e não conclui”. 299

298 Arquivo Histórico da Universidade Federal de Juiz de Fora. Inventários do Primeiro Ofício. SABER, Nair.

(inventariante). Alexandre Saber (inventariado), 1940. ID 4956, Caixa: 470-B.

299 Entrevista com o senhor Wilson Coury Jabour , realizada na cidade de Juiz de Fora, no 03 de outubro de

Este contato próximo com indivíduos que possuíam tradições diferentes das suas, provavelmente levou a uma troca cultural entre jovens e crianças juizforanas e aquelas sírias e libanesas. Mas não era só os estudantes que estabeleciam laços com os juizforanos. Os pais destes alunos também se relacionavam com a população da cidade por serem em sua maioria sócios contribuintes da Associação Comercial, por terem os locais como fregueses em suas lojas, por terem vizinhos de outros grupos étnicos, enfim, por conviver cotidianamente em espaços onde os juizforanos e até mesmo imigrantes de outras etnias freqüentavam.

As fontes dos recintos educacionais nos indicaram uma relação mantida entre sírios e libaneses e juizforanos no meio escolar, havendo possíveis trocas culturais entre os dois grupos. Mas e com relação aos casamentos? Estes também eram uma forma de estabelecer vínculos com a população de Juiz de Fora? Eram exógenos? Se a resposta for afirmativa, a partir de quando se tornaram mais freqüentes? Analisando os registros de casamento podemos chegar a algumas conclusões.

No documento julianagomesdornelas (páginas 91-97)