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Guerra Fria, Descolonização e Despertares Sociais e Globais

Capítulo III A independência de Angola

3.2. Guerra Fria, Descolonização e Despertares Sociais e Globais

A sombra de Edward Said74 paira em torno de todos os estudos contemporâneos

acerca do imperialismo. Este crítico faz uma análise penetrante sobre o como de pressupostos condescendentes do "Oriente", infetando o pensamento Ocidental que tem forçado os estudiosos a meditar sobre as desigualdades de poder e preconceitos inscritos nos discursos básicos das Relações Internacionais. Conceitos ocidentais como a democracia, a liberdade e a justiça são, de acordo com este crítico, repletos de profundas suposições acerca de superioridade Ocidental e de subserviênciaOriental. (Suri, 2006: 353).

Culpas inteletuais indicaram, assim, com especial particularidade, fatores como a legitimidade de discursos imperiais que, por sua vez, legitimam práticas imperiais de trabalho

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Direção Geral de Segurança

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Polícia de Segurança Pública de Angola

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Polícia de Informação Militar

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Organização Provincial de Voluntários para a Defesa Civil de Angola

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Chefe de Estado-Maior do Exército

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53 académico (por parte de Said), e ainda que se tenha focado em grande parte do século XIX, acabaria por possuir enormes implicações para a história mundial pós-1945. Dos EUA, de acordo com Said, ressuscitarão todas as ferramentas “orientalistas” de um império repressivo de Guerra Fria. (Ibidem: 353).

É possível verificar-se uma certa deprimência no que respeita às formulações políticas antes atuais, já que é sempre verificado o recurso ao poder e interesse nacional na gestão dos assuntos dos povos inferiores por parte do centro metropolitano. Tal cuidado destrutivo verificar-se-ia, por seu lado, quando as situações se tornam um pouco ásperas. E, por último, um aviso que tem sido rotineiramente seguido por cometer o erro, como testemunham as guerras do Vietname e do Golfo, embora a incrível, se muitas vezes passiva, colaboração com tais práticas por parte de inteletuais, artistas e jornalistas, cujas posições em casa são progressivas e cheias de sentimentos admiráveis, seja o pior cenário. Contudo, o oposto quando se trata do que é feito no exterior em seu nome.

Explicando a Descolonização em termos de Guerra Fria, segundo alguns estudiosos, o silêncio verificado por parte dos povos não-ocidentais recria o domínio orientalista de elites ocidentais. (Ibidem: 354). Referem, assim, críticas da bolsa padrão neste mesmo período. Desafiam, sobretudo, a suposição de núcleo da maioria das análises da Guerra Fria: a luta entre o liberal capitalismo americano, dominando a União Soviética dominada pelo comunismo e estruturando relações entre as sociedades após a II Guerra Mundial. A nova bolsa de estudos no "Terceiro Mundo" dá maior atenção à ideologia, mas não referente à Guerra Fria. Mencionou, em muitos aspetos, suplantando Woodrow Wilson75 e Vladimir Lenin76.

O novo livro de Westad, “A Global Guerra Fria”, dá, portanto, peculiar atenção à enorme bolsa de estudos sobre a Guerra Fria, mas também às críticas levantadas por Said e outros autores. Neste mesmo livro incide uma série de interrogações e interseções históricas cruciais entre esta Guerra, a Descolonização e Despertares Sociais e Globais. (Ibidem: 353- 355).

Entre o Vietname e Angola, os principais Estados comunistas tornaram-se profundamente envolvidos na política local, e muitas vezes nas guerras civis. Receberam pouco retorno tangível sobre os seus investimentos, num momento em que a União Soviética, China e Cuba foram seriamente carentes de recursos em casa.

A bipolaridade da Guerra Fria era de âmbito mundial, e não apenas afetou as relações com sociedades estrangeiras, como também as definições básicas de identidade para os Estados emergentes que, de alguma forma, tivessem de escolher o sistema que iriam adotar. As rivalidades presenciadas entre capitalistas e comunistas inspiraram movimentos políticos revolucionários que, por sua vez, ofereceram quase fontes de assistência estrangeira para figuras, como de Fidel Castro para Ho Chi Minh para Patrice Lumumba, buscando assim construir novos Estados em antigos territórios coloniais. O posto colonial dos regimes refletido em dinâmicas locais não só precedeu à Guerra Fria, como também foram criaturas dessa

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Presidente dos Estados Unidos da América entre 1912 e 1921.

54 mesma Guerra. Na realidade, Fidel de Castro, Ho Chi Minh, Lumumba (líder anticolonial e político congolês), e quase todos os seus correspondentes, acabaram por internacionalizar a rivalidade capitalista-comunista da Guerra Fria na formação dos seus movimentos.

As promessas de liberdade e justiça que dominaram a retórica da Guerra Fria deslegitimaram as realidades de dependência e repressão vividas em muitas sociedades. O posto colonial dos líderes, em parte, importando a retórica revolucionária, atenderam às crescentes expetativas de cidadãos em período Pós-colonial. Pode concluir-se que se as forças da modernização viraram “camponeses em Frenchmen” antes da I Guerra Mundial, as pressões da política da Guerra Fria transformaram antigos súditos coloniais em ativistas globais em meados do século. (Ibidem: 356).

Inspirados, em parte, pelos EUA, os Despertares Sociais e Globais da Guerra Fria, habilitaram ampla oposição às políticas Norte-americanas. Douglas McDonald explica que “Westad”, perseguido por um conjunto de intervenções reformistas nestas áreas e projetado para melhorar as condições locais, herdou, a curto termo, esta defensiva posição. Porém, indicou, ainda, desacreditarem nas reivindicações americanas, a fim de lutarem pela liberdade da democracia, motivando assim figuras locais a olhar para o apoio do bloco comunista. (Ibidem: 356).

Pode, portanto, concluir-se que a Guerra Fria fez o Terceiro Mundo parecer mais importante para os EUA, mas também tornou muito mais difícil os nacionalistas deste mesmo mundo aliarem-se ao Governo dos EUA. Ao contrário do que se verificou nos EUA, em Angola, esta dinâmica apresentou maior evidência. Segundo o livro de Westad, os líderes soviéticos eram muito relutantes comparativamente ao facto de intervir nesta ex-colónia portuguesa. Além disso, também a presença de aproximadamente 30.000 forças cubanas, lutando ao lado de rebeldes pró-comunistas indígenas, sofreu um significativo aumento quanto à pressão de uma semelhante intervenção soviética. No entanto, também os EUA, trabalhando em parte através de forças Sul-africanas na região, intervieram em Angola. Deste modo, líderes soviéticos acabaram por se sentir forçados a aderir a esta Guerra Civil, não devido a qualquer especial estratégia de interesse angolano, mas porque acreditavam na opinião africana, e em outras partes de Terceiro Mundo, nomeadamente de "transformar na sua direção." (Ibidem: 356-357).

Perante este cenário, é possível concluir que a interseção da Guerra Fria, a Descolonização e Despertares Sociais e Globais apresentaram consequências verdadeiramente devastadoras, e isto especialmente nas áreas de conflito e no âmbito do Terceiro Mundo. Rastreando as interseções da Guerra Fria, a Descolonização, e Despertares Sociais e Globais no modelo de Westad, o presente livro oferece três perspetivas conceituais para a internacional história do período pós-1945:

Relativamente à primeira abordagem, é possível confirmar que, tal como em Angola, também a Etiópia mobilizou, a nível político, atores locais, muitas vezes convidados à intervenção das superpotências. A principal conclusão a retirar-se desta primeira abordagem é que a Descolonização era, portanto, em parte, um produto da Guerra Fria.

55 A segunda abordagem incide, essencialmente, na riqueza de disponíveis evidências que, por sua vez, foram uma fonte primária de várias sociedades que revelaram que o poder colonial era notavelmente difuso e multidimensional. Já quanto aos EUA e à União Soviética, as potências militares dominantes no Terceiro Mundo, foram também os que limitações de maior gravidade enfrentaram na sua alavancagem. Porém, no que respeita aos aliados menores, é possível destacar França, Cuba e o Vietname do Norte.

Em terceiro e último lugar, é dada uma especial atenção à formulação e implementação de políticas entre os governos que acabaria por comprometer os binários simples para o padrão da bolsa de Guerra Fria, mas também para as críticas de Said acerca do orientalismo. Pode confirmar-se que a Guerra Fria transcendeu os EUA e a União Soviética, dividindo ainda capitalistas e comunistas neste mesmo contexto, seguindo-se um envolvimento de rivalidades dentro de blocos, bem como entre eles. Incluiu também novos compromissos para o desenvolvimento económico e humano, e a devastadora propagação da violência. Contudo, o mais importante a ter em conta nesta terceira abordagem é, sem dúvida, o facto de os Estados desta Guerra e sociedades em conjunto em todo o mundo, se encontrarem mais conetados do que propriamente divididos entre si quanto à Guerra.

A partir da exploração da origem de novas fontes disponíveis a partir das diversas sociedades verificadas, os estudiosos começam a reconhecer que a Guerra Fria, a Descolonização e os Despertares Sociais e Globais tiveram muitas interseções complexas e reais que desafiam, por seu lado, uma fácil categorização. (Ibidem: 360-361).

Já segundo Arne Westad indica em “A Guerra Fria Global”, esta Guerra trata-se de um marco esforço nesse sentido. É uma modelar história de nível internacional na sua base empírica e na sua conceituação. É prova de que a pesquisa académica sobre a Guerra Fria está apenas a começar.