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6 RESULTADOS E DISCUSSÕES

6.2 Concentração de mercúrio total e os aspectos biológicos

6.2.1 Hábito alimentar e posição trófica

As concentrações de mercúrio total observadas são apresentadas na tabela 6.3 e 6.4. A maior concentração observada foi para a espécie Elops saurus (109 ± 15 ng.g-1), Menticirrhus americanus (104 ± 30 ng.g-1) entre as espécies de

peixes capturadas, já para os invertebrados, as espécies de siri Callinectes bocourti (201 ng.g-1) e Callinectes larvatus (104 ± 43 ng.g-1) foram as que apresentaram os

maiores valores. Em ambos os grupos (peixes e invertebrados) as espécies de hábito carnívoro e elevado nível trófico apresentaram as maiores concentrações. Tabela 3 - Nome científico, área de coleta, hábito alimentar, posição trófica e concentração de mercúrio apresentada pelas espécies de peixes capturadas na região do Baixo Jaguaribe.

Nome Científico Comprimento

(cm) Alimentar Hábito Trófico Nível [Hg]Total (ng.g-1)

Elops saurus 24,7 ± 2 Carnívoro 3,5 109 ± 15

Menticirrhus

americanus 13,5 ± 1 Carnívoro 3,4 104 ± 30

Lutjanus jocu 12,8 ± 2 Carnívoro 3,7 84 ± 34

Lutjanus synagris 18 ± 4,4 Carnívoro 3,9 61 ± 15

Cathorops spixii 26,7 ± 5 Onívoro 3,3 50 ± 16

Centropomus

parallelus 18,7 ± 5,5 Carnívoro 3,8 39 ± 12

Eugerres brasilianus 11,5 ± 1 Onívoro 3,3 37 ± 10

Mugil curema 22,4 ± 3,4 Iliófago 2 23 ± 13

Gobionellus

Tabela 4 - Nome científico, área de coleta, hábito alimentar, posição trófica e concentração de mercúrio apresentada pelas espécies de invertebrados capturadas na região do Baixo Jaguaribe.

Nome Científico Peso (g) Alimentar Nível Trófico [Hg]Total (ng.gHábito -1)

Callinectes bocourti N.D. Carnívoro 3,8 201

Callinectes larvatus 74 ± 48 Carnívoro 3,8 104 ± 43

Callinectes danae N.D. Carnívoro 3,8 87 ± 45

Mytella charruana 1,2 ± 0,4 Filtrador 2 52 ± 8

Anomalocardia brasiliana 4,4 ± 1,4 Filtrador 2 51 ± 14

Pugilina morio 55,5 ± 8,3 Carnívoro 3 49 ± 12

Callinectes exasperatus N.D. Carnívoro 3,8 23 ± 3

Litopenaeus vannamei 9,2 ± 5,2 Detritívoro 2 13 ± 4

E. saurus e M. americanus apresentaram elevadas concentrações de

mercúrio total, em relação às outras espécies de peixes analisadas (Tabela 6.3), o que se deve, provavelmente, a dieta apresentada por essas espécies, sendo composta principalmente por peixes e crustáceos que estão associados ao sedimento (SANTOS-MARTÍNEZ & ARBOLEDA, 1993; RONDINELI et al., 2007; TURRA et al., 2012). Portanto, o hábito alimentar é um dos fatores determinantes, juntamente da posição trófica apresentada pela espécie, nas concentrações de mercúrio total presente nesses organismos (VAN WALLEGHEM et al., 2013; GOUTTE et al., 2015). Por conseguinte, espécies que apresentem hábito carnívoro tendem a apresentar maiores concentrações que espécies onívoras, detritívoras e/ou herbívoras (SOARES et al., 2016).

Centropomus parallelus, espécie de comprimento reduzido, que segundo

Muller et al. (2015) corresponde a fase juvenil, apresentou uma reduzida concentração de mercúrio total em relação aos outros carnívoros devido sua dieta, em seus primeiros estágios do ciclo de vida, baseada em pequenos peixes ou larvas de peixes, pequenos crustáceos, poliquetos e pequenos insetos, organismos de baixa concentração de mercúrio (ITAGAKI, 2005; TONINI et al., 2007; CONTENTE, 2008).

Entre os invertebrados, as maiores concentrações apresentadas pelos crustáceos do gênero Callinectes, possivelmente se deve a predisposição de acumular metais presentes na água e/ou sedimento por absorção como também

através da ingestão, aliada a capacidade do metil mercúrio, que representa 90% em relação à concentração de mercúrio total presente em espécies carnívoras, de acumular nos tecidos e seu longo tempo de residência nos organismos (REICHMUTH et al., 2010), são, possivelmente, fatores que contribuem para a elevada concentração de mercúrio total apresentada pela maioria das espécies do gênero Callinectes (C. bocourti, C. larvatus e C. danae), conforme observado na Tabela 6.4.

Contudo, a dieta de Callinectes exasperatus composta, principalmente, por pequenos crustáceos e moluscos é um dos fatores que contribuem para sua reduzida concentração de mercúrio total, além da disponibilidade de alimento presente na zona de coleta dessa espécie (CARVALHO & COUTO, 2015).

As espécies filtradoras Mytella charruana e Anomalocardia brasiliana, apesar de estarem mais próximas a base da cadeia trófica, apresentaram concentrações de mercúrio total (52 ± 8 ng.g-1 e 51 ± 14 ng.g-1, respectivamente)

superiores a outras espécies de invertebrados pertencentes a posições tróficas superiores (Tabela 6.4), como os carnívoros Pugilina morio (3) e Callinectes

exasperatus (3,8). Tal fato, possivelmente, esteja relacionado a sua capacidade de

incorporação de metais por assimilação de espécies químicas dissolvidas na água, associadas ao material particulado em suspensão e/ou incorporada ao sedimento (TORRES, 2009). Outro fator é a proporção de metilmercúrio em relação a concentração de mercúrio total presente nesse grupo, que é relativamente baixa, apresentando um valor médio de 30 a 50%, quando comparada a espécies, presentes em outros níveis tróficos, que incorporam em sua musculatura apenas o mercúrio em sua forma orgânica (MIKAC et al., 1996; CLAISSE et al.,2001; APETI et al., 2012; BRIANT et al., 2017).

P. morio e C. exasperatus obtiveram concentrações inferiores aos

invertebrados filtradores, o que pode estar ligado a fatores endógenos e exógenos. A espécie P. morio tem sua dieta composta por bivalves, espécies filtradoras, que apesar de apresentarem concentrações de mercúrio total superiores em relação a essa espécie possuem reduzida razão metilmercúrio/mercúrio total, como foi mencionado anteriormente (NOGUEIRA, 2010).

As espécies iliófagas, entre os peixes, e detritívoras, entre os invertebrados, foram as que apresentaram as menores concentrações de mercúrio total, o que está ligado diretamente a sua dieta constituída, basicamente, de flora

algal, microcrustáceos, poliquetos, restos orgânicos e sedimentos inorgânicos, sendo considerada uma espécie pertencente ao grupo dos consumidores primários. A espécie iliófaga Mugil curema tem sua dieta composta de microalgas dinoflageladas e diatomáceas, copépodos e detritos (RAMANATHAN et al., 1980; VASCONCELOS FILHO, 1990; FRANCO et al., 1992; DEUS et al., 2007).

Gobionellus oceanicus alimenta-se, assim como a espécie M. curema, de

diatomáceas, microcrustáceos e moluscos, logo também pertencendo ao grupo dos consumidores primários (VASCONCELOS FILHO, 2009).

Ao analisar a posição trófica apresentada por cada espécie, apesar de algumas espécies de elevado nível trófico apresentarem concentrações de mercúrio inferiores a espécies de menor nível trófico, é possível notar um crescimento nas concentrações de mercúrio com aumento da posição trófica das espécies estudadas (Figura 6.1), conforme observado nas sete espécies que apresentaram as maiores concentrações, dispostas na tabela 6.3 e 6.4: C. bocourti (3,8), C. danae (3,8), C.

larvatus (3,8), M. americanus (3,4), E. saurus (3,5), L. jocu (3,7)e L. synagris (3,9).

Figura 17 - Representação gráfica da relação concentração de mercúrio total com posição trófica ocupada pelas espécies em estudo.

A capacidade de bioacumulação apresentada pelo mercúrio orgânico, garantida pelo seu elevado tempo de residência no organismo, sua característica lipossolúvel, que contribui no aumento no transporte biológico e sua afinidade aos radicais sulfidrílicos das proteínas, dificultando, assim, sua eliminação (WHO, 1976; CRAIG, 1985; MOREL et al., 1998; SELLANES et al., 2002), possibilitam que ocorra

y = 6.9004e0.6133x R² = 0.4085 0 50 100 150 200 250 1 2 3 4 5 [Hg ] T ota l (n g.g -1) Nível trófico

o processo de biomagnificação desse elemento ao longo das cadeias tróficas, logo, espécies encontradas no topo da cadeia, de hábitos alimentares, essencialmente, carnívoros, apresentarão concentrações mais elevadas em relação a espécies próximas a base, como pode ser observado na figura 6.1 (KASPER et al., 2009).

Características morfológicas como o formato e posição da boca, a dentição, o tamanho dos indivíduos, associada às características fisiológicas e ambientais (ciclo migratório, idade, atividade reprodutiva, sexo, ciclo de vida, distribuição e disponibilidade do alimento) contribuem no hábito alimentar e posição trófica apresentada por cada espécie, podendo variar para cada etapa do seu ciclo de vida, a qual os peixes juvenis que apresentam uma alimentação, basicamente, composta por pequenos crustáceos substituem por uma dieta essencialmente piscívora em sua fase adulta, levando a ampla dispersão dos pontos apresentados na figura 6.1, principalmente em espécies carnívoras, em espécies de diferentes tamanhos, fases da vida distintas e amplo espectro alimentar (BROOKS & DODSON, 1965; WERNER, 1974; BOND, 1979; MAGNAN & FRITZGERALD, 1984; WERNER et al., 1984; KEAST, 1985; WINEMILLER, 1989; LOWE-McCONNELL, 1999).

O tipo de dieta apresentada por cada espécie coletada, que podem ser definidas em três grupos: generalistas, especialistas e oportunistas, fator esse dependente das condições fisiológicas, ecológicas e ambientais, também pode contribuir na especificação do hábito alimentar e na posição trófica e, com isso, influenciar nas concentrações de mercúrio incorporado (GERKING, 1994).

Contudo, embora haja espécies em posições tróficas mais elevadas apresentando menores concentrações de mercúrio total em relação a espécies de posições tróficas inferiores, uma análise das variações nas concentrações para cada hábito alimentar das espécies coletadas, como pode ser observado nas tabelas 6.5, para os peixes, e 6.6, para os invertebrados, e em suas respectivas representações gráficas (figuras 6.2 e 6.3), confirmou a importância do hábito alimentar na determinação das concentrações de mercúrio presente nesses organismos. Nos peixes, os carnívoros (76 ± 3 ng.g-1) foram os que apresentaram as maiores

concentrações, seguido de onívoros (45 ± 3 ng.g-1) e iliófagos (19 ± 1 ng.g-1), com

diferenças significativas entre as faixas de concentração obtidas (F = 28,15, p < 0,05).

Em moluscos e crustáceos, o mesmo resultado, apresentado pelos peixes, foi observado, havendo diferença significativa entre os hábitos alimentares (H = 67,2, p < 0,05). Entretanto, entre carnívoros (81± 5 ng.g-1) e filtradores (53 ± 2

ng.g-1), não houve diferença significativa (p > 0,05) nas concentrações de mercúrio,

o que pode estar relacionado a proporção mercúrio total/metilmercúrio, que em organismos filtradores, como a A. brasiliana e M. charruana, é baixa (30 a 50%) em relação a proporção encontrada em carnívoros (80 a 90%) (APETI et al., 2012; FERREIRA et al., 2015; BRIANT et al., 2017).

Tabela 5 - Hábito alimentar dos peixes, número amostral, nível trófico médio, comprimento e peso médio e desvio padrão, concentração de mercúrio total médio e desvio padrão. Hábito Alimentar n Nível Trófico Médio Comprimento (cm) Peso (g) [Hg] Total (ng.g -1)

Média Desvio Média Desvio Média Desvio

Carnívoro 23 3,7 16,4 4,9 51,8 38,3 76,3 2,5

Onívoro 23 3,3 26,9 4,7 203,4 106,4 45 2,7

Iliófago 26 2,6 19,1 5,5 73,7 70,6 19,4 1,3

Figura 18 - Representação gráfica (bloxspot) das variações na concentração de mercúrio nas espécies com hábitos alimentares distintos (carnívoros, onívoros e iliófagos), abordando o grupo dos peixes.

Tabela 6 - Hábito alimentar dos invertebrados, número amostral, nível trófico médio, comprimento e peso médio e desvio padrão, concentração de mercúrio total médio e desvio padrão. Hábito Alimentar n Nível Trófico Médio Comprimento (cm) Peso (g) [Hg] Total (ng.g -1)

Média Desvio Média Desvio Média Desvio

Carnívoro a 24 3,6 9,8 1,4 67 32,9 81,2 4,9

Filtrador a 31 2 2 0,2 3,3 1,9 53 1,9

Detritívoro b 38 2 10,5 2,1 8 5,6 12,7 0,3

Figura 19 - Representação gráfica (bloxspot) das variações na concentração de mercúrio nas espécies com hábitos alimentares distintos (carnívoros, filtradores e detritívoros), abordando o grupo dos moluscos e crustáceos.

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