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CAPÍTULO 2 – PROJETO POLÍTICO-PASTORAL DA DIOCESE DE

2.2 D HELMEL: AGENTE DE LIDERANÇA NAS ASSEMBLEIAS DA CNBB

Em 1952, a CNBB organizou-se no Brasil, nos parâmetros da Ação Católica, visando a articulação e troca de experiências entre os bispos brasileiros. Com a criação da CNBB, facilitou-se a organização da Igreja com as ações tomadas pelos bispos, a fim de aplicar a doutrina para os fiéis. No Paraná, houve o enlace das dioceses, ou seja, a ação dos bispos paranaenses foi articulada numa espécie de “rede”, na qual, prelados discutiam sobre a situação do catolicismo no Brasil e no Estado, além de planejarem estratégias pertinentes ao emprego da doutrina e dos

moldes adotados pela Igreja para atingir o objetivo da evangelização católica no mundo social.

Nas reuniões e assembleias realizadas pela Igreja Católica em acordo com a CNBB, os representantes das dioceses (bispos) debatiam sobre temas relevantes que permeavam o cenário cultural/social do Brasil. A DG participou de assembleias e reuniões, que visavam fomentar o debate e a produção de conhecimento que, posteriormente, seriam readaptados para o trabalho pastoral.

Porém, os bispos do Paraná resistiram em entrar em acordo coma CNBB, pelo fato de não aceitarem com tanta facilidade à sua organização. Zulian (2009, p. 356-357) afirma que o Episcopado paranaense teve uma reação crítica e desconfiada, devido a presença de relatores, que configuravam acessórias oriundas de outras regiões aprovada pela CNBB. Isso contrariou os bispos do Paraná, pois os mesmos entendiam esse fato como intromissão e reagiram com muitas reservas diante da proposta da CNBB.

Em Guarapuava, o bispo atuou na diocese, buscando participar dos assuntos de interesse discutidos nas assembleias. Um desses eventos realizou-se em Curitiba (Mossunguê), de 10 a 14 de setembro de 1982, a XXX Assembleia da

Igreja de todo o Paraná – XXX Assembleia do Regional Sul II, da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil. Nesse encontro, o objetivo foi discutir sobre o

engajamento dos bispos e suas Igrejas no Paraná, contando com a liderança dos prelados, representantes dos sacerdotes, religiosos e leigos de todas as dioceses. (BOLETIM DIOCESANO, out. 1982, p. 3). Nessa assembleia, o representante dos leigos da DG foi Itamar, integrante do Movimento Juventude Guarapuavana – MOVIJUG, contando também com a presença de D. Frederico Helmel e Pe . Attílio. (BOLETIM DIOCESANO, out. 1982).

Figura 9 – D. Helmel no encontro em Curitiba, com a Pastoral da Juventude – maio de 1982

Fonte: Boletim Diocesano (out. 1982). Nota: D. Helmel está em pé, à direita.

Trinta anos depois, inseridos em um novo contexto, não mais de resistência e a problemas internos da CNBB, os bispos do Paraná escreveram um texto intitulado Nota da Igreja no Paraná em favor à CNBB, de setembro de 1982, no qual, o posicionamento dos bispos estava de acordo com a proposta da CNBB, esta relacionada pela defesa dos direitos humanos. Os bispos se pronunciaram a favor, tendo em vista, que grupos de pessoas ou setores inconformados (expressão do documento) criticavam a postura da CNBB e o trato com a questão social. Abaixo, citamos o documento em defesa da organização da CNBB:

Nós, bispos, sacerdotes, religiosos e leigos, reunidos na XXXª Assembléia do Regional Sul II da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, nos dias 11 a 14 de setembro de 1982, em Curitiba, avaliando a caminhada pastoral orgânica da Igreja no Paraná e iniciando um método de planejamento participativo, com vistas ao VIII Plano deste Regional, colocamo-nos em comunhão e solidariedade com a CNBB, seja a sua Presidência ou os Pastores em particular, face a campanha difamatória encetada por setores inconformados com as recentes conquistas sociais de nosso povo. Afinal, com o coração amargurado, temos assistido a uma serie crescente de atitudes escusas, praticadas por grupos que se acobertam no anonimato e na impunidade, agora com o objetivo principal de desmoralizar a Igreja e desarticular o trabalho de educação e conscientização que Ela desenvolve no meio do povo, a fim de que ele próprio construa sua História, livre de tutelas e autoritarismo de toda espécie. Além de procurar atingir os membros da Presidência da CNBB e sua linha pastoral, esses atos difamatórios se dirigem também as Igrejas particulares, geralmente com a utilização de documentos apócrifos ou falsificados. Foi o que aconteceu

com D. Aldo Mongiano, Bispo de Bela Vista, em Roraima, através de obscurantista publicação em quadrinhos, com D. Eugênio Araújo Sales, Cardeal Arcebispo do Rio de Janeiro, e com D. Benedito Ulhoa Vieira, Bispo de Uberaba, através da falsificação das respectivas cartilhas de orientação política de suas áreas pastorais; com D. Paulo Evaristo Arns, Cardeal Arcebispo de São Paulo, através da falsificação do jornal “O São Paulo”, além de caluniado, juntamente com outros bispos, por hedionda publicação em forma de cordel, tendo indecentes desenhos e conotações, com o indevido emprego dos logotipos das Edições Paulinas e Vozes em documentos forjados, bem como adulterações de boletins editados por regionais e dioceses [...] falsificação do próprio boletim semanal da CNBB (noticias), de 13 de agosto passado, e a ocorrência de violação de correspondências, principalmente de pessoas ligadas a área religiosa [...] ao mesmo tempo em que condenamos tais posições e atitudes, reafirmamos as solicitações de D. Luciano Mendes de Almeida, secretário geral da CNBB, para que as autoridades constituídas não meçam esforços para pôr um paradeiro em tais ações covardes e inconstitucionais [...] enfim, sugerimos que seja ampliada a divulgação e reflexão desse pronunciamento, fazendo-se o uso do mesmo em celebrações, nas reuniões dos grupos e comunidades de base, dos movimentos e associações, bem como nos meios de comunicação de que dispomos. (BOLETIM DIOCESANO, nov. 1982, p. 4, grifos nossos).

No documento acima, observamos que o corpo episcopal se pronunciou diante de críticas realizadas ao trabalho da CNBB. Na parte sublinhada do texto, verificamos que a intenção desses grupos buscava desarticular a CNBB, ou seja, desqualificar o trabalho educativo da Igreja Católica perante a opinião pública.

Scott Mainwaring (1989) analisou o aspecto entre a Igreja Católica e a Política no Brasil, entre 1916 a 1985. Sobre as mudanças na Instituição Católica, afirma que a Igreja, como qualquer outra instituição social, é influenciada por mudanças sociais ocorridas ao longo da história. Assim, “[...] práticas sociais e as identidades institucionais não se modificam porque surgem ideias novas, mas, sim, porque o conflito social leva a uma nova maneira de se compreender a realidade” (MAINWARING, 1989, p. 25). Sobre a crise na Igreja Católica no Brasil, após a Segunda Guerra Mundial, as sociedades foram atravessadas por mudanças sociais, desarticulando a realidade social existente. Na Igreja Católica, mudanças ocorreram com o comportamento dos fiéis, muitos deixaram de frequentar as missas, crise nas vocações e a perda de influência entre as classes dominantes. Além dessas, o protestantismo e o espiritismo tornaram-se religiões presentes no cenário religioso social, o que, de certo modo, diminuiu o prestígio da Igreja Católica.

Destarte, o funcionamento do Partido Comunista no Brasil até 1964, criou na Igreja um período de insegurança, principalmente devido aos valores adotados pelos comunistas. A apreciação dos preceitos comunistas significava um sinal de

decadência da Igreja, principalmente pela presença significante do Partido Comunista no Rio de Janeiro, em 1946. (MAINWARING, 1989).

Mainwaring (1989) indica que, entre 1930 e 1964, os comunistas foram a principal ameaça dentro da Igreja e, em 1937, foi elaborado um documento contra os ideais comunistas49. Em 1955, havia três grupos distintos presentes na Igreja Católica, divididos entre posicionamentos diferentes, como os tradicionalistas que se sentiam ameaçados pela esquerda e apoiavam menos o trabalho social da Igreja, acreditando na presença da instituição no mundo social. Os modernizadores conservadores acreditavam na mudança da Igreja para atingir os católicos do contexto moderno. Os reformistas acreditavam em uma proposta evangelizadora mais eficiente, com atitudes educativas mais progressistas, ou seja, eram adeptos de uma ação educativa mais eficaz. (MAINWARING, 1989, p. 57).

Lucelmo Lacerda Brito (2010) enfatiza que as Conferências de Medellín (1968) e Puebla (1979) foram momentos explosivos entre conservadores e progressistas. Logo após a realização do Concílio Vaticano II, houve a necessidade de se discutir melhor os documentos conciliares, sob a ótica da América Latina. Em Puebla, 1979, a ala conservadora foi apoiada pelo Papa João Paulo II, que assumiu o Vaticano em 1978. O Papa combateu três correntes de pensamento: o Comunismo, a Teologia Liberal europeia e Teologia da Libertação. A primeira viagem pastoral do Papa foi para o México, na Conferência de Puebla. Nesse momento, houve o primeiro embate público entre conservadores e progressistas. De acordo com Bernstein e Politi (1996, p. 216 apud BRITO, 2008, p. 34), no discurso realizado na abertura da Conferência de Puebla, esse dividido em quatro partes e com duração de uma hora, destinou as duas primeiras partes a evitar uma aproximação da Igreja com a esquerda, ou melhor, com a Teologia da Libertação, e já na terceira parte demonstrou um apreço pela justiça social.

A participação de D. Frederico na CNBB – Paraná, como Presidente da Comissão Teológica, principalmente, o posicionamento de seus ideais em concordância com a mesma, indica que os assuntos que foram debatidos, bem como a elaboração de documentos norteadores, denotam a ação de liderança do bispo no campo religioso católico. As discussões realizadas pelos prelados estiveram circunscritas na conjuntura oscilante de posicionamentos ideológicos, ou

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seja, com vertentes diferentes, os bispos realizavam seu trabalho pastoral de acordo com o ideal de seu grupo.

Na DG, em maio de 1986, D. Frederico escreveu um artigo referente ao envolvimento dos bispos na CNBB, o que chamou a atenção do Papa João Paulo II. De acordo com D. Frederico, houve rumores de que a convocação dos bispos para Roma foi devido a uma discordância entre o entendimento de Igreja entre o Papa e os bispos brasileiros, deixando a Igreja em evidência. Na Assembleia Geral dos Bispos, realizada em Itaici-SP, em abril de 1986, o Cardeal-Prefeito Bernardim Gantin, trouxe de Roma uma carta escrita pelo Papa João Paulo II e entregou aos bispos do Brasil nesta assembleia. Em Abril, D. Frederico redigiu sua mensagem aos fiéis da diocese utilizando fragmentos dessa carta, a fim de discorrer sobre a Teologia da Libertação, fazendo uma espécie de divulgação da mensagem do Papa:

Foram os senhores mesmos (bispos) que afirmaram explicitamente que no fundo dos problemas mais sérios que enfrentam, está a questão eclesiológica e que a solução dos mesmos problemas passa forçosamente por uma justa e bem fundada concepção da Igreja [...] a Igreja é antes de tudo um mistério ... um prolongamento da missão do Verbo Encarnado. Não pode ser definida a partir de categorias puramente humanas e racionais (sócio-políticos) [...] a Igreja é o mistério da salvação que também está a serviço do homem! Faz parte pois da missão da Igreja preocupar-se das questões que envolvem o homem, como são as coisas sociais e sócio- políticas. Nisto deve haver uma nítida distinção entre o que é função dos leigos comprometidos nas tarefas temporais e o que é função dos Pastores, formadores dos leigos, para as suas tarefas. Não cabe a Igreja indicar soluções técnicas..., mas iluminar a busca das soluções à luz da fé. (JOÃO PAULO II, apud BOLETIM DIOCESANO, maio 1986, p. 2).

O que estava sendo discutido era a prática da Teologia da Libertação, esta voltada para o lado social da Igreja, com o engajamento dos cristãos na luta de classes.

A postura da Teologia da Libertação foi analisada por D. Frederico no artigo de outubro de 1979. Nesse artigo, fez explanações sobre as características dessa corrente de pensamento social, focando o contexto histórico da América Latina. Na sua avaliação, indicou alguns posicionamentos contrários à Teologia da Libertação.

É verdade que a salvação anunciada por Cristo não se refere apenas aos valores espirituais. O cristão deve encarnar também os princípios de fraternidade dentro da sociedade em que vive [...] deve-se observar, porém, o seguinte: o cristianismo não pode ser reduzido a um sistema moral ou de ação social. A primeira opção do cristão é sempre a fé! Só em função desta poderá conceber programas políticos e sociais. Com outras palavras: A mensagem da salvação cristã não se identifica com a libertação proposta pelas correntes políticas. Isto não quer dizer que o cristão deve deixar de se interessar pela justiça social, mas que não veja nela uma solução “mágica”.

Que os homens trabalhem com afinco em prol de um mundo melhor, mas que não se iludam a respeito do resultado. O pecado continua! A experiência do mundo atual nos ensina que nenhum sistema social satisfaz plenamente. A figura de um Jesus político é desmentida pela própria Bíblia. Sem dúvida, Jesus teve por mira fundar um reino, - o reino de Deus. “meu reino não é deste mundo. Dai a César o que é de César e a Deus o que é de Deus”. É importante, pois, estudarmos o Evangelho para cumprirmos a nossa verdadeira missão de cristãos na América Latina. (BOLETIM DIOCESANO, out. 1979, p. 1).

Nesse artigo, escreveu sobre a Teologia da Libertação, não a aceitando como fundamento religioso. Voltando à resposta do Papa aos bispos do Brasil, quando o pontífice afirma que o problema da Igreja é um problema eclesiológico, referiu-se às concepções divergentes do posicionamento social e político da Igreja na América Latina. Em ambas as visões de Igreja, de D. Frederico e Papa João Paulo, a Igreja é antes de tudo o espaço que deve cultivar a fé do católico. Quando o Papa citou o Evangelho, afirmou categoricamente que o reino proposto por Deus não está neste mundo dos homens, direcionando a postura da Igreja, que deve pensar primeiramente nas soluções dos problemas sociais advindas da fé.

No mesmo mês de maio de 1986, aconteceu em Guarapuava um encontro entre os bispos da Província Eclesiástica. Essa reunião contou com a participação dos seguintes bispos: D. Frederico Helmel (Guarapuava); D. Pedro Fedalto, D. Albano Cavallin e D. Ladislau Biernaski (Curitiba); D. Walter Ebjer (União da Vitória); D. José Alves da Costa (Bispo Auxiliar de Ponta Grossa) e D. Bernardo (Paranaguá). (BOLETIM DIOCESANO, jun. 1986, p. 1). Esse evento evidenciou mais um encontro de trabalho entre as dioceses do Paraná. A escolha por Guarapuava, ao sediar a reunião, pode ter sido decorrência do cargo exercido por D. Frederico na CNBB do Paraná.

Quais seriam os temas ou a pauta desse evento que reuniu importantes prelados? A primeira questão foi organizar critérios comuns de pastoral. O segundo foi discutir temas relevantes na atuação da Igreja, como a Família no Mundo de Hoje; presença dos leigos na política; CEB‟s e liturgia. Sobre a família, o foco das discussões pautou-se na natalidade, filhos e planejamento familiar. Coube aos leigos a explanação sobre o método natural Billings, advertindo-se da importância de centros difusores do método natural às famílias católicas. (BOLETIM DIOCESANO, jun. 1986, p. 1).

Por meio dessas observações, podemos concluir que a preocupação dos bispos era manter a postura da Igreja comprometida com as preocupações

correlatas à formação da família, como prevenir a gravidez sem métodos contraceptivos, para não violar os preceitos da moralidade católica, uma estrutura que desse respaldo à organização familiar, bem como em discutir o papel dos leigos e a função espiritual da própria Igreja.

2.3 D. ALBANO CAVALLIN: BREVE HISTÓRIA DA TRAJETÓRIA DO 2º BISPO DE