• Nenhum resultado encontrado

VI. Efeitos secundários

3. Tipos de Efeitos Adversos

3.1. Hematológicos/ Mielossupressão

Secundariamente à administração de quimioterápicos podem ocorrer efeitos tóxicos na medula óssea que resultam em mielossupressão. Habitualmente o prognóstico é bom e a recuperação rápida sendo que, a maioria dos animais, não apresenta sinais clínicos. Embora as células estaminais e precursores das células hematopoiéticas sejam as células mais sensíveis à quimioterapia na medula óssea, as mais diferenciadas não são afetadas e, por essa razão, vão providenciar células sanguíneas maduras ao organismo nos primeiros 5 a 10 dias após as sessões. Este fator, aliado ao tempo de vida do tipo de célula sanguínea, permite definir o nadir ou o ponto mais baixo da contagem de células no sangue, para cada composto (Frimberger, 2005). O conhecimento dos diferentes tempos de vida das diferentes células torna possível prever o tempo de ocorrência dos vários efeitos adversos da depressão medular. Desta forma, enquanto os neutrófilos têm um tempo de semivida em circulação no cão e no gato de horas e, por isso, o seu nadir irá ocorrer cerca de 5 a 10 dias após a sessão, já as plaquetas têm aproximadamente 10 dias de tempo de semivida, ocorrendo o seu nadir entre a primeira e a segunda semana após a sessão. Os eritrócitos têm cerca de 120 e 70 dias de tempo de semivida no cão e no gato respetivamente, o que torna a anemia um efeito adverso raro e, normalmente, sem significado clinico (Frimberger, 2005).

A sequela mais perigosa e potencialmente fatal da mielossupressão, principalmente da neutropenia, é a ocorrência de sepsis. A monotorização cuidada da contagem de leucócitos torna-se assim crucial para o início da instituição de terapêutica, bem como para a potencial interrupção dos ciclos de quimioterapia (Coppoc, 2009). Assim como as células maturas, as células estaminais hematopoiéticas são na sua maioria não proliferativas e, portanto, relativamente resistentes aos efeitos dos quimioterápicos. Quando existe perda de proliferação dos percursores celulares, as células estaminais iniciam rapidamente a divisão,

24

de modo a substituírem as células perdidas. Se ocorrer uma segunda administração de quimioterápicos mielossupressores, enquanto este processo decorre, poderá ocorrer uma grave e prolongada mielossupressão, devido à destruição das células estaminais hematopoiéticas (Frimberger, 2005). O correto espaçamento no tempo das sessões de quimioterapia e o balanço da toxicidade secundária, nunca utilizando conjuntamente fármacos fortemente mielossupressores, evita o decorrer deste processo (North & Banks, 2009).

3.1.1. Neutropénia

A neutropénia ligeira é um efeito secundário expectável da quimioterapia, sendo, frequentemente, o fator limitante da dose do fármaco (Dobson & Lascelles, 2011). A neutropénia varia desde clinicamente silenciosa até potencialmente fatal, dependendo a gravidade da dose, do fármaco e do individuo (Thamm & Vail, 2007). Habitualmente, em contagens de neutrófilos superiores a 1000 células/µl o risco de infeções é reduzido (Vail, 2009). No entanto, a possibilidade de ocorrência de sepsis é agravada com a sobreposição de efeitos gastrointestinais à neutropenia. A translocação microbiana ocorre como resultado do aumento da permeabilidade epitelial, consequente da destruição da mucosa intestinal (Richardson & Dobish, 2007).

Como referido anteriormente, a neutropénia ocorre habitualmente entre 7 a 10 dias após a sessão e, em casos de administração de vimblastina, ocorre entre 4 a 5 dias após a sessão (Vail, 2009). Secundariamente à administração de carboplatina, pode ocorrer até 2 a 3 semanas após a sessão (Kisseberth, et al., 2008).

Diferentes autores classificam a neutropenia e sua gravidade em diferentes graus e classes, aconselhando diferentes abordagens aos doentes. O autor Vail (2009) dividiu a classificação em neutropénia induzida pela quimioterapia e em neutropénia febril. Na primeira categoria, incluem-se os animais com contagens de neutrófilos superiores a 1000 células/µl que não requerem tratamento. Animais com contagens inferiores a 1000 células/µl, assintomáticos, são considerados com neutropénia moderada, recomendando o autor a realização de antibioterapia por via oral, com antibióticos de largo espectro, mas que salvaguardem a microbiota intestinal anaeróbia. A hospitalização não é aconselhada, uma vez que o risco de exposição a bactérias nosocomiais ultrapassa os benefícios que a hospitalização poderia trazer. Na segunda categoria estão incluídos os doentes sintomáticos, normalmente com contagens de neutrófilos inferiores a 500 células/µl (Vail, 2009). É de notar que nem todos os animais em sepsis irão apresentar febre, uma vez que animais com neutropénia grave podem não conseguir produzir uma resposta inflamatória (Vail, 2009; Dobson & Lascelles, 2011). É aconselhada hospitalização, fluidoterapia com cristaloides, antibioterapia intravenosa, de largo espectro que inclua anaeróbios. Podem ser instituídas associações de penicilina com aminoglicosídeos, trimetoprim e sulfametoxazol ou cefalosporinas de primeira

25

geração em conjunto com fluoroquinolonas. Os antipiréticos são desaconselhados, uma vez que dificultam a interpretação da verdadeira resposta ao tratamento (Vail, 2009).

Por seu lado, Dobson e Lascelles (2011) classificam como neutropénia ligeira contagens de neutrófilos inferiores a 2000-2500 células/µl e aconselham a suspensão da sessão. Aconselham também a instituição de antibioterapia profilática em animais assintomáticos com contagens inferiores a 1500 neutrófilos/µL, antibioterapia em animais febris com contagens de neutrófilos de 2000-1000 células/µL e hospitalização em contagens inferiores em animais febris e sintomáticos. O tratamento deverá incluir a correção dos desequilíbrios eletrolíticos e dos défices de hidratação, antibioterapia de acordo com a sensibilidade detetada em cultura e monotorização cuidada da evolução.

A utilização de antibioterapia profilática é reservada para animais assintomáticos com neutropenia (Vail, 2009). Um trabalho realizado por van de Wetering e outros autores (2005), que reuniram os estudos realizados em medicina humana, revelou que aquela administração em doentes oncológicos é clinicamente efetiva. No entanto, a sua utilização é controversa, sendo a possibilidade da ocorrência de resistências teoricamente uma possibilidade. Segundo Britton, Kelleher, Gregor e Sorenmo (2012), a utilização profilática de antibiótico não foi relacionada com o tempo de hospitalização, o que sugere que a sua utilização não aumenta o risco de desenvolvimento de infeções resistentes em animais com neutropenia induzida por quimioterapia.

A redução da dose dos fármacos quimioterápicos deve ser ponderada nas sessões seguintes aos episódios de neutropenia, tendo esta decisão que ser pesada face à importância da intensidade da dose e dos seus efeitos anti tumorais. Alguns autores aconselham a redução da dose em 20% em animais cujo nadir atingir valores inferiores a 1000 neutrófilos/µl, outros apenas nos casos em que a contagem no nadir é inferior a 500 neutrófilos/µl e aliada à ocorrência de sepsis (Thamm & Vail, 2007).

A utilização de fatores de estimulação de colónias de granulócitos é algo controversa. A recomendação da sua administração é dependente dos clínicos e autores, aconselhando alguns a utilização profilática, o uso em doentes com neutropenia febril ou somente em casos de neutropenia grave que persiste mais de 72 horas (Thamm & Vail, 2007; Vail, 2009; Dobson & Lascelles, 2011; Britton et al., 2012). No entanto, a sua utilização em medicina veterinária está limitada pelos custos elevados e pela disponibilidade apenas da recombinante humana, com a consequente possibilidade do desenvolvimento de anticorpos neutralizantes (Vail, 2009; Dobson & Lascelles, 2011). Além disso, o seu uso, em estudos em medicina humana, parece não trazer benefício, quer em termos de diminuição da duração da hospitalização, quer na mortalidade (Vail, 2009; Britton et al., 2012). Está ainda descrita a possibilidade da utilização desde fator poder promover o desenvolvimento de alguns tumores hematopoiéticos, ainda que o risco permaneça baixo (Hershman, et al., 2007).

26 3.1.2. Trombocitopénia

A trombocitopénia associada à quimioterapia raramente é clinicamente significativa. Vários autores aconselham a suspensão do tratamento em contagens de plaquetas inferiores a 50,000 células/mL (Withrow & Vail, 2007; Dobson & Lascelles, 2011), sendo que, em casos de contagens reduzidas, a realização de cirurgias ou biópsias deve também ser adiada (Morris & Dobson, 2001). Está ainda descrita a possibilidade de efeitos tóxicos cumulativos, em tratamentos prolongados com lomustina, em intervalos de 3 semanas, com contagens de plaquetas sucessivamente mais baixas (Moore, et al., 1999).

Documentos relacionados