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Hemoterapia Brasileira

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O primeiro relato acadêmico sobre a hemoterapia no Brasil foi em setembro de 1879, era "pré-científica". Trata-se de uma tese de doutoramento apresentada à Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro que foi rejeitada por ser muito polêmica. Entretanto, a tese foi aceita pela Faculdade de Medicina da Bahia, em dezembro do mesmo ano. O trabalho descreve experiências empíricas sobre transfusão de san- gue realizadas até aquela época, discutindo se a melhor transfusão seria a do ani- mal para o homem ou entre os seres humanos (JUNQUEIRA et al., 2005).Ainda na

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Bahia, em 1915, o professor de Clínica Médica, Garcez Fróes, fez a primeira trans- fusão de sangue, usando o Aparelho de Agote (Figura 06), improvisado por ele, transfundindo 129 ml de sangue do doador, um servente do hospital, em uma paci- ente operada de pólipo uterino com metrorragia importante. (JUNQUEIRA et al., 2005).

Na década de 40, no Rio de Janeiro e em São Paulo, a hemoterapia brasi- leira começou a se caracterizar como uma especialidade médica. Em dezembro de 1942, foi inaugurado o primeiro Banco de Sangue no Rio de Janeiro, visando obter sangue para o mesmo hospital e atender ao esforço de guerra, mandando plasma humano para os hospitais das frentes de batalha da Segunda Guerra Mundial. Em 1943, em São Paulo, fundou-se o Banco de Sangue do Hospital das Clínicas ligado à Universidade de São Paulo, que marcou época e serviu de exemplo a outros vá- rios estados, tanto em suas rotinas assistenciais como no desenvolvimento de ensi- no e pesquisa. Nesta mesma década, houve a fundação da Sociedade Brasileira de Hematologia e Hemoterapia (SBHH). Em 1950, a partir de iniciativa do Banco de Sangue do Distrito Federal, foi promulgada a lei nº 1075, de 27 de março de 1950, que dispõe sobre a Doação Voluntária de Sangue. Também neste ano foi fundada a Associação de Doadores Voluntários do Brasil (JUNQUEIRA et al., 2005).

Em 1964, o MS criou um grupo de trabalho para estudo e regulamentação da Hemoterapia no Brasil, que resultou na formação da Comissão Nacional de He-

Figura 06: Aparelho de Agote e Adaptação de Eugênio de Sousa

Fonte: Rev. Bras. Hematol. Hemoter. vol.27 no.3 São José do Rio Preto Julho/Setembro. 2005.

moterapia, em 1965. No período de 1964 a 1979, a hemoterapia no Brasil já tinha legislação e normatização adequadas, porém ainda carecia de uma rígida fiscaliza- ção das atividades hemoterápicas e de uma política pública para doação de sangue consistente, pois em alguns bancos de sangue, de ética questionável, indivíduos das camadas mais pobres da população, que muitas vezes não tinham reais condições físicas e mesmo nutricionais, eram estimulados a doar (JUNQUEIRA et al., 2005).

Neste cenário o Brasil, que tinha 80% de doação remunerada, passou a ter exclusivamente doadores voluntários. (JUNQUEIRA et al., 2005). Os gestores se espelharam na experiência mundial de países que deixaram de remunerar doadores, percebendo que, para se atingir a doação altruísta, era necessário um estágio inter- mediário com o apelo à doação de reposição entre amigos e familiares dos pacien- tes que necessitavam de transfusões. No dia 1° de maio de 1980, o sistema de doa- ção remunerada foi finalizada no estado de São Paulo (GUERRA, 2005).

Apenas em 2002, a regulamentação legal do artigo 199 da Constituição de 1988 foi aprovada proibindo a doação gratificada de sangue, conceituando a remu- neração dos serviços através da cobertura de custos de processamento (JUNQUEI- RA et al., 2005). A exemplo do que ocorreu em outros países do mundo, as princi- pais mudanças no sistema hemoterápico brasileiro não ocorreram nem por interven- ção dos especialistas, nem por influência direta do governo, e sim por razões eco- nômicas e outras causas aleatórias, como o advento da SIDA.

Hoje a doação de sangue se destaca no Brasil como um ato voluntário, con- forme disposto na Constituição da República e na Resolução 343 (BR/MS/ANVISA, 2002) que estabelecem que não seja admitido qualquer tipo de remuneração. Assim, a busca do doador voluntário e habitual se deve não somente à segurança, mas também à economia, pois doadores testados e retestados significam bolsas de san- gue com margem maior de segurança para o receptor e um menor número de bol- sas desprezadas após os testes sorológicos. Se toda a população realizasse esses exames com frequência, estes teriam um caráter preventivo e muitas doenças pode- riam ser evitadas ou acompanhadas (LUDWIG e RODRIGUES, 2005). Os doadores pagos, por causa do incentivo financeiro, geralmente retêm a informação que pode- ria de outra maneira resultar em seu descarte. Já os doadores de reposição são a- migos da família ou dos próprios receptores, e são recrutados para substituir o san-

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gue usado ou que será usado, então, por causa da pressão para doar podem ta m- bém omitir a informação que poderia conduzir ao seu descarte (SCHMUNIS e CRUZ, 2005).

No Brasil, por sua própria cultura, não há o hábito de doar sangue por dois motivos equivocados: o medo de adquirir uma doença no ato da doação, que na grande maioria dos casos seria a SIDA, e o medo da picada da agulha. O primeiro motivo é muito mais freqüente, diferente dos países como EUA e Inglaterra onde a população doa sangue porque viram seus pais fazê-lo. Por certo deve existir nestes países a consciência de que este ato é importante para salvar vidas, desenvolvida em função das duas grandes guerras em que estiveram envolvidos no século XX, na Europa, e da guerra do Vietnã, que sem dúvida forjaram o espírito cívico e amadure- ceram, nesse aspecto, a sociedade, que começou a doar sangue para proteger a saúde dos que lutavam pela pátria, ato que se transformou com o passar do tempo, em um hábito aprendido, passado de geração em geração, persistindo até hoje (DORLHIAC-LLACER, 2001).

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