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4. GESTAO E GERENCIAMENTO DE RESÍDUOS

4.2. Gestão Integrada de Resíduos Sólidos Urbanos Domiciliares: O Enfoque

4.2.3. Da Hierarquia para a Rede

A hierarquia é caracterizada geralmente por pirâmides e organogramas pressupondo que haja uma certa ordem de prioridade ou subordinação entre determinada ação, pessoa ou objeto.

No caso da GIRSUD, esta hierarquia representa uma seqüência de prioridades na qual a opção primeira é a redução do resíduo, passando pela sua reutilização, reciclagem, tratamento até chegar ao último recurso que é a disposição final.

Porém, na prática, a aplicação da hierarquia de GIRSUD não é fielmente cumprida. Esta afirmação pode ser verificada pelo trabalho realizado por Bagby (1999), em Seattle, em que a reciclagem foi adotada como estratégia inicial à guisa da redução, que foi trabalhada em seguida.

BAGBY (1999), relatou que em 1987 a gestão dos resíduos sólidos em Seattle passava por uma crise, pois seus dois aterros sanitários estavam esgotados, e naquele momento, os resíduos gerados eram encaminhados para uma cidade vizinha, aumentando consideravelmente os custos de disposição. Iniciou-se então um extenso projeto para tentar encontrar novas soluções, cujo primeiro resultado foi a criação de um plano para os resíduos sólidos denominado “No caminho para a recuperação”. Este programa, numa primeira instância, teve como conseqüência altos índices de reciclagem, tornando a cidade uma referência mundial nesta atividade. Porém, a quantidade de resíduos gerados não diminuía, pelo contrário, continuava a aumentar, fazendo com que se estabelecesse um novo desafio à administração municipal – reduzir a quantidade de resíduos gerados.

CRAIGHILL E POWELL (1996), também questionaram a utilização da hierarquia de resíduos como política governamental para se alcançar a gestão sustentável dos resíduos sólidos. Num estudo realizado por estes autores eles compararam os impactos ambientais provenientes da reciclagem com aqueles produzidos pela disposição, empregando para tanto, a técnica de análise do ciclo de vida (ACV) para valorar economicamente estes impactos.

Os resultados deste trabalho apontaram que para o caso dos plásticos (PET, PEAD e PVC), a reciclagem não seria mais ambientalmente benéfica que a disposição. E, portanto, segundo estes pesquisadores a hierarquia de resíduos não parecia refletir os impactos reais provocados pelas alternativas de gestão e que as prioridades pareciam estar baseadas mais na intuição do que em comprovações científicas.

Verifica-se, que estes dois exemplos, ocorridos em situações distintas, questionaram a validade da hierarquia da GIRSUD. No primeiro caso, questiona-se a aplicação desta hierarquia uma vez que Seattle, mesmo conhecendo a hierarquia, adotou a reciclagem como opção inicial ao invés da redução. No segundo exemplo, a hierarquia

é criticada quanto a sua veracidade, pois a pesquisa constatou que para certos resíduos a destinação final seria mais ambientalmente preferível que a reciclagem.

CAPRA (1994) escreveu que a hierarquia é uma projeção humana e que tem estruturas bastante rígidas de dominação e controle. E, a guisa desta hierarquia, na natureza não existe ‘em cima’ e ‘em baixo’, existem apenas redes trabalhando dentro de outras redes, ou seja, na Natureza as relações podem ser analisadas em diferentes escalas. Portanto, considerando este raciocínio, a seqüência de prioridades da hierarquia não é totalmente válida, pois estas ações encontram-se interligadas e sobrepostas.

Como bem dito por MARTINHO (2003),

Se antes, na sociedade industrial, os processos de trabalho eram bem representados pela metáfora da máquina (ou do mecanicismo), agora o desenho da rede passa a ocupar lugar preponderante no imaginário da sociedade pós-industrial.

A fim de exemplificar o que foi por Martinho, faz-se uma analogia no intuito de compreender a idéia de rede. Os sistemas urbanos de saneamento (água, esgoto, resíduos sólidos e drenagem), juntamente com os sistemas de transportes, telefonia, luz, entre outros podem ser comparados como uma grande rede que existe para suportar as atividades urbanas. E, sendo uma rede, todos estes sistemas interligam- se em algum momento de forma que a perturbação em um dos sistemas acarretará, cedo ou tarde, efeitos negativos ou positivos nos demais sistemas.

Especificamente, com relação a GIRSUD, propõe-se que haja uma ampliação da hierarquia para a rede. A Figura 4.3 mostra a Figura 4.2 (pirâmide) sob a perspectiva de rede.

Reduzir Reutilizar Reciclar Tratar Dispor Reduzir Reutilizar Reciclar Tratar Dispor (a) (b)

Figura 4.3: Proposta de rede para a GIRSUD

Fonte: o AUTOR

Na Figura 4.3 os pontos representam os elementos (ações) que compõem a rede dos resíduos sólidos, que neste caso destacaram-se os mesmos da Figura 4.2: tratar, reduzir, reciclar, dispor e reutilizar. As linhas representam a relação existente entre esses elementos. A Figura 4.3 (a) ilustra uma situação hipotética inicial da gestão dos resíduos sólidos. O ponto destacado em vermelho, referente à ação reduzir, foi selecionado para exemplificar o que acontece na rede quando um elemento sofre alguma ação. Neste caso, a alteração pode ser tanto o aumento de eficiência na conscientização da população quanto à ação de reduzir a quantidade de resíduos produzidos. A nova eficiência acarreta várias conseqüências na rede, como pode ser observada na Figura 4.3 (b), que não são lineares.

Portanto, o gestor deve conhecer bem as relações existentes entre os vários elementos da rede para depois fazer a escolha pelas estratégias mais apropriadas de forma a buscar a melhoria no desempenho do sistema como um todo.

Parece então, a partir desta discussão sobre redes, ser mais apropriado adotar esta nova forma de pensar para gerir os resíduos sólidos urbanos. A rede possibilita ao gestor enxergar na trama dos fluxos de informações a configuração de um estágio avançado com relação à visão compartimentada atualmente praticada. Na concepção de rede ao contrário da hierarquia, não deve haver “melhor” ou “pior” solução, mas uma situação de paridade, que estabelece entre si relações de equilíbrio e equidade.

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