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4 MODELOS TEÓRICOS DE PREFERÊNCIA

4.4 HIPÓTESE DE MISMATCH

O modelo de discriminação estatística aponta a hipótese de Mismatch. Esta hipótese indica a ocorrência de incompatibilidade dos indivíduos quanto à escolaridade, ocupação e renda, incidente no sistema educacional e empregatício. A hipótese de

mismatch12 identifica diferentes graus de escolaridade classificados em três níveis. O primeiro nível é definido como overeducation (sobre-educação) e representa o evento em que o indivíduo apresenta um nível educacional superior ao necessário para sua inserção em um determinado ambiente educacional/empregatício. O segundo nível é denominado Undereducation (subeducação). Neste nível o indivíduo apresenta uma qualificação abaixo do requerido. E, o terceiro nível, consiste no required education

12 O método utilizado nesta dissertação para identificar os níveis de Mismatch será o Realied Matches

ajustado. Este método permite calcular as probabilidades do indivíduo ser compatível ou não com o nível de educação necessário no Ensino Superior.

(educação requerida) e reflete o nível de escolaridade compatível ao requerido (CAVALCANTI, 2008).

Os autores afirmam que a condição de overeducation pode refletir em salários menores que o compatível com a qualificação quando o indivíduo for participar do mercado de trabalho, isto pode ensejar uma desmotivação dos indivíduos a investir na sua capacitação visto que não irá ter o retorno socialmente esperado. Já o fenômeno de

undereducation indica que o indivíduo exerce uma atividade onde se requer uma

qualificação superior a que efetivamente possui. Isso resulta em ganhos salariais maiores que aos demais indivíduos que exercem a mesma função e possui uma qualificação ideal. A required education é o nível adequado, uma vez que a escolaridade estará dentro do nível requerido e tanto o estudante como o trabalhador estarão inserido em ambientes compatíveis com sua formação.

Conforme Cavalcanti e outros (2010), a ocorrência desses eventos sugere que os sistemas educacionais público e privados estão desalinhados, visto que o ensino particular tende a ser mais rigoroso que o ensino público. Isso influencia na formação dos recursos humanos que podem apresentar resultados aquém ou além do demandado.

Para Spence (1973), a educação é vista apenas como um sinalizador para selecionar os indivíduos, principalmente no mercado de trabalho, assim indivíduos com um maior grau de formação educacional tendem a ser mais produtivos. Contudo, o nível educacional não garante a eficácia produtiva. Para o autor, a eficácia produtiva depende da educação recebida e de diversos fatores que são próprios dos indivíduos, como história pessoal, qualidades ou talentos natos e influência do meio familiar.

Neste sentindo, para Spence (1973, apud LOUREIRO, 2013), pessoas que apresentam um desempenho elevado como estudantes provavelmente serão trabalhadores mais eficazes e produtivos. Um ano a mais de educação sinaliza que o indivíduo poderá ser mais produtivo quando comparado com outro que apresenta um ano a menos de educação.

A noção de educação como sinalizador de produtividade vai contra a teoria do capital humano que afirma que anos de educação diferentes explicam ganhos salariais diferentes, indo muito além da função de sinalizadora de produtividade, pois contribui

para melhorar a condição social dos indivíduos. Cavalcanti (2008) discute que a educação como sinalizador pode contribuir para melhorar o aproveitamento de recursos sobre circunstâncias específicas. Isto é, reduzir o incentivo a aquisição de educação para equilibrar os rendimentos dos trabalhadores, ou incentivar a formação educacional para elevar o nível de renda.

Para Ducan e Hoffman (1981), o fenômeno de overeducation é apenas temporário, de curto prazo, sendo eliminado quando o nível educacional é ajustado ao requerido. Enquanto que para Rumberger (1981) o efeito também é temporário, porém de longo prazo, e indica ineficiências e/ou desequilíbrios no sistema educacional e no mercado de trabalho. Para Sicherman (1991) existe um trade-off entre educação e capital humano que interfere na incompatibilidade, porém para o autor não há explicações satisfatórias das causas de over e undereducation. Contudo existem estudos que identificam que indivíduos colocados em ambientes diferentes de seu nível educacional tendem a ser improdutivos.

Na concepção de Bauer (2002), o fenômeno de mismatch educacional está atrelado às habilidades naturais dos indivíduos. Em sua análise para a Alemanha entre os anos de 1984 à 1998, por meio de dados em painel, foi possível controlar os efeitos da heterogeneidade das variáveis não observadas, sendo identificado que o efeito de

overeducation apresenta um redução e tende a perder significância estatística.

Santos (2002) estudou o mercado de trabalho brasileiro para medir o fenômeno

overeducation. Sua pesquisa identificou que as empresas optam por contratar

trabalhadores com melhor formação educacional para treiná-los conforme as atividades das empresas. Esse resultado foi explicado na hipótese de que o Estado é ineficiente em prover uma boa educação geral e básica, prejudicando uma melhor formação aos estudantes brasileiros.

A decisão de adquirir uma melhor formação educacional é considerada um investimento de longo prazo, uma vez que o indivíduo prefere se qualificar no presente para obter uma remuneração maior no futuro. Os indivíduos restringem a sua função utilidade no presente para que possam obter salários maiores devido a um maior nível de educação. Essa decisão interfere no nível de renda presente e incide em custos associados à qualificação educacional. Contudo, indivíduos de baixa renda e de grupos socialmente

discriminados nem sempre têm acesso a um ensino de qualidade e o Estado por meio das ações afirmativas pode ser um mecanismo propulsor de oportunidades para estes indivíduos.

4.4.1 Ações Afirmativas e a Hipótese de Mismatch

A hipótese de Mismatch versa sobre a alocação de indivíduos em ambientes onde o nível educacional é incompatível. Sander (2004) cita que a incompatibilidade de conhecimento pode resultar em perdas significativas na qualidade da formação dos indivíduos. Para Krishna e Tarasov (2013), colocar estudantes em escolas ou programas mais adequados ao nível de preparação culmina em resultados melhores que inserir indivíduos em ambientes educacionais mais rígidos e incompatíveis ao nível de formação educacional.

Em seu estudo, Sander (2004) analisou a questão de quanto a Ação Afirmativa nas escolas de direito dos EUA geraria em benefícios ou custos para os negros que estudavam para se formarem em advogados. Sua conclusão foi que a Ação Afirmativa nas faculdades de direito imporia enormes custos a indivíduos de cor negra e criaria benefícios relativamente menores. Segundo as conclusões de Sander, os alunos aprendem menos quando são academicamente incompatíveis com os seus pares. O autor definiu como hipótese de "mismatch acadêmico" o resultado obtido, pois os educadores jurídicos passaram a enfrentar um provável problema de estudantes cujas credenciais acadêmicas são significativamente mais fracas do que as de seus colegas de classe. Neste sentido, uma desvantagem acadêmica inicial poderá produzir efeitos cumulativos e substancialmente inferiores de aprendizagem.

Assim o efeito de incompatibilidade está presente quando estudantes com baixa capacitação educacional são matriculados em cursos mais seletivos, quando comparado aos demais colegas de turma, sobrecarregando os indivíduos que apresentam desvantagens para acompanhar o curso. Desta forma, estes estudantes podem se sentir deslocados e perdidos no ambiente onde estão inseridos, com isso é gerado o efeito desânimo (SANDER, 2004), que pode acirrar a evasão universitária e influenciar negativamente no desempenho destes estudantes.

Corroborando, Arcidiacono e outros (2011) afirmam que as discussões sobre a hipótese de mismatch têm se baseado em comparações dos resultados de estudantes que possuíam desvantagens iniciais matriculados em universidades de alto prestígio nos EUA com estudantes de universidades de menor prestígio. Como resposta, a comparação evidencia que alocar estudantes minoritários em ambientes incompatíveis com seu nível de aprendizado resulta em pior desempenho pelos estudantes beneficiados. Conforme Sander (2004), estudantes com desempenho inferiores são mais propícios a abandonar os cursos e a não atuarem no mercado de trabalho.

Su (2005) ratifica que a essência do processo educacional segue categorias. Desse modo, só é possível passar para fases mais avançadas quando se finalizam as etapas anteriores, e quanto melhor a formação básica, melhor será a eficiência dos aprendizados nas fases que se sucederão. Sendo assim, as deficiências encontradas no ensino de base se refletirão no ensino superior.

A adesão as Políticas de Ações Afirmativas no Ensino Superior é vista como um instrumento para melhorar os resultados educacionais e para contribuir na formação de capital humano de grupos com desvantagens, no sentido de reparar a dívida historicamente gerada com as divergências sociais. Todavia, os estudos de Sander (2004) e Sowel (2004) comprovam que esses programas acabam provocando um aumento nas taxas de reprovação e de abandono dos cursos.

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