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Hipóteses paleoambientais referentes à Formação Tatuí

5 PALEONTOLOGIA DA FORMAÇÃO TATUÍ

5.5 Hipóteses paleoambientais referentes à Formação Tatuí

A partir dos dados levantados em afloramentos e do estudo dos fósseis até agora descobertos e identificados, foi possível deduzir dois contextos paleoambientais para a Formação Tatuí.

O mais evidente está relacionado com a Fácies Ibicatu da região de Araras e Leme, Afloramento 9, em que são encontrados caules de pteridófitas e espermatófitas de grande porte. Depósitos de alta energia provavelmente associados a canais contínuos e os vegetais teriam sido transportados durante grandes enxurradas, como às que ocorrem em tempos atuais na Região Sudeste do Brasil. Depósitos semelhantes também foram observados nos afloramentos 7, 11 e 12, que possuem fácies de constituição sedimentológica similar, porém sem a presença de restos fósseis.

Esta fácies representaria depósitos de domínio de água doce em que o paleoambiente era dominado por sistema de rios de alta energia que poderiam ter formado depósitos deltaicos como sugeriu STEVAUX et al. (1986). Estes rios poderiam ter empurrado o grande corpo d’água, responsável pelos depósitos das formações Rio Bonito e Palermo, para regiões mais ao sul.

Esta hipótese é viável, pois rios controlando a posição da linha de costa são observados em tempos atuais. Um exemplo são as relações do Rio São Franscisco e outros rios menores que se dirigem diretamente para o oceano. Os sedimentos trazidos pelos rios barram as suas desembocaduras e as correntes costeiras provocam os deslocamentos dos rios a jusante da corrente costeira, crescendo o continente para o sul (BACOCCOLI, 1971; GAMA Jr. 1976).

O recuo do grande corpo d’água para regiões ao sul da bacia, também, poderia ser resultado de mudanças ocasionais do nível do Mar Palermo. Tais mudanças foram observadas por PERINOTTO (1992) e ZACHARIAS & ASSINE (2005) que relataram variações dos níveis dos corpos d’ água durante a deposição das formações Rio Bonito e Palermo, que poderiam afetar os depósitos da Formação Tatuí em São Paulo.

Com o recuo do Mar Palermo foram isoladas lagoas e lagunas na linha de costa, tornando-se, com o tempo, dulceaquícolas, permitindo a existência de conchostráceos. Tais lagoas poderiam ter tido sua composição química modificada sazonalmente, levando diversos conchostráceos a morte, formando coquinas.

Em uma segunda mudança paleoambiental os depósitos tempestíticos ou de decantação sucederam os de água doce.

Os depósitos tempestíticos seriam representados por arenitos finos com estratificação cruzada de grande porte e hummockies que podem ser observados nos afloramentos do Sitio Santa Maria (Afloramentos 1, 2 e 3), Afloramento 4 (Ponte sobre o Rio Passa Cinco), Afloramento 6 (Km 150 da Rodovia do Açúcar) e no ponto C do Afloramento 12 (Fazenda Ponte Nova).

Os depósitos de decantação são siltitos ou arenitos muito finos, encontrados em contato com a Formação Irati. Estes depósitos foram observados no Afloramento 5 (Próximo ao Rio Passa Cinco, ocorrência de Clarkecaris), Afloramento 8 (Rodovia SP- 304, Km, 151, entre Piracicaba e Santa Bárbara D’Oeste) e Afloramento 10 (Rodovia Irineu Penteado). Em todos estes casos ocorre o contato direto com a Formação Irati.

Observações nos afloramentos com depósitos tempestiticos conduziram à interpretação de que se trata de um corpo de água de grande extensão, sugerido pelo

tamanho métrico das estruturas observadas. Tal corpo seria relacionado aos depósitos da Formação Palermo (PERINOTTO, 1992), sugerindo que os grandes rios atuantes na região não eram mais importantes no controle da linha da costa ou pelo aumento do nível do corpo d’água. Este evento é posterior ao dos rios, como observado no Ponto C do Afloramento 12, onde o corpo arenoso grosso, correlacionado à Fácies Ibicatu, é subjacente ao de arenitos finos com estratificação cruzada em contato com a Formação Irati. Esta hipótese reforça a proposta de ASSINE et al. (2003), que separa os depósitos da Fácies Ibicatu dos arenitos da base da Irati.

Os Afloramentos representados por depósitos de decantação (afloramentos 5, 8 e 10) foram formados provavelmente afastados da linha de costa e da ação de ondas e teriam se formado na mesma época dos depósitos tempestíticos.

Contudo durante um período as enxurradas que afetaram os depósitos da fácies Ibicatu, ainda se manifestariam como camadas arenosas grossas ou conglomeráticas, de diferentes espessuras nas fácies siltico-arenosas dos Afloramentos 8, 11 e 12, sugerindo que a influência de rios e de enxurradas não havia parado imediatamente, mas teria sido gradual. No afloramento 11 ocorrem ainda estratificações flaser nestes pequenos corpos arenosos. Tanto neste afloramento quanto no afloramento 7 (Km 152,5 da Rodovia do Açúcar) ocorrem estratificações sigmóides e “espinha de peixe”,modificando o topo da fácies Ibicatu nestes afloramentos, sugerindo a presença de marés.

A influência dos depósitos de marés aparentemente é mais presente nos depósitos ao sul, pois o topo da fácies Ibicatu do afloramento da Fazenda Ponte Nova não apresenta estratificações sigmóides, sendo caracterizado pelos depósitos de enxurradas, observados no Ponto C deste afloramento. Segundo levantamentos históricos do afloramento 9, seção tipo da fácies Ibicatu, não foram observadas estratificações sigmóides ou evidencias de marés (STEVAUX et al. 1986; MOCHIZUKI, 2001; ASSINE et al. 2003; FERNANDES, 2004)

O topo da Formação Tatuí é caracterizado por uma regressão, registrada principalmente nos afloramentos onde ocorrem os depósitos tempestíticos em contato arenoso brusco com a Formação Irati, marcado por uma discordância erosiva. O Afloramento 1 foi o que melhor representou essa regressão, com as grandes estruturas de tempestade gradualmente substituídas por marcas onduladas e, em seguida, um arenito maciço com icnofósseis. Estes, únicos na região, estariam possivelmente relacionados com a icnofácies Psilonichnus, praial aérea, indicando o recuo total do grande corpo de água naquele ponto.

Na região centro-leste de São Paulo este grande corpo d’água, que resultou nos depósitos do topo da Formação Tatuí, não fornece informações sobre salinidade, por causa da total ausência de fósseis indicadores de água doce ou salgada. Contudo em depósitos correlatos no sul do Estado de São Paulo e da Formação Palermo na Região Sul foram observados acritarcos (Michrystridium) no contato Palermo (Tatuí em São Paulo) e Irati (CAZZULO-KLEIPZIG et al. 1989; PERINOTTO, 1992; ARAÚJO- BARBERENA,1993; MARASCO et al.,1993). Estas observações sugerem salinidade para o corpo d’água, mas não necessariamente marinho como sugeriram alguns destes autores. Pelo menos o ambiente não foi salino o suficiente para a colonização de corais, cefalópodes e outros seres vivos marinhos e também não teria sido de água doce para suportar conchostráceos e carófitas.

A presença de acritarcos não deve ser considerada indicadora marinha e sim da presença de salinidade mínima, pois acritarcos ocorrem logo que é injetada alguma água salina no ambiente. Um exemplo significativo ocorreu na fase “Yoldia Sea”, referente a evolução do Mar Báltico, que representou uma fase de salinidade entre duas dulceaquícolas e de confinamento do Mar Báltico, que durou apenas 200 anos, no final do Pleistoceno. Nesta fase foi encontrado um único gênero de acritarco junto com algas de água doce (BRENNER, 2005), similar ao que ocorre na Formação Palermo e Formação Tatuí, contudo o ambiente do Mar Báltico era controlado pelo degelo glacial o que não ocorreu nessa época, na Bacia do Paraná.

Os foraminíferos aglutinantes, citados por FÚLFARO et al. (1984), estariam na base da Formação Tatuí e não no topo. Tais fósseis poderiam estar associados aos moluscos (SIMÕES, 1992) e braquiópodes (HOLZ et al.1998) descritos em São Sepé, Rio Grande do Sul, base da Formação Palermo, ou relacionados às ultimas transgressões marinhas da Formação Rio Bonito (ZACHARIAS & ASSINE, 2005). Se esta interpretação estiver correta, poder-se-ia afirmar que, anteriormente ao “domínio da água doce”, os depósitos da base da Formação Tatuí teriam sido formados em paleoambiente salino passando gradualmente a dulciaquícola. Em visita ao Afloramento do Córrego do Veado, tais foraminíferos (citados por STEVAUX et al. 1986) não foram encontrados nas camadas silticas e na Fácies Ibicatu. Provavelmente estariam abaixo da fácies Tag e seriam correlatos à fácies basal do Afloramento da Fazenda Ponte Nova, de ambiente costeiro.

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