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A grande questão a ser testada nesse experimento é qual o peso da informação

no Exame da OAB. Assim, questiona-se se engenheiros, matemáticos e outros membros

do grupo de STEM teriam desempenho muito melhor ao fazer a prova da OAB com consulta da legislação. Ainda, será que, tendo acesso as leis e à funcionalidade de busca no texto como o “Control+F”, os membros do grupo de STEM conseguiriam atingir o desempenho mínimo de 50% de aproveitamento? Essas perguntas podem ser separadas analiticamente em hipóteses.

Hipótese 1: A média do desempenho dos voluntários do grupo de STEM no expe-

rimento sem informação será baixa, muito inferior ao mínimo necessário para aprovação, que é 50% de acertos.

Hipótese 2: A média do desempenho dos voluntários do grupo de Direito no

experimento sem informação será superior à média do grupo de STEM no mesmo experimento.

Hipótese 3: A média do desempenho dos voluntários do grupo de Direito no

experimento sem informação será próxima do percentual necessário para aprovação no exame oficial.

Hipótese 4: A média do desempenho dos voluntários do grupo de STEM irá subir

no experimento com informação.

Hipótese 5: A média do desempenho dos voluntários do grupo de STEM no

experimento com informação ficará próxima do percentual necessário para aprovação no exame oficial.

Hipótese 6: A média do desempenho dos voluntários do grupo de Direito no ex-

perimento com informação será alta, significativamente acima do percentual necessário para aprovação no exame oficial.

Após a realização dos experimentos seria possível contrastar os resultados em- píricos com as expectativas. Caso todas as hipóteses fossem confirmadas, seria possível

Tabela 2: Hipóteses de performance média dos voluntários dos dois grupos

Sem informação Com informação

STEM ≤ 50% ≈ 50%

Direito ≈ 50% ≥ 50%

que pessoas desvinculadas do domínio jurídico conseguem responder a prova simples- mente por terem acesso à informação necessária, por conseguirem processá-la e por serem dotados de background knowledge.

Diferentemente de programas de computador, ao serem apresentadas à questão discutida na seção 3.7, seria factível, para seres humanos, perceber a correlação implícita no enunciado entre impopularidade e desagrado de autoridade.

A ideia desse experimento comportamental significa uma aposta justamente nessa direção. Talvez, com o bom-senso que todo ser humano têm, com informação e buscadores adequados, a prova da OAB se torne um desafio simples - mesmo para pessoas sem nenhuma formação em Direito.

Novamente, o intuito desse experimento não seria o de questionar a qualidade da prova. O grande questionamento que poderia ser feito diz respeito a um projeto de educação jurídica modelado para maximizar o desempenho nesse Exame. Mais uma vez, essa seria outra evidência científica que poderia colocar o personagem Custódio em apuros. A motivação pessoal por trás dessa pesquisa não é a de criticar o Exame da OAB em si, como forma de filtro para quem exerce a profissão. O interesse é discutir o quão importante esse Exame deveria ser na formação dos juristas do país. Em uma linha, a provocação seria: se Engenheiros passam no Exame da OAB usando o Google, por quê valorizar tanto essa prova pedagogicamente num mundo em que o Google está sempre ao nosso alcance?

Conclusão

Quando entramos em uma biblioteca, percebemos que as áreas do conhecimento são separadas por blocos. De um lado, temos as estantes das Ciências Humanas, em outro, as Ciências Exatas. Dentro de um mesmo bloco, como o de Ciências Exatas, existem estantes separando os assuntos.

Essa cisão não ocorre apenas nas bibliotecas, ela também acontece na divisão das disciplinas, desde o Ensino Fundamental e, eventualmente, na segmentação dos cursos superiores. Tal partição existe, sobretudo, por motivos didáticos. É dividindo que se conquista. No caso, que se aprende.

O que muitos parecem ignorar é o fato de que, no mundo real, os problemas não estão separados como nas bibliotecas. Muitas vezes, a solução engenhosa de um problema passa pela interdisciplinariedade. Aliás, intuitivamente, parece existir alguma correlação positiva entre a complexidade do problema e a vocação interdisciplinar da sua solução3.

Como evidenciado por (RESTREPO-AMARILES, 2014), existe uma tendência mundial de ascensão da Matemática no mundo jurídico, em especial com o uso de indi- cadores numéricos baseados em estatística. Estes influenciam o comportamento de juízes e determinam aspectos da administração da justiça, como promoções em cargos. Como o trabalho de (FORTES,2015) mostra, percebe-se que a virada matemática do Direito (mathematical turn) acontece também na administração da Justiça Brasileira, em espe- cial, isto pode ser visto na iniciativa pioneira do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) por meio do projeto Justiça em Números4.

Indispensável que se diga que a aproximação da Matemática com o Direito não ocorre apenas no âmbito governamental. O Supremo em Números5 é um projeto precursor,

criado em 2010, no âmbito da Fundação Getúlio Vargas - uma instituição acadêmica. A iniciativa, além de produzir trabalhos importantes para o debate nacional no formato de relatórios acessíveis para todos, já produziu trabalhos acadêmicos sofisticados de nível internacional, como (ARGUELHES; HARTMANN, 2017).

Este trabalho é uma aposta nessa direção. Diante de um problema complexo, sugeriu-se, timidamente, um diálogo com a Psicologia. Em especial, recorreu-se à Ma- temática e à Ciência da Computação - áreas que historicamente não dialogam com o Direito.

Chega-se aqui com a conclusão de que a missão inicial foi descumprida, já que não 3 Id est, quanto mais complexo o problema, mais interdisciplinar será a sua solução.

4 Mais informações em:http://www.cnj.jus.br/programas-e-acoes/pj-justica-em-numeros 5 Mais informações em:http://www.fgv.br/supremoemnumeros/

foi construído o algoritmo capaz de ser aprovado no Exame da OAB. O melhor resultado alcançado foi o desempenho de 33% em uma amostra de questões de ética. Entretanto, “no caminho”, surgiu uma promissora performance para encontrar as justificativas das alternativas corretas.

O entusiamo com esse diálogo epistemológico é tão grande que talvez estejamos observando o surgimento de uma nova área. No início da década de 1960, os trabalhos de (CALABRESI,1961) e de (COASE et al.,1960) inauguraram a área que ficou conhecida como Law & Economics (Direito & Economia). A inovação desse campo consistiu em aplicar métodos da Economia Ortodoxa (Neoclássica) no contexto jurídico. Talvez seja o caso de pensarmos em cunhar a área de Law & Mathematics (Direito & Matemática)6, em que seriam usados instrumentos da Matemática e da Computação no campo jurídico. Como este trabalho está inserido no macro tema de educação jurídica, cabe tam- bém pensar em como inserir esse perfil interdisciplinar nos cursos de Direito. Em (VAR- GAS,2014), o autor defende que o século XXI possui um novo perfil de Jurista, o Juristia Criativo, marcado pelo pragmatismo. Um indivíduo que deixa de lado o puritanismo frio do liberalismo e o revolucionarismo adolescente do Critical Legal Studies para focar nos problemas, nas causas - independentemente do método ou da matriz de pensamento que se faça necessário para criar uma solução. A Matemática e a Ciência da Computação são duas ferramentas poderosas na resolução de problemas e que, até aqui, foram negligenci- adas, não apenas nas Escolas de Direito clássicas mundo afora, como também na própria

ideia da Escola Criativa de Direito7.

Espera-se que este trabalho se torne mais um exemplo na direção do diálogo entre Direito, Matemática e Ciência da Computação. Verdade seja dita, esta monografia tem um valor simbólico, já que é o primeiro Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) do recém- criado programa de dupla graduação em Direito e Matemática Aplicada, uma iniciativa louvável da Fundação Getúlio Vargas do Rio de Janeiro8. Um das vantagens desse pro-

grama é a exigência de apenas um TCC para a obtenção dos dois diplomas. Torço para que este seja o número um de muitos.

Dado que o trabalho não cumpre totalmente o que foi “vendido” como sua grande missão inicial e começa com uma imagem cinematográfica, leitores ácidos poderiam dizer que este trabalho é mais imaginativo do que qualquer outra coisa. A resposta?

Uma citação de Albert Einstein: Imagination is more important than knowledge9.

6 Ou talvez estender o termo Legal Tech para além das start-ups que trabalham na interseção entre Direito e tecnologia.

7 Ressalte-se a iniciativa louvável da FGV DIREITO RIO de ter iniciado, em 2013, de forma pioneira, um grupo de estudos denominado “Programação para Advogados”. Em 2014, a disciplina se tornou um curso eletivo e, desde então, foi oferecida anualmente.

8 Muito me orgulha ter sido o responsável por sugerir esse programa para o corpo de gestores das Escolas de Direito e de Matemática Aplicada.

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