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DA HISTÓRIA FISCAL DO BRASIL

Apêndice III: Citações de atores com visão presidencial sobre Reforma Tributária

CAPÍTULO 2: DA HISTÓRIA FISCAL DO BRASIL

“O orçamento é o esqueleto do estado despido de todas as ideologias enganosas”

Rudolf Goldscheid161

FINANÇAS PÚBLICAS E DESENVOLVIMENTISMO

No século entre 1880 e 1980, o Brasil se destacou dentre os demais países em crescimento econômico162. A duas décadas do final do século XIX era um país agrário, com parte substancial da população constituída por agregados e escravos163 residentes em fazendas de uma pequena elite proprietária. Em cem anos, desta base se operou um processo de industrialização e urbanização acelerado, induzido fortemente pelo Estado, inclusive através de políticas que dinamizaram sua capacidade de captar e redirecionar recursos. Os empreendimentos produtivos – privados ou estatais – se desenvolveram significantemente sendo orientados e viabilizados através de uma conjugação de políticas que envolveram investimentos estratégicos efetivados diretamente pelo Estado, financiamentos favorecidos, juros subsidiados164 e proteção contra a competição estrangeira165. Um poderoso ‘consenso desenvolvimentista’, mesmo a custo de substanciais sacrifícios sociais, foi forjado no processo de evolução do Estado nacional durante a maior parte do século XX166.

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“The budget is the skeleton of the state stripped of all misleading ideologies”, Goldscheid, citado por Schumpeter em “The Crisis of the Tax State”.

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A análise que aponta o maior crescimento mundial se baseia em dados precários dado que o Brasil só teve contas nacionais a partir de 1947. Existem, contudo estimativas de historiadores baseadas na produção de café, de cana-de-açúcar e da indústria incipiente. Das pesquisas e dados disponíveis é que veio o cálculo mais aproximado da taxa de crescimento do PIB real para a economia brasileira anterior a 1947 e que aponta no século entre 1880 e 1980 como o país de crescimento mais elevado na economia mundial.

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De um universo de 10 milhões de habitantes, três milhões eram escravos. 164

Parte substancial do crédito era provido por instituições e recursos públicos. Além disso, em diversos períodos da nossa história os juros nominais foram inferiores à inflação. Esta combinação de fatores direcionava recursos dos credores (muitas vezes este era o estado via crédito facilitado de instituições públicas) aos devedores.

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Proteção da produção doméstica por tarifas de importação elevadas, políticas de câmbio múltiplo e diferenciadas (selecionavam as importações) ou taxas cambiais altas. Subsídios tributários foram instrumentos se destacaram nesta proteção e para direcionar o investimento privado às atividades que o Estado desejava promover.

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O Brasil era um país periférico (ex-colônia portuguesa) cuja revolução industrial estava ocorrendo 150 anos depois da inglesa e mais de um século depois da americana. Entre 1930 e 1970, o Brasil e os demais países da América Latina cresceram a taxas elevadas impulsionadas por estratégias nacionalistas e desenvolvimentistas via proteção à industria nacional nascente e a promoção de poupança forçada através do Estado para financiar investimentos estatais. O Estado foi o principal instrumento de ação coletiva, coordenação e mobilização de recursos para promover o principal objetivo nacional que era acelerar o

O governo federal assumiu o principal encargo da grande tarefa nacional de promover o desenvolvimento econômico. Procurou assim, dentro dos limites e restrições fiscais que enfrentava a cada período, elevar sua arrecadação e centralizar os recursos públicos, através da gestão dos principais tributos.

Gráficos 1: Carga Tributária e Despesa Governamental em % PIB: 1900-2000

Despesa Governamental Primaria Total

Fonte: Cossio (2002: 23 e 39)

Esta estratégia desenvolvimentista, todavia, estava conjugada ao esforço de apaziguamento das elites políticas regionais. No desenho das políticas públicas, para superar entraves, foram estabelecidas muitas vezes caminhos segundo as “linhas de menor resistência” ou de “fuga para frente”. Neste processo, a elite governamental

desenvolvimento econômico. O Estado desenvolvimentista foi a versão do protagonismo estatal mais evidente nos países periféricos, correlata ao Estado de Bem Estar dos países desenvolvidos.

dirigente trabalhou intensamente com as políticas distributivas de forma a minimizar o conflito, tendo o Estado nacional como o grande provedor para as demandas particulares e garantidor da integração nacional.

A demanda por recursos tributários e sua distribuição federativa entre os níveis de governo apresentou movimentos em distintas fases de contração e expansão que coincidem com as Reformas Tributárias de 1934, 1946, 1967 e 1988. Nos períodos democráticos de descentralização tributária que se expressam após 1946 e 1988 (mais intenso) ocorreram também as mais fortes expansões da despesa primária e o conseqüente aumento do tamanho do governo167.

Gráfico 2: Despesa Governamental Primaria – Federal x Subesferas: 1900-2000

Fonte Cossio (2002: 40)

As relações federativas no Brasil atuaram para amortecer as enormes disparidades regionais e acomodar os objetivos conflitantes das elites locais. A natureza do pacto desenvolvimentista168, todavia, estava fundada em alianças muitas vezes não institucionalizadas na lei, com base em uso de fundos e recursos públicos da União para amenizar parte dos desequilíbrios regionais. Esta dinâmica, mesmo para os estados com mais recursos, funcionava numa linha de flexibilização e informalidade orçamentária

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Uma descrição da evolução deste processo com a exposição da metodologia de estimativa dos dados que formam os gráficos apresentados pode ser observada na tese de Cossio (2002), orientada por Rogério Werneck .

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Vide a obra de Fiori (1990 a 1995) para análise deste pacto desenvolvimentista entre as elites brasileiras. Este pacto embora tenha um eixo desenvolvimentista, se expressará de forma diferenciada segundo coalizões e conjunturas distintas. Por exemplo, no governo Vargas cresce a promoção do nacional-desenvolvimentismo no qual capital estrangeiro estaria subordinado aos interesses nacionais brasileiros. No governo militar pós 1964 o desenvolvimentismo já se expressava de uma forma mais dependente e associada ao capital internacional.

que não favorecia o desenvolvimento de restrições fiscais e financeiras endógenas aos estados e à União.

De modo geral, a ampliação da receita regional e local nos processos de reformas constitucionais acabou não sendo acompanhada pela correspondente descentralização formal das responsabilidades pelos serviços públicos. Os estados e municípios, com maior volume de receitas livres disponíveis, aumentaram sua despesa primária de acordo com suas próprias prioridades e fora de uma coordenação geral. As crises fiscais que ocorriam no nível federal decorrentes da manutenção e até ampliação dos papéis do governo central levaram-no a trabalhar para elevar sua receita tributária e compensar a perda de fontes de receita. Desta forma, destaca Cossio (2002), nos processos de descentralização fiscal do século XX ocorre um aumento da carga tributária comandado pelo governo federal enquanto o aumento da despesa pública é comandado pelos níveis inferiores de governo.

A transformação da base econômica do país de agroexportador para urbano- industrial, com o fortalecimento do consumo e renda internos, favoreceu ajustes e mudanças tributárias169. No período de 1901 a 1944, com uma média de investimento anual de 10,30% do PIB o país logrou uma taxa média de crescimento anual do PIB de 4,47% ao ano.

Gráfico 3: PIB e Investimento

Variação real do PIB e Taxa de Investimento anual

Brasil: 1901 a 1944 -5 0 5 10 15 20 25 1 9 0 1 1 9 0 3 1 9 0 5 1 9 0 7 1 9 0 9 1 9 1 1 1 9 1 3 1 9 1 5 1 9 1 7 1 9 1 9 1 9 2 1 1 9 2 3 1 9 2 5 1 9 2 7 1 9 2 9 1 9 3 1 1 9 3 3 1 9 3 5 1 9 3 7 1 9 3 9 1 9 4 1 1 9 4 3

Fonte: IBGE/SCN 2000 Anual ano

(% a o a n o )

PIB - variação real Taxa de investimento (% PIB) Polinômio (PIB - variação real )

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Os processos de evolução tributária dos paises em função do desenvolvimento são destacados nos principais manuais de finanças públicas como o de Giambiagi e Além (2000) e pela sociologia fiscal, como destacam Campbell (1993) e Moore. Para uma análise detalhada deste processo no Brasil ver Varsano (1996).

Este processo de crescimento da despesa governamental e da carga tributária no século XX não se dá apenas no Brasil. Já no século XIX era explicitada a chamada "Lei de Wagner", que presupõe uma relação positiva entre o crescimento econômico e o tamanho do setor público170. O crescimento dos gastos públicos é um processo que acompanharia o aumento do nível de renda per capita das nações. Vários fatores resultantes da modernização como níveis mais elevados tanto econômicos como populacionais, a urbanização crescente, a evolução da estrutura etária da população, da distribuição de renda e as mudanças tecnológicas atuariam conjuntamente para impulsionar o fenômeno de maior demanda por serviços públicos. Campbell (1993), apoiado nas contribuições de Tilly, Ardant e Mann, defende que a construção estatal guarda estreita correlação com sua fiscalidade. Se o nível de tributação é baixo, o estado não consegue assumir a responsabilidade pela gestão econômica e nem estabelecer agências reguladoras para gerir a expansão monetária, a inflação e outras políticas econômicas mais complexas. Esta teoria de construção estatal reconhece que os esforços das elites políticas para alterar o nível e a forma de tributação é de fundamental importância para o desenvolvimento ou colapso do estado. A necessidade de financiar o desenvolvimento pode levar a alterar as políticas que obtém os recursos necessários da sociedade seja via empréstimos (muitas vezes compulsórios como o imposto inflacionário) ou pela tributação.

Neste amplo período de 44 anos se destacou o governo Vargas pelo rompimento com os acordos das elites oligárquicas (após a revolução de 1930) e pela reformulação do papel do Estado no Brasil pautado pela construção do projeto nacional desenvolvimentista171 conjugado ao desenvolvimento de políticas sociais.

Neste processo brasileiro de construção estatal, o descontrole orçamentário associado às demandas desenvolvimentistas muitas vezes impeliu o setor público a se

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Esta relação é muito destacada nos tradicionais manuais de finanças públicas. Destaca esta “lei” que o tipo de papel (ou tarefas) que o Estado é instado a assumir com o avanço do desenvolvimento leva a necessidade de um maior volume de recursos tributários. A correlação entre gastos e tributação já foi comentada no capítulo anterior. Dos Santos e Gentil (2009) destacam que as teorias mais aceitas atualmente apontam uma forte vinculação também entre a distribuição da renda “do eleitor mediano” e a carga tributária.

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O nacional-desenvolvimentismo que defendia uma economia mista na qual o setor privado receberia incentivos, segundo as prioridades nacionais. O Estado interviria diretamente para superar os estrangulamentos assegurando investimentos nas áreas fora de interesse ou possibilidades do setor privado, através de empresas estatais e de empresas de economia mista. O capital estrangeiro seria aceito apenas sob uma cuidadosa regulamentação das autoridades brasileiras. Esta linha se contrapunha a neoliberal, representada pelo economista Eugênio Gudin, que defendia o equilíbrio dos orçamentos governamentais e o controle severo das emissões de moeda. O Brasil, país carente de capitais, deveria acolher e estimular o capital estrangeiro.

apoiar mais fortemente, em certos períodos, no financiamento de última instância, o imposto inflacionário. Na análise dos gráficos 1, nota-se que as despesas governamentais se situavam, neste período em nível mais alto do que o das receitas tributárias. A sociedade e as demandas sobre o Estado se complexificavam à medida que o desenvolvimento econômico se aprofundava. As diferentes forças e coalizões políticas que emergiam demandavam diferentes prioridades ao Estado.

CRESCIMENTO ECONÔMICO E INFLAÇÃO – DE 1945 A 1963

Como norma geral, o governo central não conseguia adequar o nível de suas crescentes despesas públicas aos limites da receita. A base tributária do país era estreita, com maior peso nos tributos indiretos, que flutuavam de acordo com a dinâmica econômica172.

Gráfico 4: Inflação de 1945 a 1963

Inflação 1945-1963

IGP-DI acumulado em 12 meses

0,00 10,00 20,00 30,00 40,00 50,00 60,00 70,00 80,00 90,00 1 9 4 5 .0 2 1 9 4 5 .0 8 1 9 4 6 .0 2 1 9 4 6 .0 8 1 9 4 7 .0 2 1 9 4 7 .0 8 1 9 4 8 .0 2 1 9 4 8 .0 8 1 9 4 9 .0 2 1 9 4 9 .0 8 1 9 5 0 .0 2 1 9 5 0 .0 8 1 9 5 1 .0 2 1 9 5 1 .0 8 1 9 5 2 .0 2 1 9 5 2 .0 8 1 9 5 3 .0 2 1 9 5 3 .0 8 1 9 5 4 .0 2 1 9 5 4 .0 8 1 9 5 5 .0 2 1 9 5 5 .0 8 1 9 5 6 .0 2 1 9 5 6 .0 8 1 9 5 7 .0 2 1 9 5 7 .0 8 1 9 5 8 .0 2 1 9 5 8 .0 8 1 9 5 9 .0 2 1 9 5 9 .0 8 1 9 6 0 .0 2 1 9 6 0 .0 8 1 9 6 1 .0 2 1 9 6 1 .0 8 1 9 6 2 .0 2 1 9 6 2 .0 8 1 9 6 3 .0 2 1 9 6 3 .0 8 ano.mês % a c u m u la d o e m 1 2 m e s e s carta renúncia de

Jânio Quadros no dia 25 de agosto de 1961

Fonte: Ipeadata

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Segundo Varsano (1996: 4-5), “Quanto à composição da receita tributária federal, o imposto de importação permaneceu como a mais importante fonte de receita até o final da década de 30 quando foi superado pelo imposto de consumo. Em virtude da Segunda Guerra Mundial, sua participação no total da receita federal reduziu-se bruscamente em 1942. A partir daí, ele deixou de ser uma fonte importante de receita para o governo federal, posto que, tendo tomado a forma de imposto específico desde 1934, não teve, em presença da inflação, seu valor reajustado.(...) Em 1946, o imposto de consumo era responsável por aproximadamente 40% da receita tributária da União e o IR -- imposto de renda -- , cuja arrecadação chegou a superar a do imposto de consumo em 1944, representava cerca de 27% da mesma. O Brasil ingressa na fase em que a tributação explora principalmente bases domésticas ao mesmo tempo em que começava um processo de desenvolvimento industrial sustentado.”

Conforme os dados de inflação, desde 1945, nota-se que, após a reforma tributária de 1946, numa conjuntura democrática, os períodos do final do segundo governo Getúlio (1953-54) e do o Plano de Metas do governo Juscelino (1956-61)173 se destacam. Neste houve um maior recurso ao financiamento inflacionário pela intensificação dos gastos públicos visando a modernização do país e a industrialização nacional frente as dificuldades políticas de se efetivar uma reforma tributária para elevar a receita pública.

Seguia-se a linha de minimizar resistências através de uma política econômica que, por desconsiderar certos limites fiscais, acelerava o movimento inflacionário174. As grandes tarefas a que se impunha o estado brasileiro não fechavam dentro do quadro de suas fontes normais de recursos. Acabou-se, na falta de opções viáveis, por apelar para o financiamento inflacionário, quadro que ficou mais destacado na maior elevação dos preços da primeira metade da década de 1960, particularmente elevando o nível de conflito distributivo e a instabilidade política nos governos Jânio e Jango175.

A fragilidade do poder central e do governante nacional para fazer ajustes estruturais que impusessem perdas no início da década de 1960176 é exemplificada pela explicação do ex-presidente Jânio sobre o episódio de sua renúncia, apresentada como um estratagema para fortalecer a autoridade presidencial177.

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No início da década de 50, a economia enfrentava estrangulamentos na infraestrutura de transportes e energia que poderiam ser rompidos através de decidida ação governamental. Getúlio Vargas, eleito presidente pelo voto direto, em seu segundo governo cria o BNDE, a Eletrobrás e a Petrobrás, segundo as orientações nacional-desenvolvimentistas apoiadas por setores militares, camadas operárias, alguns intelectuais e o movimento estudantil. O Governo JK também seria caracterizado pelo esforço estatal para avançar com o desenvolvimento econômico.

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Em um diagnóstico ortodoxo da trajetória inflacionária, pode-se enfatizar o excesso de gasto público e emissão monetária acima dos limites estabelecidos pela demanda da sociedade como seu fator alimentador mais importante. O período traz várias idiossincrasias desde entraves cambiais, mas a necessidade de investimento público e promoção do desenvolvimento fica clara. Para um enfoque mais detalhado do período vide Abreu (1990), mais particularmente o período do final do Vargas (op cit: p 120 e 142) e JK (op cit: p 179-194).

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No governo JK o déficit do governo era financiado por empréstimos do Banco do Brasil (então com função de Banco Central) ao Tesouro e que implicavam na expansão da base monetária. Desde 1960 o déficit era financiado quase que integralmente por emissões de papel-moeda (op cit: p 218). Com despesas crescendo aceleradamente, o déficit do Tesouro em 1962 e 1963 ultrapassa a marca dos 4% do PIB. O descontrole das contas públicas em 1963 leva a oferta monetária se expandir rapidamente a partir de maio. Neste ano há ainda a deterioração significativa do Balanço de Pagamentos e da política cambial. A fragilidade fiscal do governo torna-se evidente.

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Jânio tinha uma visão conservadora de política econômica que diagnosticava as principais dificuldades econômicas do país como a aceleração da inflação, o descontrole fiscal e a deterioração das contas externas. Seu governo de curta duração não permitiu a avaliação da efetividade de seu programa de estabilização. A crise política, após a renúncia, a partir do último trimestre de 1961 leva a um maior descontrole fiscal, monetário, creditício e inflacionário.

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Jânio, eleito presidente em 1960, renunciou com menos de um ano de mandato em agosto de 1961. Fez mistério originalmente sobre suas razões, mas as esclareceu em 25 de agosto de 1991, no dia do trigésimo aniversário da sua renúncia, num depoimento-confissão a seu neto, no quarto do Hospital Israelita Albert

O desenvolvimento econômico com inflação não era buscado de forma deliberada, mas tácita. O financiamento via “imposto inflacionário”, aplicado mais intensamente a partir do final da década de 1940178, embora possibilitasse uma série de investimentos estatais, acabava sendo uma tributação disfarçada sobre os pobres, os mais ignorantes e acomodados, através da mudança nos preços relativos e ajustes para absorção do maior estoque moeda. Os perdedores deste processo de aumento generalizado de preços eram os que não tinham ativos capazes de se valorizar nominalmente e nem estavam suficientemente atentos para se defender das fortes mudanças no valor real que se dão nas acelerações inflacionárias. Os emissores de moeda (governos e bancos) bem como os empreendedores mais dinâmicos acabavam sendo os mais beneficiados por este processo.

A inflação em crescimento refletia ainda uma elevação no conflito distributivo e pressão por inclusão social que não encontrava solução na institucionalidade da época.

Alguns agentes empreendedores foram mais capazes de se beneficiar deste estado de fluidez econômica, ao investir nos processos produtivos dinâmicos que despontavam e criavam possibilidades de maior valorização real. Deste modo, aproveitaram melhor as grandes oportunidades de criar e de se apropriar das transferências de renda, riqueza e poder que ocorriam de forma intensa neste período de aceleração da industrialização-urbanização do país.

Einstein pouco antes da sua morte em 16/02/1992, aos 75 anos de idade. Neste o ex-presidente destacou: “Quando assumi a presidência, eu não sabia da verdadeira situação político-econômica do País. A minha renúncia era para ter sido uma articulação: nunca imaginei que ela seria de fato aceita e executada. Renunciei à minha candidatura à presidência, em 1960. A renúncia não foi aceita. Voltei com mais fôlego e força. Meu ato de 25 de agosto de 1961 foi uma estratégia política que não deu certo, uma tentativa de governabilidade. [...] Ao renunciar, pedi um voto de confiança à minha permanência no poder. Isso é feito frequentemente pelos primeiros-ministros na Inglaterra. Fui reprovado. Também foi o maior fracasso político da história republicana do país, o maior erro que cometi [...] Tudo foi muito bem planejado e organizado. Eu mandei João Goulart em missão oficial à China, no lugar mais longe possível. Assim, ele não estaria no Brasil para assumir ou fazer articulações políticas. Escrevi a carta da renúncia no dia 19 de agosto e entreguei ao ministro da Justiça, Oscar Pedroso Horta, no dia 22. Eu acreditava que não haveria ninguém para assumir a presidência. Pensei que os militares, os governadores e, principalmente, o povo nunca aceitariam a minha renúncia e exigiriam que eu ficasse no poder. Jango era, na época, semelhante a Lula: completamente inaceitável para a elite. Achei que era impossível que ele assumisse, porque todos iriam implorar para que eu ficasse [...] Renunciei no dia do soldado porque quis sensibilizar os militares e conseguir o apoio das Forças Armadas. Era para ter criado um certo clima político. Imaginei que, em primeiro lugar, o povo iria às ruas, seguido pelos militares. Os dois me chamariam de volta. Fiquei com a faixa presidencial até o dia 26. Achei que voltaria de Santos para Brasília na glória. [...] O País pagou um preço muito alto. Deu tudo errado’’. QUADROS NETO e GUALAZZI (1996).

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Segundo Varsano (1996:7), “O apoio à industrialização e ao desenvolvimento regional gerou um crescimento das despesas que não pode ser acompanhado pelo das receitas. Assim, a despesa do Tesouro Nacional, ao redor de 8% do PIB no final da década de 40, elevou-se para 11% a partir de 1957 e, no início dos anos 60, atingiu a marca dos 13% do PIB. Nessa época, o sistema tributário mostrava insuficiência até mesmo para manter a carga tributária que vinha conseguindo gerar na década de 50 (...) o déficit foi coberto quase que totalmente através de emissões.”

No período entre 1945 e 1963 a taxa de investimento nacional esteve sob forte crescimento levando sua média anual a subir para 14,42% do PIB. Este maior investimento possibilitou uma taxa de crescimento anual média mais elevada, atingindo 6,91% ao ano, todavia numa tendência em que já desacelerava no início da década de 1960. A carga tributária apresentou também tendência ao crescimento, dado seu comportamento pró-cíclico, atingindo a média de 15,83% do PIB entre 1947 e 1963179 (gráfico 5).

Gráfico 5: PIB, Carga Tributária e Investimento de 1945 a 1963

Variação do PIB, Carga Tributária e Taxa de Investimento anual

Brasil: 1945 a 1963 -5 0 5 10 15 20 25 30 1945 1946 1947 1948 1949 1950 1951 1952 1953 1954 1955 1956 1957 1958 1959 1960 1961 1962 1963

Fonte: IBGE/SCN 2000 Anual ano

( % d o P IB )

Variação real do PIB Taxa de investimento Carga Tributária Bruta Polinômio (Variação real do PIB)

Nos períodos de rápida expansão econômica e criação de mais produto e riqueza as restrições fiscais não apareceram tão claramente para a população. Havendo mais produto, mais fácil ficavam os processos da distribuição. Na estratégia da “fuga para a frente” dos conflitos apresentados, o Estado acabava por socializar perdas e conceder

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