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Histórico e Caracterização das Crianças, dos Adotantes e do Estágio de

CAPÍTULO 3: A Trajetória de Crianças Adotadas Tardiamente e Seu Retorno

3.2 Histórico e Caracterização das Crianças, dos Adotantes e do Estágio de

S., sexo feminino, cor negra, nove anos de idade. A mãe foi destituída do poder familiar quando a criança estava com três anos de idade, por maus tratos físicos,

psicológicos, abandono e negligência. A mãe teve diversos companheiros e com cada um deles uma filha. S., foi uma destas filhas. O pai da criança abandonou a família quando soube que iria ser pai. A mãe nos contou, em sua primeira passagem pelo Fórum, que passou a rejeitar a criança quando ela ainda estava na sua barriga. Aos dois anos de idade, S., teve seu primeiro abrigamento: a mãe a deixava sozinha em casa. Havia denúncias dos vizinhos que a criança era espancada pela mãe. O Conselho Tutelar abrigou a criança. S., ficou no abrigo 04 meses e retornou para a mãe. Desta vez, passou a ser negligenciada pela mãe: ficava sem comer e tomar banho, tinha tratamento diferenciado em relação as outras irmãs, porque ela tinha a pela de cor negra, segundos informações dos vizinhos. S., retornou novamente ao abrigo e lá ficou 06 meses. Quando retornou novamente ao convívio da mãe, ela já tinha outro companheiro. Este companheiro não aceitava a criança e acabou abusando sexualmente de S. Desta vez, o Ministério Público, entrou com o pedido de destituição do poder familiar da mãe de S., que fugiu levando as outras filhas. S., voltou ao abrigo pela terceira vez. No abrigo, começou a manifestar comportamentos regredidos: enurese noturna, movimento de pêndulo, dificuldades de comunicação (não falava com ninguém), dificuldade de aprendizagem na escola. Pedia constantemente pela mãe e chorava muito sem qualquer motivo. Não brincava com as outras crianças e evitava trocas afetuosas com os adultos. Levada para uma avaliação psiquiátrica, o médico, suspeitou de esquizofrenia. Desde então, a criança passou a ser estigmatizada de doente dentro do próprio abrigo e não era procurada para adoção. Na escola não conseguia passar de ano e passou a freqüentar classe especial. Era considerada dentro do abrigo como uma criança com forte carência afetiva. Também era uma criança que se ressentia muito quando presenciava outra criança sendo adotada. Pedia para ter uma mãe. A criança foi adotada por M.L., sexo feminino, cor branca, quarenta e nove anos de idade, solteira, professora de educação artística. Entrou para o Cadastro de Adoção em 2002. Por ocasião da avaliação psicossocial, contou que gostaria de adotar uma criança, por ser solteira e pela idade que tinha. Disse que se sentia em condições de oferecer um projeto de vida para uma criança. Não fazia restrição em adotar uma criança maior de sete anos de idade, desde que fosse menina. Também não fazia restrição quanto a cor da pele e até aceitava uma criança com algum tipo de deficiência física ou mental. Pesquisando na relação de crianças disponíveis para adoção, observamos que, S., tinha o perfil dado por M.L. Foi apresentada à criança e permaneceu com ela

durante um ano. Não houve qualquer preparo na transição da criança do abrigo para a ida na convivência da adotante, pois no dia da apresentação feita no Fórum, a adotante não aceitou realizar um período de visitação à criança proposto por nós e pelo abrigo. Também não foi possível passar informações sobre o histórico da criança no abrigo e suas imensas dificuldades e carências. Foi tudo feito às pressas, uma vez que a adotante estava acompanhada de seu advogado que rejeitou nossas sugestões. A adotante, visivelmente emocionada pela situação, não soube entender a importância do rito de passagem que significa a transição da criança do abrigo para sua companhia. A adotante não demonstrou nenhum sentimento de medo ou insegurança frente à nova situação; pelo contrário, demonstrou autoconfiança e preparo, afirmando ter experiência com crianças em função de ser professora há muitos anos. Durante o estágio de convivência, M.L. com S., houve o relato de inúmeras dificuldades no relacionamento com a criança. A adotante contou que S. não dormia à noite. Tinha pesadelos e acordava chorando e gritando. Também acordava toda urinada. Contou que teve que colocar a cama da criança em seu quarto, pois ela tinha medo de ficar sozinha. Relatou que a criança precisava dela para tudo: para ir ao banheiro, para se limpar, na hora de escovar os dentes e para tomar banho e se arrumar. A criança não tinha iniciativa para nada e solicitava sua atenção o tempo todo. Quando estava trabalhando era chamada na escola que S. freqüentava, pois a criança chorava muito e não acompanhava o desenvolvimento das outras crianças. Assustada diante da dimensão dos problemas apresentados pela criança, M.L. levou S. para uma avaliação médica. Nada foi diagnosticado. Em contato com o abrigo nenhuma informação era passada sobre a história da criança. Nas entrevistas realizadas no Fórum, ao adentrarem na sala de atendimento, S. , não permanecia ao lado da adotante, ela dava à volta na mesa e vinha se sentar ao nosso lado. Em momento algum observamos qualquer gesto de afeto da adotante em relação à criança. Nas visitas domiciliares, observávamos que a criança permanecia no quarto o tempo todo e ficava se balançando na cama. A adotante não entendia a forma como a criança se comunicava. Foi somente no quinto mês de convivência que a adotante se interessou em saber a história de vida da criança e quando o soube, demonstrou ter sido enganada. Disse que em momento algum havia dito na avaliação que aceitava criança com qualquer tipo de deficiência. Também não era observada qualquer modificação no comportamento da criança. Os mesmos comportamentos manifestados no abrigo, foram mantidos na convivência

com a adotante. A gota d’água na deterioração da relação, foi quando S. contou à empregada que o irmão de M.L., havia mexido em seus genitais, quando foi para a praia com o mesmo e suas primas. Quando chegou em casa, e ficou sabendo do ocorrido, a adotante levou à criança para fazer exame de corpo de delito. Nada foi constatado, uma vez que a criança já tinha o hímen rompido. Afirmando não ter mais condições de permanecer com a criança, a adotante a devolveu ao abrigo. S. retornou ao abrigo pela quarta vez e permaneceu abrigada por mais quatro anos até ser adotada por um casal italiano.

C., sexo feminino, cor branca, oito anos de idade. Até os três anos de idade, a criança foi criada por uma tia avó materna, que não tendo mais condições de cuidar, a entregou para a mãe. Quando a criança foi para a companhia materna, começou a ser vítima de maus tratos físicos, psicológicos e de abuso sexual. A criança era trancada no banheiro e lá ficava por dias, sem alimentação. Os vizinhos testemunhavam que a criança comia sabonete e ração de cachorro. C., apanhava muito da mãe, dos irmãos e do companheiro da mãe. Apanhou tanto, que teve o osso da bacia fraturado. Levada ao hospital, os médicos constataram que a criança também tinha o braço esquerdo fraturado e traumatismo craniano. Também apresentava queimaduras pelo corpo feitas com bitucas de cigarro. O hímem estava rompido e depois se soube que foi através de um cabo de pente introduzido na sua vagina pelo companheiro da mãe. A criança estava desnutrida e precisou ser acompanhada por uma junta médica. A mãe foi presa imediatamente. O companheiro dela fugiu para não ser preso, mas em depoimento para a polícia, acusou a mãe da criança de ser a causadora de tudo. A mãe foi condenada a cinco anos de detenção em regime fechado por crime de tortura e destituída do poder familiar. Na cadeia, contou que quando estava grávida de C. levou uma surra do pai da criança, precisando ser internada. Quando a filha nasceu não quis ficar com ela e a entregou para uma tia criar. Disse que tinha muito ódio da filha, porque ela lhe lembrava do ex-marido. Disse ainda, que a filha era uma criança muito difícil, desobediente e que só quando apanhava melhorava. Sentia-se muito arrependida pelo que fez e tinha esperança que quando saísse da prisão, poderia retomar a guarda dos filhos. Quando C. saiu do hospital foi levada para o abrigo. Lá encontrou os irmãos, mas como também apanhava deles, foi separada dos mesmos e encaminhada a outro abrigo. Procurando familiares que pudessem cuidar da criança,

encontramos um casal de primos da sua mãe que se predispuseram cuidar da mesma. Os irmãos da criança foram entregues aos avós maternos e não tinham contato com C. Durante o período que permaneceu com este casal, a criança continuou sendo vítima de maus tratos físicos. A criança recebia cartas de sua mãe que estava presa, mantendo a esperança de um dia voltar ao seu convívio. A mãe da criança saiu para passar o Natal com os pais, e não voltou mais para a prisão, ficando foragida. Chegou a fazer contato com a criança e parece ter sido este o motivo do Ministério Público ter pedido o retorno de C. ao abrigo. No abrigo a criança era considerada a “rainha da bagunça”. Tinha um comportamento arredio, agressivo com dificuldades de estabelecer vínculos com as funcionárias e outras crianças. Desconfiada e egocêntrica. Não sabia perder nas brincadeiras e jogos, ficava irritada e frustrada. Deixava os meninos passarem as mãos em seus genitais em troca de favores, principalmente, o de poder ganhar nas brincadeiras. Sedutora, conseguia ganhar tudo na conversa. Independente, não aceitava ajuda de ninguém. Dizia que quando morou com os primos fazia todo o serviço doméstico. Não gostava da escola, tinha dificuldades de aprendizagem e de manter a disciplina. Não pedia para ser adotada, dizia que ainda iria voltar para a mãe. Perguntava muito pelos irmãos, principalmente, pela irmã caçula. Não aceitava ter sido separada dos irmãos. Destruía todos os presentes que ganhava e todas as suas roupas eram manchadas de tinta de caneta. Urinava na cama e quando ia ao banheiro não se limpava adequadamente. Não se alimentava, dizendo que não gostava da comida do abrigo. À noite não dormia, e quando dormia tinha o sono agitado. Não aceitava ordens e limites impostos pelo abrigo. A criança foi adotada pelo casal J., sexo masculino, branco, trinta e oito anos, professor de geografia, casado há quinze anos com E., sexo feminino, branca, trinta e cinco anos, professora de geografia. O casal entrou para o Cadastro de Adoção em 2003. Não podiam ter filhos biológicos, uma vez que E. era estéril. Fizeram vários tratamentos para fertilização, todos infrutíferos. Optaram pela adoção como projeto para poderem ter filhos.Também havia a cobrança dos familiares. Davam muita importância à maternidade e à paternidade. Todos os familiares tinham filhos, só eles que não. Sabendo da demora na fila de adoção para uma criança recém-nascida, optaram por uma criança com idade acima de cinco anos, de preferência uma menina branca, até que pudessem adotar uma criança recém-nascida. Visitando o abrigo conheceram C. e se interessaram em adotá-la. Disseram que a criança foi muito carinhosa e atenciosa com eles,

chegando a ir no colo de J.. Também acharam a criança fisicamente bonita com traços bem definidos. Aceitaram visitar a criança durante trinta dias. Solicitaram licença para levar a criança para passar os feriados de final de ano em sua companhia, sendo prontamente atendidos pelo abrigo. Contaram que logo que chegou à casa do casal, C. correu para o quarto reservado a ela para ver o que havia. Mostrou-se desapontada: havia poucos brinquedos e roupas novas. C. fez questão de experimentar todas as roupas que havia no guarda roupas. Depois deitou-se no sofá da sala e perguntou ao casal o que eles eram dela. Despreparados para pergunta, se assustaram e disseram que não eram parentes e que estavam interessados em adotá-la. Exigiram que a criança passasse a chamá- los de pai e mãe. Outro acontecimento digno de nota, segundo o casal, foi quando a criança estava brincando ao lado deles, e do nada verbalizou que pretendia contar no abrigo que apanhava deles. O casal relatou que ficou perplexo diante desta conduta da criança, sentiram-se chantageados. Mesmo assim, levaram a adoção adiante. Quando a criança passou a viver em definitivo com eles, o primeiro mês de convivência transcorreu sem incidentes. Os problemas começaram quando a criança passou a freqüentar a escola. C., não fazia as lições de casa sem a supervisão da adotante. A criança só queria ficar assistindo televisão. Não tinha iniciativa para nada, para tudo solicitava a atenção dos adotantes – até para se limpar quando ia ao banheiro. Algo que irritava o casal era que a criança tinha a mania de quebrar todos os brinquedos que ganhava, não antes de fazer muito barulho. Depois queria montar tudo de novo e desmontar novamente. Fomos surpreendidos com uma ligação de E., relatando que a criança havia dito que ela não era sua mãe. Ficou perdida e não soube como agir, disse que chorou muito. O casal relatou que a criança tinha muitos problemas na escola: ficava andando pela sala, não entendia as orientações da professora, e dava seus pertences aos colegas de classe. Recusava- se a seguir qualquer limite imposto pela professora. Tinha vergonha de contar para as outras crianças que era filha adotiva, porque temia que “gozassem” dela. Os adotantes foram várias vezes chamados na escola em virtude do comportamento da criança em sala de aula. A professora estranhou o fato de C. ser filha adotiva, uma vez que não aparentava ter um comportamento de criança adotada, ela não falava da sua vida em família na escola. Tinha um comportamento anti-social e não tinha amizades. Algo que sempre chamou a atenção dos adotantes, é que as pessoas comentavam que C., era muito parecida fisicamente a E., e notavam que a criança

não gostava destas comparações. Nas visitas domiciliares que fizemos, sempre observamos que a criança ficava no quarto o tempo todo brincando. Os adotantes contaram que a criança tinha o costume de se intrometer na conversa deles, que era mandona e autoritária e que preferiam que ela ficasse no quarto. O sono da criança era perturbador. Gritava e se mexia muito na cama. Tinha pesadelos. Sentia falta do abrigo. Pedia para ser levada para visitar os amiguinhos que lá deixou. Falava muito da vida que teve quando viveu com casal de primos. As revelações que fazia desta convivência anterior, irritavam os adotantes. Davam a impressão que a criança ficava comparando as experiências que teve e que ainda não gostava de viver entre os adotantes. C., costumava perguntar aos adotantes que marcas eram aquelas que ela tinha pelo corpo. Dizia não se lembrar do que havia acontecido, dos maus tratos sofridos. O casal não sabia como agir: contava-se toda a verdade ou se não contava. Achavam que a criança no fundo sabia de tudo, só não queria admitir os maus tratos feitos pela mãe. A criança sempre se referia à mãe com saudades e carinho. Contou que teve contatos com ela depois dela ter saído da prisão. Contou que mantinha contato com os irmãos e que sentia muitas saudades da irmã caçula. Perguntava ao casal se eles iriam adotar os irmãos dela, o casal falava que não. Os adotantes não aceitavam o jeito de ser da criança: mentirosa e curiosa. Diziam que a criança mexia nos pertences da adotante e nunca admitia um erro, jogava a culpa nas outras pessoas. Às vezes a criança apresentava comportamentos extremados: muito carinhosa e muito agressiva. Os adotantes várias vezes verbalizaram nas entrevistas, que não se sentiam adotados pela criança. Não tinham idéia da dimensão dos problemas trazidos pela criança. Não foram avisados pelo abrigo sobre a vida da criança naquele lugar. Sentiam-se frustrados e sentiam que não correspondiam às expectativas da criança. Ela queria voltar para a mãe e os irmãos. Eles jamais teriam condições de concretizar este desejo. Com o tempo perceberam que não eram preparados para adotar uma criança com tantos problemas e pediram para que C. retornasse ao abrigo. Queriam mesmo adotar uma criança recém- nascida. Logo após o retorno da criança ao abrigo, os adotantes fizeram novo contato conosco, para relatar e mostrar os desenhos feitos pela criança no período que permaneceu com eles. Contaram que o desenho era uma forma da criança expressar seus sentimentos, uma vez que tinha dificuldades em expressar afeto através de gestos. Os adotantes chegaram a montar uma pasta com todos os desenhos da criança e os entregaram ao abrigo.

Os irmãos M., sexo masculino, cor branca, dez anos de idade e P., sexo masculino, cor branca, oito anos de idade; eram órfãos de pai e mãe. Os pais faleceram em virtude da contaminação pelo vírus da Aids. Com a morte dos pais, as crianças foram circulando entre os familiares por parte da mãe. Por todos os familiares que passaram eram colocados para pedir esmolas na rua e quando não chegavam em casa com dinheiro, eram severamente espancados. Em função disso, foram abrigados pelo Conselho Tutelar. No abrigo, nunca receberam visitas dos familiares. Em entrevista no Fórum, as tias maternas se recusaram a visita-los e concordaram que fossem adotados. No abrigo eram crianças agressivas, revoltadas, quebravam tudo que lhes caia nas mãos. Não aceitavam qualquer aproximação de adultos e eram tidos como os reis da bagunça. Enfrentavam agressivamente qualquer tentativa de imposição de limites, chegando a agredir colegas e professoras na escola. Inclusive com cuspes. Não gostavam da escola e eram constantemente transferidos. Os funcionários do abrigo pediam para que encontrássemos uma família para eles. A única atividade que faziam com certo prazer era desenhar. Desenhavam muito, até nas paredes do abrigo. As funcionárias ficavam encantadas com a qualidade dos desenhos. Observamos que nos desenhos havia um traço comum: casinhas todas muito coloridas. As crianças comentavam que gostariam de morar numa casa igual ao desenho. Após longo tempo de abrigamento, os irmãos começaram a ser visitados por A., sexo feminino, cor negra, quarenta e um anos de idade, solteira, assistente social. A., entrou para o cadastro de adoção com muitas dificuldades. Na avaliação psicológica contou que era solteira porque não gostava de homens. Considerada homossexual, foi reprovada. Entrou com recurso no Tribunal de Justiça, que lhe garantiu o direito de ingressar no cadastro. Conhecemos A., por intermédio do Grupo de Apoio à Adoção Projeto Acalanto. Ela estava procurando dois meninos para adotar. Não fazia restrição a idade, nem a cor da pele. Afirmava já estar velha para querer adotar um recém-nascido. Também dizia que havia ajudado as irmãs a criarem seus filhos e agora queria ter os seus. Os irmãos M. e P., tinham o perfil desejado pela adotante. Inicialmente, as visitas foram feitas no abrigo e depois os irmãos passaram a ir aos finais de semana para a casa da adotante. Não houve por parte da adotante, qualquer referência aos comportamentos dos irmãos. O abrigo também não informou como era o comportamento deles. Como a adotante era cadastrada por outro Fórum e morava em São Paulo, o acompanhamento do estágio de convivência, não foi realizado por

nós. Após um ano sem ter notícias da adotante e das crianças, fomos surpreendidos com uma visita da adotante no Fórum. Estava desesperada, pedindo nossa ajuda, porque pretendia devolver as crianças para o abrigo. Chorando muito, contou que não havia outra saída a não ser devolver as crianças. Contou que no início da convivência tudo transcorreu as mil maravilhas. Os problemas começaram quando os irmãos passaram a freqüentar a escola. Não tinha idéia dos problemas que iria enfrentar, não havia sido preparada. Disse que as crianças não aceitavam qualquer autoridade dela. Não queriam dormir nas horas determinadas e ficavam assistindo televisão até tarde da noite. Não iam à escola: não entravam e matavam aula. Foram pegos várias vezes pela Guarda Municipal e levados ao Conselho Tutelar. Ficava muito constrangida. Disse que os meninos pediam esmolas na rua e chegaram a vender as bicicletas que ganharam por ocasião do natal. Na escola extorquiam dinheiro das outras crianças. Ela não tinha apoio da sua família. Tinha vergonha de freqüentar a casa das irmãs com medo dos comentários, principalmente da diferença da cor da pela entre ela e a das crianças. Diante da impossibilidade de permanecer com os meninos procurou ajuda no Fórum respectivo, mas não foi atendida. Recorrendo ao grupo de apoio, foi orientada a nos procurar. Os irmãos retornaram ao abrigo e depois foram encaminhados a outro abrigo para adolescentes.

A trajetória das quatro crianças e dos adotantes contados acima merece uma atenção e análise que passaremos a expor.

Bowlby (2002), relata que a decisão de separar, por qualquer motivo, uma criança de sua família, é muito séria, desencadeando uma série de acontecimentos que afetarão, em maior ou menor grau, toda a sua vida futura. Seja qual for a causa da

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