• Nenhum resultado encontrado

3 AS PRINCIPAIS OCORRÊNCIAS DE GENOCÍDIO: DA SEGUNDA GUERRA

3.1 O HOLOCAUSTO NAZISTA NA ALEMANHA

Em primeiro lugar, deve-se explanar sobre o genocídio mais notório da história: o Holocausto. Este evento marcou a humanidade como o massacre mais numeroso registrado na contemporaneidade, onde mais de seis milhões de pessoas perderam a vida, principalmente judeus, ciganos, homossexuais e deficientes. O ódio aos judeus nunca foi uma novidade na Alemanha. O antissemitismo existe há centenas de anos na Europa, manifestando-se por teorias da conspiração, como de que seriam os judeus os assassinos de Jesus Cristo, ou de forma mais efetiva, como a morte de judeus durante a Santa Inquisição. Entretanto, essa foi a primeira que os números de mortos foram tão significativos.

O holocausto pode ser considerado o maior genocídio cometido até momento, deflagrado com uma tentativa de encontrar culpados para a derrota alemã e os seus efeitos na Primeira Guerra Mundial. Tudo começou com o assassinato de Francisco Ferdinando no ano 1914, que acarretou uma guerra de consequências mundiais, na qual o Império Alemão, derrotado, foi levado a assinar o Tratado de Versalhes, o que trouxe importantes perdas para o país. Um país enfraquecido pela guerra, somado ao medo do avanço socialista da União Soviética, se tornou um cenário fértil para as

ideias antissemitas de Hitler. Começou com o boicote de lojas judaicas e partiu para a total segregação do grupo, até que em 1935 foram proclamadas as leis de Nuremberg, que determinava que os judeus no país não possuíam mais cidadania alemã (VEZNEYAN, 2009).

Antes da imposição do nazismo, logo após a Primeira Guerra Mundial, o império Alemão foi transformado em uma república parlamentar instituída pela Constituição de Weimar em 1919. Durante este período, Adolf Hitler se associa ao Partido dos Trabalhadores Alemães, e após fracassar em uma tentativa de golpe de Estado (chamado de Putsch de Munique), e ser encarcerado por isso, elabora na prisão a obra de sua vida, Mein Kampf (Minha Luta). Após esse fracasso, Hitler acaba chegando ao poder através do cargo de chanceler, e por fim, com a morte do presidente Hindemburg, finalmente alcança a almejada posição de Führer (CAETANO, 2010).

Com o cargo de Führer, enfim Hitler alcançou o poder para instituir as leis de Nuremberg, ordenamento jurídico puramente discriminatório, que legalizava juridicamente a perseguição e segregação dos judeus. Os primeiros atacados foram os judeus que integravam o serviço público, em seguida, os operadores do direito.

Ainda mais medidas segregadoras foram tomadas, com a proibição de judeus frequentando as escolas e de possuir bens, e declarando, por exemplo, em que casos uma pessoa era categorizada como judia (GALINDO, 2017).

Desde os primórdios do partido nazista, a propaganda, a oratória e o carisma de Hitler foram a principal arma utilizada pelo Führer. Era comum encontrar nas ruas grandes bandeiras vermelhas com a suástica, além de discursos acalorados de Hitler na televisão e nos rádios. Nos jornais e revistas, era comum ver caricaturas depreciativas com os judeus e reduzindo-os a animais como ratos e vermes (PEROSA JUNIOR, 2009).

Com a propaganda nazista, liderada por Joseph Goebbels, Ministro da Propaganda na Alemanha Nazista, grande parte da população sequer se incomodou com a crescente perseguição, sinagogas queimadas e a criação de campos de concentração. Com a invasão à Polônia e o início da Segunda Guerra Mundial, a caça se intensificou, pois assim que o exército polonês sucumbiu, a captura de judeus poloneses se iniciou. Com a guerra se alastrando pela Europa, mais judeus acabavam à mercê do Estado Nazista, dando início ao que seria conhecida como

Solução Final. A Solução Final era o extermínio de todos os judeus, que, ao serem transportados para os campos de concentração, eram selecionados e sumariamente eliminados, sendo o método mais conhecido, as câmaras de gás (VEZNEYAN, 2009). A filósofa alemã e judia Hannah Arendt define a assimilação da perseguição pela população alemã como:

[...] todas as nossas experiências nos dizem que precisamente os membros da sociedade respeitável, aqueles que não tinham sido afetados pela comoção intelectual e moral dos primeiros estágios do período nazista, foram os primeiros a se render. Eles simplesmente trocaram um sistema de valores por outro. Diria que, portanto, os não participantes foram aqueles cuja consciência não funcionava dessa maneira, por assim dizer, automática – como se dispuséssemos de um conjunto de regras aprendidas ou inatas que aplicamos caso a caso, de modo que toda nova experiência ou situação já é prejulgada, e precisamos apenas seguir o que aprendemos ou o que possuímos de antemão. (ARENDT, 2004, p. 106-107).

Do ano de 1933 até 1945, o regime nazista originou cerca de 20.000 campos de concentração e extermínio, o primeiro destinado a prender judeus e o segundo para a eliminação efetiva. Aqueles que não eram mortos nas câmaras de gás, sucumbiam perante as péssimas condições a que eram submetidos, desde a viagem de trem que levava aos campos até a chegada ao local final, onde eram privados de água e comida (RODRIGUES, 2015). Sobre o processo de execução, conhecido como a “Solução Final” é explicada por Rudolf Hess, vice-líder do partido nazista, na obra Ascensão e Queda do Terceiro Reich, escrita pelo jornalista americano William L. Shirer:

A “solução final” da questão judaica significava o extermínio por completo de todos os judeus da Europa. Ordenaram-se em Julho de 1941 que se criasse em Auschwitz, facilidade para o extermínio. Já havia no Governo Geral da Polônia, nesse tempo, três outros campos de extermínio: Belzec, Treblinka, e Wolsek [...], Visitei Triblinka para ver como executavam o extermínio. O comandante do campo contou-me que havia liquidado 80.000 pessoas no decurso de meio ano. Estava muito interessado em liquidar todos os judeus do Gueto de Varsóvia. Usava “gás de monóxido”. Eu não achava que seu método fosse muito eficiente. Assim quando instalei o edifício destinado ao extermínio, Auschwitz, empreguei o Zyklon B, ácido prússico, que lançávamos na câmara de morte por uma pequena abertura. Matava as pessoas, na câmara de gás, entre 3 e 15 minutos, dependendo das condições climáticas. Sabíamos que as pessoas estavam mortas, quando seus gritos cessavam. Esperávamos, geralmente, cerca de meia hora para abrir as portas e remover os corpos. Removidos estes, nossos comandos especiais tiravam-lhes os anéis e extraíam o ouro dos dentes. Outra vantagem que tivemos sobre Treblinka foi construirmos nossa câmara de gás para acomodar 2.000 pessoas de uma só vez, ao passo que lá dez

câmaras de gás só acomodavam 200 pessoas cada uma [...] (SHEIRER, 1964, p. 54).

Apenas em 1945, com a derrota alemã, o povo judeu foi liberto pelas tropas soviéticas, inglesas e americanas, e, finalmente, pela primeira vez desde os tempos antigos, foi designado um território a ser ocupado por essas pessoas. A criação da nação israelense foi a solução encontrada para realocar os judeus, porém deu origem a novos conflitos que perduram até os dias de hoje com os antigos povos que habitavam a região, os palestinos (RODRIGUES, 2015).

Quanto à Alemanha, com o fim da Guerra, sofria as consequências dos seus atos. Um país devastado e empobrecido pela guerra, responsável por mais de seis milhões de mortos, fora os óbitos não contabilizados, chega a hora de identificar os responsáveis e julgá-los pelos seus crimes. Para tal julgamento, se reuniram os vencedores aliados e deram seguimento no que seria conhecido como Tribunal de Nuremberg (CAMPOS, 2008).

O Tribunal de Nuremberg pode ser chamado como um Tribunal de vencedores, pois partiu da premissa de beneficiar aqueles que derrotaram a Alemanha na guerra. Também se trata de um procedimento jurisdicional muito criticado, tendo em vista sua natureza ad hoc, isto é, não havia prévia determinação legal que criminalizasse a conduta nazista, pelo contrário, Hitler havia legitimado legalmente as atrocidades cometidas. Porém, apesar das críticas, o Tribunal marcou a primeira tentativa de punição ao genocídio (CAMPOS, 2008).

Após o fim do nazismo, a Alemanha passou por grandes transformações.

Logo após a guerra, com o país ainda sendo ocupado pelos aliados, iniciou-se o processo de “desnazificação”, que expôs para a população civil as barbáries comedidas e restringiu cargos importantes para pessoas abertamente apoiadoras do regime derrotado. Também se procurou indenizar as vítimas, repatriando os grupos marginalizados dentro da sociedade e devolvendo os bens que foram expropriados (GALINDO, 2017).

Tem-se que foram gastos mais de 3,5 bilhões de marcos alemães no processo de indenização, principalmente para os grupos de judeus e ciganos. Com a diminuição de partidários nazistas, o foco se passou para o registro e memória dos crimes cometidos contra a humanidade, com destaque para o Memorial do Holocausto, e também a preservação dos campos de concentração, sendo diversos

deles transformados em museus. A Alemanha atualmente não teme sacrificar sua liberdade de expressão, quando se trata de combater o nazismo, sendo veementemente punida qualquer manifestação neonazista (GALINDO, 2017).

Pode-se concluir, ao final de todo o processo, que dificilmente um regime genocida cresce sem ser embasados por preconceitos anteriores, sem ser insuflado, e que muitas vezes a própria população o apoia ou prefere não combatê-lo. A Alemanha foi extremamente transparente e se responsabilizou pelos seus atos, de forma que o mundo todo pôde ver as consequências que o antissemitismo traz.

Apesar do preconceito infundado contra judeus ainda perdurar em algumas partes do mundo, pode-se dizer que também é combatido, seja por sanções ou pela conscientização, porém o holocausto não preveniu os demais genocídios que viriam a ocorrer nos anos seguintes.

Documentos relacionados