• Nenhum resultado encontrado

SUMÁRIO

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

4.3.1 Horário das refeições: momento de encontro das famílias

Percebe-se, no relato das rotinas, uma grande preocupação com os filhos. Mesmo quando a rotina é bastante atribulada, pelas diferenças de horários entre as atividades dos membros da família, há uma preocupação declarada em manter a família integrada, e, para tal, o horário das refeições se revela como um momento importante. Uma das entrevistadas afirma que faz questão de ir para casa na hora do almoço, “nem que seja para brigar com os filhos” (SOFIA, 50 anos, professora).

Eva (53 anos, professora aposentada) e Mateus (54 anos, professor aposentado), casados há 29 anos, ressaltam que sempre fizeram questão de vir em casa almoçar com os filhos, mesmo quando tinham que “atravessar a cidade” para isso, pois consideram esse momento muito importante, uma vez que, em geral, à noite, mesmo havendo um horário para o lanche, este se dá de maneira mais dispersa.

O casal Renata (46 anos, pedagoga) e Sebastião (56 anos, professor aposentado) afirma que a única refeição que os dois fazem juntos é o café da manhã. Habitualmente não fazem refeições juntos, nem nos finais de semana, devido às diferentes atividades que

Cozinhas, eletrodomésticos e modos de vida: implicações dos eletrodomésticos nas transformações de rotinas

domésticas na cozinha, em residências de Florianópolis/SC.

197

desenvolvem. Nos finais de semana, ela normalmente almoça com o filho, e este, por sua vez, almoça com o pai durante a semana.

Um hábito comum, entre algumas famílias dos casais pesquisados, é almoçar em restaurantes de “comida em quilo”, durante a semana. Esse hábito não é seguido pelos aposentados entrevistados, que preparam o almoço, nem pelo casal Luana e Amauri, que têm seus horários de trabalho nos períodos vespertino e noturno, o que lhes permite preparar o almoço em casa e reunir-se, durante essa refeição, com as filhas. Esse momento parece ser agitado, como descreve Luana (37 anos, técnica em enfermagem):

Mas, assim, elas contam da escola, elas trocam de roupa, elas ajudam a botar a mesa, eu também vou botando a mesa, ele vai arrumando o material dele pra ir, o laptop direto em cima da mesa. A mesa é dividida, metade da mesa pra cá é pra comer, metade da mesa pra lá é o escritório.

Essa afirmação de Luana reflete um novo hábito que surge com a introdução de novos recursos tecnológicos de informática, como, por exemplo, laptops, notebooks, netbooks, i- pads, entre outros, os quais, por sua mobilidade facilitada, passam a ocupar também o espaço das interações durante as refeições. Isso não era comum com os computadores do tipo desktop, que não dispunham dessa mobilidade.

Joana (43 anos, auditora operacional) afirma que a rotina da família na cozinha se divide entre o café da manhã, em que cada um tem um horário diferente, o almoço e o jantar, que são refeições que a família faz conjuntamente. Nesses dois momentos a família se encontra e põe a conversa em dia.

Alan (42 anos, assistente administrativo) e Raul (31 anos, programador visual) afirmam que fazem todas as refeições juntos, mesmo quando essas são feitas fora de casa. Falam que atualmente só fazem em casa o lanche da noite, uma vez que a cozinha está em reforma.

Alan cita com prazer o ato de preparação da alimentação:

É uma coisa boa, porque acho que esse tempo que a gente ficava na cozinha preparando a comida, fazendo, a gente tá conversando. É um momento de descontração aonde não tem problema, não tem nada que precise ser resolvido, não tem nada incomodando a cabeça de nenhum dos dois, a gente tá conversando meio que se distraindo.

Cozinhas, eletrodomésticos e modos de vida: implicações dos eletrodomésticos nas transformações de rotinas

domésticas na cozinha, em residências de Florianópolis/SC.

198

Revelam que, quando cozinham, Alan é o cozinheiro, e Raul o auxiliar.

O casal formado por Eduarda (58 anos, técnica em comutação aposentada) e Anselmo (60 anos, professor aposentado) descreve sua rotina em relação à cozinha e diz que Anselmo, no período da manhã, prepara o café, cuida da horta e prepara o almoço. Segundo eles, a família normalmente almoça junto, incluindo as filhas casadas e os genros. Durante o preparo das refeições, o rádio fica ligado para Anselmo ouvir as notícias, pois, de acordo com ele, “nem tudo que passa no rádio passa na televisão.”.

Julieta (60 anos, professora aposentada) e João (62 anos, professor aposentado) revelam que a rotina da família na cozinha é a seguinte: pela manhã os dois tomam o café juntos, e o almoço é preparado por João, na maioria das vezes. O almoço se dá em conjunto com o filho solteiro. Afirmam que todos os filhos cozinham quando estão em casa, e é sempre motivo de confraternização.

Sulamita (27 anos, jornalista) e Pilar (31 anos, jornalista freelancer) fazem a maioria das refeições em casa, e há uma divisão nas responsabilidades pelo preparo das mesmas. Ressaltam elas que o ato de cozinhar desperta, e muito, a libido em ambas.

Nívea (62 anos, dona de casa) revela que faz as refeições sozinha quando o marido está fora, por motivo de trabalho, ou os dois realizam as refeições juntos.

O casal Zenaide (58 anos, professora aposentada) e Alberto (53 anos, empresário) faz as refeições em casa todos os dias, contando com a ajuda de uma empregada que as prepara. O casal vê o horário das refeições como um momento importante de reunião da família.

Kamila (27 anos, advogada) e Lucas (28 anos, guarda municipal) argumentam que fazem as refeições juntos e que, durante o preparo, também estão juntos. É um momento em que conversam e brincam com o filho.

Ângela (31 anos, artesã) e Mabel (30, barista desempregada) preparam juntas as refeições e fazem juntas com o filho todas as refeições do dia, aproveitando esse tempo para conversar sobre o que acontece no dia a dia.

Os demais casais citam o lanche da noite como o principal momento de reunião do casal com filhos e filhas, quando a maioria deles está em casa.

É importante observar que todos os casais entrevistados destacam a importância do horário das refeições para as conversas da família, como pode ser notado no depoimento de Sofia (50 anos, professora), referindo-se ao pai e ao momento da refeição em família: “[...] ele dizia assim: ‘A mesa é sagrada’, mas, nesse sentido, de que ele tava com os filhos, né? Então, essa coisa é importante. É um momento de reunião, assim. Não é o único momento que a gente usa, mas é o momento que a gente sente, que parece que o sentido da família se faz.”

Cozinhas, eletrodomésticos e modos de vida: implicações dos eletrodomésticos nas transformações de rotinas

domésticas na cozinha, em residências de Florianópolis/SC.

199

Todos os entrevistados afirmam a importância desse momento de reunião da família, mesmo para quem esse momento não é habitual, como pode ser observado no seguinte relato:

[...] eles têm muito o hábito, na família do Sebastião, não na minha família, de se reunir na cozinha, de ficar conversando depois da refeição. Na minha casa, tu terminava de comer, tu tinha que recolher tudo pra lavar a louça, pra deixar a coisa limpa. Na família do Sebastião, eles tin... eles têm o hábito, e, no começo, me agoniava muito, de ficar conversando. Aquele era um momento de congregar, de conversar, de rir [...]. (RENATA, 46 anos, Pedagoga).

Percebe-se que, entre os casais entrevistados, o momento de preparação do alimento, em alguns casos, e na totalidade o horário das refeições é tido como importante para a integração da família, sendo utilizado para colocar a conversa em dia, trocar informações, discutir questões cotidianas, sendo o espaço da comensalidade e da sociabilidade.