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I DEnTIfICAR A POPuLAçãO ALVO

SELEçãO DE OBSERVAçõES

A. I DEnTIfICAR A POPuLAçãO ALVO

Quando coletamos dados para fazer conclusões, identificar a popu- lação-alvo (ou “população de interesse”) é um passo crítico. Tal significa que todos os casos, sujeitos, países ou outras unidades em um espaço de tempo específico sobre o qual o pesquisador cole- taria informações se o tempo e os recursos não fossem restritos. Se o objetivo é estimar a idade média nos Estados Unidos, então a população de interesse inclui todos os seres humanos atualmente vivendo nos Estados Unidos, onde o investigador clara e precisa- mente define os conceitos de “seres humanos”, “Estados Unidos”,

“vivendo” e “idade”. Deve ser possível, em princípio, mesmo que não na prática, a coleta de todos os membros dessa população, e a definição da população deve ser suficientemente clara de maneira a não existir nenhuma ambiguidade quanto a quem está incluído e quem está excluído.

Essa tarefa pode parecer simples, mas vários exemplos na literatura jurídica sugerem o inverso. Considere o exame minucioso de Fried- man da história da “counter majoritarian difficulty”,314 um termo

que Bickel cunhou para refletir o “problema” de permitir que juízes não-eleitos vetem a legislação passada pelos representantes eleitos.315

Ao desenvolver essa história, Friedman tenta refutar uma parte do juízo convencional, qual seja, que a crítica ao exercício de revisão judicial da Corte corria em uma “seta direta dos tempos de Lochner até o New Deal”,316 com a natureza dessas críticas adquirindo formas

similares. Para tanto, Friedman detalha algumas críticas específicas que surgiram durante a Era Progressiva/Populista e o período do New Deal. Quanto à primeira, ele aponta para, entre outros, um comentário feito por Theodore Roosevelt: “Aqui os tribunais decidem se ou não (...) as pessoas devem ter cumpridas a sua vontade”; para o período do New Deal, ele cita uma frase escrita para Franklin Roosevelt por um “correspondente”: Nove HOMENS VELHOS, cuja idade total soma cerca de 650 anos, deveriam ter ajuda adicional”.317

O objetivo de Friedman, assim, é alcançar uma inferência descri- tiva; ou seja, usar essa amostra de citações para traçar uma afirmação geral sobre a população. Mas qual é essa população? Todas as críticas feitas por alguém contra a Corte? Aquelas feitas por ou para políti- cos? Aquelas na mídia? As registradas em livros de história? E qual é o espaço temporal de interesse? O período do New Deal começa com a eleição de Roosevelt ou com suas primeiras propostas econô- micas? Ele acaba com a Segunda Guerra Mundial, com a morte de

Franklin D. Roosevelt, ou com algum outro fato? É difícil responder a essas perguntas por meio dos exemplos e narrativas de Friedman, uma vez que ele nunca especifica o objeto preciso de sua inferência. O conhecimento empírico requer menos ambiguidade, porque sem a clara identificação da população-alvo, avaliar a qualidade das infe- rências e a incerteza de suas conclusões torna-se impossível. Mesmo que Friedman seja incapaz (por qualquer razão) de investigar cada um dos elementos em sua população, ele deve estar certo quanto a qual é essa população e, ao menos em teoria, estar apto a identificar todos os seus membros. O objetivo geral é crítico, mas mundano: o pesquisador pode atingir um objetivo mais facilmente se este objetivo está claramente identificado.

O estudo de Friedman é qualitativo, mas o mesmo pressuposto mantém-se para trabalhos quantitativos. Um exemplo é a investi- gação de Veilleux sobre aquilo que ela hipotetiza serem as maiores causas de declínio na proporção de suspensões de execução conce- didas pelas cortes federais: mudanças nas interpretações concer- nentes à doutrina do “abuso de lei (?)” (abuse of the writ doctrine) e aumento da atenção ao interesse dos estados.318 Para investigar

essas explicações; isto é, para traçar uma inferência causal, ela ana- lisa uma amostra de decisões de suspensão publicadas entre 1981 e 1995 pela Suprema Corte, pelas Cortes de Apelação do Quinta e do Décimo Primeiro Circuito, e por todas as cortes federais distri- tais localizadas nessas regiões.319 Tal é demonstrado; o que ela

deixa de definir, no entanto, é a população relevante em torno da qual ela quer elaborar a inferência causal. São todas as suspensões concedidas por todas as cortes federais desde o começo do tempo? São todas as suspensões publicadas? São todas as suspensões publi- cadas desde 1981?

mos nunca ter de adivinhar – como devemos neste caso, assim como no artigo de Fischer, tentando explicar a afirmação da posição dos acordos entre acusação e defesa na justiça criminal.320 No iní-

cio, Fischer escreve o seguinte:

Devemos seguir o curso de ascensão dos acordos entre defesa e acusação para atentarmos para a fonte de sua força. Contarei a história de como ele se desdobrou na América, apesar de que as suas primeiras instâncias possam também ter ocorrido em outros lugares, e apesar de que os acordos entre defesa e

acusação, dentro de um tempo, espalhar-se-ia pelo mundo da common law e além, ele primeiro triunfou aqui. Dentro da América, focarei em Massachusetts.

(...) Dentro de Massachusetts, focarei principalmente em seu maior condado, Middlesex County [,](...) onde trabalhei como promotor, uma experiência que tornou familiares para mim os rumos de seus tribunais e talvez ainda mais ciente da maneira como as coisas mudaram. Dentro de Middlesex County,

olharei mais atentamente à camada média do sistema judicial do condado, a qual possui jurisdição sobre todos os crimes, à exceção dos mais sérios. 321

Mas qual é o real objetivo de sua inferência? Baseado em sua descrição e em nossa leitura de seu ensaio, poderia ser qualquer uma das seguintes: acordos entre defesa e acusação (1) no mundo; (2) nos Estados Unidos; (3) em Massachusets; (4) em Middlesex, o maior condado de Massachusets; (5) na camada média do sistema judicial do condado; ou talvez algum outro lugar. A lista de possibi- lidades é aparentemente infinita, mas não deve e não precisa ser assim; o autor deve tornar conhecido o objeto de cada inferência.