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2.4 IDEIAS E IDEAIS DE FREIRE

O CENÁRIO DA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS 1990 a

2.4 IDEIAS E IDEAIS DE FREIRE

Paulo Freire, um dos mais célebres educador brasileiro, é a principal referência no que diz respeito à educação de Jovens e Adultos. Freire sempre esteve envolvido em movimentos sociais ligados à questão do analfabetismo. Para este autor a educação deveria dar possibilidades para os educandos participarem da vida política, econômica e social do país.

Para Freire (2007), uma das tarefas fundamentais da Educação Popular, é inserir os grupos populares no movimento de superação do saber do senso comum pelo conhecimento mais crítico.

Não é possível a educadoras e educadores pensar apenas os procedimentos didáticos e os conteúdos a serem ensinados aos grupos populares. Os próprios conteúdos a serem ensinados não podem ser totalmente estranhos àquela cotidianidade. O que acontece no meio popular, nas periferias das cidades, nos campos - trabalhadores urbanos e rurais reunindo-se para rezar, ou discutir seus direitos – nada pode escapar à curiosidade arguta dos educadores envolvidos na prática da Educação Popular (FREIRE, 2007, p. 15-16).

Freire denominou a educação proposta para os grupos sociais, como educação libertadora, uma vez que, a concepção de educação para este autor, implica numa ―inserção na realidade, num contato analítico com o existente para comprová-lo, para vivê- lo e vivê-lo plenamente, praticamente, buscando através deste contato, o desenvolvimento de uma mentalidade crítica e democrática em seus educandos (FREIRE, 1967, p. 93).

Para melhor entendermos a educação libertadora proposta pelo autor, é necessário, que antes entendamos a educação bancária, a qual ele se opõe e busca superar através de uma educação dialógica.

De acordo com Freire (1987), a educação bancária tem como característica fundamental a utilização da narração ou dissertação para transmitir os saberes dominantes. Estas ―práticas de ensino‖ exigem um sujeito narrador- o professor, sujeito que tudo sabe- e outro ouvinte e paciente, que são os educandos. A crítica que o autor faz é que através destas práticas de ensino a realidade é tratada ―como algo parado, estático, compartimentado e bem comportado‖ (FREIRE, 1987, p.33) e, muitas vezes, alheia às experiências de vida que os educandos possuem.

A educação bancária é uma analogia, em que a cabeça do educando representa o banco em que podem ser depositados conhecimentos, fica claro que o que importa é a capacidade de memorizar os conteúdos e não refletir sobre os seus significados.

Nesta concepção de educação não há diálogo, os saberes são construídos a partir de comunicados que é uma doação, quase um favor, daqueles que sabem, que se julgam sábios para aqueles que não sabem. Esta doação está baseada na ideologia da opressão, alienação e ignorância, já que não existe problematização dos conteúdos, que são ―depositados‖ como prontos e acabados na cabeça dos educandos, para que não haja tomada de consciência dos educandos.

Contudo, para Freire, só existe aprendizado se houver comunicação e interação entre os envolvidos no processo de ensino-aprendizagem. Os conteúdos devem ser pensados e discutidos de acordo com o interesse e a realidade dos educandos. De acordo

com Freire, não podemos impor um conteúdo para o trabalhador impondo um modelo de bom homem contido no programa cujo conteúdo nós mesmos organizamos, pois desta forma, haveria um desrespeito pela visão do mundo particular de cada sujeito como uma espécie de ―invasão cultural‖ (FREIRE, 1987, p. 49).

Diante disso, percebemos que a educação bancária, tem a função de apassivar os homens, adaptá-los ao mundo da opressão e dificultar seu pensamento autêntico. A educação funciona como um instrumento de domesticação, em que o sujeito mais educado é aquele mais adaptado ao mundo.

A educação bancária se disfarça como ―neutra‖ e ―humana‖ para defender certos interesses, ao mesmo tempo em que oculta a realidade e ilude os homens (BRANDÃO, 1983). E este é o desejo dos opressores: ―quanto mais se adaptam as grandes maiorias às finalidades que lhes sejam prescritas pelas minorias dominadoras, de tal modo que careçam aquelas do direito de ter finalidades próprias, mais poderão estas minorias prescrever‖ (FREIRE, 1987, p.36).

Tendo em vista esta situação opressora que ocorre no âmbito escolar através da educação bancária, surge a necessidade de uma reforma no sistema educativo, Freire propunha uma educação conscientizadora como forma de superar as amarras da opressão.

Segundo Freire (1967), conscientização é o desenvolvimento da tomada de consciência que, por sua vez pode ser entendida como a compreensão que se tem da realidade. O autor aponta três formas de consciência:

I- Consciência intransitiva: uma consciência fechada, que se atenta

apenas para questões vitais e não realiza questionamentos mais amplos, limitando sua esfera de interesses e preocupações. Segundo Freire, esta forma de consciência representa uma falta de comprometimento do homem com sua própria existência.

II- Consciência transitiva: à medida que aumenta o interesse do sujeito

em estabelecer diálogos com outros homens e com o mundo sua consciência transita podendo se tornar consciência ingênua que se caracterizaa peka simplicidade na interpretação dos problemas por aceitar explicações fabulosas em vez de assumir uma postura investigativa e pela fragilidade na argumentação e no estabelecimento de um diálogo.

III- Consciência crítica: pode ser desenvolvida a partir de uma educação

dialógica e que insira o sujeito num papel ativo, lhe proporcionando a problematização de situações vivenciadas e a prática de tomada de decisão. Nesta concepção o sujeito assume responsabilidades políticas e sociais, recusa a passividade possui segurança em sua argumentação, além de estar sempre aberto para receber novos questionamentos.

Esta última forma de consciência, é um ponto de partida para que o sujeito não aceite ser mero expectador de sua história e busque participar dos processos de tomada de decisão. Para o autor a atitude consciente e crítica é um meio de realizar sua vocação natural de integrar-se ao mundo.

Entretanto, apesar da educação ser um instrumento para favorecer este tipo de consciência:

Nada ou quase nada existe em nossa educação, que desenvolva no nosso estudante o gosto pela pesquisa, da constatação, da revisão dos ―achados‖ – o que implicaria no desenvolvimento da consciência transitivo-crítica. Pelo contrário, a sua perigosa superposição à realidade intensifica no nosso estudante a sua consciência ingênua (FREIRE, 1967, p. 95).

Segundo Freire, a educação deve ser um ato coletivo e solidário, diferentemente da forma como ocorre a educação bancária. A superação da condição de oprimido e a conquista da liberdade devem ocorrer a partir do conhecimento e do reconhecimento da necessidade de lutar por sua libertação, ou seja, deve ocorrer através da práxis.

O conceito de práxis tem um papel central na teoria de Freire ―a práxis, porém, é reflexão e ação dos homens sobre o mundo para transformá-lo, sem ela é impossível a superação da contradição opressor-oprimidos‖ (FREIRE, 1987, p.21). A autêntica reflexão irá conduzir à prática; e os saberes resultantes da ação deverá ser objeto de reflexão crítica. Assim a práxis conduzirá à construção permanente de novos saberes sobre a realidade. Segundo o educador, a libertação através da práxis se efetiva a partir de uma relação dialógica permanente.

A construção do conhecimento ocorre através de um diálogo crítico e libertador. Dessa forma, deve ser realizado no encontro dos educadores com os educandos a partir da valorização da realidade vivenciada por esses últimos.

Ao contrário do educador bancário, que não se questiona sobre o conteúdo a ser depositado em seus educandos, o educador dialógico, propõem os temas de acordo com a realidade dos educandos.

Arroyo (2006b) afirma que a relação entre o saber popular e o saber escolar pode ser considerado uma riqueza para o saber educativo da EJA e tal diálogo não pode ser perdido. De acordo com o autor o caráter dialogal apresentado por Freire foi um importante legado que passou a realizar uma leitura positiva dos saberes populares

trazidos pelos educandos. Outra autora que também concorda com essa posição é Ribeiro:

a disposição para o diálogo é base para procedimentos que são essenciais nesta modalidade educativa: a definição de objetivos compartilhados, a negociação em torno de conteúdos e métodos de ensino e o ganho de autonomia dos educandos no controle de seus processos de aprendizagens (1999, p. 193).

O educador na perspectiva da educação libertadora, não é aquele que apenas educa, mas também é educado, em diálogo com o educando, que ao ser educado, também educa. Ambos, se tornam sujeitos do processo em que crescem juntos e em que os ―argumentos de autoridade‘ já não valem (FREIRE, 1987, p. 39).

A educação é entendida como uma troca entre as pessoas mediatizadas pelo mundo, e não uma imposição ou uma construção isolada, assim, o conhecimento é construído coletivamente através de práticas permanentes de ação e reflexão.

Outra especificidade da EJA, está relacionada à conscientização política da mesma, segundo Arroyo (2006ª) esta situação só foi possível devido ao fato da EJA ser um campo que recebeu intervenções e propostas de diversos segmentos da sociedade.

Freire, sempre defendeu a importância da conscientização política para tomada de consciência da sociedade, para que isso seja possível, devemos nos atentar para que a prática educativa não se aprisione pela burocracia de elementos escolarizantes.

Diante disso, Freire (1987), defende que o papel do educador é problematizar os conteúdos e recriá-los junto com os educandos, que não são mais vistos como meros recipientes de depósitos, mas sim como sujeitos investigadores, que estabelecem diálogos críticos. A ideia é que o educador em conjunto com os educandos busque superar a consciência ingênua e a desenvolverem um pensamento crítico.

A teoria de Freire influenciou todos os cursos de formação da equipe da Secretaria Municipal de Educação nesse período.

Segundo documentos consultados a Secretaria Municipal de Educação era responsável pela folha de pagamento dos professores que cumpriam 20 horas semanais, distribuídas em 15 horas de trabalho em sala de aula e 5 horas de módulo para a confecção de material e formação com as coordenadoras, já os alunos, cumpriam 15 horas semanais de aula. Em 2005 eram 29 salas de aula que atendiam à 416 alunos.

Contatamos que no período analisado, a Educação de Jovens e Adultos no município de Uberlândia, passou por diversas reestruturações dentro do PMEA, sempre com o discurso de desenvolver uma proposta mais adequada de alfabetização, atrelada

aos interesses políticos de cada gestão. Como projeto foi tratada como modalidade, e como modalidade foi tratada equivocadamente como programa e projeto.

CAPITULO III