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Capítulo 2. Justificação da ação

2.2. Identificação do problema

Nos primeiros dois momentos de observação de aulas, o processo de observação da prática letiva traduziu-se numa maior consciencialização das dificuldades da PEI e na necessidade de haver tomada de decisões pedagógicas face ao processo de ensino-aprendizagem inicial. De acordo com Nunan (1989), a aula é o sítio ideal para a construção e negociação de saberes (entre alunos e professores):

Não existe nada que substitua a observação direta como meio de fazer descobertas acerca das aulas da língua. Se queremos enriquecer a compreensão do que significa ensinar e aprender uma língua, precisamos de passar tempo a olhar para dentro das salas de aula. Dado que são especificamente constituídas com o propósito de provocar a aprendizagem, seria de admirar se assim não fosse. A aula é o local onde se passa a acção. (p. 76)

Se associarmos esta teoria à formação inicial de professores, ensinar provoca a necessidade de aprender, apreender, refletir, descobrir e redescobrir. A sua finalidade inclui a construção e reformulação de saberes. O ano de estágio define ainda o futuro de muitos destes professores.

Embora no início, os professores estagiários encarem o momento de observação de aulas como um momento de avaliação das suas capacidades, com o passar do tempo esta visão altera-se e começam a perspetivar estes mesmos ciclos de observação como um confronto entre diferentes saberes, comportamentos e teorias. Allwright (1988) citado por Vieira (1993a) menciona uma “crença no observável” e como a mesma afirma “…através da análise do observável, se pode ver o que é invisível, chegar ao não-dito pela interpretação do dito, descobrir o pensamento através da palavra e da acção” (p. 38).

Foi precisamente assim que nasceu a base deste projeto, e, tal como referi no início, nos dois primeiros momentos de observação de aulas foi possível atentar numa série de lacunas a nível da postura, comportamento e práticas pedagógicas da PEI. Atendendo às fases de um ciclo de observação - encontro pré-observação, observação e encontro pós-observação – foi possível interpretar o que já tinha sido descrito como um possível problema para a PEI e, com base nos dados recolhidos, refletir sobre as lacunas detetadas.

Após análise e discussão das mesmas, chegamos à conclusão de que os “lesson openings” eram um passo crítico que condicionava todo o resto da aula. O stress, o

nervosismo, as pausas prolongadas, a postura introvertida, a baixa projeção de voz, a pouca empatia e recetividade por parte dos alunos, criaram uma barreira entre a PEI e os mesmos, que condicionou, de forma significativa, a prática letiva da mesma.

A escolha dos “lesson openings” não foi de todo aleatória. Os “lesson openings” têm como objetivo principal motivar, desafiar, criar curiosidade nos alunos e a minha prática mostrou-me que o início de uma aula de língua tem, sem sombra de dúvida, um impacto significativo na forma como a aula se desenrolará. Alunos desconcentrados, pouco motivados, sem curiosidade e imaginação serão alunos pouco participativos e desinteressados em aprender e apreender novos conceitos, matérias e uma nova língua.

A primeira lacuna nas aulas da PEI tinha lugar, precisamente, neste passo da aula e condicionava todo o desenrolar da mesma. Richards & Lockhart (1994) são da opinião que os começos de aulas se revelam eficazes para a aprendizagem da aula no seu todo e cabe ao professor usar as estratégias necessárias para captar a atenção dos alunos em termos cognitivos e até comportamentais. Richards & Lockhart (1994) vão mais longe e referem mesmo que “the way a lesson opens reflects a number of decisions that a teacher makes, either consciously or unconsciously” (p. 115). Segundo os mesmos, essas decisões podem estar relacionadas com a descrição dos objetivos da aula, com a revisão de conteúdos lecionados na aula anterior, entre outros. Contudo, destaco um, que, na minha opinião, condicionou o desempenho da professora estagiária ao longo do seu estágio e que não foi totalmente ultrapassado: “do something in order to capture the students’ interest and motivation”. (p. 115)

O stress e a ansiedade sentidos pela PEI não contribuíam, de facto, para criar a melhor atmosfera, mas é amplamente reconhecido que ser professor é uma tarefa ingrata. Ser professor estagiário de uma língua estrangeira é ainda mais ingrato, dado que as dificuldades linguísticas na língua inglesa afetam o desempenho dos professores estagiários e revelam uma enorme influência na forma como eles estabelecem contacto com os alunos. Para além disso, a gestão do tempo, dos alunos, das atividades, do plano e o facto de estarem a ser observados contribuem para o escalar do stress e da ansiedade.

e desde logo foram alvo de análise.

Durante o mês de fevereiro, nos seminários semanais, estas dificuldades foram novamente analisadas e a discussão ficou registada em áudio. A decisão de registar as conversas em áudio e posteriormente transcrevê-las prendeu-se com a ideia de reunir informação para mais tarde poder ser analisada pela PEI e por mim. De acordo com Bailey (2006), o uso de gravações áudio e vídeogravações possui vantagens referidas como “its longevity and its impartiality: Although they are selective, unedited videotapes and audiotapes are not judgmental. In addition, teachers, alone or with supervisors, can review tapes repeatedly” (p. 135). Ao gravar este primeiro momento de observação e identificação de algumas lacunas, esta mesma gravação iria servir para rever se estas lacunas iriam ser as mesmas no próximo momento de observação de aulas, que coincidiria com o primeiro ciclo do projeto de investigação-ação. A gravação pretendia apenas analisar o discurso e serviria para memória futura, mantendo a sua imparcialidade e veracidade. Nesta transcrição, procurei ser o mais fiel possível, sem inverter a ordem de palavras. Pequenos erros gramaticais de concordância verbal e nominal podem permanecer no texto dependendo do tipo de transcrição.

Segue-se a transcrição de um excerto que refere, precisamente, estes aspetos. Sup: Porque te sentes tão nervosa quando inicias uma aula?

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PEI: Porque tem a ver com a minha falta de experiência, a

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expectativa da aula para ver se eu vou com o plano

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respeitado, algumas aulas também são avaliadas e vistas

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pela professora da faculdade, ou seja, acrescento mais um

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stress. Também tem a ver com a minha personalidade, sou

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bastante reservada e tímida e ter os alunos a olhar para mim,

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também tenho medo, tenho essa sensação que eles vão

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julgar-me, se eu me enganei, ah! eles vão dizer a professora

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não sabe, mas à medida que a aula vai correndo eu acabo

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por me relaxar um bocadinho mais.

SUP: A questão da pronúncia é…

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PEI: Sim, também a questão da pronúncia, sim.

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SUP: …é preocupante?

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PEI: Sim, tendo um sotaque bastante carregado de francês,

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tenho medo que os alunos não me entendem. Então tento

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evitar algumas palavras que eu sei que a pronúncia me pode

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dar problemas e utilizar outras palavras. Agora o que pode

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acontecer, mesmo utilizando essas palavras, os alunos às

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vezes podem não perceber, tendo o fator de stress faz com

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que a pronúncia não seja perfeita, não é perfeita. Faz com

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que também acrescente um stress a mais.

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SUP: Adicional

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SUP: De que forma, e nós já falamos de algumas

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estratégias, é que esse stress inicial ou essa insegurança

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poderia ser ultrapassada? Uma das sugestões que eu fiz teve

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a ver com o fato de tu mimares as aulas, fazeres a mimica

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da aula antes de dares a própria aula, ou seja, em frente ao

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espelho, dares a aula para treinar.

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PEI: Sim, eu já costumo fazer isso.

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SUP: Achas que resultou?

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PEI: Resulta um bocado, porque sempre se vai mais

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preparada, eu já treinei isso, então sabemos como lidar com

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essas situações.

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Como se pode constatar, a PEI tem consciência que, muitas das suas dificuldades derivam da sua personalidade introvertida e da sua competência linguística,

extremada pela Língua Francesa. Logo no início do estágio, a PEI referiu que a influência da Língua materna (Francês) poderia ser um entrave no decorrer do mesmo, reforçando a ideia da sua insegurança. Tal veio a verificar-se e estas lacunas deram o mote para o uso do vídeo como ferramenta de recolha de imagem/dados para posterior análise, interpretação, reflexão e, se possível, redefinição de práticas letivas na disciplina de Inglês.