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As colecções de 2016 foram apenas o início da revolução de Michele. Em Outubro desse ano, a marca correspondeu às expectativas dos Millennials ao redesenhar o website que agora proporciona apresentações visuais e histórias e um serviço ao cliente personalizado através de webchat, e-mail e telefone, (Arienti, [et al.], 2018, p. 5). Para a colecção AW17 (Outono Inverno 2017), Glen Luchford realizou “Gucci and Beyond” (Gucci, 2017), um shortfilm surreal inspirado na estética sci-fi dos anos 1950-60 que se tornou viral e que vaticinou um grande acontecimento para a marca italiana que cul- minou na campanha Gucci Hallucination para a colecção Primavera Verão 2018, (Gucci, [s.d.] b; Gu- cci, [s.d.] c; Gucci, [s.d.] e; Gucci, 2018). Ignasi Monreal é o artista convidado para reinterpretar obras de arte icónicas para um shortfilm dirigido por Christopher Simmonds e aplicado numa campanha multiplataforma com páginas publicitárias em imprensa especializada; murais em Nova Iorque, Lon- dres, Milão e Hong Kong; montras com animações em vídeo e experiências de realidade aumentada através da utilização da app da marca; e galerias de arte interactivas nas flagship stores, (Arienti, [et

al.], 2018). A campanha foi considerada uma simbiose de iniciativas online e offline. Além dos murais

4(Nenny x i.M, 2019)

5(Lil Pump, 2017)

de Monreal, a dinâmica offline incluiu: os manequins das montras sentados em bancos em frente às animações de Monreal; autocolantes com Call To Action para fazer o download da Gucci app e scan às animações; versões impressas de bilhetes vintage como oferta aos clientes de 52 lojas da marca (os bilhetes davam acesso a wallpapers digitais e mais peças criadas por Monreal); as lojas seleccionadas tinham aparelhos de VR para proporcionar uma experiência imersiva e panoramas de 360° inspira- das nas animações que simulam um universo de sonhos.

Vários editoriais e publicações de moda incluíram imagética da Gucci Hallucination com possibili- dade de se fazer um scan através da app e estender a experiência da AI ao público através da impren- sa, (Petcu, 2018). A popularidade da campanha estendeu-se a uma colecção limitada de 200 t-shirts e 100 sweatshirts intitulada #GucciHallucination Collection com etiquetas numeradas, disponível ex- clusivamente online. A colecção foi fotografada por Julia Hetta num estilo surreal alinhado com o de Ignasi Monreal que evoca “os antigos mestres da pintura holandesa, Caravaggio e o movimento Pré-Rafaelita”, “com referências obscuras ao trabalho de Hieronymus Bosch”, (Gucci, [s.d.] f). Após o lançamento da campanha Gucci Hallucination, ao longo de nove meses, a Gucci registou 44,5% de aumento de lucros e atingiu a 47ª posição da listagem World’s Most Valuable Brands da Forbes. As notícias reportaram crescimentos de 115% e mais de 61,798,514$ em earned media, (Makris, 2018). A Gucci ascendeu à 36ª posição da listagem (uma subida de 11 lugares), e no segmento de luxo é apenas ultrapassada pelas gigantes Louis Vuitton (que segura o 15º lugar) e Hermès (no 35º lugar). Este ranking da Forbes atribui à Gucci uma valorização da marca de 14,9 biliões de dólares e lucros de 6,7 biliões de dólares, (Forbes, 2019).

Segundo o relatório Global Powers of Luxury 2018, elaborado pela Deloitte, no ano de 2017 as vendas de e-commerce da Gucci aumentaram em 86%, em que “os Millennials representam cerca de 50% dos lucros”. A consultora atribui este crescimento “às sinergias da reinvenção da marca para os consum- idores Millennial no estilo geek-chic e à sua experiência online”. Um dos destaques do relatório é que “A marca líder do grupo, Gucci, registou vendas online com um crescimento substancial devido ao novo website gucci.com e outras iniciativas digitais”, (Arienti, [et al.], 2018, p. 5).

3. Arte & Publicidade, Intericonicidade

a. Arte

“All art is quite useless.” Oscar Wilde

A discussão sobre a utilidade da arte pode ser semelhante ao debate sobre a utilidade do luxo.

Ainda assim, o movimento do esteticismo do século XIX epitomizou o slogan “arte pela arte”7. Esta

rejeição da utilidade e do significado da arte em favor do estilo exímio e do artifício perfeito é o

7Frequentemente atribuída a Théophile Gautier, esta máxima também está associada a Victor Cousin, Benjamin

triunfo da forma sobre a função, (Rohmann, 1999, pp. 8-9). No entanto, esta mesma dissertação debruça-se sobre a aplicação da arte à publicidade: as peças criadas por Monreal serão então arte ou publicidade? E o triunfo pertence à forma ou à função?

A par da epistemologia, da ética, da lógica e da metafísica, a estética (o estudo da natureza da beleza e da arte) é um dos cinco campos clássicos da filosofia. Para os gregos, a harmonia artística era apre- ciada segundo as regras da simetria, proporção e união. Mas foi apenas no século XIX que a ‘arte’ se tornou sinónimo das ‘artes finas’ (pintura e escultura) e da literatura. Até a ideia de ‘inspiração artística’ é um conceito relativamente moderno; durante a Idade Média a inspiração para uma peça artística derivava fortemente da sua função religiosa. Em A Crítica do Juízo, Kant revoluciona a es- tética, considerando que a sua apreciação “não apenas a percepção de beleza intrínseca, mas envolve um julgamento subjectivo e informado”. Desde então que a estética se distanciou da simples consid- eração de beleza em si mesma para questões como a natureza do artista, o papel da arte e a relação entre o observador e a obra. O consenso sobre estas questões não é absoluto: o poeta e crítico Samuel Taylor Coleridge caracterizou o envolvimento estético como “a suspensão voluntária do cepticismo” enquanto o observador aceita o imaginário proposto pela obra. Esta noção foi contestada pelo esteta Edward Bullough no século XX: Bullough defendia o “distanciamento estético” (a negação do en- volvimento com a atmosfera emocional e narrativa da peça) como única forma de verdadeiramente apreciar as qualidades estéticas de uma obra. Para a psicologia freudiana, a arte deriva de informação primária no inconsciente; para os marxistas, a arte serve um propósito social relativo à condição económica. Actualmente a arte é considerada um veículo de influências políticas, sociais e psicológi- cas, (Rohmann, 1999, pp. 9-10). O artista e activista chinês Ai Weiwei é defensor desta perspectiva da arte, (Weiwei, 2018).

A história da arte organiza-se em vários períodos. Uma análise rápida da tabela de conteúdos de The

Story of Art de E.H. Gombrich revela um início pré-histórico e primitivo; a era do Egipto, Mesopo-

tâmia e Creta; a beleza grega dos séculos VII e V a.C. até ao século I d.C.; as influências romanas, budistas, judaicas e cristãs; os séculos VI ao XI de profusão europeia; um longo período romano e bizantino do século V ao século XIII; a devoção à religião dos séculos XII e XIII; o realismo e a inovação do século XV concentrado em Itália; a harmonia toscana e romana do século XVI a par dos desenvolvimentos alemães e holandeses; a crise de arte europeia do fim do século XVI; a admi- ração da natureza no século XVII holandês; os jogos de poder e glória em Itália, França, Alemanha e Áustria do século XVII e XVIII; a era da razão em Inglaterra e França no século XVIII; a quebra com a tradição no virar do século XVIII para o século XIX; e, por fim, a busca de novos valores do século XIX e a arte experimental do século XX, (Gombrich, 1972).