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4. A LUTA DOS CATADORES DA ASMARE A PARTIR DA LEITURA DE

4.4. Avanços em âmbito nacional versus inflexões no âmbito local (2005 2010)

4.4.2. Imbricações entre o âmbito local e o nacional: um breve apontamento

É interessante observar que alguns profissionais da área de gestão de resíduos sólidos, algumas pessoas ligadas à Igreja Católica, gestores públicos e políticos que atuaram na experiência de formação da Asmare e no programa de coleta seletiva de Belo Horizonte, passaram a atuar no âmbito nacional, seja dentro do governo federal e/ou em instâncias extra- institucionais ligadas ao tema como o FNLC.

A ex-superintendente de limpeza urbana na gestão Patrus Ananias (1993-1996), ao fim da gestão petista, foi atuar no UNICEF na criação do FNLC e do Programa Nacional e Lixo e Cidadania. A ex-coordenadora do programa de coleta seletiva do mesmo período, por sua vez, também foi trabalhar na construção do FNLC.

O Fórum se tornou um espaço de articulação política em torno do tema, contando com a participação de diferentes segmentos ligados a temática, incluindo agentes de apoio à

organização de catadores de várias regiões do país. Dentre os componentes do Fórum estão membros da Pastoral de Rua de Belo Horizonte, como o ex-membro da Cáritas que se tornou militante do FNLC nos anos seguintes.

A partir de 2003, no governo Lula, tiveram início as ações de apoio aos catadores no âmbito federal. Uma das primeiras ações foi a criação do Comitê Interministerial para Inclusão Social de Catadores (CIISC). A ex-superintendente conta que com a criação do CIISC, o FNLC esvaziou-se porque grande parte dos integrantes do fórum foram trabalhar no governo federal em ministérios ligados diretamente ao tema ou com interfaces. Desse modo, passaram a participar das reuniões do CIISC representando os ministérios e não mais como representantes da sociedade civil dentro do FNLC. Já aqueles que não eram do governo, começaram a ser convidados para as reuniões do Comitê como o MNCR, o UNICEF, o Compromisso Empresarial para a Reciclagem (CEMPRE), dentre outros. A ex-coordenadora do programa de coleta seletiva também reforça esse acontecimento em sua narrativa.

Por sua vez, com a criação do MDS, em 2004, Patrus Ananias assume o ministério e convida para ocupar o cargo de secretária da SAIP/MDS a ex-superintendente da SLU de sua gestão municipal em Belo Horizonte. A ex-superintendente narra que passou a coordenar o CIISC e a construir parcerias para desenvolvimento de ações de apoio aos catadores. A ex- coordenadora do programa de coleta seletiva na gestão Patrus Ananias (1993-1996) também foi trabalhar no MDS na SAIP.Além dessas três pessoas, a ex-coordenadora conta que uma ex-analista de mobilização social da SLU também foi atuar no governo federal no MMA na área de saneamento. A ex-analista atualmente trabalha na Caixa Econômica Federal, que também integra o CIISC. Dentre seu campo de atuação, desenvolve projetos voltados para os catadores.

Outro aspecto a ser ressaltado refere-se ao envolvimento pessoal do ex-presidente no apoio aos catadores. A ex-superintendente relata que Lula assumiu o compromisso de, em sua gestão, desenvolver políticas voltadas para inclusão social e produtiva de catadores. Ela narra que o ex-presidente, ao visitar um aterro, viu uma pessoa comendo um pedaço de melancia podre, o que o sensibilizou muito. Conta, também, situações dos bastidores de elaboração de políticas públicas que reforçam o compromisso e o envolvimento pessoal de Lula para melhorar as condições dos catadores. Ela relata que quando estava para ser aprovada a Lei Nacional de Saneamento, em 2007, ele não aprovou, devolveu e disse que não estava abordando os catadores do jeito que ele queria. Mandou de volta para refazerem, de modo a prever melhores condições e possibilidades para o desenvolvimento do trabalho dos

catadores. Vale ressaltar também, o “Natal do Lula com os catadores”, realizado anualmente em São Paulo, desde 2003.

Além do Lula, a ex-superintendente aponta o papel desenvolvido por Gilberto Carvalho, que era chefe de gabinete do ex-presidente. Por ser uma pessoa ligada à Igreja Católica, aos movimentos sociais e ao MNCR, sempre apoiou os catadores. A entrevistada destaca que ele era a “porta de entrada” do movimento nacional dos catadores no governo federal. Fato também abordado na narrativa da atual administradora da Asmare.

É interessante observar as mudanças de papéis e o movimento rumo à atuação no governo federal, de pessoas que trabalharam na experiência de Belo Horizonte. Algumas delas foram procuradas pela Pastoral de Rua para apoiar os catadores, antes mesmo de ser construído o programa de coleta seletiva. Além disso, essas pessoas já possuíam relações de proximidade, seja profissionalmente ou de amizade. Na construção tanto da experiência de Belo Horizonte, quanto no desenvolvimento de políticas no governo federal, estão envolvidas pessoas que, para além da relação institucional, possuem relações de proximidade e/ou de grande envolvimento pessoal com a causa dos catadores.

Também é importante ressaltar o vínculo com a Igreja Católica de parte das pessoas envolvidas na construção de políticas para os catadores. A Igreja Católica, tanto em Belo Horizonte, como em âmbito nacional, com o MNCR, tem um papel fundamental na organização dos catadores e na articulação de uma rede de apoio.

Outro aspecto interessante foi o fato de militantes do fórum, representando diversas organizações da sociedade civil ligadas ao tema no país, terem passado a ocupar cargos do executivo federal, denotando mudanças de papéis e novas implicações na relação entre governo e sociedade civil. Além disso, os avanços na construção de ações, programas e políticas voltadas para os catadores no governo federal ocorreu em um contexto político favorável e com o então presidente envolvendo-se pessoalmente na questão.

Vale ressaltar que os comentários tecidos acima são de caráter exploratório, apontando alguns aspectos para análises em estudos futuros, uma vez que não é o foco dessa pesquisa analisar essas questões.