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2. POLÍTICAS EDUCACIONAIS NO BRASIL: aproximações históricas sobre a

2.2 Impactos das teses neoliberais na política educacional

Considerando que a resistência dos(as) trabalhadores(as) à opressão e à exploração representa a grande força motriz da história, pode-se dizer que a conjuntura atual brasileira expressa tais relações de poder. Ademais, tendo em vista que em sociedades capitalistas, as demandas do capital são dominantes, mas não determinantes, ao longo da história, a luta de classes implicou a conquista de direitos sociais, a exemplo do direito à educação.

No entanto, os direitos sociais reivindicados pelos movimentos e considerados como investimentos sociais, hoje

são classificados como “custo Brasil”. As carências de educação, saúde ou segurança são consideradas seja diretamente como custos, na medida em que impedem, retardam ou tornam mais onerosos os investimentos no desenvolvimento econômico, seja como custos para a sociedade que, através do Estado, terá que investir recursos para supri-las. (SAVIANI, 2000, p. 4)

Por que hoje essas necessidades são classificadas como custo Brasil? Como tratado anteriormente, no início dos anos 70 manifesta-se a crise do welfare state em face do esgotamento da fase de regulação keynesiana e do ressurgimento de ações ofensivas do mundo do trabalho, ou seja, das contradições entre capital e trabalho. O modelo de desenvolvimento das políticas tinha o keynesianismo como paradigma, cujo pilar básico era a

intervenção do Estado na economia, visando impedir as crises cíclicas do capitalismo. É esse modelo que se mostra incapaz de solucionar a crise gerada pelo estancamento econômico.

Enquanto o Estado mediou a relação entre capital e trabalho, conseguindo tanto controlar a luta de classes – por meio de vários mecanismos de negociação; como garantir a acumulação – mesmo que diminuindo a margem de lucros – os grupos hegemônicos não questionavam os investimentos estatais em políticas públicas.

Porém, com a crise de 70, ganham credibilidade as teorias que defendem a não- participação do Estado na economia, ocupando centralidade o neoliberalismo – retorno aos princípios ortodoxos do liberalismo9. Assim, as políticas passam a ser analisadas numa relação custo/benefício. Nas palavras de Bianchetti (2005, p. 23),

No diagnóstico sobre a crise do capitalismo, os neoliberais consideravam que as sociedades do mundo capitalista foram desviadas do processo natural evolutivo de suas instituições e devem retomar seu desenvolvimento, realizando um ajuste estrutural sobre a base do modelo econômico neoclássico considerado como manifestação objetiva das relações naturais entre os homens.

Além disso, a idéia de fim da história e/ou fim das utopias, advindas do colapso do socialismo real, simbolicamente representado pela queda do muro de Berlim, colocou o adiamento da construção de uma sociedade fundada na solidariedade e na igualdade.

Passa-se, então, a reforçar a crença de que não há outra saída a não ser se curvar à lógica do mercado. Tal crença pressupõe que as relações econômicas de mercado constituem- se na única forma de distribuição dos bens, mantendo o equilíbrio entre a demanda que cada vez mais cresce e a oferta, esta limitada pelas possibilidades da natureza (BIANCHETTI, 2005).

Entendido dessa forma, o neoliberalismo, constituindo um ataque à classe trabalhadora quanto aos seus ganhos históricos (frutos de sua luta), bem como aos seus sonhos de construção de uma sociedade justa, não pode ser considerado simplesmente como uma nova estratégia de acumulação capitalista. É um projeto de uma burguesia sempre atenta à necessidade de recomposição dos mecanismos de hegemonia visando à manutenção da ordem vigente.

Ramos (2005), ao fazer uma abordagem sobre a reconfiguração das relações econômicas da última década, define o neoliberalismo como ideologia que, no plano político, dá suporte a essas relações por meio da difusão de uma lógica de criar condições para a

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De acordo com Bianchetti (2005), o liberalismo se por um lado constitui-se uma ruptura com a ordem medieval, por outro representa uma continuidade da concepção que atribui à ordem da natureza as desigualdades sociais; refere-se tanto a uma filosofia centrada no indivíduo, quanto a uma teoria política preocupada com as origens e com a natureza do poder, como ainda a uma teoria econômica organizada sobre as leis do mercado.

realização do excedente econômico potencial, constituindo-se no novo discurso da economia política mundial. E acrescenta: “ele [o neoliberalismo] se instaurou como ideologia e prática; modo de compreender e agir; forma de gestão do mercado e poder político; concepção do público e do privado; ordenação da sociedade; e visão do mundo” (RAMOS, 2005, p. 31).

Bianchetti (2005), analisando a historicidade de alguns conceitos constituintes do ideário neoliberal, no intuito de explicitar as concepções de educação subjacentes a esta lógica, afirma a sua pertinência à raiz conservadora do liberalismo10. Nesse sentido, sinaliza que Friederich Hayek, da Escola de Viena, e Milton Friedman, da Escola de Chicago, são os autores que mais influenciam os intelectuais contemporâneos, tanto no se refere aos fundamentos epistemológicos como na orientação das políticas econômicas.

De acordo com o referido autor, as tendências conservadoras do liberalismo sustentam a necessidade de continuidade política como condição para a evolução natural das instituições econômicas que, por sua própria dinâmica, estabeleceriam o equilíbrio na sociedade. Tal equilíbrio seria permitido pela desigualdade dos homens e mulheres que, possuidores(as) das capacidades naturais que lhes permitem desenvolver-se, agem em função de seus próprios interesses, mas na sociedade, nas relações entre indivíduos, o somatório dessas ações individuais maximizaria o bem-estar coletivo.

Porquanto, as idéias neoliberais fundamentam-se na concepção do indivíduo como átomo social – unidade que identifica as demais tendências liberais, da qual decorrem os pressupostos de direito de propriedade e de impossibilidade de modificação das instituições sociais.

No que se refere ao primeiro, o neoliberalismo postula que o indivíduo tem a propriedade irrestrita de si e de seus bens, devendo ser respeitado na sua individualidade, através da “aceitação dos seus gostos e opiniões como sendo supremos dentro de sua esfera, por mais estreitamente que isto se possa circunscrever” (HAYEK, apud BIANCHETTI, 2005, p. 72). Resumindo: é a soberania dos objetivos individuais e, em conseqüência, o indivíduo como juiz supremo de seus próprios objetivos.

Este pressuposto leva ao segundo. Na visão neoliberal, as coincidências entre os objetivos individuais, ao longo de várias gerações, constituem o consenso alcançado pelos homens e mulheres: são as normas e tradições, que se desenvolvem naturalmente, do mesmo modo que os demais elementos da natureza – embora pareçam estruturadas e planejadas.

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Segundo Bianchetti (2005), na concepção liberal desenvolvem-se três tendências: conservadoras, moderadas e democráticas, todas compreendendo o indivíduo como átomo social; no entanto, diferenciando-se quanto à concepção de poder e ao contexto que deve conter as relações econômicas.

Assim, elas garantem a continuidade evolutiva da sociedade, não podendo, portanto, serem modificadas, sob pena de obstaculizar o processo de desenvolvimento.

Coerente com tais pressupostos, na perspectiva neoliberal, o alvo das críticas é o Estado, visto que a evolução natural das instituições sociais dá-se por mecanismos que nele se expressam. Estes teriam sido desvirtuados pelo welfare state através das políticas keynesianas, que incorporaram critérios outros que os de mercado, como a necessidade de padrões mínimos de saúde e educação, por exemplo.

Enfatiza-se, pois, o mercado como estruturador das relações econômicas, sociais e políticas. Sobre essa lógica do mercado Bianchetti (2005, p. 87) analisa:

As relações de mercado são comparadas, pelos liberais com as relações que se podem estabelecer em um jogo onde só existem certas regras que é necessário respeitar. Por isso, rechaçam qualquer intervenção externa que possa alterar as condições de suposta igualdade que deve imperar nesse tipo de disputa. Nesse sentido, a ação do Estado quando intervém nas atividades econômicas é percebida como um obstáculo que, ao favorecer alguns dos interventores, desequilibra o jogo.

Assim, o modelo neoliberal, apoiando-se na lógica do mercado estendida a todas as relações sociais, gera, entre outras coisas, um novo tipo de Estado e de políticas oficiais. Toma corpo a idéia da reconstrução do Estado, apoiada na defesa da necessidade de uma descentralização administrativa, política e financeira, como resposta às crises fiscal, da forma burocrática de administração e do tipo de intervenção estatal.

Entendendo o Estado como “organização que surge espontaneamente como produto da existência das relações de mercado” (BIANCHETTI, 2005, p. 79), o modelo neoliberal identifica-o como espaço de mediação entre indivíduos desiguais por natureza, tendo em vista a preservação da sociedade. Tal preservação se daria através do estabelecimento de normas aplicáveis a situações gerais, mas que não obstaculizem a liberdade de mercado.

De acordo com uma visão de mundo calcada no individualismo, nas análises neoliberais, os mecanismos de freio das energias do mercado tendem a inibir iniciativas empreendedoras dos indivíduos, assim como gerar máquinas estatais desvirtuadas das suas reais finalidades.

Nesse contexto, a única intervenção aceita do Estado “é aquela que tem por objetivo impedir (paradoxalmente) a intervenção do Estado na economia ou retirá-lo das atividades que, segundo sua interpretação, não correspondam com sua natureza”. (BIANCHETTI, 2005, p. 82).

Pautadas nessa ótica, as políticas sociais do Estado capitalista são vistas como onerosas, porque os gastos produzem um aumento da pressão fiscal sobre a população que tem maior poder aquisitivo e que não se beneficia diretamente com essas políticas.

Economizando palavras: o Estado é visto como ameaça à realização plena das relações mercantis, sob o pressuposto de que estas pertencem à natureza do ser humano, ou como diz Frigotto (1995, p. 84), “na realidade, a idéia de Estado mínimo significa o Estado suficiente e necessário unicamente para os interesses da reprodução do capital”.

Em consonância com a tese do Estado mínimo no âmbito das políticas públicas de corte social, os neoliberais defendem que o custo financeiro da educação seja conveniente com a lógica do custo-benefício, que se associa à produtividade, à busca de eficiência, ou seja, ao alcance dos objetivos propostos por um “caminho mais curto” e menos oneroso. Obviamente que a redução de recursos implica em diminuir a ação e a intervenção do Estado.

Tal diminuição tem significado a desobrigação cada vez maior do Estado em financia r a educação e o estímulo permanente à busca de parcerias na esfera do privado. O Estado deve subsidiar apenas os mais pobres, responsabilizando, inclusive, a família pela educação dos(as) filhos(as) e pela busca, no mercado, daquela modalidade mais adequada às suas condições. Assim, são as propostas de financiamento e descentralização que sintetizam o ideário neoliberal aplicado ao campo educacional.

No Brasil, as implicações das teses neoliberais no campo da educação evidenciam-se nas reformas educacionais, no âmbito da Reforma do Aparelho do Estado11, implementada no governo FHC, na segunda metade da década de 90, consubstanciando-se na segunda fase de ajustes, visando à incorporação do país no processo de integração das economias mundiais.

Tal fase, em que se implementam as chamadas reformas de segunda geração, constitui-se de medidas para a resolução dos problemas estruturais do setor público que, na perspectiva neoliberal, são comprometedores das reformas de primeira geração – relacionadas ao ajuste macroeconômico para a redução da inflação e restabelecimento do crescimento (GAETANI, 1998).

Neste cenário, a educação ocupa relevância graças às pressões, em especial, do sistema financeiro internacional, que proclama seu potencial para a redução da pobreza –

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Ao publicar o documento Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado (BRASIL, 1995), o presidente FHC evidencia a diferença entre a reforma do Estado e a reforma do aparelho do estado: “A reforma do estado é um projeto amplo que diz respeito às várias áreas do governo e, ainda, ao conjunto da sociedade brasileira, enquanto que a reforma do aparelho Estado tem um escopo mais restrito: está orientada para tornar a administração pública mais eficiente e mais voltada para a cidadania” (p. 17)

como se esta não fosse uma conseqüência inerente ao modo de produção capitalista – e a melhoria da qualidade da mão-de-obra, critérios importantes para que os países periféricos sejam considerados merecedores de investimentos.

As reformas educacionais, portanto, representam um desdobramento da Reforma do Estado, no tocante ao seu aparato institucional, inserindo-se no processo de redefinição do

modus operandi dos respectivos serviços públicos, como estratégia para o que se colocou

como prioridades para as reformas de segunda geração: melhorar as condições sociais, a competitividade internacional e manter a estabilidade macroeconômica (GAETANI, 1998).

Conforme com a tese neoliberal, que postula a necessidade de “construir um Estado forte, consistente, com uma economia dinâmica competitiva, da qual é parceiro e regulador, além de desempenhar de forma adequada suas funções clássicas (administração de serviços prestados direta ou indiretamente e gestão dos direitos sociais básicos)” (GAETANI, 1998, p. 86; grifos nossos), as políticas educacionais da década de 90 diversificaram as formas de distribuição de recursos e responsabilidades, apelando para o estímulo à participação da sociedade e para a distribuição de encargos em direção às empresas privadas, num evidente movimento de desresponsabilização da ação estatal e, conseqüente, privatização. Fato constatável na gestão da educação em São Luís, pelos mecanismos de parcerias entre a esfera municipal e as organizações privadas, de caráter não-governamental; questão que será discutida mais adiante.

Todavia, nos discursos oficiais das reformas, este movimento é denominado descentralização. Assim, o entendimento de descentralização refere-se à transferência de responsabilidades, apesar de, como analisam Castro e Carnoy (1997), esta ser apenas uma das modalidades de descentralização utilizada em tempos liberais, podendo assumir outras formas, dependendo da situação de desenvolvimento do país que a está utilizando.

No Brasil o que se verifica é uma transferência de responsabilidades públicas para a sociedade civil no que diz respeito à execução das políticas, que são definidas, fiscalizadas e avaliadas, centralizadamente, pelo Poder Executivo (dada sua hipertrofia nesse processo de redefinição do Estado), em consonância com os preceitos dos organismos internacionais.

No movimento da descentralização também se dá a transferência de responsabilidades aos estados e municípios – “descentralização vertical” (BRASIL, 1995, p. 18). Com a aprovação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) – Lei 9.394/96 –, a organização da educação apresenta-se dividindo o poder entre as esferas do governo, cabendo a cada uma delas organizar seus respectivos sistemas de ensino.

Nesse contexto, ao MEC coube a responsabilidade pela formulação, fiscalização e avaliação da política educacional nacional. Ainda à esfera da União coube a coordenação dessa política, articulando os diferentes níveis e sistemas, reduzindo seu papel executivo e fazendo predominar sua função supletiva e redistributiva em relação às demais esferas. Na análise de Pino (2001, p. 38), “sob a forma de desconcentração de algumas decisões e da ‘descentralização da execução’ (...) aos níveis dos estados e municípios oculta-se o objetivo de manter centralizado o poder de formulação de políticas públicas na área da educação”.

Outra medida redefinidora do papel do Estado, que afeta diretamente a educação, refere-se à publicização, entendida como “a descentralização para o setor público não-estatal da execução de serviços que não envolvem o exercício do poder de Estado, mas devem ser subsidiados pelo Estado” (BRASIL, 1995, p. 17-18). Este fato, aliás, justifica que a Prefeitura Municipal de São Luís, por meio da SEMED, tenha contratado serviços privados para a oferta de merenda escolar, assim como empresas de consultorias e ONGs para a gestão de tarefas relativas à avaliação, capacitação, gestão, antes sob sua responsabilidade, conforme se discorrerá posteriormente.

Transformando o modelo de gestão do burocrático para o de gerencialismo, a reforma do aparelho do Estado delimita suas funções em três âmbitos: as atividades exclusivas do Estado; os serviços sociais e científicos do Estado; e a produção de bens e serviços para o mercado. A partir dessas funções, define-se a divisão do aparelho do Estado em quatro setores: 1) o núcleo estratégico; 2) atividades exclusivas; 3) serviços não- exclusivos; e 4) produção de bens e serviços para o mercado (BRASIL, 1995).

A educação insere-se no setor de serviços não-exclusivos, o qual “corresponde ao setor onde o Estado atua simultaneamente com outras organizações públicas não-estatais e privadas” (BRASIL, 1995, p. 52; grifo nosso). Por constituir um direito humano básico, é um serviço que não pode ser totalmente privatizado podendo, no entanto, ser administrado pelo setor público não-estatal.

Verifica-se, pois um processo de publicização, viabilizando a política de parcerias entre o público e o privado, que nada mais é que outra forma de transferência de responsabilidades, tendo em vista que passa a ser de responsabilidade dos parceiros a execução das políticas definidas e avaliadas pelo Estado. Transforma-se a educação pública em educação pública não-estatal ou se coloca esse serviço à mercê da filantropia e do voluntariado, inclusive de empresas “amigas” da criança e da escola.

Merece destaque ainda outra orientação em que se evidenciam as implicações das teses neoliberais no campo educacional: a focalização do dever do Estado para com a

educação, mediante a transferência para todos os setores da sociedade, o papel de assegurá-la e a priorização sistemática do ensino fundamental regular em detrimento dos demais níveis e modalidades do ensino.

Tais medidas são orientações da Conferência Mundial de Educação para Todos, realizada em Jontiem, Tailândia, no ano de 1990, evento que se constitui um marco nas políticas educacionais do final do século e consolida a influência do BM – presente desde a década de 1960 – nesse campo.

Por fim, há de se ressaltar a reforma legislativa “que assegurou ao governo federal [nos dois mandatos de FHC] o controle do sistema, particularmente mediante a fixação de diretrizes e parâmetros curriculares nacionais e o desenvolvimento do sistema de avaliação” (RAMOS, 2005, p. 37).

Além da Lei 9.394/96 (LDB), anteriormente citada, pode-se mencionar as medidas regulamentadoras desta, a exemplo da Lei 9.424/96 que criou o Fundo de Manutenção do Ensino Fundamental e Valorização do Magistério (FUNDEF) e a Lei 10.172/91 que aprovou o Plano Nacional de Educação (PNE).

Nesse sentido, a política oriunda das reformas traduziu-se, grosso modo, nas seguintes medidas: descentralização, realocação de recursos públicos da educação superior e técnica para a educação básica, concentração da capacidade limitada de subsídio do Estado aos alunos pobres para desenvolvimento das necessidades básicas de aprendizagem no Ensino Fundamental; avaliação dos estabelecimentos de ensino tendo como referência a aprendizagem dos(as) alunos(as), assim como a eficiência das escolas na utilização dos insumos (custo-benefício); reformas curriculares no intuito de formar trabalhadores(as) flexíveis (treináveis, para um mercado em transição) e empregáveis.

Tendo como diagnóstico a crise dos sistemas escolares públicos, evidenciada nos baixos padrões de escolaridade, constrói-se o argumento de que, após anos de gestão de políticas educacionais por parte do Estado, construiu-se um sistema escolar que não logrou responder aos anseios e necessidades da população que precisa desse serviço.

Outro aspecto presente nesse diagnóstico é destacado por Costa (1995), quando revisa a literatura sobre a “insatisfação generalizada com a condução estatal da política educacional brasileira”, tendo por base a trajetória recente de formatação do sistema educacional do país. Segundo a autora, trata-se do processo de polarização do sistema escolar, ou seja:

A ação estatal seria capaz de, concentrando recursos, distribuí-los de maneira desigual, beneficiando ‘sobretudo as classes médias e alguns segmentos dos

trabalhadores assalariados que, incorporados de forma subordinada ao projeto hegemônico, ofereceram sustentação política ao governo’ (COSTA, 1995, p. 58). Parece estar presente a preocupação com as desigualdades que o sistema educacional pode reforçar ao ser considerado esse aspecto contraditório que por um lado, vem formando elites em algumas áreas do conhecimento e, por outro, excluindo alguns segmentos das classes populares que realmente necessitam da escola, tanto para ter acesso aos conhecimentos historicamente construídos quanto para buscar qualificação para o mercado de trabalho.

Todavia, em Bianchetti (2005), verifica-se que tais críticas já eram realizadas por Friedman, ao se preocupar com os impostos necessários para sustentar o sistema estatal, uma vez que as pessoas que não utilizam este serviço pagam duas vezes: uma ao Estado e outra à rede privada, onde matriculam seus filhos.

É essa a verdadeira preocupação dos pensadores neoliberais, atualmente inserida no diagnóstico de políticas educacionais com outra roupagem, no intuito de um convencimento sobre a atenção dispensada à equidade. Essa e outras críticas constituem os principais argumentos para justificar reformas educacionais que reduzam a ação do Estado e garantam o enxugamento dos gastos públicos e/ou melhor gestão dos dispêndios já existentes. Sob a égide de um pensamento calcado no princípio da desigualdade e em uma concepção individualista, os diferentes tratamentos na oferta de educação, que excluem milhares de crianças e jovens das classes populares do acesso à educação com qualidade, são naturais e inalteráveis.

Esse pensamento se expressa nos referenciais curriculares e nos objetivos da

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